Sobre as Correntes Filosóficas dentro do Movimento Feminista

Anuradha Gandhi


Movimento de mulheres na Índia


capa
Baixe o livro em pdf

Muitas das correntes mencionadas anteriormente que se desenvolveram no Ocidente, têm seus reflexos em nosso país, particularmente vistas em alguns núcleos urbanos. Naturalmente, não se repetirão mecanicamente. Ainda assim, iremos enfocar em algumas de suas manifestações particulares no contexto indiano.

O Liberalismo na primeira fase

No período colonial, no século XIX, as ideias liberais influenciaram setores da intelligentsia em diferentes partes da Índia, particularmente no Índia Ocidental e no Sul, o que levou ao surgimento do movimento por reformas sociais. Naturalmente, a difícil situação das mulheres tornou-se uma das questões importantes em torno das quais se realizavam educação e propaganda. Contudo, a especificidade das condições sociais da Índia, onde o sistema de castas constitui importante instituição de opressão e exploração tornou a mobilização por reformas sociais também diferenciada. Já que muitos deles eram oriundos das castas mais altas, levantavam questões que afetavam principalmente as mulheres das castas superiores, como sati, purdah e viúvas que se casavam novamente. Durante o domínio britânico, inicialmente, eram homens os reformadores sociais como Gopal Krishna Gokhale, M.G.Ranade, Agarkar, Veerashivalingu, Ishwarchand Vidyasagar, Keshab Chandra Sen que se inspiravam na filosofia liberal em sua campanha para melhor as condições das mulheres. Defendiam a educação feminina. Porém, não defendiam direitos iguais em todas as esferas, procuraram somente melhorar os costumes mais cruéis como viuvez permanente.

Ao mesmo tempo, entre as castas médias e os intocáveis também houve um despertar que levou ao surgimento de intelectuais oriundo destas. O enfoque dado por Jotiba Phule era muito mais democrático porque colocou a questão da opressão de casta e ligou a questão da mulher com o sistema de castas. Eles reivindicavam direitos iguais para as mulheres e para todas as castas. Mulheres reformadoras sociais deste período inicial como Tarabai Shinde, Pandita Ramabai, Savitribai Phule, Ramabai Ranade, Muthulaxmi Reddy também deram um enfoque mais democrático, enfrentando a subordinação da mulher no seio da religião e da família. Elas lutaram para difundir a educação entre as mulheres, ajudar as em dificuldade e empregá-las. Ainda assim, suas atividades permaneciam basicamente no quadro das reformas sociais.

No contexto indiano, uma vez que a luta contra costumes e valores feudais se desenvolveu sob um regime colonial, com o apoio parcial da própria potência colonial que sustentava as classes feudais, esta não poderia assumir um conteúdo democrático profundo. Além disso, já que as principais forças pequeno-burguesas e burguesas que lideravam o movimento por reformas não eram a favor de romper com a estrutura feudal desde suas raízes, observamos que a ideologia liberal foi adotada em seu sentido mais limitado. No período após 1947, já que a Índia ainda não viu uma transformação democrática, dado que as mulheres ainda não são aceitas como seres independentes com direitos iguais e a existência de anomalias nas leis que negavam os direitos iguais das mulheres, costumes feudais opressores como o purdah e o sati, ainda continuavam, foi possível para mulheres das classes médias e altas ser ativas na questão da discriminação contra a mulher e pelos direitos com um olhar liberal.

Quando as massas foram mobilizadas no movimento antibritânico após a Primeira Guerra Mundial, as mulheres também começaram a se mobilizar por suas exigências. Assim, o movimento de mulheres surgiu dentro do movimento antibritânico. Os setores desse movimento, oriundos das camadas mais altas, eram influenciados pelas ideias liberais. Lideranças femininas como Mridula Sarabhai, organizações como All India Women's Conference (AIWC), Anjuman Khawateen-E-Islam, eram reuniões de mulheres das classes média e alta e realizavam campanhas e petições para os direitos das mulheres à propriedade, aos direitos no casamento, ao direito de voto, etc. Não questionavam a estrutura social ou ligavam a questão do status secundário da mulher com a questão mais ampla da estrutura social. Sua ênfase era garantir os direitos das mulheres através da lei. Hoje, a filosofia liberal rege o funcionamento das organizações e fóruns de mulheres como a Comissão Nacional de Mulheres, organizações gandhistas de mulheres como a SEWA e suas lideranças como Ila Bhatt.

A segunda fase, contemporânea

Mulheres das classes populares como operárias e camponesas, e também as estudantes foram mobilizadas em grandes números sob a influência da ideologia socialista e marxista. Elas participaram ativamente em lutas contra a opressão latifundiária e britânica, e organizações femininas com milhares de membros foram criadas em várias partes do país, especialmente em Bengal, Punjab e Andhra Pradesh. Na primeira fase do movimento de mulheres na Índia, durante a primeira metade do século XX, tanto as correntes liberais, como as marxistas foram consideravelmente influentes entre as mulheres.

Na segunda fase do movimento feminino na Índia, dos anos 70 em diante, a situação é muito mais complexa e as influências muito mais diversas. A mobilização das massas de mulheres teve lugar em problemas que surgiam das contradições que flagelavam a sociedade indiana: desemprego, aumento de preços, corrupção, contínua e brutal exploração dos camponeses pobres e sem-terra, tribais e não-tribais, pelos latifundiários. Mulheres foram mobilizadas sob liderança dos naxalitas, socialistas e partidos revisionistas como o PCI e o PCI (marxista). As principais lideranças dos grupos urbanos independentes de mulheres que surgiram em meados dos anos 70 vinham de mulheres escolarizadas que haviam sido ativas em vários grupos ou partidos de esquerda (revisionistas, revolucionários e independentes). Eram influenciadas pelo movimento de mulheres do Ocidente e os debates surgidos ali. A questão da violência contra a mulher – estupro, assassinatos pelo marido, sati, assédios, representação sexista da mulher na mídia, violência doméstica, etc., tudo isso foi enfocado pelo movimento urbano de mulheres. Estes grupos, seus membros e suas atividades inicialmente tiveram apoio da mídia e daí seu impacto amplamente difundido.

O movimento urbano de mulheres surgiu espontaneamente de forma independente de qualquer partido político. Sob o impacto do movimento de mulheres no Ocidente, os grupos também apontaram a importância de ter autonomia de partidos. A influência predominante sobre o movimento de mulheres autônomas era a do feminismo socialista. As atividades e pensamento desses grupos e indivíduos também passou por muitas mudanças ao longo dos últimos vinte e cinco anos. Responderam de forma diferentes às várias campanhas realizadas por elas. O crescimento de partidos e organizações de direita, particularmente o BJP, VHP e Bajrang Dal afetou o movimento. A mobilização de grandes números de mulheres em apoio ao sati, na campanha para demolir o Babri Masjid, e mesmo em apoio ao movimento contra os pogroms contra muçulmanos em Gujarat fez o movimento de mulheres perceber que mera "sororidade" não pode unir todas as mulheres. A natureza das atividades realizadas pelos grupos urbanos mudou no final dos anos 80, com menos foco em propaganda entre as mulheres e mobilização de massas entre estas, além de mais ênfase em documentação, influência na mídia, lobby pelas mudanças em leis, etc., ajudando mulheres em dificuldades. O impacto do feminismo socialista é bem mais amplo do que destes grupos porque se espalhou entre homens e mulheres da comunidade acadêmica e entre setores amplos de mulheres intelectuais.

O impacto do feminismo socialista pode ser claramente visto na forma com que as questões são levantadas. O foco destes grupos tem sido no patriarcado, em especial na violência familiar e suspeitam de qualquer política organizada, inclusos partidos revolucionários. Mas de forma consistente, se opuseram às políticas direitistas e expuseram seu caráter antimulher através de seus escritos e pesquisas. Também desempenharam papel importante ao expor a brutalidade destes partidos e do Estado em manifestações e pogroms e seu impacto em mulheres, seja nos protestos anti-sikh em Délhi em 1984 ou no massacre de Gujarat em 2002. Mas não tiveram um papel tão significante ao apoiarem diversos movimentos de massa que surgiram nas últimas duas décadas nas regiões rurais onde as mulheres desempenharam papel ativo e também sofreram forte repressão do Estado. O pacifismo que foi promovido pelas feministas culturalistas é influente entre várias feministas (inclusas não-gandhistas) e daí encontramos um enorme setor que se opõem às formas militantes de luta e se opõem à luta armada dos oprimidos.

Gail Omvedt tem sido uma importante escritora na Índia que teorizou sobre a questão da mulher dentro do amplo quadro do feminismo socialista. Diferente de muitas outras feministas, Gail Omvedt sempre deu importância aos movimentos de massa e, especialmente, ao movimento de mulheres rurais (We Will Smash this Prison) e, assim, aqueles que lutam pela revolução deram importância a seus escritos. Em seu livreto amplamente lido, Violência contra a Mulher, novos movimentos e novas teorias, escrito em 1990 e reimpresso em 2000, focou em três novas teorias – a análise e programa dado pela organização Shetkari Sangathana liderado por Sharad Joshi, a análise de Sharad Patil e a de Vandana Shiva e o apoio ao Movimento Chipko. Ela considera estas como intelectuais orgânicas que deram contribuições significantes para a causa da mulher na Índia. Sharad Joshi iniciou uma mobilização massiva de mulheres camponesas de 1987 a 1990 sob a bandeira da Shetkari Mahila Agadhi (Frente de Mulheres Camponesas) em Maharashtra e pressionou pela participação ativa de mulheres nas eleições locais para Panchayats e Zilla Parishads. Sharad Patil, anteriormente uma líder distrital do PCI (Marxista), fez um estudo detalhado baseado em antigos textos sobre as origens das castas na Índia – a escravidão dos Dasa Shudra e, a partir disto, traçou o surgimento da opressão da mulher. Ele acreditava que apenas o marxismo não poderia adequadamente analisar a história da Índia e a particularidade das castas nos obriga a também adotar a abordagem teórica desenvolvida por Phule e Ambedkar (recentemente este repudiou tal fusão teórica). As visões ecofeministas de Van- dana Shiva foram analisadas por ela. Apresentando seus pontos básicos e suas debilidades e pontos corretos, ela ressalta que todos dão importância ao papel da violência em subjugar as mulheres contra a explicação "marxista tradicional", que lida apenas com causas econômicas, como a produção de valor e o surgimento da propriedade privada. Então, Omvedt passa a dar a sua própria análise sobre as origens da opressão das mulheres.

Omvedt acredita que a análise de Engels ultrassimplificou as origens da opressão das mulheres, ao considerar que surgiu com o desenvolvimento da sociedade de classes a partir do aparecimento da propriedade privada e do Estado. De acordo com ela, "rejeitamos as simplificações do marxismo tradicional que considera a violência apenas como um epifenômeno e temos que descartar a interpretação de 'classe' e de 'luta de classes' em termos de propriedade privada e da centralidade de uma fábrica baseada em um proletariado, em grande parte, do sexo masculino". Também rejeita a simplificação das feministas radicais de que a dominação masculina estava associada ao ato de caçar, considerado como a forma mais antiga de exploração e de violência.

Historicamente — defende — ainda que sociedades agrícolas assentadas apareceram entre 10.000 e 8.000 AC, nas quais havia a produção de excedentes, ainda por um longo período não haviam evidências de violência, exploração de classe ou dominação patriarcal. Ela segue o estudo de Gerda Lerner, que diz que a dominação patriarcal é visível com o surgimento dos primeiros estados (3.000 AC). No entanto, afirma não haver evidências para sustentar que a propriedade privada ou a propriedade da terra precederam a formação desses estados, que não há nenhuma classe proprietária de terras ou de escravos cujo poder é baseado na propriedade privada de bens. Ela acredita que esses primeiros Estados eram próximos ao modo de produção asiático e que havia uma "classe estatal" que extraía o excedente dos camponeses, entre os quais ainda não haviam diferenças de classe. As classes surgiram posteriormente, e a análise de Engels dá conta apenas dos Estados que apareceram quase dois mil anos depois na Grécia, Roma e Magadha (Bihar). Disso conclui que "no geral, as evidências históricas e arqueológicas dão razão à ênfase no papel autônomo da força e da violência encontrada na teoria de Shetkari Sanghatana e outras teorias recentes". Neste período antigo, a violência organizada e legitimada pelo Estado era central no desenvolvimento dos saques, da exploração econômica e do patriarcado. Então, ela acrescenta que é necessário analisar também o papel do sistema de castas no desenvolvimento da dominação de Estado, da exploração e do patriarcado. Além disso, com a situação do capitalismo e do imperialismo atualmente e sua ligação com a destruição ecológica, haveria necessidade de se incorporar as preocupações das ecofeministas. Finalmente, acrescenta que as dialéticas do sexo, as formulações das feministas radicais precisam ser incorporadas em uma análise holística. Assim, de acordo com ela, a questão da opressão das mulheres está relacionada a condições básicas que incluem — "controle da propriedade e dos meios de produção, controle do poder político e dos meios de violência, controle sobre seus próprios corpos e dos meios de reprodução" – e todos esses apareceram na agenda do movimento de mulheres no presente. As feministas urbanas e da esquerda tradicional não têm abordado com propriedade nenhuma dessas questões e cada uma delas está sendo assumida por diferentes movimentos. Ela acredita que as teorias, ideias e métodos convencionais estão sendo desafiados. Acredita que a luta de liberação não é simplesmente aquela de mobilizar um exército para capturar o poder de Estado e estabelecer uma sociedade socialista, mas de mudar os indivíduos tanto quanto transformar os movimentos coletivos contra a exploração eles mesmos. Isso está sendo feito, não pela velha esquerda ou as feministas urbanas, mas por movimentos que surgem das profundezas da ordem social exploradora e destrutiva, os movimentos de camponeses, dalits e adivasis.

A perspectiva de Omvedt, ainda que traga alguns pontos importantes que o movimento de mulheres precisa incorporar, é, de fato, mais reformista do que transformadora. Ainda que assinale a importância dos movimentos de massa e, especialmente, dos movimentos rurais no contexto indiano, não faz nenhuma distinção entre reforma e revolução. De fato, a revolução não está, em absoluto, na agenda dela. Enquanto sua análise das origens do patriarcado lida com o papel do Estado na Antiguidade, absolutamente não lida com o papel do Estado na situação contemporânea. Apesar de levantar a questão do papel do Estado na presente incidência de violência sobre as mulheres, não a enfrenta, não tenta respondê-la. Enquanto os sistemas de casta e de classe na Índia rural continuarem como estão, e com a extrema competitividade que existe dentro das políticas da classe dominante, o quão eficientes as mulheres podem ser ao usar essas instituições para reduzir a violência contra elas? Quais foram as experiências da última década e meia das mulheres que participaram das zilla parishads e panchayats? A questão do poder político é certamente crucial, mas a libertação das mulheres não pode ser levada adiante por mulheres com cargos de poder na atual configuração exploradora e corrupta. A falta de vontade de Omvedt para considerar a – difícil, mas necessária – tarefa concreta da revolução, a derrubada do Estado, a sua rejeição dessa tarefa torna sua análise em nada diferente daquela das reformadoras liberais. Também ignora o amplo movimento dos maoístas na Índia e o papel jogado neste pelas mulheres, particularmente as mulheres adivasis.

Omvedt usa o termo velha esquerda ou esquerda tradicional para referir-se a todos que reivindicam uma análise marxista, particularmente os partidos comunistas. Isto é problemático porque, ao usar esse termo não-científico e desnecessariamente amplo, coloca, no mesmo saco, marxistas de vários matizes, trotskistas, maoístas, e até revisionistas do PCI (Marxista), esses últimos que fazem parte das classes dominantes. Após o trabalho pioneiro de Engels, marxistas revolucionários em todo o mundo têm tomado várias medidas para combater a opressão das mulheres no curso dos movimentos revolucionários e após a revolução. Nesse sentido, os esforços feitos na China durante o movimento revolucionário e posteriormente, as formulações de Mao Tsé-tung, a teorização durante a Revolução Cultural e a prática iniciada nesse período, tudo isso deve ser levado em conta antes de rejeitar as "simplificações do marxismo". A interpretação mecânica e o atraso de alguns marxistas indianos não pode ser usado para rejeitar o marxismo como um todo. Este tipo de uso seletivo da história não contribui em nada para a causa das mulheres. Permanece o fato de que Omvedt enfatizou o papel da violência na subjugação das mulheres, mas não se mostrou capaz de responder à questão que surge a partir daí – violência para quê? Se ela responder "para controle reprodutivo", a questão ainda se impõe, controle reprodutivo com que propósito? A formulação de Engels era extremamente complexa – ele tentou determinar as causas materiais da opressão das mulheres na história e para isto entrelaçou os fatores econômicos (excedente, classes), os sociais (parentesco, família) e os políticos (o surgimento do Estado). O Estado é o instrumento da violência e é necessário para a subjugação.

As visões de Periyar e de Ambedkar também influenciam o entendimento da questão da mulher na Índia. Um grande número de mulheres das castas dalit têm sido mobilizadas por organizações que professam o "ambedkarismo", e essa corrente também tem ganho adesões entre os acadêmicos na última década. Ambedkar era profundamente influenciado pela filosofia liberal e, portanto, ativamente lutou para conquistar igualdade para os dalits e para as mulheres na Índia. A queima da Manusmriti, a elaboração do Código Bill Hindu (que pretendia dar às mulheres hindus os direitos de casamento, propriedade, adoção, etc.) eram os meios pelos quais ele tentou destacar a situação das mulheres na Índia. No contexto específico da opressão de casta na Índia, da qual dalits e mulheres são as maiores vítimas, Ambedkar estudou a fonte da opressão de casta e suas origens. Em seu trabalho Quem eram os Shudras? concluiu que a religião Hindu, da maneira que foi desenvolvida pelos Brahmins, é responsável pela condição degradante das mulheres e, posteriormente, fez campanha para expor a natureza essencialmente desigual da religião. Periyar também denunciou as tradições brahmínicas que negavam às mulheres um status igual. Ainda que isso tenha significado que o ataque se concentra na cultura tradicional, tendendo a dar menos importância às causas materiais, pela primeira vez a ligação entre a opressão de casta e a das mulheres foi claramente articulada pelo movimento não-braahmínico na Índia.

A influência do gandhismo era marginal quando o movimento de mulheres reemergiu na década de 70 na Índia, porém, nos anos 90, este ganhou fortes proponentes na figura de pensadoras famosas como Madhu Kishwar e Vandana Shiva. Existem diferenças consideráveis entre elas, mas ambas assinalam a importância dos métodos não-violentos e glorificam as tradições pré-coloniais e a vida comunitária nas aldeias. Enquanto Shiva apoiou o princípio prakriti que apresenta as mulheres como uma força ativa em relação à natureza, Madhu Kishwar tem apoiado a tradição indiana e buscado elementos desta que são fortalecedores das mulheres. Ela tende a defender a tradição em todos os seus aspectos. Portanto, criticou as organizações de mulheres que atacaram práticas tradicionais misóginas como o sati. De acordo com ela, precisamos fazer uma distinção entre a imolação forçada de viúvas, que é um ato criminoso, e a tradição do sati, que era uma celebração do poder e da superioridade espiritual das mulheres. Kishwar enfatiza que através do princípio de auto sacrifício, muitas mulheres ganharam apoio e proteção consideráveis dentro da família e da comunidade. Ela interpreta a popularidade de Sita, como uma mulher e esposa ideal, também a partir da mesma perspectiva. As classes dominantes feudais criaram essa cultura patriarcal para assegurar a sub-jugação continuada das mulheres. Ao internalizar tais valores, as mulheres têm procurado obter a aprovação da sociedade – ou seja, os setores dominantes da aldeia ou comunidade. O comportamento baseado neste tipo de internalização de valores patriarcais só poderia levar a uma ilusão de poder para as mulheres, que fez sua real escravização invisível. A defesa acrítica que Kishwar faz da tradição se encaixa com a abordagem pós-moderna de aclamar a localidade e de enfatizar a questão da identidade. Isso vai contra os básicos interesses da massa de mulheres que são oprimidas pelas tradições feudais, que ainda dominam e negam até mesmo seu direito à vida por meio dessas mesmas tradições e atitudes. Ao defender a não-violência como um princípio absoluto, estão negando às mulheres o direito de escolher a forma com que se vai levar a luta pela liberação adiante. Ambas, Madhu Kishwar e Gail Omvedt, são apoiadoras diretas da globalização. Ignorando completamente os fatos, são da opinião de que o regime da OMC dará oportunidades para os camponeses, as mulheres, os dalits, etc.

Uma força importante organizando as mulheres dentro do país são as ONGs, que trabalham principalmente entre as mulheres camponesas e moradoras de favelas. Mas a maior parte destas está envolvida na execução direta dos projetos patrocinados pelo governo como os grupos de autoajuda, microcrédito e organização da comunidade. A maior parte dessas atividades tem sido levada a cabo com a ajuda de fundos do governo ou de doadores estrangeiros, como Igrejas, fundações, etc. Não são parte do movimento de mulheres, mas se apropriaram da língua e a cultura (músicas, etc.) do movimento de mulheres enquanto implementam as políticas dos governos centrais e do Estado entre as mulheres. Nesse sentido, estão tentando antecipar o crescimento de um movimento de mulheres independente e evitar que as mulheres se somem à luta revolucionária. Um pequeno setor entre elas está, inclusive, usando a linguagem do feminismo radical para organizar as prostitutas e fazer campanhas pela legalização da prostituição na Índia. Desta maneira, servem diretamente aos interesses dos imperialistas, que planejam desenvolver amplamente sua indústria do sexo e o turismo sexual.

O movimento de mulheres revolucionário, sob o guia teórico do marxismo, conforme desenvolvido através da experiência de Lenin e Mao, tem sido bem-sucedido em organizar as mulheres das castas e comunidades mais oprimidas, as camponesas pobres e as trabalhadoras sem-terra. O movimento tem dado atenção às questões levantadas pelo movimento internacional das mulheres e considera a luta contra o patriarcado parte integrante da Revolução Democrática de novo tipo. Ao estudar as tendências anteriormente citadas de maneira crítica, pegando os pontos positivos e integrando-os à sua teoria e prática, pode realizar seu objetivo de libertar as vastas massas de mulheres indianas, enquanto completa exitosamente a Revolução Democrática, e avançar em direção ao socialismo.


Inclusão 30/09/2019