Prefácio para a edição inglesa de Amor Vermelho

Alexandra Kollontai

10 de Março de 1927


Primeira Edição: Red Love, Seven Arts Publishing Co., New York, 1927.

Fonte: https://www.marxists.org/archive/kollonta/red-love/ch00.htm

Tradução: Nicolas de Oliveira Farias e Revisão: Alice Rodrigues

HTML: Fernando Araújo.

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Esse romance não é nem um estudo sobre a "moral", nem um retrato do padrão de vida na Russia Soviética. É apenas um estudo psicológico das relações sexuais no período do pós-guerra.

Eu escolhi o ambiente do meu próprio país e fiz os protagonistas do meu próprio povo, por conhecê-los melhor e poder dar um retrato mais vívido de suas características e vida pessoal. Muitos dos problemas apresentados não são exclusivamente russo-soviéticos; eles são fatos mundiais, que podem ser notados em todos os países. Esses dramas psicológicos silenciosos, nascidos da mudança nas relações sexuais; essa evolução, especialmente, nos sentimentos da mulher, são bem conhecidos para a geração mais jovem da Europa.

Nós já julgamos um homem pela sua conduta nas relações amorosas? Normalmente, se ele não ultrapassar certos limites bem flexíveis, nós dizemos que a sua vida sexual é um "caso privado." O caráter de um homem não é avaliado pela sua conduta na moral familiar, mas pela sua eficiência no trabalho, pelo seu intelecto, sua vontade, sua utilidade para o Estado e para a sociedade. Enquanto a maioria das mulheres não tiver deveres diretos para com o Estado ou a sociedade, enquanto todas as suas atividades se concentrarem dentro dos limites familiares, as nações civilizadas não irão demandar outras qualidades na mulher do que ela exiba "boas morais" na vida sexual e familiar.

Agora, quando mais da metade das cidadãs adultas trabalham e lutam, assim como o homem, a sociedade coloca novas demandas às mulheres. Suas habilidades em responder aos deveres sociais de cidadã começam a ter mais importância do que sua "bondade" e "pureza" na moral familiar. A vida familiar não é o único campo da atividade da mulher nos dias de hoje; frequentemente seus deveres entram em conflito amargo com seu trabalho fora de casa e seus deveres públicos. É apenas natural, portanto, que o método de avaliação da mulher hoje seja diferente dos nossos avôs e avós.

Embora uma mulher possa, atualmente, atingir a "perfeição" no atual padrão burguês de moral familiar e ser "estimada" pelo seu próprio povo, ela não pode receber uma valorização real e nem o "respeito" do Estado. Ela será simplesmente "esquecida". Pelo contrário: uma mulher pode não ser "imaculada" do ponto de vista da moral sexual burguesa atual, mas se ela é uma figura excepcional na política, arte, ciência, etc., ninguém "sussurra" sobre ela pelas costas. Se colocasse na balança duas mulheres : uma com "boa moral", mas que nunca fez nenhum trabalho útil para o país ou para a humanidade, e a outra, cuja "moral familiar" não é livre de críticas, mas que é uma eficiente servidora pública —não haveria dúvidas quanto à escolha.

Nossos critérios na moral sexual estão sempre mudando. Não há nunca uma paralisação. Existem apenas períodos na história humana onde a evolução da moral acontece mais rapidamente; outros períodos (com uma estagnação geral em todos os campos da vida) onde as mudanças parecem relaxar. Apenas meio século atrás Alexandre Dumas escreveu sobre uma "divorciada" como uma criatura "caída", enquanto hoje na França se discute abertamente a questão de igualar os direitos de mães não-legais com os das mulheres legalmente casadas. Cada vez menos permanece da velha hipocrisia burguesa no nosso modo de pensar e julgar a moral sexual.

Eu espero que este livro ajude a combater a velha hipocrisia burguesa nos valores morais, e mostre de uma vez que nós estamos começando a respeitar a mulher, não pelas suas "boa moral", mas pela sua eficiência, por sua engenhosidade com relação a seus deveres com a classe, com o país e a humanidade com um todo.

Cidade do México, 10 de Março de 1927


Inclusão: 08/03/2021