MIA > Biblioteca > Manfred > Novidades
Embora as revoluções de 1848 não tivessem acabado vitoriosas, as forças da reacção nesta altura eram incapazes de impedir o avanço do progresso social. O rápido crescimento do capitalismo na Europa e na América estava na base da evolução social da segunda metade do século XIX. A produção mecanizada já tinha destruído o trabalho na maioria dos países da Europa e nos E.U.A. Grandes fábricas capitalistas surgiam todos os dias em todos os ramos da indústria. Inovações tecnológicas importantes estavam a transformar a economia destes países. A mudança da madeira para o carvão e depois para o petróleo como principal fonte de combustível foi também um promotor do progresso social. O novo método de converter o ferro fundido em aço, inventado por Henry Bessemer, e os fornos abertos, tornaram a produção do metal um processo muito mais rápido e dinâmico. O rápido avanço de metalurgia foi, um estímulo para as outras esferas de produção. Este período também assistiu a uma rápida expansão do caminho de ferro. O comprimento total dos caminhos de ferro do Mundo, que em 1830 era apenas de 350 kms, excedia 270 000 km, em 1870. Descobertas importantes na física, particularmente no campo da electricidade, em breve levaram ao aparecimento de uma nova forma de comunicação: o telégrafo.
Em 1859 foi publicada a famosa obra de Charles Darwin «A Origem das Espécies pela Selecção Natural», que desempenharia um papel decisivo no subsequente desenvolvimento das Ciências Naturais. Também se fizeram progressos importantes na Agronomia. Métodos mais progressistas de cultivo da terra foram encontrados.
Assim, ocorreria um grande avanço industrial em todos os países industriais desenvolvidos a partir dos anos cinquenta. No entanto, em 1857, a Europa e os Estados Unidos foram atingidos por um novo tipo de crise, uma crise superprodução. Era a primeira vez que uma crise de dimensões tão sérias se dava à escala internacional. Mas não foi a última: crises económicas deste tipo têm ocorrido no mundo capitalista com intervalos regulares aproximadamente de dez em dez anos.
O país capitalista mais avançado do tempo era a Inglaterra. Submetendo os povos de um vasto império a uma cruel exploração e extraindo grandes riquezas das colónias, a burguesia britânica tinha conseguido industrializar a economia do país com extrema rapidez. As chaminés das fábricas apareciam em toda a parte no horizonte inglês. Por volta de 1870, a Inglaterra tinha-se tornado um país predominantemente urbano com dois terços da população a viver nas cidades. Nessa altura, produzia metade do ferro do Mundo e as suas fábricas de fiação produziam mais tecidos de algodão que as do resto do Mundo todas juntas. A Inglaterra ocupava também uma posição importante noutras esferas da indústria; tinha o maior comércio externo do Mundo e a maior marinha mercante.
A Inglaterra conheceu o auge do seu poderio durante a era vitoriana, durante o reinado da rainha Vitória (1837-1901). No entanto, a «Alegre Inglaterra» era extremamente dura para muitos, dada a desigualdade da distribuição de riqueza. Os donos das fábricas, os banqueiros, os magnates da construção de navios e os senhorios juntaram enormes fortunas durante este período. A política interna e externa do país servia os seus interesses e as incessantes guerras coloniais na Índia, na China e na África trouxeram-lhes enormes lucros. Nos anos 1853-1856, quando a Inglaterra, com a França e a Turquia, estava a travar uma guerra contra a Rússia na Crimeia, foi sobretudo a gente do povo, a quem a guerra era imposta pelas classes dominantes de ambos os lados, quem mais sofreu.
Os operários ingleses sofriam árida de condições de vida e de trabalho extremamente duras, de resto objectivamente retratadas pelo notável romancista inglês Charles Dickens (1812-1870) nas suas grandes obras desse período, tais como Bleak House, Hard Times e Sittle Dorrit. Estes romances apresentavam um quadro vivo dos ricos cruéis e calculistas e dos sofrimentos dos pobres honestos na Inglaterra vitoriana.
Os camponeses estavam ainda em pior situação e todos os oprimidos pobres da Irlanda, e mais ainda os milhões submetidos nas colónias inglesas, estavam sujeitos a uma cruel exploração e mesmo ao extermínio físico, como os Maoris na Nova Zelândia.
A classe operária inglesa tinha aumentado consideravelmente nesta altura e estava também mais organizada. Um número cada vez maior de operários começava a inscrever-se nos sindicatos. Utilizando greves e manifestações políticas, os operários ingleses conseguiram arrancar várias concessões às classes dominantes: o dia de trabalho de dez horas e uma lei sobre a protecção ao trabalho das crianças. Foi em grande medida devido à pressão exercida pelos operários que a segunda Lei da Reforma foi adoptada em 1867, dando o direito de voto a um sector muito maior da população. À medida que a classe operária crescia numericamente e se tornava politicamente mais activa, a astuta burguesia começou a recorrer a variadas e complicadas manobras. A mais importante foi uma campanha para provocar uma cisão na classe trabalhadora. Com parte dos enormes lucros da exploração colonial, esta decidiu comprar o sector mais próspero do proletariado, os trabalhadores especializados. Pagando a estes trabalhadores salários consideravelmente mais elevados e concedendo-lhes privilégios, a burguesia promoveu a criação de uma espécie de «aristocracia industrial». Esta aristocracia separou-se desde logo da grande massa do proletariado industrial e pouco a pouco tornou-se um instrumento da burguesia dentro da classe operária.
Esforçando-se por dividir o proletariado e fazendo concessões democráticas ocasionais em matéria social e de trabalho, nos anos cinquenta e sessenta, as classes dominantes inglesas conseguiram consolidar as suas posições sem o auxílio do exército ou da polícia.
Consolidando o capitalismo na Inglaterra, vários obstáculos se opuseram ao seu desenvolvimento nos outros países da Europa e da América.
Durante o século XIX, o capitalismo desenvolveu-se com muita rapidez nos Estados Unidos. A sempre crescente exploração de terras aumentada à medida que os colonos avançavam para Oeste, expulsando os índios à sua frente, e a escassez de mão-de-obra (apesar do crescente influxo de imigrantes) levou a uma rápida e ampla introdução de maquinaria.
O desenvolvimento capitalista nos Estados Unidos não se realizou em ritmo uniforme. As relações de produção capitalistas afirmaram-se desde logo no Norte, onde cresceram grandes centros industriais e no Oeste que era predominantemente agrícola. No Sul, entretanto, o trabalho-escravo estava ainda a ser utilizado e o número de plantações que utilizavam o trabalho-escravo estava ainda a aumentar. A parte sul dos Estados Unidos era nesta altura o maior centro de trabalho-escravo do Mundo; por volta de 1860 havia lá mais de quatro milhões de escravos negros. Estes escravos podiam ser vendidos, mutilados ou até assassinados impunemente e podiam ser compelidos sob a ameaça do chicote a trabalhar de manhã à noite debaixo das ordens dos seus cruéis senhores nas plantações de algodão ou tabaco.
Estes dois sistemas inteiramente diferentes, o do Norte e do Oeste, que era capitalista e baseado no trabalho assalariado, e do Sul esclavagista corriam para um confronto inevitável.
À medida que os anos passaram, as contradições entre os dois sistemas aumentariam, dando por vezes origem a amargos conflitos. Finalmente, em 1861, depois de Abraham Lincoln (1809-1865), filho de um pobre camponês, honesto democrata e um dos ardentes opositores da escravatura (ou abolicionistas como eram conhecidos nos Estados Unidos) ter sido eleito presidente, os donos de escravos do Sul organizaram uma revolta declarada contra o governo federal, separando-se da União, para estabelecerem os Estados do Sul da América Confederados com o seu próprio Governo e presidente. O rico plantador esclavagista coronel Jefferson Davies foi eleito presidente, e não hesitou em declarar em público que o negro era inferior ao homem branco e que a escravatura era a sua condição natural.
De 1861 a 1865, os Estados Unidos viram-se envolvidos numa angustiante guerra civil. De início, a vantagem esteve do lado dos Confederados, porque eram mais versados nas tácticas militares. Contudo, à medida que maior número de Americanos toma parte na guerra contra o Sul e a guerra assumia um carácter mais revolucionário, as posições mudavam-se. O ponto de viragem da guerra foi o decreto de Abraham Lincoln segundo o qual lotes de terra do Oeste seriam dados àqueles que estivessem prontos a trabalhar para eles (a Lei das Quintas) e todos os escravos pertencentes aos rebeldes do Sul teriam a liberdade a partir de um de Janeiro de 1863. Estas leis tiveram grande significado revolucionário e atraíram muitos recrutas para o exército do Norte. A partir de então os Confederados sofreram derrota após derrota e na Primavera de 1865 estavam vencidos.
A Guerra Civil que acabou abolindo a escravatura representa um capítulo heróico na história do povo americano, uma segunda revolução, por assim dizer. No entanto, o povo não conseguiu manter as vitórias que obteve durante esta luta heróica. Em catorze de Abril de 1865, cinco dias depois de os sulistas terem capitulado, o presidente Lincoln, que tinha conduzido nobremente o povo americano nos anos críticos da guerra civil, foi morto a tiro por um agente dos esclavagistas derrotados. Nos anos que se seguiram, a alta burguesia obteve o firme controlo do aparelho de Estado do país. Agora que a escravatura já não representava um obstáculo ao seu avanço, o capitalismo fez rápidos progressos nos Estados Unidos, ultrapassando os estados capitalistas mais antigos da Europa no seu ritmo de desenvolvimento.
A unidade nacional, a libertação da dominação estrangeira, e a independência ainda não tinham sido obtidos por alguns países e povos da Europa. Este facto era uma questão particularmente vital na Itália deste período. Depois das mal sucedidas revoluções de 1848-1849, a Itália era ainda constituída por dois Estados separados, estando Roma ocupada por tropas francesas, e a Lombardia e a Veneza no Norte por tropas austríacas.
Os patriotas italianos desejavam ardentemente expulsar os opressores estrangeiros e unir o país num só estado independente. Havia duas perspectivas segundo as quais era possível atingir estes objectivos.
No Norte, do reino do Piemonte Sardenha, os círculos mais abastados, donos de fábricas, proprietários liberais, altos funcionários de Estado que se acautelavam e desconfiavam das massas populares, eram de opinião que a unificação do país devia ser organizada «de cima», com a monarquia piemontesa como núcleo central, através de manobras diplomáticas e políticas, sem envolver as massas. O principal autor desta teoria era o primeiro-ministro, o rico proprietário conde Camillo Benso di Cavour. Esperando estabelecer elos mais íntimos com a França de Luís Napoleão e assim assegurar o seu apoio político-militar para a sua causa, Cavour tinha envolvido o Piemonte na Guerra da Crimeia (1853-1856). Contudo, a participação nesta guerra não tinha defendido os interesses do povo italiano: tudo o que ficou desta campanha para a Itália foi um cemitério em Sebastopol. Em 1859, depois de aprovado um acordo secreto entre Cavour e Napoleão III, a França e o Piemonte travaram uma guerra com a Áustria e obtiveram duas notáveis vitórias nas batalhas de Magenta (quatro de Junho) e Solferino (vinte e quatro de Junho). Porém, no próprio momento em que os Austríacos viam aproximar-se a derrota, Napoleão III traiu os seus aliados italianos e conclui secretamente um armistício separado e depois uma paz com a Áustria, de acordo com a qual a Lombardia era cedida ao Piemonte, os Austríacos ficavam com a Venetia, e Sabóia e Nice eram entregues à França. Assim, a manobra de Cavour não serviu de nada.
Entretanto, os defensores de uma campanha de tipo diferente pela unificação política da Itália também estavam em actividade. Eram os membros do movimento da «Jovem Itália» (Giovane Italia) chefiada pelos notáveis patriotas italianos Giuseppe Mazzini (1805-1872) e Giuseppe Garibaldi (1807-1882). O movimento da «Jovem Itália» não punha as suas esperanças em intervenções estrangeiras e intrigas políticas, mas na coragem e na ousada acção revolucionária dos seus membros. Este partido, em vez de temer o povo, procurou o seu apoio. Quando os planos oportunistas de Cavour de fazer «uma revolução de cima» falharam, a influência da «Jovem Itália» no país ganhou rapidamente terreno e a partir de então começou a desempenhar um papel importante no movimento pela unificação.
Em 1859, uma revolta popular chefiada pela «Jovem Itália» nos principados nortenhos de Parma, Módena e Toscana e na Romagna papal conseguiu derrubar as autoridades e unir-se ao reino de Piemonte. Mais tarde também estalou uma revolta popular do reinado das Sicílias e Garibaldi apressou-se a ir em seu socorro.
Dois navios lançaram a âncora perto das costas rochosas da Sicília num dia de Maio de 1860 e desembarcaram destacamentos de homens armados que vestiam camisas vermelhas. Eram os famosos «Mil» de Garibaldi, que reunindo-se ao grito de guerra de «viva a Itália», deram batalha às tropas do governo. Apoiados pelos camponeses locais, os Camisas Vermelhas de Garibaldi infligiram uma esmagadora derrota ao exército do rei de Nápoles. Depois, novos voluntários se juntaram ao contingente de Garibaldi e, numa marcha forçada, derrotando os regimentos do rei que encontravam pelo caminho, o seu exército, agora numeroso, atravessou todo o Sul da Itália e entrou em Nápoles. A dinastia Bourbon foi logo derrubada e uma Nápoles rejubilante saudou Garibaldi como herói nacional. Contudo, ele e os seus partidários não estavam preparados para unificar o país sob a bandeira republicana. No Outono de 1860, o Norte e o Sul foram unidos sob o ceptro do rei do Piemonte-Sardenha, Vitor Manuel, que marchou em triunfo para Nápoles, onde Garibaldi lhe entregou voluntariamente os poderes de ditador que o povo lhe havia conferido. Os serviços do herói lendário já não eram precisos e este voltou à vida obscura da sua ilha piscatória natal de Caprera. Herzen escreveu que ele foi despedido «como uma carruagem que tinha levado o passageiro ao seu destino». Em Março de 1861, o reino Unido da Itália foi proclamado em Turim, e Vítor Manuel foi aclamado rei.
A unificação final do país só foi conseguida alguns anos mais tarde. Em 1886, a Venetia foi libertada dos Austríacos como resultado da guerra austro-prussiana e, em Setembro de 1870, depois da queda do Segundo Império, a antiga capital Roma foi mais uma vez restituída à Itália.
A unificação da Itália foi feita por dois processos paralelos, um «de cima» e outro «de baixo». O papel decisivo neste movimento foi desempenhado pela actividade revolucionária das massas populares chefiadas por Garibaldi e Mazzini. Porém, eles não conseguiram levar este processo às suas consequências lógicas; a criação de uma república, e a burguesia liberal, uma vez com o poder em suas mãos, realizou a sua ambição de unir a Itália na forma de uma monarquia constitucional burguesa. No entanto, só o facto de o país estar unido representava um importante passo em frente na história do povo italiano.
Os povos escravizados da península dos Balcãs também travaram uma luta firme contra os seus opressores estrangeiros. Durante muitas décadas os Romenos, os Búlgaros, os Sérvios, os Albaneses e os Montenegrinos tinham sofrido com a cruel opressão turca. Em várias ocasiões tinham pegado em armas contra os seus opressores. Nos anos cinquenta e sessenta, o movimento de libertação contra os Turcos entrou numa nova e mais eficiente fase.
Em 1850, os camponeses búlgaros da região de Vidin ergueram-se contra os seus senhores turcos. A revolta foi esmagada, mas a luta de libertação do povo búlgaro continuou sob outras formas. Um papel muito importante na preparação da insurreição armada contra os Turcos foi desempenhado pelo notável revolucionário búlgaro Georgi Rakovky (1821-1867). Mais tarde, o seu lugar seria ocupado por Vasil Levsky (1837-1873) e Lyuben Karavelov (1837-1879), líderes democráticos do povo, que eram ambos republicanos ardentes, apesar de várias divergências de opinião. O Comité Central Revolucionário Búlgaro seria formado com Levsky e Karavelov em 1870, e este corpo ia tornar-se o centro de organização da luta do povo búlgaro contra a dominação turca.
Logo, em 1830, a Sérvia tinha conseguido a posição de principado com governo próprio, obrigada no entanto a reconhecer o sultão da Turquia como seu senhor supremo. Contudo, nos anos sessenta fez importantes progressos no caminho da independência completa. Em 1867, as guarnições turcas estacionadas em Belgrado e outras fortalezas sérvias foram retiradas do principado sérvio.
Em 1859, os habitantes romenos de dois principados que tinham sido artificialmente separados um do outro, a Moldávia e a Valáquia, uniram-se num só Estado, a Roménia, como seria chamado a partir de 1861. O coronel Alexandre Cuza foi eleito príncipe da Roménia, mas em 1866 foi derrubado por nobres e oficiais reaccionários, e um príncipe alemão Hohenzollern foi posto em seu lugar. No entanto, a unificação do estado romeno em si foi progressista. Embora oficialmente a Roménia ainda reconhecesse o sultão como autoridade suprema na prática, a partir de 1859, a Roménia é um estado independente.
Entretanto, nem todos os movimentos de libertação deste período tiveram êxito. Em 1866 rebentou uma revolta na ilha de Creta, onde o povo fora levado ao desespero pela impiedosa opressão turca, e ergueu-se unido para se libertar do jugo estrangeiro. Muitos arautos da liberdade partiram da Europa para entrarem na luta pela justa causa dos Cretenses. Entre eles estava o revolucionário francês amigo de Blanqui, Gustave Flourens (1838-1871). Contudo, nenhuma das grandes potências veio ajudar a pequena Creta e, em 1869, a revolta foi cruelmente esmagada.
Desde a partilha da Polónia pela Rússia, Prússia e Áustria no final do século XVIII que a luta do povo pela libertação tinha começado. Os Polacos lutavam para libertar o seu país do domínio estrangeiro e reunificação. Esta tarefa era tanto mais difícil quanto é certo que os opressores da Polónia eram três poderosas potências europeias, a Rússia czarista, o reino da Prússia (mais tarde Alemanha) e o império austríaco. Para conseguir vencer adversários tão fortes era vital que todo o povo polaco estivesse unido. O principal problema do movimento polaco de libertação era o facto de os seus líderes pertencerem à nobreza, que temia o campesinato e não confiava nem procurava conhecer as suas justas reivindicações. Alguns dos líderes punham as suas principais esperanças no auxílio das potências ocidentais, convencidos de que elas, e não o povo polaco, seriam o factor decisivo na restauração da soberania do país.
Esta fraqueza inerente ao movimento de libertação polaco determinou o resultado negativo da insurreição de 1863, apesar da enorme bravura e do heroísmo que revelou. Os líderes da revolta continuaram a temer os camponeses e seguiram uma política muito indecisa em relação a eles, não conseguindo por isso uni-los para a revolta. Entretanto, a Rússia czarista e a Prússia trataram de chegar a acordo sobre a linha de acção a seguir, enquanto as potências ocidentais guiadas pelos seus próprios interesses não prestaram atenção à ajuda a dar aos Polacos. Os trabalhadores ingleses e franceses e os círculos progressistas da Rússia apoiaram imediatamente o povo polaco, mas só lhes puderam dar um apoio moral. A situação era tal que na Primavera de 1864 a insurreição tinha sido cruelmente dizimada.
A unificação da Alemanha estava também por conseguir. A reacção política que se estabelecera depois de a Revolução de 1848 ter sido esmagada não pôde deter o rápido avanço económico dos estados alemães. Na Renânia, na Saxónia, na Silésia e em Berlim, uma poderosa e bem equipada indústria desenvolveu-se e levou a um rápido crescimento do proletariado. Este rápido desenvolvimento capitalista fez sobressair a falta de correspondência política e económica como um anacronismo ainda maior herdado da Idade Média.
Como tinha acontecido na Itália, também na Alemanha a unificação podia ser conseguida por um de dois métodos, um que começasse «de cima» e o outro «de baixo». Este último foi seguido pelos operários alemães progressistas chefiados por August Bebel (1840-1913), talentoso torneiro autodidacta, que se havia de tornar num organizador do movimento operário alemão, e pelo jornalista Wilhelm Liebknecht (1826- 1900), discípulo afecto a Karl Marx, com quem estivera relacionado no seu exílio em Londres. Bebel e Liebknecht chefiaram primeiro sindicatos de operários e mais tarde depois de terem conhecido Marx e Engels fundaram um Partido Alemão Social-Democrata em 1869. Conscientes da necessidade vital de unificar a Alemanha consideraram que esse objectivo só se podia alcançar pela acção revolucionária do povo com o objectivo único de estabelecer uma república democrática alemã. No entanto, Bebel e Liebknecht não tiveram o apoio de todos os operários alemães, muitos dos quais se juntaram à Associação Geral de Operários Alemães (Allgemeiner Deutscher Arbeiterverein) fundada em 1863 por Ferdinand Lassalle (1825-1864). Este talentoso orador e comentador político, que sabia lidar com o público, não era um verdadeiro revolucionário proletário quer nas suas opiniões teóricas quer na sua actividade política. Em relação à questão da unidade alemã, Lassalle era a favor da criação de uma Alemanha unida à sombra da monarquia prussiana, e teve mesmo conversas secretas com Bismarck acerca do assunto, Os seus sucessores na Associação Geral dos Operários Alemães continuaram esta política incorrecta e oportunista. Esta cisão no movimento operário reduziu a sua influência no curso dos acontecimentos que levaram à unificação.
A unificação da Alemanha acabaria porém por ser conseguida por outros métodos. A partir de 1862, o governo prussiano era chefiado por Otto von Bismarck (1815-1898). Este Junker da Pomerânia, era ao mesmo tempo um reaccionário, um impiedoso homem de acção e um político astuto e subtil. Bismarck tinha clara consciência da necessidade de unificar a Alemanha, mas não se poupou a esforços para garantir que esta unificação fosse feita por métodos estritamente prussianos.
«Esta política, disse, não terá êxito através de discursos, concursos de tiro e canções; só pode ser posta em prática pelo sangue e pelo ferro.»
Na verdade, a unificação da Alemanha foi conseguida pelo «sangue e pelo ferro». Em 1864, em aliança com a Áustria, a Prússia foi para a guerra com a Dinamarca, conseguindo assim a posse da província de Schleswig, ficando a Áustria com o Holstein. Dois anos mais tarde, em 1866, a Prússia declarou guerra ao seu aliado de poucos anos antes. A três de Junho de 1866 o exército austríaco foi derrotado na batalha de Sadowa, e fez-se a paz apenas sete semanas depois de a guerra ter começado. Depois desta derrota, a Áustria já não estava em posição de impedir a Prússia de conseguir a unificação da Alemanha sob a sua própria hegemonia.
Nota: Convencido nesta altura de que não tinha poder para reclamar o principal papel entre os Estados alemães, em 1867, o governo austríaco estabeleceu uma monarquia dupla — a Áustria - Hungria.
A Áustria também entregou à Prússia alguns Estados alemães que tinham lutado ao seu lado na guerra, como o Holstein e Hannover. Em 1867, Bismarck conseguiu estabelecer a Confederação da Alemanha do Norte, que era constituída por vinte e dois Estados e na qual a Prússia ia desempenhar o principal papel. Foi outro marco importante no caminho para a unificação alemã.
No entanto, havia outro obstáculo sério no caminho da unificação alemã sob a chefia da Prússia: a França de Luís Napoleão.
No Segundo Império em França, estava realizada já a revolução industrial. Seguiu-se um período de rápido desenvolvimento económico e a introdução de maquinaria moderna triplicou a produção industrial da França. Contudo, embora as grandes fábricas modernas crescessem rapidamente, a produção manual em pequena escala ainda continuava a desempenhar um papel significativo na manufactura de artigos de luxo e na alta costura. Este importante avanço económico estava longe de trazer prosperidade a todos: muitos pequenos empresários ficaram arruinados, incapazes como eram de competir com as grandes empresas industriais. Um grande aumento do custo de vida veio a tornar as coisas muito difíceis para os operários.
Entretanto, a classe operária era submetida a uma exploração ainda maior do que antes. Todas as vantagens obtidas com o novo progresso económico foram para os donos das fábricas, empresários e financeiros. Estes últimos, particularmente, enchiam os bolsos rapidamente através de toda a espécie de especulação, e a intriga financeira cresceu como nunca durante os anos do Segundo Império. A grande burguesia e toda a espécie de especuladores auferiram lucros fabulosos das várias guerras travadas pelo imperador.
«O império significa a paz», declarou Napoleão III pouco depois de subir ao Poder. Na prática, porém, ia-se provar o contrário. Houve guerra após guerra e não só porque as guerras traziam grandes riquezas aos financeiros e industriais mas porque também serviam os interesses dinásticos do imperador. O aventureiro, agora no governo da nação, depois de tomar o poder pela força e de utilizar o nome do seu famoso tio, compreendeu que, para reforçar a sua autoridade, precisava de êxitos militares. Pouco depois do início do Segundo Império, em 1853, Napoleão III levou a França a uma guerra contra a Rússia. Esta guerra durou três anos, custou muito dinheiro à França e também muitas vidas, sem lhe trazer vantagens apreciáveis. Os resultados da guerra de 1859 com a Áustria foram igualmente insignificantes porque embora a França tivesse ficado com a Sabóia e Nice, também ficou com um novo inimigo: os Italianos.
Durante os anos cinquenta e sessenta, a França continuou a travar incessantes guerras coloniais. Este período assistiu a uma crescente penetração francesa na Argélia e a anexação de uma grande parte do Sara. Em 1857-1858 e 1860, a França empreendeu uma guerra de pilhagem contra a China, depois do que começou uma guerra de anexação contra o Vietname que ia durar toda uma década. O Camboja e a Cochinchina foram ainda presas dos colonialistas franceses. Em 1862 começou uma ambiciosa aventura colonial no México. No entanto, esta «grande empresa imperial» ia acabar num fiasco, e, em 1867, a força expedicionária francesa foi obrigada a deixar o México depois de denunciadas humilhantemente as suas intenções.
O falhanço da expedição ao México foi uma das maiores derrotas do Segundo Império, mas outras se lhe haviam de seguir. A oportunidade política externa seguida pelo Segundo Império levou a uma deterioração das relações da França com algumas grandes potências como a Rússia, a Itália e a Inglaterra. Napoleão havia de sofrer uma derrota final com a sua política em relação à Alemanha. Durante a Guerra Austro-Prussiana, a França conservara-se neutra, esperando assim receber consideráveis compensações. Contudo, a Prússia não tinha esta intenção e não fez qualquer tentativa de ajudar a França no impasse.
Nesta altura já era evidente o falhanço da política externa do Segundo Império, que tinha revelado a sua fraqueza intrínseca e serviu para precipitar a sua queda. A táctica de manobras ou proteger certos grupos seguidos pelo governo de Napoleão III não ia aumentar a base de apoio do regime. As eleições realizadas no fim dos anos sessenta revelaram que a maioria da população, embora cada classe tivesse para isso, razões diferentes, se opunha ao corrupto regime do império bonapartista. O famoso escritor e pensador democrático Victor Hugo (1802-1885) tinha escrito o seu Napoléon, le Petit em 1852, e a partir dessa altura nunca tinha deixado de criticar o Segundo Império. Os sentimentos antibonapartistas de Hugo eram agora partilhados pela grande maioria do povo francês.
Apesar da crescente crise interna, o governo da Napoleão III continuou a lançar-se em novas aventuras, ainda convencido de que só se podia debelar a crise por meio de sucessos militares. O inimigo, nesta altura, era a Prússia, que já tinha astuciosamente vencido a França no campo de batalha da diplomacia. Em 19 de Julho de 1870, o governo do Segundo Império declarou guerra à Prússia.
Em Paris, polícias disfarçados de operários saíram para as ruas para reunir as massas aos gritos de «Para Berlim». Napoleão III fez-se comandante-chefe e partiu para se juntar ao exército. Tanto ele como os seus conselheiros militares esperavam uma rápida vitória. Contudo, desde o princípio que as tropas francesas mostraram que não podiam competir com o inimigo. Esta guerra tornou mais uma vez evidente o poder periclitante do regime bonapartista. A uma derrota seguiu-se outra e, finalmente, apenas seis semanas depois de ter sido declarada a guerra, a 2 de Setembro de 1870, na batalha de Sédan, um exército francês de cem mil homens e chefiado por Napoleão III rendeu-se aos Alemães.
Este desastre militar decidiu o destino do Segundo Império. Em 4 de Setembro de 1870, o povo revoltado em Paris derrubou o odiado governo do Segundo Império agora manchado por outra derrota humilhante, e pela terceira vez foi proclamada uma república.
A guerra continuou e a táctica prussiana assumia agora um carácter nitidamente agressivo. Em 18 de Janeiro de 1871, Guilherme I da Casa dos Hohenzollern foi proclamado imperador da Alemanha em Versalhes ocupada pelos soldados alemães. Os Estados do Sul, incluindo a Baviera e a Saxónia, foram incorporados no novo Império. Nos termos da Paz de Francfort, concluída com a França em 10 de Maio de 1871, o império alemão também ia incluir as recentemente conquistadas províncias da Alsácia e da Lorena. Assim, finalmente, a unidade alemã acabou por conseguir-se a «sangue e ferro», depois de uma guerra de conquista formou-se um império militarista, chefiado por elementos reaccionários da casa prussiana de Hohenzollern.
O rápido avanço da indústria capitalista estava inevitavelmente ligado ao rápido crescimento da classe operária. A consciência de classe do proletariado, a sua organização e actividades também se desenvolveram rapidamente. Nesta altura, a classe operária tinha já uma considerável experiência de luta de classes.
As lições das revoluções e contra-revolução de 1848-1849 também tinham constituído valiosa experiência. Os trabalhadores começaram a fundar a suas organizações, apareceram sindicatos em Inglaterra, em França, nos Estados Unidos e na Alemanha. As greves tornaram-se cada vez mais frequentes e os êxitos conseguidos por este meio serviram como estímulo para o movimento como um todo. Fundaram-se grupos e círculos socialistas, e os trabalhadores já não discutiam os seus problemas visto do estreito ângulo da fábrica em que trabalhavam, da sua cidade ou do seu país. A solidariedade proletária internacional ganhava rapidamente terreno, particularmente no início dos anos sessenta. Os operários franceses e ingleses manifestaram o seu apoio aos revoltosos polacos em 1863. Durante a guerra civil nos Estados Unidos quando o governo britânico procurava maneira de ajudar o Sul, esclavagista, as organizações operárias inglesas opuseram-se-lhe fortemente.
Nos anos sessenta, depois de ter adquirido uma experiência considerável e atingido um nível mais alto de consciência de classe o movimento operário estava pronto para unir as suas forças numa base internacional. A primeira organização proletária internacional, a Liga Comunista, tinha deixado de existir desde o início dos anos cinquenta e estava mal equipada para se tornar uma organização de massas. Tinha chegado a altura de unir as massas trabalhadoras numa nova organização internacional.
Em 28 de Setembro de 1864 foi fundada a Associação Internacional Operária numa reunião em Londres entre operários da Inglaterra, França, Alemanha, Itália e vários outros países. O representante dos trabalhadores alemães no Presidium era Karl Marx, o notável líder da luta de libertação do proletariado. Encarregaram-no de elaborar o Discurso de Inauguração e o Regulamento Geral. Ele e Frederich Engels eram os principais líderes políticos do movimento e os seus pensadores mais notáveis. Operários que tinham atingido vários níveis de consciência de classe juntaram-se na Internacional e por esta razão o seu programa — O Discurso de Inauguração — teve de ser elaborado de modo a ser claro e perceptível por todos, permanecendo embora fiel aos princípios básicos do comunismo científico. Marx cumpriu esta tarefa com notável competência. O Discurso de Inauguração descrevia as duras condições de vida em que os operários viviam em regime capitalista e observava que por isso «tomar o poder político tornava-se a tarefa prioritária da classe operária». Notava-se no discurso que a classe operária já era suficientemente numerosa para travar uma luta vitoriosa, mas a organização e a experiência não eram menos importantes do que os números. O Discurso de Inauguração também apelava para que os operários se opusessem às guerras de conquista e agressão.
Naquela altura não existiam ainda partidos políticos. Mas muitos sindicatos, cooperativas, grupos de educação de trabalhadores e outras organizações em vários países da Europa e nos Estados Unidos juntaram-se na Primeira Internacional. Em todos estes países fundaram-se filiais nacionais da Associação Internacional Operária em pouco tempo a Internacional tinha-se tornado uma ampla organização proletária internacional. O seu principal corpo executivo era o Congresso, e durante os intervalos entre Congressos as actividades da Internacional eram presididas por um Conselho Geral que se reunia em Londres. O chefe político do Conselho Geral era Karl Marx, cujos escritos foram a sua inspiração.
Ao mesmo tempo, Marx realizava um importante trabalho teórico. Em 1867 completou e publicou o 1º volume do Capital, no qual tinha estado a trabalhar havia mais de 20 anos. Esta obra continha uma análise profunda dos aspectos económicos e sociais do capitalismo, e uma análise científica da ascensão do capitalismo e da instabilidade da queda final do sistema. Esta grande obra dava à classe operária, conhecimentos fundamentais e era um largo guia para a sua luta.
Ao mesmo tempo que continuava com a sua obra teórica, Marx nunca abandonou a sua tarefa diária de trabalho revolucionário prático nas fileiras do movimento operário. Sob a sua chefia, o Conselho Geral tornou-se o quartel-general das actividades do movimento internacional operário. A internacional deu uma ajuda activa à direcção política e assistência material, ao movimento de greves dos trabalhadores. Naquele período estavam a ser organizadas amplas greves em alguns países, tais como a Inglaterra, a Suíça e a Bélgica. A ajuda e a direcção da Internacional deu a muitas greves operárias a possibilidade de obterem sucessos e de arrancarem significativas concessões ao patronato. Este facto serviu para consolidar e aumentar a autoridade da Internacional entre o proletariado. Os factos convenciam agora os trabalhadores de como lhes era possível, lutando, pôr em prática o slogan da Internacional «Operários de todo o Mundo, Uni-vos».
Nos congressos da Internacional, os membros do Conselho Geral e amigos e partidários de Marx esforçavam-se, citando exemplos da luta do dia-a dia dos trabalhadores, para explicar as inconsistências do socialismo pequeno-burguês de Proudhon e Bakunin, que tinham uma certa voga entre o operariado francês, espanhol, belga e outros. Os proudhonistas e bakuninistas embora «vissem este problema do seu ângulo particular, pensavam que a principal força capaz de transformar o Mundo estava não na classe operária mas nos pequenos proprietários, e esta tese errada era a base para toda a sua política. Nos renhidos debates travados nas reuniões do Congresso, o comunismo científico começou pouco a pouco a ser aceite de preferência a outras teorias. Tanto de um ponto de vista ideológico como de um ponto de vista organizativo, a Primeira Internacional ia tornar-se uma organização de operários, cada vez mais unida e influente. A luta de libertação da classe operária contra os opressores dos trabalhadores tinha nesta altura atingido um nível realmente muito mais elevado.
Inclusão | 04/11/2016 |