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A 18 de janeiro, o Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Porto Alegre completou 51 anos de existência. Os bancários gaúchos, para comemorar a data, promoveram um debate sobre eleições diretas. Giocondo Dias, do Coletivo Nacional de Dirigentes Comunistas, foi convidado para a discussão e interveio com o texto que publicamos abaixo.
É com satisfação que aqui compareço, aceitando vosso convite. Minha presença neste evento é testemunha da enorme importância que nós, os comunistas brasileiros, atribuímos ao vosso sindicato.
Realmente, um sindicato que ultrapassa os marcos dos cinquenta anos de lutas em um país como o nosso, de larga tradição autoritária e elitista na condução dos assuntos concernentes aos trabalhadores assalariados,
constitui um símbolo da presença do proletariado no cenário político e social. Ainda mais se registrarmos o elevado índice de sindicalização dos bancários em Porto Alegre que, segundo os dados de que dispomos, aproxima-se dos 80% da categoria deste município.
Já tendo sofrido três intervenções e tendo recentemente quatro de seus líderes cassados, o vosso sindicato reúne inegável experiência de lutas e vitórias dentro do movimento sindical brasileiro, notadamente a conquista da jornada de seis horas de trabalho e a semana de cinco dias. A realização do presente ato é, sem dúvida, um exemplo que deverá ser seguido, e a indicação, na prática, que os trabalhadores podem e devem participar da vida política.
Companheiros: o Brasil vive momentos críticos de sua história, seja no campo econômico ou no plano político. Simultaneamente a uma crise de gravidade inédita em nossa pátria, participamos de um momento crucial na transição para uma vida política democrática. Após a espetacular vitória oposicionista nas eleições de 1982, constatamos o desafio de novos e difíceis problemas para as forças da oposição. Ao inegável avanço, à confirmação da tendência principal rumo à democracia, somam-se também tendências desagregadoras, priorizando interesses particulares em detrimento da frente democrática, alguns apostando em saídas "por cima", através de acordos que excluem a ciasse operária, e outros propugnando uma salda golpista.
Todos, ou melhor, quase todos os brasileiros compartilham do sentimento de urgência que se deve dar à busca de soluções reais para a atual crise econômica. Constatamos uma correlação de forças políticas e sociais tal que, de um lado, nos deparamos com um governo e seus aliados sem base de sustentação, às vezes até parlamentar, suficiente para aplicar impunemente (como gostaria) todas as suas medidas em comum acordo com o FMI, sendo exemplo marcante a batalha parlamentar e de massas envolvendo os decretos anti-populares do ano passado. Por outro lado, também as forças de oposição não encontram uma coesão tal que lhes permita impor ao regime uma saída conforme os interesses da Nação. Acreditamos que isso se deve principalmente à debilidade da presença operária e sindical no campo da luta. Neste contexto é que se insere a proposta dos comunistas de "lutar para negociar e negociar para mudar".
Nós, comunistas, procuramos sempre a unidade contra o regime, principalmente a unidade do movimento sindical. Não terá nosso apoio qualquer tentativa que vise a divisão do movimento sindical. Entretanto, entendemos que as divergências são normais e devem ser resolvidas sempre através do caminho positivo, que é o da busca da unidade do movimento.
A história do movimento sindical, na qual os comunistas sempre tiveram grandes responsabilidades, contém experiências valiosas a esse respeito. Assim, por exemplo, constitui grave erro a partidarização desse movimento, pois que contraria por princípio a sua ampla base de representatividade. Isto não significa, contudo, que os sindicatos devam ser apolíticos. Ao contrário, entendemos que, hoje principalmente, faz-se urgente a presença do movimento sindical, unido, com uma clara proposta alternativa à atual orientação econômica. No Brasil de hoje, isso significa necessariamente optar por um regime democrático, por mudanças de caráter político que proporcionem soluções democráticas ao nível econômico, social e político. Só um novo governo em Brasília, eleito diretamente pelo povo, terá maiores possibilidades de conseguir uma saída positiva da crise que a Nação brasileira enfrenta.
Companheiros, as diferentes expressões políticas estão apresentando seus projetos para enfrentar a crise. Se os trabalhadores querem romper com a tradição de serem sempre excluídos das grandes negociações que envolvem opções de fundo na vida nacional, se querem evitar um novo pacto das elites, é preciso que se unam em torno de um programa mínimo que, ampliando a representatividade sindicai, capacite-os na mesa de negociações, para que as soluções sejam favoráveis àqueles que realmente produzem a riqueza do Brasil. E só organizados e unidos os trabalhadores serão ouvidos. A organização e a união são as armas que os trabalhadores possuem.
Inegavelmente, não passamos por uma simples crise conjuntural. A esta junta-se o quadro de crise econômica internacional de grandes dimensões. Já se reconhece publicamente que se trata da maior crise que o país já enfrentou, estabelecendo recordes de todo um século.
O Brasil, por sua característica dependente, é particularmente atingido, coincidindo também aqui uma crise estrutural, com uma crise conjuntural. As consequências são terríveis. O Jornal do Brasil, ainda este mês (8/1/84), apresentava como manchete o fato de encerrarmos 1983 com 10 milhões de desempregados. O pior é que não há indícios de melhora, caso se mantenha a atual orientação econômica; e o mesmo jornal, citando estudos do Instituto de Planejamento da Seplan, mostra que, para voltar ao índice de desemprego de 1978, com 5,6 milhões de desempregados, deveriam ser criados, até o fim do ano,7,5 milhões de empregos novos, o PIB teria que crescer 14% ao ano até 1986, e a economia em seu conjunto teria de crescer, até lá com taxas de 7% a 8% ao ano. Ora, não é preciso ser economista para imediatamente prever a impossibilidade de taxas tão elevadas.
Cabe ressaltar, ainda, que a presente crise é real também para outros segmentos da sociedade, embora atingidos diferencialmente. Assim, parcela ponderável dos capitalistas e milhares de pequenos produtores são levados à ruína. A exceção é a dos grandes monopólios e do capital financeiro. Segundo as leis do desenvolvimento capitalista, devemos estar presenciando um considerável aumento da concentração e centralização do capital nas mãos dos monopólios.
É por isto que, além dos assalariados, também outros setores sociais estão se posicionando contra a política econômica do governo federal. Para uma grande maioria da população brasileira, já está claro que este governo é incapaz de, pelo menos, abrir caminho para soluções positivas da crise, por seus compromissos com os monopólios, principalmente os estrangeiros, e por seu caráter autoritário, antidemocrático e antinacional.
A nosso ver, algumas medidas já se tornaram consensuais entre as forças democráticas, podendo vir a constituir a base de um programa mínimo, cujos itens principais podem ser assim sintetizados: enfrentar o endividamento externo segundo os interesses nacionais, rompendo com o FMI e declarando a moratória; maior controle e taxação dos monopólios, principalmente os estrangeiros; investimentos que criem empregos; proteção à pequena e média unidade de produção; ampliação do mercado interno com uma política salarial que beneficie a quem trabalha; reformas financeira, tributária e agrária.
Também vai obtendo um consenso cada vez maior a compreensão de que a solução dos problemas só é possível através da política, pois somente um governo que tenha legitimidade e suficiente base social e política poderá reverter as tendências recessionistas. Indubitavelmente, hoje, o estuário das diversas formas de descontentamento é a exigência de eleições diretas para a presidência da República.
A bandeira das eleições diretas vem encontrando apoio nos mais diferentes setores, afirmando-se realmente como veículo consequente da unificação daqueles que querem mudar a aluai orientação política oficial. Por outro lado, é importante notar que, principalmente para os trabalhadores, as eleições diretas devem significar parte de lodo um conjunto de mudanças. As eleições diretas não devem ser entendidas como um passo isolado, mas sim acompanhadas de amplas liberdades democráticas, com a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte livremente eleita, possibilitando, assim, a participação de todos os partidos políticos, inclusive dos comunistas.
Companheiros: assim entendemos nós as eleições diretas - realmente livres c abrindo caminho para mudanças profundas na vida econômica, social e política de nossa Pátria.
Por eleições livres e diretas!
Tudo pela unidade dos trabalhadores!
Tudo pela paz, a democracia e o socialismo!