(1939-1997): Hardial Bains nasceu na Índia em 1939, em Chak 6, hoje situado no Paquistão. Seu pai era um comunista conhecido na região, trabalhando sempre na clandestinidade quando não era preso por suas atividades anticoloniais, progressistas e de resistência às atrocidades cometidas pelo Raj-Britânico. Foi criado em Mahilpur, distrito de Hoshiarpur. A família de sete irmãos e irmãs sofreu muito com a perseguição dos britânicos. Hardial conheceu seu pai pela primeira vez quando tinha nove anos de idade. Embora sua mãe carregasse o fardo mais pesado, criando uma família sem uma fonte de renda, garantiu que todos os filhos recebessem educação. As irmãs de Hardial foram as primeiras mulheres a serem admitidas na faculdade Khalsa em Mahilpur. Os irmãos e irmãs mais velhos de Hardial puderam, então, sustentar a família quando atingiram idade suficiente.
Hardial era ativo politicamente desde a juventude. Entre seus oito ou nove anos de idade, ele se juntou, ainda criança, ao movimento comunista que lutava pela liberdade da Índia contra o domínio britânico, ingressou no movimento de juventude do Partido Comunista da Índia (PCI) quando estava na quarta série, sendo o membro mais jovem de todo o país. Relembrando aquele período tumultuado, Hardial disse: “Havia um requisito de idade mínima para os membros, mas como eu era relativamente alto para minha idade e geralmente ativo e enérgico, ninguém perguntava minha idade. Mais tarde, fui o secretário mais jovem em nível distrital”.
Viajou por todas as regiões da Índia, realizando diversas ações para organizar as massas contra o legado cruel imposto pelo Raj-Britânico na época da colonização. Hardial iniciou seu trabalho político no Canadá logo após emigrar e chegar a Victoria em 1959. Ele começou imediatamente a se familiarizar com a vida canadense, sua economia e sua história. Ele se integrou aos marceneiros e aprendeu sobre os Ghadri Babas, que lutaram pela liberdade indiana e contra as leis racistas de segregação impostas pelos britânicos no Canadá e em outros lugares. Mudando-se para Vancouver, ele fez pós-graduação em microbiologia na Universidade de Colúmbia Britânica (UBC) entre 1960-1965, e trabalhou como técnico de laboratório para o governo da região entre 1960 e 1961. Mergulhou-se no crescente movimento estudantil e nos movimentos da juventude até que foi eleito presidente da BC Students Federation (Federação Estudantil de Colúmbia Britânica) em 1964.
Uma característica de seu trabalho durante esse período foi criar uma organização com as forças sociais interessadas em promover as mudanças exigidas pela época. Em 1963, ele reuniu uma parcela da juventude de vanguarda e com visão de futuro para organizar o movimento The Internationalists (Os Internacionalistas). Esse grupo trabalhou para criar uma atmosfera acadêmica no campus da Universidade contra o sectarismo faccional e a conciliação ideológica com a classe dominante. Mais tarde, ele classificou essas tendências como os três “i”, de imperialismo, ignorância e impotência.
Hardial lecionou também no Trinity College Dublin, na Irlanda, de 1965 a 1967, como palestrante de intercâmbio. Seu manual de ensino ainda estava sendo usado pelo Departamento quando Hardial fez uma visita à universidade 25 anos depois.
Durante sua estadia na Irlanda, Hardial continuou com a prática de realizar reuniões democráticas junto com as massas ao ar livre, às quais compareciam um grande número de estudantes para discutir assuntos atuais da conjuntura e tirar ações práticas sobre suas principais preocupações e demandas econômicas e políticas. Assim, ele foi capaz de fundar The Irish Internationalists (Os Internacionalistas Irlandeses) em Dublin. Para ser capaz de dirigir e continuar esse trabalho, organizou o Necessity for Change Study Program (Programa de Estudos “Mudanças Necessárias”), sob a necessidade de envolver a juventude na análise de suas condições de vida e para que eles mesmos tirassem as conclusões fundamentais para as mudanças que precisavam. Uma série de importantes palestras que ele proferiu com base nesse programa o levou a realizar, em Londres (Inglaterra), dos dias 1 a 10 de agosto de 1967, a Conferência Mudanças Necessárias. As suas análises adotadas pela Conferência estão resumidas em seu célebre panfleto intitulado Mudanças Necessárias, que já vendeu milhares de cópias ainda naquela época. Esse panfleto foi republicado em 1998 com um novo prefácio do autor.
Em seguida, Hardial retornou ao Canadá, aterrissando em Montreal em 1º de maio de 1968. Muitos jovens revolucionários da Colúmbia Britânica e de todo o país se juntaram a ele em Montreal. Juntos, com Hardial à frente, realizaram um trabalho de organização revolucionária por todo o país. Em 7 de maio, Os Internacionalistas, que tinha sido fundado na UBC em 1963, foi reorganizado como um movimento estudantil de jovens marxista-leninistas, de acordo com as conclusões da análise “Mudanças Necessárias”, que revelou a importância de uma força organizada, baseada no centralismo democrático.
Hardial continuou a elaborar e enriquecer a análise de seu panfleto Mudanças Necessárias, agora com base também na experiência adquirida no decorrer do trabalho prático de organização do movimento. Assim, surgiram as condições necessárias para se fundar o Instituto de Estudos Ideológicos “Mudanças Necessárias” criado em 1967, que posteriormente ficou conhecido apenas como Centro de Estudos Ideológicos (CEI). Hardial trabalhou profissionalmente como diretor deste instituto pelo resto de sua vida.
Durante esse período, nos anos 60, Hardial Bains também liderou a fundação de muitas organizações que lutaram pelos direitos democráticos, inclusive defendendo os direitos de todos os trabalhadores e o direito do povo de Quebec à autodeterminação e aos direitos hereditários dos povos indígenas e originários. Seu trabalho em apoio às lutas de libertação dos povos da Albânia, Índia, Coreia, Vietnã, Indochina, Cuba, Grécia e de todos os povos do mundo garantiu que o conteúdo anti-imperialista fosse colocado em primeiro lugar. Seu trabalho acertou as contas com o chauvinismo anglo-canadense, o anticomunismo, o revisionismo moderno e o oportunismo de todos os matizes, bem como com o excepcionalismo dos EUA. Mais importante ainda, Hardial liderou o trabalho para fundar o Partido Comunista do Canadá (Marxista-Leninista) (PCC-ML) em 1970 e permaneceu como seu primeiro-secretário até sua morte prematura em 1997.
Em 1969, fundou, em Montreal, o Comitê de Defesa das Liberdades Democráticas (CDLD). Também entre 1968-1969, fundou os movimentos estudantis locais revolucionários e a organização Os Intelectuais e Operários Patriotas do Quebec (IOPQ), ao mesmo tempo em que construía os instrumentos para a imprensa do partido, que era publicada diariamente em dois idiomas desde o início. Hardial também organizou os indianos que residiam no exterior e reorganizou o Partido Hindustani Ghadar (PHG) em 1969, com base no centralismo democrático e nos princípios revolucionários, apelando a todos os mártires indianos. Organizações de todo o país fundadas sob sua direção incluem o Comitê de Defesa da Índia Oriental (CDIO), em 1973, e a Frente Popular Contra a Violência Racista e Fascista (FPCVRF), em 1980, bem como a Organização dos Povos da Índia Ocidental (OPIO), entre outras. Ele também trabalhou em estreita colaboração com as mulheres e a juventude na defesa de seus direitos.
O que lhe era mais caro era o trabalho entre os trabalhadores e operários, trabalhou de costa a costa para desenvolver um verdadeiro movimento operário, com base na política independente de classe, para que fossem capazes de enfrentar a crise capitalista e para que promovessem uma revolução socialista de acordo com suas tarefas históricas. Hardial dava muita atenção às questões culturais, incluindo festivais esportivos, música e literatura. Ele ajudou organizações de trabalhadores culturais no Canadá e na Grã-Bretanha, onde ele mesmo contribuiu com canções e poemas que inspiraram todos os que estavam lutando a continuar batalhando sem medo. Como diz a frase de um de seus poemas gravada no Monumento do PCC(ML) no Cemitério de Beechwood: “Que a marcha continue, pois o caminho está livre. Que o ser humano moderno faça história. Alguma coisa está chamando, siga em frente”.
Um fio vermelho que conectava sua política era a luta ideológica contra o revisionismo e a interpretação dogmática dos princípios marxista-leninistas. Muitos de seus escritos abordam como o abandono dos ideais progressistas e do socialismo foi o cerne do conflito na antiga União Soviética e na Europa Oriental, junto a traição às causas populares em vários países do mundo. A luta contra esse abandono foi uma característica marcante de suas atividades a partir da década de 1960.
Como parte disso, Hardial também desempenhou um papel importante na assistência aos partidos e organizações marxista-leninistas que surgiram em todo o mundo nas décadas de 1960-1970. Seu internacionalismo era tal que ele nunca interferia nos assuntos internos dos outros, ao mesmo tempo em que incentivava as massas de cada país a serem seus próprios modelos e a se manterem ideologicamente firmes. Na década de 1990, ele ajudou a organizar Seminários Internacionais sobre problemas comuns.
Hardial Bains era muito admirado por seus colegas, camaradas e por aqueles que conheceu no decorrer de suas atividades políticas por sua dedicação ao progresso da humanidade e pela adesão aos princípios mais avançados. A elite governante canadense desprezava sua política e o atacou com o notório programa Operação Caos, liderado pela Agência Central de Inteligência (CIA) dos EUA. Foi continuamente caluniado e difamado. Teve de lutar e derrotar vários processos fraudulentos que visavam criminalizá-lo e desacreditá-lo, e desafiou várias tentativas de assassiná-lo, inclusive tentando tirar o carro em que estava da estrada e incendiando o tanque de gasolina, além de outros atos desesperados. Ele foi alvo de um mandato da Interpol durante a Lei de Medidas de Guerra em 1970 e teve a cidadania canadense negada até 1988, o que acarretou a negação dos direitos de sua esposa e filhos. Também foi privado de seu passaporte pelo governo da Índia de 1975 a 1977. Ele esteve sob constante vigilância do FBI e teve sua entrada nos Estados Unidos negada.
Com o colapso da União Soviética em 1990 e o estabelecimento do chamado mundo unipolar, Hardial assumiu a missão de criar as condições para a revolução canadense em meio ao refluxo revolucionário mundial, com o objetivo de lutar contra a crise econômica capitalista que atingia a classe trabalhadora por todos os lados. Assim começa o trabalho para a chamada “Renovação Democrática” para se discutir as transformações necessárias para o Canadá. Em nome do Partido Comunista do Canadá (Marxista-Leninista), apresentou um pedido de “Reforma Eleitoral Sobre os Fundos Partidários” em 1990, de forma a democratizar o financiamento aos partidos políticos. Em 1992, dirigiu o “Comitê Vote Não!” no plebiscito reacionário de 26 de outubro, o chamado Acordo de Charlottetown, por meio do qual as classes dominantes do Canadá tentaram reformar a Constituição do Canadá, diminuindo a necessidade da participação popular, o papel dos trabalhadores, dos povos originários, imigrantes e ainda não respondia aos direitos de autodeterminação do Quebec. O “Comitê Vote Não!” saiu vitorioso diante de todas as forças dominantes que pressionavam as massas a votar pelo “Sim”. Para contribuir teoricamente com a vitória do “Não”, Hardial publicou dois panfletos que debatem os problemas constitucionais do Canadá, entre eles, o “A Essência do Relatório do Consenso Constitucional” e o “Um Futuro a se Enfrentar”.
Posteriormente, ele publicou um terceiro livro em 1993, “Um Poder a se Compartilhar”, do qual defendeu a necessidade de uma verdadeira “Reforma Democrática” no processo político canadense. Com o ímpeto e a unidade política obtida pela campanha bem-sucedida para derrotar o Acordo de Charlottetown, Hardial dirigiu a fundação do “Conselho Nacional Pela Renovação Política”, que levou a criação do Partido Canadense Para a Renovação (PCR), como uma organização legal para dar continuidade para o trabalho de Renovação Política do povo canadense. Em 1995, lançou a “Iniciativa Histórica”, um projeto de construção revolucionária da nação que exige que a classe trabalhadora constitua o poder político do país e confira soberania ao povo. Seu trabalho teórico concentrou-se na necessidade de acertar as contas com a antiga consciência política reacionária da sociedade de forma a permitir o surgimento do indivíduo democrático moderno. Sua vida foi interrompida prematuramente por um câncer em 1997.