Sobre as Correntes Filosóficas dentro do Movimento Feminista

Anuradha Gandhi


Visão geral do Movimento de Mulheres no Ocidente


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Internacionalmente um dos mais notáveis desenvolvimentos na era capitalista foi o surgimento e crescimento do movimento de mulheres. Pela primeira vez na história humana, mulheres se organizaram coletivamente para reivindicar seus direitos, ter seu lugar ao sol. A emancipação da mulher de séculos de opressão tornou-se uma questão imediata e urgente. O movimento desaguou em análises teóricas e soluções para o problema da opressão feminina. O movimento de mulheres desafiou a atual sociedade patriarcal e exploradora por meio de atividades práticas e por teorias.

Não é como se antigamente as mulheres não compreendessem sua opressão. Compreendiam. Articularam isto em diversas formas – canções populares, expressões e poemas concisos, pinturas e outras formas de arte a que tinham acesso. Também se enfureciam contra a injustiça que sofriam. Interpretaram e reinterpretaram mitos e épicos a fim de expressar seu ponto de vista. As várias versões de Ramayana e Mahabharat por exemplo, ainda em circulação entre mulheres camponesas através de canções em várias partes da Índia, são testemunhos vivos disso. Algumas mulheres extraordinárias que apareceram no período feudal que buscaram formas pelos meios disponíveis da época e se tornaram símbolos de resistência contra a ordem patriarcal. Mirabai, a santa, é apenas um exemplo entre vários que causaram impacto na sociedade. Isso é verdadeiro para todas as sociedades no mundo. Era uma contracultura, o que reflete uma consciência dos oprimidos. Mas era limitada por certas circunstâncias e foi incapaz de encontrar uma saída, um caminho para acabar com esta opressão. Em vários casos, buscaram a resposta na religião, ou algum Deus pessoal.

O desenvolvimento do capitalismo trouxe uma enorme mudança nas condições sociais e no pensamento. O conceito de democracia significou que as pessoas se tornaram importantes. O Liberalismo como uma filosofia política e social orientou esta mudança em sua fase inicial. As mulheres das classes progressistas se mobilizaram de forma coletiva. Assim, pela primeira vez na história, surgiu um movimento propriamente de mulheres, que exigiu da sociedade seus direitos e sua emancipação. Tal movimento, como todos os outros movimentos sociais, teve seus fluxos e refluxos. O impacto do capitalismo, mesmo que construído e distorcido em colônias como a Índia, teve seu impacto em homens e mulheres progressistas. Um movimento próprio de mulheres na Índia surgiu na primeira metade do século XX. Era parte desta efervescência internacional e ainda enraizada nas contradições da sociedade indiana. As teorias que surgiram nos países capitalistas encontraram a rota para a Índia e foram adaptados às condições indianas. O que se apresentou de uma forma ainda mais acentuada no contexto do movimento de mulheres contemporâneo que surgiu na década de 1960 no Ocidente.

O movimento feminino contemporâneo tem suscitado muitos mais desafios perante a sociedade porque os limites do capitalismo na sua fase imperialista são agora abertamente evidentes. Foram necessárias muitas lutas para adquirir legitimidade formal pela reivindicação por igualdade. E, mesmo após isso, tal igualdade ainda não se realizava não apenas nos países atrasados, mas mesmo em países capitalistas avançados como os Estados Unidos e França. O movimento de mulheres agora buscava pelas raízes da opressão no próprio sistema societário em si. O movimento de mulheres analisou o sistema patriarcal e buscou as origens do patriarcado na história. Abordaram as ciências sociais e demonstraram o viés masculino inerente a elas. Expuseram como uma forma patriarcal de pensar deixou sua marca em todas as análises sobre o papel da mulher na história e na sociedade contemporânea. Mulheres têm história, mulheres estão na história, elas disseram. (Gerda Lerner). A partir de estudos da história, recuperaram as contribuições que as mulheres deram ao desenvolvimento humano e em grandes movimentos e lutas. Também expuseram a divisão sexual do trabalho sob o capitalismo que relegou uma esmagadora maioria de mulheres às categorias com menores salários e menos qualificadas. Expuseram a forma como as classes dominantes, especialmente a classe capitalista, se beneficiava economicamente do patriarcado. Expuseram o caráter patriarcal do Estado, suas legislações e regulamentações. As feministas analisaram os símbolos e tradições de uma determinada sociedade e demonstraram como perpetuam o sistema patriarcal. Deram importância à tradição oral e, portanto, foram capazes de trazer à tona a voz das mulheres silenciadas ao longo da história. O movimento feminista fez com que homens e mulheres olhassem de forma crítica à suas próprias atitudes e pensamentos, suas ações e palavras com relação às mulheres. Desafiou as várias atitudes patriarcais, antimulher que contaminava mesmo movimentos progressistas e revolucionários e afetavam a participação feminina nestes. Não obstante confusões e debilidades teóricas, o movimento feminista contribuiu significativamente para a compreensão da questão das mulheres hoje. O movimento mundial por democracia e socialismo foi enriquecido pelo movimento de mulheres.

Uma das características importantes do movimento de mulheres contemporâneo foi o esforço feito por feministas para teorizar sobre a condição da mulher. Entraram no campo da filosofia a fim de dar um fundamento filosófico à sua análise e abordagem. Mulheres foram até filosofias de libertação e trabalharam com várias correntes filosóficas que consideravam que poderiam dar uma visão para a luta da mulher. Diversas correntes filosóficas como existencialismo, marxismo, anarquismo, liberalismo, etc., todas foram estudadas e adotadas por ativos movimentos femininos nos Estados Unidos e, em seguida, na Inglaterra. Portanto, as feministas são um grupo eclético que inclui uma grande variedade de abordagens, perspectivas e panoramas que variam de acordo com qual corrente filosófica adotada. No entanto, compartilham o compromisso de dar voz às experiências das mulheres e acabar com a subordinação feminina. Dada a hegemonia do Ocidente, estas tendências também tiveram uma forte influência sobre o movimento das mulheres na Índia. Assim, um estudo sério do movimento das mulheres deve incluir uma compreensão das várias tendências teóricas de dentro do movimento. As filósofas feministas foram influenciadas por filósofos tão diversos como Locke, Kant, Hegel, Marx, Derrida, Nietzsche, Freud. Ainda assim, a maior parte delas concluíram que a filosofia tradicional possui um viés demasiado masculino, onde seus principais conceitos e teorias, sua própria autocompreensão revela "uma maneira distintamente masculina de se aproximar do mundo". (Alison Jaggar). Daí tentaram transformar a filosofia tradicional.

Tendo em mente este pano de fundo, nos comprometemos a apresentar algumas das principais correntes filosóficas entre as feministas. Algo a se tomar nota é que estas diversas tendências não são fixas e separadas. Algumas feministas se opõem a estas categorias. Algumas mudaram sua abordagem ao longo do tempo, algumas podem mesclar duas ou mais correntes. Ainda assim, para fins de compreensão, esses tópicos gerais podem ser úteis. Mas antes de discutir as teorias, iremos começar com uma breve introdução ao desenvolvimento do movimento de mulheres no Ocidente, especialmente nos Estados Unidos. Esta digressão é necessária para entender o ambiente no qual que os desenvolvimentos teóricos entre as feministas cresceram.

Visão geral do Movimento de Mulheres no Ocidente

O movimento de mulheres no Ocidente é dividido em duas fases. A primeira fase originou-se em meados do século XIX e terminou na década de 20, enquanto que a segunda fase começou nos anos 60. A primeira fase é conhecida pelo movimento sufragista ou o movimento de mulheres por direitos políticos, ou seja, o direito ao voto. O movimento de mulheres surgiu no contexto de crescimento do capitalismo e divulgação de uma ideologia democrática. Surgiu em um contexto de outros movimentos sociais que emergiram na época. Nos Estados Unidos, o movimento de libertação dos escravos negros e o movimento de organização das crescentes fileiras do proletariado foram uma parte importante do fermento sociopolítico do século XIX. Nas décadas de 30 e 40 do século XIX, entre os abolicionistas (aqueles que militavam pela abolição da escravidão), existiam algumas mulheres escolarizadas que enfrentaram a oposição social à campanha de libertação dos negros da escravidão. Lucretia Mott, Elizabeth Cady Stanton, Susan Anthony, Angeline Grimke estavam entre as mulheres ativas no movimento anti-escravidão e que mais tarde se fizeram presentes também na luta pelos direitos políticos das mulheres. Contudo, dentro das organizações anti-escravidão a oposição às mulheres que as representassem e a mulheres na liderança as forçaram a pensar sobre seu próprio status na sociedade e os seus próprios direitos. Nos Estados Unidos, as mulheres de diversos Estados começaram a se juntar para exigir seus direitos à educação comum com os homens, pelos direitos das mulheres casadas à propriedade e ao divórcio. A Declaração de Seneca Falls organizada por Stanton, Anthony e outras em 1848 provou ser um marco na história da primeira fase do movimento de mulheres estadunidenses. Adotaram uma Declaração de Sentimentos aos moldes da Declaração de Independência, onde reivindicavam direitos iguais no casamento, propriedade, salários e voto. Por 20 anos, após esta Declaração, convenções em âmbito estadual eram chamadas, campanhas de propaganda através de palestras, panfletos, petições de assinaturas foram realizadas. Em 1868, uma emenda foi trazida para a Constituição (14a emenda), garantindo o direito ao voto aos negros, mas não às mulheres. Stanton e Anthony fizeram campanha contra tal emenda, mas não alcançaram sucesso em impedi-la. Ocorreu então um racha entre as mulheres e abolicionistas.

Enquanto isso, o movimento operário também crescia, embora a liderança sindical estabelecida não estava interessada em organizar as mulheres trabalhadoras. Apenas a IWW apoiou os esforços de organizar as mulheres trabalhadoras que trabalharam longas horas por salários extremamente baixos. Milhares de mulheres eram costureiras. Anarquistas, socialistas, marxistas, alguns dos quais eram mulheres, trabalhavam entre elas e as organizaram. Entre elas estavam Emma Goldman, Ella Reevs Bloor, Mother Jones, Sojourner Truth. Na década de 80 do século XIX, lutas militantes e repressão entraram na ordem do dia. A maior parte das líderes sufragistas não demonstraram interesse na exploração dos trabalhadores e não apoiaram o movimento. Entre o final do século e início do século XX um movimento de operárias desenvolveu-se rapidamente. Seu auge foi a greve de quase 40 mil costureiras em 1909. As mulheres socialistas eram bastante presentes na Europa e líderes comunistas mulheres como Eleanor Marx, Clara Zetkin, Alexandra Kollontai, Vera Zasulitch estavam na linha de frente da luta para organizar as mulheres operárias. Milhares de operárias foram organizadas e jornais e revistas feministas foram publicados. Foi na Segunda Conferência Internacional de Mulheres Operárias em Copenhague que Clara Zetkin, a comunista alemã e famosa líder do movimento internacional de mulheres, inspirada na luta das operárias estadunidenses, mudou a resolução para comemorar o 8 de março como o Dia da Mulher Proletária a âmbito mundial.

Até o fim do século, a situação da mulher havia sido submetida à muitas mudanças nos Estados Unidos. Ainda que não tivessem o direito ao voto, no campo da educação, direitos a propriedade, emprego, haviam conquistado muitos ganhos. Consequentemente, a demanda pelo voto havia ganho respeitabilidade. O movimento tomou um rumo mais conservador, separando a questão de ganhar o direito ao voto de todas as outras questões sociais e políticas. Suas principais táticas eram realizar petições e fazer lobby com os senadores, etc. Tornou-se mais ativo em 1914, com a entrada de Alice Paul que introduziu as táticas militantes das sufragistas britânicas, como piquetes, greves de fome, manifestações, etc. Devido às táticas militantes e forte campanha, as mulheres ganharam direito ao voto nos Estados Unidos em 1920. A luta das mulheres na Inglaterra começou mais tarde do que o movimento nos Estados Unidos, mas tomou um rumo mais militante no começo do século XX com Emmeline Pankhurst, com suas filhas e apoiadoras adotando táticas militantes para chamar atenção para suas demandas, enfrentando prisões diversas vezes para fazer pressão. Elas fundaram a União Social e Política das Mulheres (WPSU) em 1903, quando haviam se desiludido com o estilo de trabalho de antigas organizações. Foi esta WSPU que encabeçou a agitação pelo sufrágio. Contudo, estas se comprometeram com o Governo britânico quando a Primeira Guerra Mundial estourou em 1914. Tanto nos Estados Unidos, como na Inglaterra, as líderes do movimento eram brancas e das classes médias e branco e restringiram a sua reivindicação para as mulheres com este mesmo perfil. Foram as mulheres socialistas e comunistas que rejeitaram a demanda de voto limitada àquelas com propriedade e ampliaram a reivindicação para incluir o voto para todas as mulheres, inclusas as operárias. Organizaram mobilizações de massas separadas em apoio à exigência de direito das mulheres ao voto. O movimento de mulheres não prosseguiu durante o período da Grande Depressão, ascensão do fascismo e da Segunda Guerra Mundial. No período pós-guerra, os Estados Unidos vivenciaram um boom de sua economia e o crescimento da classe média. Nos anos de guerra, as mulheres haviam tomado todos os tipos de postos de trabalho para executar as atividades econômicas necessárias, mas após o fim do conflito, foram incentivadas a abandonar os seus postos de trabalho e tornarem-se boas donas de casa e mães.

Esta narrativa de prosperidade e contentamento durou até a década de 1960. A agitação social com o movimento negro dos direitos civis ganhou terreno e, mais tarde, o movimento antiguerra (contra a Guerra do Vietnã) surgiu. Foi um período de grande turbulência. A Revolução Cultural, que começou na China também teve seu impacto. A militância política entre estudantes universitários aumentou e foi nesta atmosfera de agitação política e social que o movimento de mulheres mais uma vez surgiu, desta vez inicialmente entre mulheres universitárias e professoras. As mulheres perceberam que enfrentavam discriminação nos empregos e salários e, em geral, na forma como eram tratadas na sociedade. A ideologia consumista também esteve sob ataque. Simone de Beauvoir já havia escrito O Segundo Sexo, mas seu impacto se sentia agora. Betty Friedman escreveu a Mística Feminina em 1963. O livro se tornou extremamente popular. Ela teve iniciativa de criar a Organização Nacional de Mulheres em 1966 para lutar contra a discriminação que as mulheres sofriam e lutar pela emenda de direitos iguais.

Mas o movimento autônomo de mulheres (movimento feminista radical) surgiu de dentro do movimento estudantil que tinha inclinações de esquerda. Estudantes negros do Student Non-violent Coordination Council (SNCC) (que havia realizado campanha para os direitos civis para os negros) expulsaram os estudantes homens e mulheres brancas na Convenção de Chicago, com a justificativa de que apenas os negros deviam lutam pela libertação dos negros. Da mesma forma, a ideia de que a libertação das mulheres é a luta exclusiva das mulheres ganhou terreno. Neste contexto, as mulheres membros do Students for a Democratic Society (SDS) exigiram que a libertação das mulheres seria uma parte de seu conselho nacional em sua convenção em junho de 1968. Mas foram vaiadas e votaram contra. Muitas destas mulheres saíram e formaram a Women's Radical Action Project (WRAP) em Chicago. Mulheres de dentro da New University Conference (NUC) — um corpo a nível nacional de estudantes universitários, funcionários e professores que queriam um EUA socialista — formaram um caucus de mulheres. Marlene Dixon e Naomi Wisstein de Chicago lideraram este processo. Shulamith Firestone e Pamela Allen começaram atividades semelhantes em Nova York e formaram o New York Radical Women (NYRW). Todas elas rejeitaram a visão liberal que mudanças nas leis e uma emenda de direitos iguais resolveriam os problemas da opressão da mulher e acreditavam que toda a estrutura da sociedade deveria ser transformada. Daí, chamavam a si mesmas de radicais. Sustentaram a opinião que grupos e partidos mistos (homens e mulheres) como o Partido Socialista, SDS, New Left não seriam capazes de levar adiante a luta pela emancipação da mulher e um movimento de mulheres, autônomo dos partidos, seria necessário.

A primeira ação pública da NYRW foi um protesto contra o concurso de beleza Miss América que levou este nascente movimento de mulheres a ter destaque nacional. Um ano depois, a NYWR se dividiu entre a Redstocking e WITCH (Women's International Terrorist Conspiracy from Hell). As Red Stockings emitiram o seu manifesto em 1969 e neste a posição do feminismo radical foi claramente apresentada pela primeira vez. "Identificamos os agentes de nossa opressão como os homens. A supremacia masculina é a mais velha e a forma mais básica de dominação. Todas as outras formas de exploração e opressão (racismo, capitalismo, imperialismo, etc.) são extensões da supremacia masculina: homens dominam as mulheres, uma minoria de homens domina o resto". "Sororidade é poderosa", "pessoal é político" se tornaram palavras de ordem que ganharam ampla popularidade. Enquanto isso, a SDS emitia o seu documento de posição sobre Libertação das Mulheres, em dezembro de 1968. Este foi debatido por mulheres a partir de vários pontos de vista. Kathy McAfee e Myrna Wood escreveram Pão e Rosas para indicar que a luta não podia ser apenas contra a exploração econômica do capitalismo (Pão) mas deveria ser também contra a opressão social e psicológica que as mulheres enfrentavam (Rosas). Estes debates realizados em vários jornais produzidos por grupos de mulheres que surgiram neste período eram levados com seriedade e influenciaram os rumos e inclinações dentro do movimento das mulheres não apenas nos Estados Unidos, mas também em outros países. Os grupos tomaram principalmente a forma de pequenos círculos de conscientização. Deve-se notar que todos estes movimentos seguiam ou o trotskismo ou a via Cubana de socialismo dentro da esquerda.

Elas se opunham a todos os tipos de estruturas hierárquicas. Dessa forma, as tendências socialistas e radicais dentro do movimento de mulheres surgiram. Ainda que tivesse várias limitações, dentro de uma perspectiva marxista, levantou problemas e trouxe à tona vários aspectos da opressão da mulher. No final dos anos 60 e começo dos 70 nos Estados Unidos e na Europa Ocidental "grupos distintos tinham visões distintas de revolução. Eram feministas, negros, anarquistas, marxista-leninistas e outras versões de política revolucionária, mas a crença de que a revolução já estava no virar da esquina, perpassava essas divisões". (Barbara Epstein). As feministas socialistas (marxistas) e radicais partilhavam da visão sobre revolução. Durante esse primeiro período, as feministas estavam trabalhando com a teoria marxista e conceitos chave como produção, reprodução, consciência de classe e trabalho. Tanto as feministas socialistas quanto as radicais estavam tentando adaptar a teoria marxista para incorporar um entendimento feminista da posição da mulher. Contudo, após 1975 produziu-se uma virada. A análise sistêmica (do capitalismo, de toda a estrutura social) foi substituída ou reformulada pelo feminismo culturalista. O feminismo culturalista começa com o pressuposto de que homens e mulheres são basicamente diferentes. Debruçou-se sobre as características culturais da opressão patriarcal e destina-se principalmente às reformas neste domínio. Ao contrário do feminismo radical e socialista, inflexivelmente rejeita qualquer crítica do capitalismo e enfatiza o patriarcado como as raízes da opressão das mulheres e se desvia para o separatismo. No final dos anos 70 e nos anos 80, o lesbianismo político surgiu como uma tendência dentro do movimento feminista. Ao mesmo tempo, as mulheres não-brancas (as negras e as mulheres do terceiro mundo que viviam nos países capitalistas do centro) levantaram críticas ao curso do movimento feminista e começaram a articular suas próprias versões de feminismo. As organizações de mulheres operárias por tratamento igual nos locais de trabalho, creches, etc., também começaram a crescer. Que o movimento feminista havia sido estritamente para as mulheres escolarizadas, brancas, de classe média dos países imperialistas e que estava focando em questões principalmente de seus próprios interesses havia se tornado óbvio. Isso deu origem ao feminismo global ou multicultural.

Nos países do terceiro mundo, grupos femininos também surgiram, mas as questões levantadas não eram necessariamente questões "puras" da mulher. A violência contra a mulher havia sido uma questão de primeira ordem, principalmente estupro, mas junto a isso havia questões que eram oriundas da exploração do colonialismo e neocolonialismo, pobreza e exploração devido ao latifúndio, questões camponesas, gentrificação, apartheid e diversos outros problemas que eram importantes em seus próprios países. Nos anos 90, o pós-modernismo se tornou influente entre as feministas.

Mas a reação conservadora contra o feminismo cresceu nos anos 80, principalmente se opondo à luta feminista pelo direito ao aborto. Também atacaram o feminismo por destruir a família, enfatizando a importância do papel da mulher no ideal familiar. Ainda assim, a perspectiva feminista se espalhou e inúmeros grupos militantes, projetos culturais e políticos pelas bases cresceram e continuaram na ativa. Estudos femininos também foram difundidos amplamente. Questões de saúde e meio ambiente têm sido o foco de atenção de muitos desses grupos. Muitas feministas de destaque foram absorvidas em trabalhos de Academia. Ao mesmo tempo, muitas das principais organizações e caucus se tornaram grandes instituições, absorvidas pelo establishment, dirigidas e funcionando como qualquer outra instituição burocrática. A militância decaiu. Nos anos 90, o movimento feminista é conhecido mais pelas atividades destas organizações e escritos de feministas na esfera acadêmica. "O Feminismo se tornou mais uma ideia do que um movimento, e um que não tem mais a qualidade visionária que já teve", escreveu Barbara Epstein na Monthly Review em maio de 2001. Nos anos 90, a crescente lacuna entre a condição econômica da classe operária e as minorias oprimidas e as camadas médias, a desigualdade de gênero continua aumentando a violência sobre as mulheres, a investida da globalização e seu impacto sobre as pessoas, principalmente mulheres do terceiro mundo, levou a um interesse renovado acerca do marxismo. Ao mesmo tempo, a participação de mulheres, principalmente jovens, em uma gama de movimentos políticos, como é evidente nos movimentos antiglobalização e antiguerra, ajudou ainda mais o processo de despertar de consciência.

Com este breve balanço geral do desenvolvimento do movimento de mulheres no Ocidente, iremos analisar as proposições das principais correntes teóricas do movimento feminista. Buscavam a criação de uma sociedade que não teria governo, hierarquia e propriedade privada.


Inclusão 30/09/2019