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Após termos examinado os principais traços distintivos das três grandes regiões dos Estados Unidos e o caráter geral das condições económicas, podemos passar à análise dos dados utilizados habitualmente. Trata-se, de início, de dados sobre a dimensão média das farms, a partir dos quais vários economistas, incluindo o Sr. Guimmer, retiram as mais categóricas conclusões.
Anos | Superfície Total (em acres) |
Superfície cultivada (em acres) |
1850 | 202,6 | 78,0 |
1860 | 199,2 | 79,8 |
1870 | 153,3 | 71,0 |
1880 | 133, 7 | 71,0 |
1890 | 136,5 | 78,3 |
1900 | 146,2 | 72,3 |
1910 | 138,1 | 75,2 |
Logo de início é possível constatar uma redução da média relativa à superfície total, e variações indeterminadas' — ora uma redução, ora um acréscimo no tocante à média da superfície cultivada. Mas o período 1860-1870 estabelece uma nítida demarcação; assim, nós o separamos com um traço. È no curso deste período que se observa uma enorme redução — de 46 acres (199,2-153,3) — na superfície média total das explorações, e a maior modificação (79,8-71,0), também no sentido de uma redução, da superfície média cultivada.
Dimensão Média das Farms em acres | ||||
Anos | No Sul | No Norte | ||
Superfície Média | Superfície Média | |||
Total |
Cultivada |
Total |
Cultivada |
|
1850 | 332,1 | 101,1 | 127,1 | 65,4 |
1860 | 335,4 | 101,3 | 126,4 | 68,3 |
1870 | 214,2 | 69,2 | 117,0 | 69,2 |
1880 | 153,4 | 56,2 | 114,9 | 76,6 |
1890 | 139,7 | 58,8 | 123,7 | 87,8 |
1900 | 138,2 | 48,1 | 132,2 | 90,9 |
1910 | 114,4 | 48,6 | 143,0 | 100,3 |
Qual é a causa desta ocorrência? Aparentemente, a guerra civil de 1861-1865 e a abolição da escravidão. Um golpe decisivo foi aplicado nos grandes domínios escravistas. Logo veremos numerosas confirmações deste fato, de testo tão conhecido que é espantoso que seja necessário confirmá-lo. Façamos uma distinção entre os dados referentes ao Sul e ao Norte, respectivamente.
Verificamos que a superfície média cultivada por farm diminuiu consideravelmente no Sul durante o período 1860-1870 (101,3-69,2), e que aumentou um pouco no Norte (68,3-69,2). Portanto, o que está em causa são precisamente as condições de evolução do Sul. Mesmo após a abolição da escravidão, ainda observamos aí uma redução progressiva, ainda que lenta e descontínua, da extensão média das farms.
"A agricultura fundada no trabalho familiar estende aqui o campo de sua dominação", conclui Guimmet, "e o capital abandona a agricultura por outros campos de aplicação" (. . .)."A decomposição extremamente rápida do capitalismo agrário nos Estados do Atlântico-Sul".
Eis uma bizarrice que talvez só possa ser equiparada aos argumentos de nossos populistas sobre a "decomposição do capitalismo" na Rússia depois de 1861, depois que os grandes proprietários fundiários substituíram a corvéia pelo pagamento em trabalho (isto é, por semicorvéias!). A desagregação dos latifúndios escravistas é qualificada como "decomposição do capitalismo". A transformação da terra não-cultivada dos ex-proprietários de escravos em pequenas farms exploradas pelos negros, dos quais a metade é formada de parceiros (recordemos que a percentagem de parceiros aumenta constantemente entre um e outro recenseamento!), é qualificada de "decomposição do capitalismo". Não é possível ir mais longe na desfiguração das concepções fundamentais da ciência económica!
No capítulo 12 do texto explicativo que acompanha o recenseamento de 1910, os estatísticos americanos fornecem detalhes sobre as plantations típicas do Sul, tais como elas se apresentam em nossos dias e não nos tempos da escravidão. Nas 39.073 plantações, existem 39.073 landlords farms ("fazendas do Senhor"), e 398.905 explorações de arrendatários. O que corresponde, em média, a 10 arrendatários por "latifundiário" ou "landlord", A extensão média de uma plantação é de 724 acres, dos quais apenas 405 são cultivados: mais de 300 acres por plantação não são cultivados; não é uma reserva modesta para que os senhores escravistas de ontem possam ampliar seus planos de exploração amanhã.
A distribuição da terra de uma plantação média é a seguinte: a "farm do grande proprietário ou senhor" estende-se por 331 acres, dos quais 87 são cultivados. As farms dos "arrendatários", ou seja, os lotes dos parceiros negros, que trabalham como antes para o lord e sob sua vigilância, possuem em média 38 acres de terra, dos quais 31 são cultivados.
Os antigos proprietários de escravos do Sul, que possuem imensos latifúndios onde mais de 9/10 da terra permanece inculta até o presente, começam gradativamente, à medida que cresce a população e a demanda de algodão, a vender estas terras aos negros, ou mesmo, o que é mais frequente, a distribuídas em pequenas parcelas em troca da metade da colheita. (De 1900 a 1910, o número dos farmers detentores da propriedade integral de toda a sua terra passou de 1.237.000 a 1.329.000, ou seja, um aumento de 7,5%, enquanto o número de parceiros passou de 772.000 a 1.021.000, ou seja, um aumento de 32,2%.) E ainda encontramos um economista para qualificar este fenómeno como "decomposição do capitalismo".
Classificaremos como latifúndios as farms que contam com 1.000 acres e mais de terra. Em 1910, sua percentagem nos Estados Unidos era de apenas 0,8% (50.135 farms), e elas ocupavam 167,1 milhões de acres, ou seja, 19% da superfície total, representando uma média de 1332 acres por latifúndio. A percentagem das terras cultivadas nos latifúndios é de apenas 18,7%, enquanto que para o conjunto das explorações agrícolas ela é de 54,4% - Precisemos que é o Norte capitalista que conta com o menor número de latifúndios: 0,5% do número total das farms, com 6,9% da superfície total e com a proporção de terra cultivada elevando-se a 41,1%. É no Oeste que o número dos latifúndios é mais elevado: 3,9% do número total de farms, com 48,3% da superfície total; aí, a percentagem de terra cultivada é de 32,3%. A mais elevada percentagem de terra não cultivada é encontrada nos latifúndios do antigo Sul escravista, que representam 0,7% do número total de farms e ocupam 23,9% da superfície total; apenas 8,5% das terras são cultivadas nestes latifúndios!! Assinale-se que estes dados detalhados mostram, com muita clareza, a que ponto é injustificado classificar os latifúndios dentro da economia capitalista, como se faz com frequência, sem a preocupação em analisar, de forma especial, os dados concretos relativos a cada país e a cada região.
Em dez anos, de 1900 a 1910, foi justamente nos latifúndios, e unicamente neles, que a quantidade total de terra diminuiu. E numa proporção importante: passa-se de 197,8 a 167,1 milhões de acres, ou seja, o decréscimo é de 30,7 milhões de acres. No Sul ele é de 31,8 milhões de acres (no Norte, registra-se um aumento de 2,3 milhões, e no Oeste, um decréscimo de 1,2 milhões). Consequentemente, foi justamente o Sul, e apenas o Sul escravista, onde a terra só é cultivada numa proporção mínima (8,5%), que se caracterizou por um gigantesco processo de desmembramento de seus grandes domínios.
De tudo isso resulta, inevitavelmente, que a única definição precisa do processo económico em curso deve ser a seguinte: passagem dos latifúndios escravistas, incultos em 9/10, à pequena agricultura mercantil não agricu1tura "fundada no trabalho familiar" — como gostam de afirmar o Sr. Guimmer, os populistas e todos os economistas burgueses, que entoam hinos baratos em glorificação do "trabalho" —, mas à agricultura mercantil. A expressão "fundada no trabalho familiar" não possui qualquer sentido político-económico, e induz indiretamente mo erro. Ela carece de sentido porque, em cada uma das formas sociais que a economia pode assumir, o pequeno agricultor trabalha", seja a época em que ele vive caracterizada, pela escravidão, servidão ou capitalismo. A expressão "fundada no trabalho familiar" é um termo oco, uma frase declamatória se qualquer conteúdo, que contribui para confundir as mais diversas formas sociais da economia, beneficiando apenas a burguesia. Esta expressão induz ao erro, ilude o público, leyando-o a acreditar na não-existência de trabalho assalariado.
Como todos os economistas burgueses, o Sr. Guimmer deixa de falar justamente nos dados relativos ao trabalho assalariado, quando eles são de importância fundamental no tocante ao capitalismo na agricultura e quando são fornecidos não apenas pelo recenseamento de 1900, mas também pelo "boletim" do recenseamento de 1910 (Abstract-Farm Cróps, by states(1*)), citado pelo Sr- Guimmer (p. 49 de seu artigo, nota).
Que o desenvolvimento da agricultura no Sul corresponde precisamente ao da agricultura mercantil e o que demonstra o caráter do principal produto do Sul, o algodão O conjunto dos cereais panificáveis representa, em valor, 29,3% da colheita total de cereais no Sul; o feno e as plantas forrageiras, 5,1%, e o algodão, 42,7%. De 1870 a 1910, a produção de lã no Estados Unidos passou de 162 milhões de libras a 321 milhões, ou seja, a produção dobrou; o trigo passou de 236 milhões de bushels(2*) a 635, o que corresponde a um acréscimo de pouco menos do triplo; o milho, de 1.094 milhões de bushels a 2.886 milhões, correspondendo também a um acréscimo de pouco menos do triplo; a produção de algodão passou de 4 milhões de fardos (de 500 libras) a 12 milhões, isto é, triplicou. O desenvolvimento do produto agrícola mercantil por excelência superou o do outros produtos, menos mercantis. Além disto, na principal região do Sul, o "Atlântico-Sul", desenvolveu-se uma produção de tabaco de grande importância (12,1% do valor global da colheita do Estado da Virgínia), de legumes (20,1% do valor global da colheita do Estado de Delaware, 23% da do Estado da Flórida), de frutas (21,3% do valor global da colheita do Estado da Flórida), etc. São todas culturas correspondentes a uma intensificação da agricultura, a um crescimento do volume económico da exploração paralelamente a uma redução da superfície cultivada e a uma utilização crescente do trabalho assalariado. Passaremos agora ao exame detalhado dos dados sobre o trabalho assalariado; por hora nos limitaremos a assinalar que, se o Sul, neste aspecto, apresenta um atraso em relação às outras regiões (no Sul, o emprego de mão-de-obra assalariada é menos detectável, país o sistema semi-escravista da parceria é mais desenvolvido), nele o emprego da mão-de-obra assalariada se desenvolve da mesma forma.
Notas de rodapé:
(1*) Dados obtidos de uma sondagem, feita pelo Estado, sobre a colheita das propriedades agrícolas. (Nota da edição francesa.) (retornar ao texto)
(2*) Bushels, medida de capacidade para cereais que nos Estados Unidos corresponde a 35,238 litros; na Inglaterra, 36,367 litros. (Nota da edição brasileira.) (retornar ao texto)
Fonte |
Inclusão | 27/02/2012 |