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Fonte: Culturalia GZ
Tradução para o Galego: José André Lôpez Gonçâlez
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
A tradução deste poema vai dedicado à poetisa brasileira Lauelina NL que me encorajou a vertê-lo para a língua galego-portuguesa.
20 de janeiro de 2019.
Lembrança ou lembrando Maria A. é um poema de Bertolt Brecht escrito num caderno quando ia de trem para Berlim em 21 de fevereiro de 1920. O grande poeta publicou mais tarde este poema no poemário Bertolt Brechts Hauspostille (Piedade de Bertolt Brecht).
O poema vem a tematizar o recordo dum passado amor que Brecht, de forma magistral, capturou na imagem da nuvem branca que passa. A imagem da nuvem que desvanece com a lembrança da amada é um motivo literário que na altura usava o genial poeta, dramaturgo, romancista e teórico regularmente. Maria A. refere-se à rapariga de quem andou namorado em Augsburgo: Marie Rose Amann.
Quero acrescentar que o texto impresso não diverge da versão manuscrita em 1920. A única diferença chamativa vem do título. A “Canção sentimental número 1004” foi trocado polo de “Memória de Maria A”. Daí que a referência biográfica veio à tona apenas na versão impressa.
No poema, ao meu pobre entender, quer se manifestar o facto da memória incidir na perda da própria memória, isto é, sobre a dúvida. A memória é fugaz e casual.
Trata-se, sem qualquer dúvida, dum dos poemas de amor mais belos já escritos no século XX.
O poema foi musicado pola colaboração entre o poeta e o pianista e compositor Franz Servatius Bruinier (Berlim, 13 de maio de 1905 – Berlim, 31 de julho de 1928). Deixo debaixo um vídeo com o poema cantado.
1
Naquele dia na lua azul de setembro
Ainda sob uma ameixeira jovem
Segurei o amor quieto e pálido
Entre os meus braços como um sonho doce.
E sobre nós no lindo céu de verão
Uma nuvem que vi por muito tempo
Era muito branca e tremendamente alta
E quando olhei para cima, já mais não estava.
2
Desde esse dia muitas, muitas luas
Flutuaram calmamente e têm passado.
As ameixeiras foram provavelmente arrancadas
E se acaso me perguntas, o que foi daquele amor?
Então eu te digo: não consigo lembrar-me
E, no entanto, certamente, já sei o que queres dizer.
Ainda que o rosto dela, realmente, não lembre
Tudo o que sei agora é que eu beijei-a um dia.
3
E também o beijo teria esquecido há muito tempo
Se aquela nuvem não houvesse estado lá;
Lembro ainda dela e sempre a recordarei,
Era muito branca e vinha de cima,
Pode ser que as ameixeiras ainda floresçam
E que aquela mulher agora tenha o sétimo filho
Mas aquela nuvem só floresceu por alguns minutos
E quando olhei para cima, ela já estava debilitando-se ao vento.
Bertolt Brecht
(21.II.20, à noite 7h no trem para Berlim)
★ ★ ★
1
An jenem Tag im blauen Mond September
Still unter einem jungen Pflaumenbaum
Da hielt ich sie, die stille bleiche Liebe
In meinem Arm wie einen holden Traum.
Und über uns im schönen Sommerhimmel
War eine Wolke, die ich lange sah
Sie war sehr weiß und ungeheuer oben
Und als ich aufsah, war sie nimmer da.
2
Seit jenem Tag sind viele, viele Monde
Geschwommen still hinunter und vorbei.
Die Pflaumenbäume sind wohl abgehauen
Und fragst du mich, was mit der Liebe sei?
So sag ich dir: ich kann mich nicht erinnern
Und doch, gewiß, ich weiß schon, was du meinst.
Doch ihr Gesicht, das weiß ich wirklich nimmer
Ich weiß nur mehr: ich küßte es dereinst.
3
Und auch den Kuß, ich hätt ihn längst vergessen
Wenn nicht die Wolke dagewesen wär
Die weiß ich noch und werd ich immer wissen
Sie war sehr weiß und kam von oben her.
Die Pflaumenbäume blühn vielleicht noch immer
Und jene Frau hat jetzt vielleicht das siebte Kind
Doch jene Wolke blühte nur Minuten
Und als ich aufsah, schwand sie schon im Wind.
Bertolt Brecht
(21.II.20, abends 7h im Zug nach Berlin)