Armamento das Massas Revolucionárias. Edificação do Exército do Povo

Vo Nguyen Giap


I - Teses Marxistas-Leninistas Sobre a Organização Militar do Proletariado


CAPA

O marxismo-leninismo estuda o problema da organização militar do proletariado na sua relação orgânica com a teoria da luta de classes e do Estado. Com a desagregação da sociedade comunitária primitiva, a sociedade divide-se em classes e a sua história é a história da luta de classes. Ao mesmo tempo que se formam as nações, aparecem a opressão e a sujeição nacional e a luta de classes toma então igualmente a forma de luta nacional. Senhores e escravos, proprietários fundiários e camponeses, burguesia e proletariado, nações exploradoras e nações oprimidas, países agressores e países agredidos, grupos sociais antagónicos, etc., empreenderam uma luta ininterrupta, multiforme, que, no auge, toma a forma de conflito armado, de guerra. Até hoje, inúmeras guerras marcaram a história da sociedade de classes. Contando só com as de bastante grande envergadura, houve mais de uma dezena de milhar, de há 5000 anos para cá.

O exército é o instrumento principal da guerra. O seu nascimento está ligado ao aparecimento do Estado, quando a sociedade se dividiu em classes antagónicas. O exército é uma organização especial do Estado, o instrumento de uma dada classe que se serve dele para realizar a sua linha política pela violência armada.

A natureza de classe do Estado é decisiva para a natureza social do exército e a sua vocação. O exército dos Estados exploradores tem sempre por vocação, no plano interno, a repressão das massas exploradas, a sua submissão à ordem da classe dominante e, face ao estrangeiro, a conquista de outros países e a defesa do território nacional contra a agressão estrangeira.

A história viu nascer três tipos de Estado explorador aos quais correspondem três tipos de exército: o exército do Estado esclavagista, o do Estado feudal e o do Estado capitalista.

No curso da história, estes tipos de exército tiveram diferentes designações, diferentes formas de organização e recorreram a diferentes processos de recrutamento em função das condições concretas, mas a sua natureza foi sempre a mesma: o exército do Estado explorador é sempre instrumento da classe dominante, e serve para reprimir as massas exploradas no país, para pilhar e submeter outros países e povos.

Sob os regimes de exploração, para se oporem à violência armada da classe dominante, as massas oprimidas, na sua luta, também criaram as suas próprias organizações armadas revolucionárias. Na própria antiguidade, em Roma, os escravos que se revoltaram sob a direcção de Spartacus, que Marx considerava:

«o sujeito mais surpreendente da história antiga, grande general representante do proletariado da antiguidade»(1)

organizaram um importante exército de insurretos constituído por centenas de milhar de homens, que combateu com tenacidade o exército do Estado esclavagista.

Sob o regime feudal, na Europa, na Ásia e em África, as organizações armadas camponesas surgiram sempre nas insurreições, nos motins, nas guerras de libertação em numerosos países, e eram de envergadura bastante importante e dotadas de grande poder de combate. Com o desenvolvimento do capitalismo, as revoluções burguesas antifeudais tiveram a participação de organizações armadas de camponeses, e mesmo de operários no estádio de luta espontânea, sob a bandeira da burguesia.

Contudo, as organizações armadas revolucionárias das classes exploradas de então, devido aos seus limites históricos e à sua incapacidade para promover uma linha política militar e organizativa justa, acabavam por ser reprimidas e traídas pelos seus «aliados», apesar da sua coragem em combate e das grandes vitórias que por vezes conseguiam arrancar.

Essa traição revela-se da maneira mais completa na revolução burguesa. Como salientava Engels, há muito tempo em França, os operários depois de cada revolução estavam armados;

«para os burgueses que se encontravam no poder, o primeiro trabalho era então desarmar os operários. Assim, depois de cada revolução conseguida com o preço do sangue dos operários, rebenta uma nova luta, que termina pela derrota destes»(2).

Era preciso esperar que nascesse o marxismo, que o proletariado tivesse o seu partido político e se tornasse uma força, política independente, que passasse do estádio «espontâneo» ao estádio «consciente», que o conjunto da sua luta revolucionária desse um salto qualitativo, para que se pudesse, sobre esta base, resolver completamente o problema da organização militar das massas oprimidas na ciência militar do proletariado. O fato de os partidos da classe operária — os partidos comunistas — terem entrado na arena política e tomado a direcção da revolução em diversos países conduziu ao nascimento das organizações armadas de natureza revolucionária e claramente popular saídas das revoluções proletárias ou das revoluções democráticas burguesas, das revoluções democráticas populares ou das revoluções de libertação nacional dirigidas pela classe operária; em particular, depois da vitória da Revolução russa de Outubro e da de uma série de outros países socialistas da Europa, Ásia e América Latina, apareceu pela primeira vez no mundo um tipo de «forças armadas completamente novas». São verdadeiras forças armadas do povo, do Estado da ditadura do proletariado — o Estado mais avançado da história da humanidade.

1. As Teses de Marx e Engels

Atribuindo à classe operária mundial o papel histórico de coveiro do capitalismo e de construtor da sociedade comunista, sociedade sem classes onde é banida a exploração do homem pelo homem. Marx e Engels mostraram ao proletariado a via mais justa para a sua libertação; trata-se para a classe operaria de, sob a direcção do Partido Comunista, se aliar estreitamente aos camponeses, empregar a violência revolucionária para varrer a burguesia do aparelho de Estado, instituir o Estado da ditadura do proletariado, servir-se deste Estado como instrumento para defender a dominação do proletariado e transformar a sociedade segundo os princípios comunistas.

O problema da organização militar proletária pôs-se a partir, em primeiro lugar, desta grande obra da luta revolucionária do proletariado. Erguendo-se para quebrar as cadeias e derrubar o mundo antigo, o proletariado e as massas revolucionárias, no decurso do processo revolucionário, têm necessariamente que constituir a sua própria organização militar. Com efeito, só uma força material pode derrubar outra força material, só o emprego da violência permite cumprir a grande tarefa histórica de derrubar a dominação capitalista e instituir a ditadura do proletariado. A classe dominante nunca se retira de bom grado da arena histórica. O Estado monárquico e o Estado burguês dispõem permanentemente de uma importante força armada que se empenham em aperfeiçoar constantemente para que constitua um instrumento eficaz na repressão do povo trabalhador do seu país e na aplicação da sua política de pilhagem no mundo. Não deixam nunca de se apoiar num aparelho militar contra-revolucionário para sufocar toda a aspiração de liberdade do proletariado e das massas trabalhadoras e afogar em sangue a sua luta revolucionária. Engels analisou esta «característica fundamental» da burguesia mesmo no período ascendente do capitalismo:

«... a burguesia mostrava até que louca crueldade é capaz de chegar na sua vingança, logo que o proletariado a ousa afrontar, como classe particular com os seus próprios interesses e as suas próprias reivindicações»(3).

O desenvolvimento do capitalismo e as suas cada vez mais agudas contradições internas conduzem necessariamente a uma tendência militarista crescente, à tendência para incrementar a forma armada contra-revolucionária no aparelho de Estado da burguesia. Engels escreveu:

«o exército tornou-se o objectivo principal do Estado, tornou-se, um fim em si mesmo; os povos já existem só para fornecer soldados e alimentá-los. O militarismo domina e devora a Europa»(4).

Esta situação obriga o proletariado e as massas oprimidas a dotarem-se de uma organização militar para se oporem à repressão armada do Estado quebrarem a sua máquina militar e esmagarem toda a resistência da sua parte a fim de tomarem o poder, instaurarem o poder revolucionário e defenderem-no. Se o dispor de uma organização militar é uma necessidade na luta do proletariado para destruir a burguesia, sob que forma deve ela ser edificada?

É um problema que foi completamente resolvido pelos mestres do marxismo-leninismo. Fundadores da ciência militar proletária, Marx e Engels foram os primeiros a lançar os fundamentos teóricos do problema da forma de organização militar do proletariado, com esta célebre tese

«... armar a classe operária, substituir o exército permanente pelo povo em armas...» é preciso que os operários sejam armados e bem organizados. Importa fazer imediatamente o que for necessário para que todo o proletariado seja provido de espingardas, carabinas, canhões e munições. Toda a tentativa de desarmamento deve ser repelida se necessário pela força»(5).

Este apelo ao combate foi lançado por Marx e Engels, nos anos 50 do último século, baseando-se na experiência adquirida a preço de sangue na primeira grande batalha do proletariado francês contra a burguesia, em 1848; consideravam este apelo uma exigência suprema do programa revolucionário do proletariado, no momento em que a insurreição e a guerra civil se tinham tornado tarefas políticas imediatas da revolução em certos países capitalistas desenvolvidos da Europa ocidental.

A história dos países da Europa do fim do século 18 até ao meio do século 19 era ainda a das revoluções democráticas burguesas. No contexto de então, o proletariado devia aliar-se aos partidos democráticos burgueses para se opor aos governos feudais e burgueses reaccionários em geral, não se podendo evitar que a saída vitoriosa da revolução levasse provisoriamente estes partidos ao poder. Em tais condições, Marx e Engels consideravam o armamento do proletariado como uma condição indispensável para, por um lado, destruir o aparelho de Estado da classe feudal e da burguesia reaccionária e assegurar a vitória da insurreição, mas também para impedir em seguida a inevitável traição do proletariado pelo partido democrático burguês após o seu acesso ao poder. Condição indispensável também para garantir e reforçar a independência política da classe operária, para defender os resultados da sua luta, criar as condições para o sucesso da revolução proletária, usando o seu poder para eliminar a dominação da burguesia.

Marx e Engels estavam convictos de que, uma vez armado, o proletariado disporia de um poder incomensurável. E este poder tinham-no avaliado na revolução de 1848 em Paris. Marx escreveu:

«sabemos que os operários, com uma coragem e um génio sem par, sem chefes, sem plano comum, sem recursos e, na sua maioria, com falta de armas, puseram em cheque durante cinco dias o exército, a guarda móvel, a guarda nacional de Paris e ainda a guarda nacional que afluiu da província»(6).

E Engels escreveu:

«Se 40 000 operários parisienses já obtiveram um resultado de tal modo formidável contra um inimigo quatro vezes superior, o que não conseguirá fazer toda a massa dos operários parisienses logo que aja unanimemente e com coesão!»(7).

Desenvolvendo esta ideia, Marx e Engels, em 1871, na base de uma análise perspicaz dos ensinamentos da Comuna de Paris, enunciaram um princípio: a preocupação de toda a revolução vitoriosa deve ser desmembrar o antigo exército, dissolvê-lo e substituí-lo por um novo, colocar, em vez do exército permanente, o povo em armas. Marx escrevia:

«Paris, sede central do antigo poder governamental e, ao mesmo tempo, fortaleza social da classe operária francesa podia resistir porque, sendo sede, estava livre do- exército e em vez dele tinha uma guarda nacional cuja massa era constituída por operários. Era este estado de fato que se tratava agora de transfor numa instituição duradoura»(8).

Marx e Engels mostraram que, sob o regime capitalista, o exército permanente é o principal instrumento de dominação da burguesia sobre os trabalhadores. Destruir este exército permanente é privar o poder da burguesia do seu instrumento, eliminar o perigo de uma resistência e de uma contra-ofensiva da sua parte. Ao mesmo tempo, apoiando-se firmemente nas forças das massas revolucionárias, o proletariado deve edificar e desenvolver rapidamente a sua organização militar, armando as suas próprias fileiras bem como as massas revolucionárias, e considerá-la a única força armada para defender as vitórias da insurreição e desenvolver a revolução. A Comuna de Paris deu ao proletariado mundial este ensinamenlo vital:

«O primeiro decreto da Comuna foi a supressão do exército permanente e a sua substituição pelo povo em armas»(9).

Marx e Engels apreciaram grandemente esta lição sobre a tarefa da classe operária de destruir a máquina burocrática e militar do antigo Estado e de a substituir por uma nova forma de organização do Estado do proletariado, o que eles consideravam uma inovação de tal significado histórico que, no prefácio de 1872 do «Manifesto do Partido Comunista», a apresentaram como uma emenda da mais alta importância ao programa do Manifesto.

Engels previu mesmo que o armamento do povo seria a forma de organização militar do Estado socialista.

Esta opinião partia, em primeiro lugar, do princípio de Marx e Engels segundo o qual a vitória do socialismo teria de se produzir simultaneamente na totalidade ou na maioria dos países capitalistas desenvolvidos. Acresce que o regime socialista é, por natureza, não agressivo, não tendo portanto também necessidade de exército permanente. Quanto à defesa da segurança interna, o povo em armas pode assumi-la. Engels apoiava-se igualmente na análise dos exércitos de diversos países e do nível da arte e da técnica militares na segunda metade do século 19. A França, a Alemanha e a Rússia eram então os únicos países capitalistas desenvolvidos dotados de um aparelho militar poderoso, não tendo ainda os outros, incluindo a Grã-Bretanha e os Estados Unidos, importantes forças armadas. Assim, uma vez que a revolução proletária tivesse triunfado no conjunto ou na maioria dos países capitalistas desenvolvidos, as forças militares dos países capitalistas restantes não seriam já muito poderosas. Nestas condições, e cientes dos ensinamentos da Comuna de Paris, Engels pensava que, sob o regime socialista e dada a sua superioridade, o povo, uma vez armado, organizado e treinado militarmente, seria capaz de derrotar os exércitos agressores para preservar o Estado socialista.

Desta análise, Marx-Engels concluíam que, no decurso da revolução socialista, o exército permanente da burguesia devia ser substituído pelo povo em armas.

Abordaram a questão do armamento das massas não somente na insurreição armada do proletariado e na organização militar do Estado socialista, mas também nas guerras nacionais. Distinguiam as guerras justas das guerras de agressão e colocaram-se sempre do lado das guerras justas, guerras de libertação, guerras de autodefesa dos povos oprimidos e agredidos. Engels seguia e estudava com grande atenção as guerras da sua época, tirava delas os ensinamentos e esforçava-se por indicar aos povos oprimidos a melhor via para conduzir a guerra popular e derrotar o exército profissional dos agressores. Em vários estudos sobre a história da guerra, Engels tratava do papel e do efeito consideráveis das massas armadas nas guerras justas, nas guerras de autodefesa. Esta ideia de Engels estava em estreita ligação com o novo esquema de guerra popular por ele preconizado.

«Um povo que quer conquistar a independência, não poderá encerrar-se nos métodos de guerra ordinários. Insurreições de massa, guerras revolucionárias, grupos de guerrilha por todo o lado, eis o único método de combate graças ao qual uma pequena nação pode vencer uma nação maior, um pequeno exército se pode opor a um exército mais forte, melhor organizado»(10).

As largas massas em armas são precisamente o elemento fundamental para a aplicação de um tal género de guerra.

Engels exaltou as resistências francesa (1793), espanhola (1807-1812), a da Rússia contra Napoleão (1812), a da Hungria contra a Áustria (1849), etc., que tinham sabido aplicar o método de guerra do povo, coordenar as operações do exército permanente com as acções militares das massas armadas, o que permitira desdobrar a força considerável do povo e do país e derrotar exércitos de agressão muito mais poderosos.

Analisando o insucesso dos Piemonteses no Norte de Itália na sua guerra de autodefesa contra as tropas austríacas, Engels escreveu:

«O grave erro inicial dos Piemonteses era o de só oporem às tropas austríacas o seu exército permanente, o de só quererem conduzir a guerra mais clássica, a mais burguesa, a mais metódica»(11).

Sublinhava que o revés das tropas piemontesas seria, no entanto, insignificante se, depois desta derrota, eclodisse uma verdadeira guerra revolucionária, se o restante das tropas italianas se declarasse imediatamente núcleo de uma insurreição geral em todo o país, se a guerra estratégica convencional a nível de exércitos se transformasse numa guerra do povo, à semelhança da guerra que os Franceses tinham conduzido em 1793(12); se o governo de Turim tivesse a coragem de adotar medidas revolucionárias, ousasse lançar o povo numa guerra revolucionária. E Engels concluía: a independência da Itália estava perdida por causa da cobardia do governo real e não da invencibilidade das armas austríacas.

Engels tirou as mesmas conclusões no seu comentário sobre a guerra franco-prussiana de 1871. Achava que a França continuava perfeitamente capaz de inverter a situação mesmo depois da ocupação de um sexto do seu território pelas tropas alemãs e da tomada das fortalezas de Metz e de Paris. Engels mostrou que, no momento em que a quase totalidade das forças alemãs estavam estacionadas nas regiões ocupadas, a França ainda tinha condições para, nos cinco sextos não ocupados, formar unidades armadas suficientes para lhes causar problemas, para lhes cortar as vias de comunicação, destruir as suas bases logísticas, atacar os seus destacamentos isolados... por toda a parte, e, por este meio, podia obrigá-los a dispersar as forças, a desguarnecer em parte as fortalezas para enfrentar a situação, de tal modo que Bazaine se pudesse escapar de Metz e que o cerco de Paris se tornasse pura e simplesmente «um espectro».

Engels punha em seguida esta questão:

«Como ficariam os Alemães se o povo francês estivesse animado de um patriotismo ardente como os Espanhóis em 1808, se cada cidade e quase cada aldeia se tivessem transformado em fortalezas, se cada camponês e cada habitante da cidade fosse um combatente»(13).

A propósito do levantamento das massas armadas, das unidades não permanentes dos destacamentos armados da Ásia — com os seus métodos multiformes de guerra popular — que eram os temíveis adversários dos exércitos de agressão do tipo europeu, Engels escrevia:

«Os Chineses envenenam o pão por atacado e com a mais fria premeditação. Embarcam com armas escondidas a bordo dos vapores comerciais e, a meio do caminho, massacram os comandantes e apoderam-se dos barcos. Os coolies emigrantes amotinam-se no decurso de cada transporte para o estrangeiro; batem-se para se apoderarem dos cargueiros, e, em vez de se renderem, preferem afundar-se com eles ou perecer nas chamas. Mesmo fora da China, os colonos chineses... conspiram e desencadeiam subitamente insurreições nocturnas»(14).

E Engels interrogava-se:

«Que pode fazer um exército para se opor a um povo que recorre a tais métodos de guerra?»

Vemos portanto que o ponto de vista inicial dos fundadores do comunismo científico sobre a organização militar do proletariado e das massas oprimidas é o armamento da classe operária, o armamento do povo, o armamento das massas revolucionárias.

Marx e Engels lançaram os fundamentos teóricos deste problema no referente à insurreição pela conquista da ditadura do proletariado, à guerra pela defesa do Estado socialista e mesmo à guerra de libertação, guerra de autodefesa dos povos oprimidos, dos países agredidos sob o regime político burguês.

Encontramos aí um ponto de vista fundamental, um êxito de Marx e Engels na aplicação da concepção materialista da história, dos pontos de classe, de massa, e da concepção da violência revolucionária na edificação da organização militar do proletariado e das massas oprimidas. É um modelo de apreciação correcta do papel decisivo das massas populares na insurreição armada e na guerra revolucionária. O grande valor desta tese reside em que, pela primeira vez no mundo, mostra ao proletariado e aos povos oprimidos a orientação e a via mais justa para criar a sua organização militar, uma organização militar de tipo inteiramente novo, saída do proletariado e do povo trabalhador, combatendo pelo povo e pela classe operária. O Partido revolucionário que disponha de uma linha justa, se se souber apoiar solidamente nas massas revolucionárias, nos operários, nos camponeses... para edificar e desenvolver a sua organização militar, pode criar uma força armada revolucionária invencível.

Este ponto de vista tornou-se o fundamento teórico da edificação das forças armadas na doutrina militar do marxismo-leninismo. É uma arma extremamente poderosa para o proletariado e para todos os povos oprimidos do mundo; dá-lhes as asas para a luta revolucionária com vista a derrubar o mundo antigo e a criar um mundo novo.

2. As teses leninistas

Os marxistas russos, com o grande Lenine à cabeça, aplicaram as teses de Marx e Engels a novas condições históricas, as das revoluções socialistas e democráticas burguesas na etapa imperialista.

Foi na época da passagem do capitalismo à etapa imperialista que Lenine formulou a sua célebre tese: o socialismo não poderá triunfar simultaneamente em todos os países mas triunfará sim, primeiro num país ou num certo número de países. Ao mesmo tempo, apoiando-se na nova teoria referente à necessidade de colocar a revolução democrática burguesa sob a direcção do proletariado e de passar desta revolução à revolução proletária, Lenine e o Partido bolchevique russo elaboraram o programa militar da revolução-democrática burguesa e da revolução-socialista na Rússia. Lenine sublinhou a necessidade de edificar a organização militar do proletariado nas novas condições históricas:

«o armamento da burguesia contra o proletariado é um dos miais importantes fatos, um dos mais fundamentais, dos mais essenciais, da sociedade capitalista moderna. A nossa palavra de ordem deve ser o armamento do proletariado para que possa vencer, expropriar e desarmar a burguesia. É a única táctica possível para uma classe revolucionária, uma táctica que resulta de toda a evolução objectiva do militarismo capitalista e que é prescrita por esta evolução»(15).

Após os primeiros anos do século 20, no decorrer da direcção da Revolução de 1905 e da Grande Revolução de Outubro, Lenine e o Partido Comunista russo, aplicando os princípios de Marx e Engels, formularam a exigência da substituição do exército permanente pelo povo em armas, pelas forças da milícia. É uma das tarefas essenciais do programa da revolução democrática burguesa e do da revolução socialista.

Lenine mostrou que na Rússia, tal como em numerosos outros países, o exército permanente (burguês) não se destinava essencialmente a combater o inimigo estrangeiro mas a reprimir o povo trabalhador e a conduzir a guerra de agressão para subjugar outros povos. Escreveu:

«Em toda a parte, o exército permanente tornou-se o instrumento da reacção, o servo do capital em luta contra o trabalho, o carrasco da liberdade do povo»(16).

Este exército não pode, pela sua natureza, ser o apoio do povo. Para a revolução, suprimi-lo é uma condição da vitória, é o meio de evitar toda a tentativa de restauração por parte das forças reaccionárias, e reduz as enormes despesas necessárias à manutenção do exército. E é preciso substituí-lo pelo armamento do povo, essencialmente dos operários e camponeses pobres.

Nas condições históricas de então, Lenine afirmava:

«Nenhuma força no mundo ousará atentar contra a Rússia livre se a defesa da sua liberdade for constituída pelo povo em armas, que terá suprimido a casta militar e feito de todos os soldados cidadãos e, de todos os cidadãos aptos a pegar em armas, soldados... A ciência militar demonstrou que a organização de uma milícia popular, capaz de estar à áltura das necessidades de uma guerra defensiva bem como de uma ofensiva, é perfeitamente possível»(17).

Durante o período anterior à Revolução de Outubro, o Partido comunista e a classe operária russa estavam empenhados na realização desta palavra de ordem, paralelamente à edificação do «exército político da revolução». Intensificaram a agitação junto dos soldados e o trabalho de organização do Partido no exército czarista visando a desagregação das unidades e o seu alinhamento na revolução; deram muita importância à instrução militar no Partido, difundiram ativamente a ciência e a instrução militares entre as massas; armaram os operários e as massas revolucionárias; estabeleceram e reforçaram a direcção do Partido comunista em todas as organizações militares; organizaram brigadas de milícia operária, destacamentos de combate para servirem de núcleo às forças armadas revolucionárias; edificaram uma força armada revolucionária em que os operários e camponeses se aliariam aos soldados revolucionários, uma força armada revolucionária com três componentes:

  1. o proletariado e os camponeses armados;
  2. os destacamentos de vanguarda organizados, formados pelos representantes destas classes;
  3. as unidades do exército do lado do povo.

A revolução conseguiu deste modo edificar uma força armada compreendendo essencialmente as largas massas operárias e camponesas armadas combatendo sob a direcção do Partido comunista, servindo de força de choque ao avanço revolucionário das massas. Foi esta força que desempenhou um papel determinante na vitória da Revolução de Fevereiro e depois na Revolução de Outubro.

O triunfo da Revolução russa de Outubro conduziu ao nascimento do primeiro Estado socialista do mundo, no meio do cerco hostil do imperialismo. Este triunfo abriu uma nova era na história da humanidade e abalou o conjunto do mundo capitalista. Tal como Lenine tinha previsto, também o imperialismo estava resolvido a sufocar o Estado proletário desde o seu nascimento. O perigo de uma agressão impôs ao Estado soviético a tarefa de se armar para defender a Pátria socialista do imperialismo agressor e de reexaminar as suas formas de organização militar.

O grande mérito de Lenine reside no fato de ter, não somente confirmado, mas também enriquecido as teses de Marx e Engels sobre o armamento do povo, ao estabelecer o princípio da necessidade de edificar um exército permanente e regular do Estado soviético sobre a base do armamento do povo, um exército de tipo novo da classe operária e do povo trabalhador.

Lenine indicou que, face a um perigo de agressão muito grave, se a República soviética não se quisesse tornar presa fácil para o imperialismo, deveria dispor de uma força armada permanente e regular, bem equipada e bem treinada, submetida a uma disciplina equitativa mas rigorosa e dispondo de um comando centralizado e unificado. Mostrou que dadas as condições em que as potências capitalistas dispõem de importantes exércitos bem treinados, equipados modernamente e em que as forças armadas do Estado soviético se vêem dotadas de um equipamento cada vez mais aperfeiçoado e os seus homens têm necessidade de serem treinados para poderem dominar as armas e o material segundo as regras da arte militar moderna, nas condições, enfim, em que os imperialistas podem a todo o momento desencadear ataques imprevistos, as forças armadas do Estado soviético não deveriam permanecer no estado de milícia mas sim dotar-se de um exérxito permanente e regular. Lenine afirmou: «Nos nossos dias, o exército regular deve ser posto em primeiro lugar». É qualitativamente diferente do da burguesia. É um exército do tipo novo, o exército do povo, o exército revolucionário, o exército socialista.

Face às exigências da guerra moderna, o exército permanente é claramente superior à milícia sob vários pontos de vista:

Face a um problema a todos os títulos novo e alvo de dificuldades de toda a ordem, mas cientes do apoio e do poder criador do povo, Lenine e o Partido Comunista da União Soviética, paralelamente à dissolução do antigo exército, resolveram passo a passo uma série de questões de princípio respeitantes à edificação de um exército regular de tipo novo do Estado proletário — o Exército Vermelho dos operários e camponeses. Lenine definiu o papel e as tarefas do Exército Vermelho; precisou a natureza revolucionária e popular do exército do Estado proletário; aperfeiçoou o sistema de organização do Partido e do trabalho político; estabeleceu o papel dirigente do Partido Comunista no exército, a orientação e a política de formação e aperfeiçoamento dos quadros, os princípios de organização, de equipamento, de educação e instrução do exército soviético, a arte militar soviética, etc., bem como outros aspectos da vida do Exército Viermelho.

No decurso da edificação deste, Lenine teve de lutar com energia e tenacidade contra concepções erróneas. Frustrou as manobras dos mencheviques, social-revolucionários e elementos anarquistas que, a pretexto de defenderem o «armamento do povo», se opunham na realidade encarniçadamente à linha preconizada pelo Partido para a edificação do Exército Vermelho. No 8.° Congresso do Partido, Lenine e os seus companheiros puseram em cheque «O grupo dos protestadores militares» do Partido, que se opunham ao reforço da disciplina, ao princípio de um comando centralizado e unificado, isto é, em última análise, ao princípio de uma edificação regular do Exército Vermelho.

No fim da guerra civil, a questão da forma de organização militar do Estado soviético foi posta de novo. O Partido Comunista, com Lenine à cabeça, rejeitou categoricamente a tendência trotskista, que preconizava a dissolução do Exército Vermelho e a sua integração nas milícias.

A prática revolucionária provou a extrema clarividência e justeza da tese lenínista. A vitória alcançada pelo Estado soviético sobre a intervenção armada do cartel dos imperialismos em conluio com a contra-revolução interna para sufocar o país após o seu nascimento, e a brilhante vitória da União Soviética sobre o fascismo alemão e o militarismo japonês na guerra patriótica de 1941-45 estão indissoluvelmente ligadas a esta tese justa de Lenine. O mundo inteiro sabe que durante a Segunda Guerra Mundial, o Exército Vermelho, poderoso exército regular do primeiro Estado socialista do mundo, desempenhou um papel determinante na derrota dos exércitos agressores do fascismo alemão e do militarismo japonês, constituídos por uma dezena de milhão de homens e dotados de um equipamento ultramoderno; expulsou os agressores da Pátria socialista e contribuiu diretamente para a libertação de numerosos países da Europa e da Ásia; perseguiu os nazis mesmo no seu covil, para os aniquilar, salvando a humanidade do perigo fascista.

O Exército Vermelho não somente provou a sua supremacia política e moral absoluta mas ainda, no decurso da guerra, provou a sua superioridade quanto ao número e à qualidade das tropas, quanto à qualidade e modernidade das armas e do material, e quanto à técnica de combate e à arte do comando. Graças a este enorme potencial, o Exército Vermelho pôde desencadear contra-ofensivas e ofensivas de muito grande envergadura, aniquilar numa só campanha dezenas de divisões inimigas, romper as linhas de defesa, libertar numerosas e vastas regiões, imprimir à guerra viragens decisivas e conduzi-la finalmente à vitória.

A tese leninista sobre a edificação do Exército Vermelho regular marca um novo desenvolvimento da tese de Marx e Engels sobre a organização militar do Estado socialista nas novas condições históricas, as de um Estado socialista cercado pelo mundo capitalista. O grande valor desta tese reside no fato de ter mostrado ao proletariado que, na etapa imperialista, e dado que o imperialismo, de natureza ultra-bélica, dispõe de colossais armas de agressão equipadas de maneira ultramoderna, o Estado socialista, para garantir a sua segurança, deve necessariamente possuir um exército permanente, regular e poderoso e não contar unicamente com o povo em armas. O proletariado no poder está perfeitamente em condições para, apoiando-se na superioridade do novo regime social e no desenvolvimento constante das bases materiais e técnicas do socialismo, usar o seu aparelho de Estado na rápida edificação de um tal exército regular, moderno e de tipo novo, servindo de pilar na defesa do Estado socialista.

Aqui põe-se uma nova questão: quando o Estado socialista tiver edificado um tal exército regular, permanente e poderoso, em que termos se passará a pôr o problema do armamento do povo?

Lenine pensava que se deveria edificar o Exército Vermelho socialista a partir da base de um armamento geral do povo. No 3.° Congresso dos Soviets dos deputados operários, soldados e camponeses da Rússia, Lenine contou a história de uma velha finlandesa que se tinha cruzado com um combatente do Exército Vermelho quando apanhava lenha. Ele, não só não lhe roubou a lenha como sempre faziam os soldados czaristas, mas ainda a ajudou a apanhá-la. Esta história significava para Lenine que as massas populares olhavam já de outro modo os soldados, os combatentes do Exército Vermelho...

«Dizem: agora já não há que ter medo do homem armado de espingarda, porque defende os trabalhadores e será implacável quando se tratar de pôr fim à dominação dos exploradores...»(18).

Era um exército revolucionário, um exército do povo. Lenine abordou em seguida as relações entre o Exército Vermelho e o povo em armas:

«Eis o que o povo sentiu, e eis porque esta propaganda feita por gente simples, pouco instruída, que conta como os guardas vermelhos concentram todas as suas forças contra os exploradores, é invencível. Ela tocará milhões e dezenas de milhões de pessoas e dará uma base sólida àquilo que a Comuna francesa, no século 19, tinha começado a criar, só o conseguindo durante um curto período, por ter sido esmagada pela burguesia; criará o Exército Vermelho socialista fundado a partir do armamento geral do povo (19) preconizado por todos os socialistas».

No 8.° Congresso do Partido bolchevique, ao insistir na necessidade de concentrar esforços para edificar o Exército Vermelho, Lenine sublinhou igualmente que o Partido continuaria a «manter o sistema de milícia». O programa do Congresso também indica como tarefas dar uma instrução militar a todo o povo trabalhador, estabelecer relações estreitas entre as tropas já reorganizadas e as empresas do Estado, os sindicatos, as organizações de camponeses pobres, etc.

Na União Soviética, imediatamente após a vitória da Revolução de Outubro, as forças armadas das massas revolucionárias, os destacamentos de guardas vermelhos, guerrilheiros operários e camponeses pobres desempenharam um papel muito importante no esmagamento das rebeliões conira-revolucionárias. Nos primeiros tempos da edificação do Exército Vermelho dos operários e camponeses, eram precisamente as formações de «guardas vermelhos» que constituiam a sua ossatura.

Antes de o Exército Vermelho ser fortalecido com milhões de homens, as formações de guerrilha eram em numerosas regiões uma das forças essenciais de combate do povo contra os intervencionistas estrangeiros e os guardas brancos. Durante a guerra civil, centenas de milhar de guerrilheiros tinham combatido na retaguarda inimiga, coordenando estreitamente as suas atividades com as do Exército Vermelho. Numerosas unidades e agrupamentos regulares desta última foram formados na altura da guerra civil a partir de unidades de guerrilha.

Depois do fim vitorioso da guerra civil, o sistema de milícias foi mantido durante vários anos sob formas apropriadas às realidades de cada período, paralelamente à redução dos efectivos e à elevação da qualidade do Exército Vermelho.

Durante a grande guerra patriótica de 1941-45, sob a direcção do Partido Comunista da União Soviética com Staline à cabeça, as formações de guerrilheiros, de milicianos, de operários combatentes... juntamente com o Exército Vermelho desempenharam um papel muito importante na derrota do fascismo alemão na sua Pátria.

Um milhão de guerrilheiros organizados pelo Partido Comunista combateram valorosamente nas regiões ocupadas pelas tropas alemãs. Aniquilaram milhões de inimigos, imobilizaram um décimo das forças terrestres do fascismo alemão.

O povo em armas combateu ao lado do Exército Vermelho, mesmo nas frentes principais, tomando firmemente cada polegada de terra da pátria soviética. No decurso de numerosas e importantes campanhas, foram cometidas proezas inolvidáveis por dezenas de divisões da milícia popular em ação coordenada com o Exército Vermelho. Se é verdade que o Exército Vermelho, exército permanente do Estado soviético, desempenhou um papel primordial na grande guerra patriótica, a sua aliança com o povo foi um exemplo vivo da guerra do povo nas condições da época atual.

O povo soviético e os combatentes do Exército Vermelho tinham um grande orgulho no poder prodigioso da guerra sagrada do povo contra o fascismo alemão nos anos 1941-45. Este orgulho é bem patente nas palavras de uma canção familiar a todos os Soviéticos:

Guerra do povo
Guerra santa

Foi a vitória da ciência militar soviética e também dos princípios de edificação da organização militar enunciados por Marx, Engels e Lenine e adaptados às novas condições pelo PCUS.

O movimento revolucionário teve um vigoroso incremento durante e após a Segunda Guerra Mundial; eclodiram numerosas insurreições e guerras revolucionárias por toda a parte, na Europa e na Ásia. A grande vitória do Exército Vermelho sobre o fascismo e a vitória das lutas revolucionárias dos povos do mundo levaram ao nascimento de uma série de países socialistas, que formaram um sistema à escala mundial. A luta dos povos do mundo pelo socialismo, pela independência nacional, pela democracia e pela paz, determinou um avanço revolucionário que lançou ataque sobre ataque contra o imperialismo.

Foi debaixo do fogo das insurreições armadas e das guerras revolucionárias posteriores à Revolução de Outubro, durante e após a Segunda Guerra Mundial, que as forças armadas revolucionárias dos povos dos países socialistas da Europa, Ásia e América Latina viram a luz do dia e rapidamente amadureceram. Em consequência de condições e circunstâncias históricas diferentes, as forças armadas revolucionárias dos países socialistas tiveram diferentes processos e níveis de desenvolvimento, diferentes sistemas de organização... mas na maior parte dos casos são resultado do movimento de guerrilha contra os reacionários do país, contra os agressores fascistas, e constituiram-se em exércitos regulares, englobando múltiplas formas de organização armada de massas.

Na Ásia, no decurso da longa e dura luta armada revolucionária contra o imperialismo, contra a classe dominante feudal e a burguesia, o povo chinês construiu o Exército Vermelho dos operários e camponeses, realizou «a mobilização e o armamento de todo o povo» e alcançou uma brilhante vitória. O nosso povo conduziu à vitória a insurreição armada e a guerra revolucionária; as nossas forças armadas constituem um dos sucessos-tipo da aplicação criadora das teses marxistas- leninistas sobre o armamento das massas e a edificação do exército — é uma análise que faremos mais adiante.

Numerosos países colonizados e dependentes conquistaram a independência com diferentes graus, por diversas formas de luta. Muitos deles conquistaram a independência nacional pela luta armada. Tornaram-se Estados nacionais. Tanto no decurso da luta armada como depois da vitória, alguns deles, combatendo ativamente o imperialismo e o colonialismo, dedicaram-se à edificação das suas forças armadas para organizar o poder do Estado nacional e, ao mesmo tempo, realizaram a um certo nível o armamento do povo.

Atualmente, os povos de numerosos países da Ásia, África e América Latina que conduzem lutas armadas para conquistar o poder e a independência nacional, aplicam às suas condições concretas esses ensinamentos sobre a organização das forças armadas revolucionárias.

Atacado em todo o lado e sofrendo repetidas derrotas, o imperialismo, tendo à cabeça o imperialismo americano, recorreu a processos pérfidos e cruéis para sufocar o movimento revolucionário dos povos e manter as suas prerrogativas e privilégios. Foi o aumento do orçamento de defesa nacional, a corrida ao armamento, a multiplicação das armas de destruição massiva, a omnipresença das bases militares, a constituição de blocos de aliança militar, as intervenções armadas sucessivas e as guerras de agressão «especiais» e «locais» em preparação de uma nova guerra mundial.

Para defenderem a Pátria socialista e a paz mundial e para impedirem os projectos e manobras bélicas do imperialismo, os países do campo socialista empenharam-se no acréscimo das suas capacidades de defesa nacional, prosseguindo a edificação da economia e o desenvolvimento da ciência e da técnica. Com a força da superioridade do regime socialista, dos sucessos na construção das bases materiais e técnicas do socialismo e do comunismo, os países socialistas edificam os seus exércitos revolucionários no sentido da modernização, com graus diferentes segundo as condições de cada um, cultivam a natureza revolucionária do exército socialista e empenham-se em dotá-lo de armas e meios cada vez mais modernos: armas convencionais, mísseis, armas nucleares.

Ao mesmo tempo que se dotam de armas modernas, os países socialistas empenham-se no amplo armamento das massas: operários e camponeses coletivistas, com formas de organização e equipamento adequado ao máximo desenvolvimento da potência das massas populares, do regime socialista na consolidação da defesa nacional.

Que conclusões podemos tirar destes fundamentos teóricos e desta prática ?

O armamento das massas revolucionárias, combinado com a edificação do exército revolucionário é o mais completo princípio do marxismo-leninismo no que respeita à forma de organização militar da defesa nacional dos países socialistas, à guerra de libertação, à guerra patriótica de autodefesa e à guerra revolucionária dos povos na época atual. Este princípio resulta da evolução da tese de Marx e Engels sobre o armamento do povo até à tese de Lenine sobre a edificação do exército revolucionário a partir da base do armamento do povo.

Marx, Engels e Lenine tiraram de maneira genial a lição das experiências adquiridas na edificação da organização militar do proletariado e dos povos oprimidos no decurso das lutas revolucionárias pela conquista e manutenção do poder. Em certa medida, também herdaram ensinamentos sobre a organização das forças armadas das classes revolucionárias e dos povos oprimidos e agredidos em épocas anteriores ao marxismo e enriqueceram-nas de modo criador.

O proletariado, o povo trabalhador e as nações oprimidas não podem naturalmente possuir, logo de início, um exército; erguem-se com as mãos nuas para fazer a revolução e derrubar a dominação burguesa, imperialista e feudal. Mas, no decurso do processo revolucionário, quando se põe o problema da luta armada, da insurreição armada, têm necessariamente que se dotar de uma organização militar própria. Normalmente, a forma inicial é o armamento das massas e, a partir desta base, constitui-se progressivamente o exército revolucionário. Na altura das insurreições, as massas desempenham geralmente o papel principal; sucede também que o exército revolucionário assume o papel de força de choque. E, quando a insurreição evolui para uma guerra revolucionária, o papel do exército torna-se cada vez mais importante; as forças armadas revolucionárias englobarão então o exército e as massas armadas.

O problema da edificação de um exército revolucionário permanente e regular propriamente dito só se poderá pôr quando o proletariado e o povo trabalhador tiverem conquistado o poder e instituído um Estado proletário. A forma de organização militar do Estado socialista, do Estado de democracia popular, suscetível de desenvolver ao máximo a potência combativa do povo, do novo regime, consiste em aliar a edificação de um exército revolucionário regular e moderno a um amplo e avançado armamento das massas revolucionárias. As massas armadas e o exército revolucionário são os dois componentes das forças armadas do Estado, sendo a sua ossatura constituída pelo exército permanente e a base constituída pelas massas armadas. É pois preciso que a edificação do exército seja acompanhada pela multiplicação dos efetivos das massas armadas.

A aliança estreita destes dois componentes nas forças armadas do Estado socialista constitui uma superioridade absoluta do regime socialista sobre os regimes de exploração.

Sob os regimes de Estado das classes exploradoras, o antagonismo entre os interesses da classe dominante e os das massas trabalhadoras gera uma oposição fundamental entre as massas trabalhadoras por um lado e o Estado e o seu exército permanente por outro. O Estado dominador vê no povo revolucionário armado um perigo para a sua própria existência. Os governos reacionários preferem, em geral, perder o país a armar o povo. Como salientou Engels, preferem um compromisso com os seus inimigos, cruéis decerto mas da mesma classe, a uma aliança com o povo. Há casos em que a classe feudal ou a burguesia, quando desempenhavam um papel historicamente progressista e tinham ainda uma consciência nacional, armaram as massas para as fazer combater contra as tropas de agressão ao lado do exército permanente. Mas, mesmo nesses casos, o armamento das massas continuava a ser limitado.

Sob o regime socialista, a situação é completamente diferente. As classes exploradoras foram derrubadas, a exploração do homem pelo homem foi abolida, foi instituída a propriedade coletiva e o poder coletivo do povo trabalhador. A função atribuída às forças armadas socialistas — principal instrumento da violência do Estado da ditadura do proletariado — é reprimir e combater os inimigos internos e externos, e defender o novo regime e os interesses do povo trabalhador. Esta elevada unidade político-moral da sociedade nova e as crescentes forças materiais e técnicas do socialismo são as bases mais sólidas para a edificação das forças armadas revolucionárias modernas de tipo novo e para o desenvolvimento da potência combativa global do exército revolucionário e das massas armadas. As forças armadas do Estado socialista são as primeiras da história a integrar os operários e camponeses, tornados verdadeiramente senhores do seu destino, dotados de uma elevada consciência política, prontos, a sacrificar tudo pelos ideais socialistas e comunistas. São forças armadas invencíveis.


Notas de rodapé:

(1) Carta a Engels, 27 de Fevereiro de 1861, in K. Marx-F. Engels, Correspondência, Alfred Costes, Editor, Paris, 1933, tomo VII, p. 20. (retornar ao texto)

(2) Introdução a «A guerra civil em França» de K. Marx, Édítions Sociales, Paris, 1952, p. 10. (retornar ao texto)

(3) Introdução a «A Guerra Civil em França», de K. Marx, Édítions Sociales, Paris, 1952, p. 10. (retornar ao texto)

(4) Anti Dühring. Édítions Sociales, Paris, 1956, p. 203. (retornar ao texto)

(5) K. Marx-F. Engels: «Mensagem do comité central à Liga dos comunistas», K. Marx-F. Engels, Obras Escolhidas, Éditions du Progrès, URSS, 1970, tomo I, p. 189. (retornar ao texto)

(6) «A luta de classes em França» (1848-1850), Obras Completas, Éditions Sociales, Paris, 1948, p. 58. (retornar ao texto)

(7) «A luta de classes em França», o 18 de Brumário de Luís Bonaparte, Éditions Sociales, Paris, 1948, p. 153. (retornar ao texto)

(8) «A guerra civil em França. 1871», Éditions Sociales, 1952, p.48. (retornar ao texto)

(9) «A guerra civil em França. 1871», Éditions Sociales, 1952, p.48. (retornar ao texto)

(10) F. Engels, V. Lenine e J. Staline, Da guerra do povo. (retornar ao texto)

(11) F. Engels, V. Lenine e J. Staline, op. cit., p. 27. (retornar ao texto)

(12) Idem, p. 29. (retornar ao texto)

(13) F. Engels. V. Lenine e J. Staline, op. cit., p. 155. (retornar ao texto)

(14) Idem, p. 148-149. (retornar ao texto)

(15) V. I. Lenine: «Programa militar da revolução proletária». Obras, Éditions Sociales, Paris, Edições em línguas estrangeiras, Moscovo, 1969, tomo XXIII, p. 38. ((retornar ao texto)

(16) V. I. Lenine: «O exército e a revolução», Obras, Éditions Sociales, Paris, Éditions du Progrès, Moscovo, 1967, tomo X, p. 51. (retornar ao texto)

(17) Idem pp. 51-52. (retornar ao texto)

(18) V. I., Lenine: Terceiro Congresso dos Sovietes dos deputados operários, soldados e camponeses da Rússia. 10-18, 23-31 de Janeiro de 1918. Obras. Éditions Sociales, Paris. Edições em línguas estrangeiras, Moscovo, 1958, tomo XXVI, p. 484. (retornar ao texto)

(19) V. I., Lenine: Terceiro Congresso dos Sovietes dos deputados operários, soldados e camponeses da Rússia. 10-18, 23-31 de Janeiro de 1918. Obras. Éditions Sociales, Paris. Edições em línguas estrangeiras, Moscovo, 1958, tomo XXVI, p. 484. (retornar ao texto)

Inclusão 31/12/2012