Contra as Atividades Capitulacionistas

Mao Tsetung

30 de Junho de 1939


Primeira Edição: ...
Tradução: A presente tradução está conforme à nova edição das Obras Escolhidas de Mao Tsetung, Tomo II (Edições do Povo, Pequim, Agosto de 1952). Nas notas introduziram-se alterações, para atender as necessidades de edição em línguas estrangeiras.
Fonte: Obras Escolhidas de Mao Tsetung, Pequim, 1975, Tomo II, pág: 407-415.
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo

capa

Até aqui, face ao agressor japonês, a primeira grande questão para a nação chinesa era saber se esta devia ou não bater-se. Entre o Incidente de 18 de Setembro e o Incidente de Lucouquiao, desenrolou-se uma polémica muito viva a esse respeito. “Fazer a guerra é sobreviver, não fazer a guerra é perecer”, era a conclusão de todos os partidos e grupos patrióticos, bem como a de todos os patriotas do nosso país. “Fazer a guerra é perecer, não fazer a guerra é sobreviver”, era a conclusão de todos os capitulacionistas. O troar dos canhões da resistência anti-japonesa em Lucouquiao resolveu, por algum tempo, essa polémica, proclamando a justeza da primeira conclusão e o erro da segunda. E por que é que a resolveu apenas por certo tempo e não definitivamente? A explicação está na política do imperialismo japonês, que procura levar a China a capitulação, bem como nas tentativas de compromisso por parte dos estrangeiros que defendem a capitulação(1) e ainda na instabilidade de certos indivíduos que fazem parte da nossa frente de resistência ao Japão. Agora a questão levanta-se de novo, mas em termos um tanto diferentes, e está transformada numa “questão de paz ou guerra” Como resultado, iniciou-se na China uma polémica entre os que são pela guerra e os que são pela paz. As posições de ambos são ainda o mesmo. “Fazer a guerra é sobreviver, concluir a paz é perecer”, é a conclusão dos partidários da Guerra de Resistência. “Concluir a paz é sobreviver, fazer a guerra é perecer”, é a conclusão dos partidários da paz. O campo dos partidários da guerra, que compreende todos os partidos e grupos patrióticos e todos os patriotas do nosso país, representa a grande maioria da nação, enquanto que o campo dos partidários da paz, quer dizer, da capitulação, não abrange mais que uma minoria hesitante no interior da frente anti-japonesa. Essa a razão por que o segundo campo se viu obrigado a recorrer a propaganda mentirosa, anti-comunista em especial. São em torrente contínua as informações, relatórios, documentos e resoluções de caráter enganoso que eles fabricam, pretendendo, nomeadamente, que “o Partido Comunista fomenta desordens”, “o VIII Exército e o Novo IV Exército não fazem mais que deslocar-se sem combater e não obedecem ao comando”, “a região fronteiriça Xensi-Cansu-Ninsia arvorou-se em feudo independente e expande-se”, “o Partido Comunista conspira a queda do governo” e mesmo “a União Soviética maquina uma agressão contra a China”. Com isso eles tentam mascarar a realidade dos fatos e preparar a opinião pública para a realização do seu propósito que é a paz, quer dizer, a capitulação. Se os partidários da paz, isto é, os capitulacionistas, agem assim é porque o Partido Comunista é o promotor e o campeão da Frente Única Nacional Anti-Japonesa, e sem opor-se a este é-lhes impossível sabotar a cooperação entre o Kuomintang e o Partido Comunista, romper a Frente Única Nacional Anti-Japonesa e capitular. Aliás, eles têm uma esperança de que o imperialismo japonês passe a concessões. Pensam que o Japão está esgotado, vai mudar a sua política básica, evacuar de livre iniciativa o Centro, o Sul e mesmo o Norte da China, podendo então esta vencer sem necessidade de travar novos combates. E depositam por fim esperanças na pressão internacional. Muitos deles esperam que as grandes potências façam pressão sobre o Japão, para obrigá-lo a concessões e facilitar assim a conclusão da paz, e também sobre o governo chinês, de modo a poderem dizer aos partidários da guerra: “vejam, no atual clima internacional, não nos resta senão concluir a paz!”, “uma conferência internacional do Pacífico(2) seria vantajosa para a China, não constituiria outro Munique(3) mas sim um passo em direção do renascimento da China!”. Esse o conjunto de opiniões, atitudes e manobras secretas(4) dos partidários da paz, dos capitulacionistas chineses. E a peça não é representada exclusivamente por Uam Tsim-vei; é-o também, e isso é o mais grave, por muitos Tcham Tsim-vei e Li Tsim-vei dissimulados no seio da frente anti-japonesa, que colaboram com Uam Tsim-vei, uns interpretando o Chuanghuam(5) e outros caraterizando-se ora de vermelho ora de branco(6).

Nós, comunistas, declaramos publicamente que sempre estivemos, e estaremos, do lado dos partidários da guerra e opomo-nos resolutamente aos partidários da paz. Aquilo que pretendemos é, juntamente com todos os partidos, grupos patrióticos e a totalidade dos patriotas do país, reforçar a unidade, consolidar a Frente Única Nacional Anti-Japonesa, fortalecer a cooperação entre o Kuomintang e o Partido Comunista, aplicar os Três Princípios do Povo, levar até ao fim a Guerra de Resistência, combater até ao rio Ialu e recuperar todo o território perdido(7), nada mais. Condenamos resolutamente todos os Uam Tsim-vei declarados e escondidos que se empenham na criação dum clima anti-comunista, provocam frições(8) entre o Kuomintang e o Partido Comunista e procuram, inclusivamente, fazer estoirar uma nova guerra civil entre os dois partidos. A tais indivíduos nós declaramos: a vossa conspiração para uma ruptura não é, no fundo, senão uma preparação para a capitulação, e a vossa política de capitulação e ruptura não é mais que uma manifestação do vosso plano geral de traição dos interesses da nação, para satisfação da cupidez dum punhado de indivíduos. O nosso povo tem olhos, saberá desmascarar as vossas conspirações. Rejeitamos categoricamente as afirmações absurdas segundo as quais uma conferência do Pacífico não seria um Munique do Oriente. A chamada conferência do Pacífico é exatamente o Munique do Oriente, que conta transformar a China noutra Checoslováquia. Condenamos firmemente o palavreado que pretende que o imperialismo japonês cairá em si e se disporá a concessões. Os imperialistas japoneses jamais abandonarão a sua política básica de subjugação da China. Os doces discursos japoneses após a queda de Vuhan — por exemplo, a afirmação de que renunciariam a sua política de “não reconhecer o Governo Nacional como interlocutor em negociações”(9) e estariam dispostos, agora, a reconhecê-lo como tal, bem como a afirmação de que, sob certas condições, retirariam as suas tropas do Centro e do Sul da China — fazem exatamente parte da sua pérfida política que visa fazer com que o peixe morda a isca, para depois fritá-lo. Quem quiser morder a isca deve preparar-se para acabar na frigideira. E a mesma perfídia política adotam os capitulacionistas estrangeiros que incitam a China a capitular. Eles encorajam o Japão a prosseguir na agressão a China e ficam a “observar o combate dos tigres, do alto da montanha”, a espera do momento oportuno para organizarem a chamada conferência do Pacífico, onde pensam atuar como mediadores, a cata de algum proveito, a maneira do ladrão que rouba a ladrão. Depositar esperanças nesses conspiradores é cair igualmente em cheio na ratoeira.

A questão de saber se se deve ou não combater está hoje convertida numa questão de guerra ou paz, mas no fundo continua a ser a mesma questão, a primeira e a mais importante de todas, a questão fundamental. Dados os esforços redobrados da política japonesa de incitamento da China a capitulação, dado o redobrar de atividade dos capitulacionistas estrangeiros e sobretudo dadas as hesitações mais acentuadas de certos indivíduos no interior da frente anti-japonesa, nestes últimos seis meses fez-se um grande alarido a volta da questão da paz e da guerra e a possibilidade de capitulação passou a ser, na conjuntura política presente, o perigo principal. A luta contra o comunismo, que significa o rompimento da cooperação entre o Kuomintang e o Partido Comunista e a ruptura da unidade na resistência, constitui o primeiro passo dos capitulacionistas em preparação da capitulação. Nessas circunstâncias, incumbe a todos os partidos e grupos patrióticos, bem como a todos os patriotas do país, o dever de seguir com olhos vigilantes a atividade dos capitulacionistas, compreender a particularidade essencial da situação atual, isto é, que a capitulação constitui o perigo principal e a luta contra o comunismo não é mais que a respetiva preparação, e opor-se com todas as forças a capitulação e a ruptura. É absolutamente inadmissível que um grupo de indivíduos faça oscilar e atraiçoe a guerra contra o imperialismo japonês, essa guerra em que a Nação está vertendo o seu próprio sangue já lá vão dois anos. É de todo inadmissível que um grupo de indivíduos sabote e rompa a Frente Única Nacional Anti-japonesa criada pelos esforços da totalidade da nação.

Se prosseguirmos na guerra e mantivermos a unidade, a China sobreviverá.

Se aceitarmos a paz e tolerarmos a ruptura, a China perecerá.

O que há pois que admitir, o que há pois que rejeitar? Os compatriotas têm de apressar-se na escolha.

Nós, os comunistas, estamos decididos a continuar a guerra e a manter a unidade.

Todos os partidos e grupos patrióticos, todos os patriotas do país estão igualmente decididos a continuar a guerra e a manter a unidade.

Mesmo que os capitulacionistas que conspiram para a rendição e a ruptura consigam passar temporariamente para a mó de cima, eles não conseguirão mais do que acabar desmascarados e punidos pelo povo. A tarefa histórica que incumbe a nação chinesa é unir-se na resistência pela libertação. Os capitulacionistas desejam seguir o caminho oposto; sejam quais forem, porém, os seus êxitos, seja qual for o seu júbilo ao pensarem que a ninguém precisam de recear, jamais poderão furtar-se ao castigo do povo.

Opor-se a capitulação e a ruptura, eis a tarefa urgente que se impõe atualmente a todos os partidos e grupos patrióticos e a todos os patriotas do país.

Que o povo inteiro se una! Que persevere na resistência, mantenha a unidade e desfaça todas as conspirações tendentes a capitulação e a ruptura!


Notas de rodapé:

(1) Imperialistas ingleses e norte-americanos que conspiravam um entendimento com o Japão, sacrificando a China. (retornar ao texto)

(2) De conivência com os chineses partidários da paz, os imperialistas ingleses, norte-americanos e franceses tentavam, com a venda da China, chegar ao compromisso com os agressores japoneses, numa “conferência internacional do Pacífico”. A opinião pública passou a designar essa conspiração por Munique do Extremo Oriente. Ao condenar, no texto, o argumento absurdo segundo o qual tal conferência não constituiria um Munique do Oriente, o camarada Mao Tsetung aludia a certas atitudes tomadas na época por Tchiang Kai-chek. (retornar ao texto)

(3) Em Setembro de 1938, os chefes dos governos da Inglaterra, França, Alemanha e Itália, realizaram uma conferência em Munique (Alemanha) de que resultou o Acordo de Munique, por força do qual a Inglaterra e a França entregavam a Checoslováquia a Alemanha, devendo esta, em contrapartida atacar a União Soviética. Em 1938-1939, os imperialistas ingleses e norte-americanos tentaram por várias vezes chegar a um compromisso com o imperialismo japonês, sacrificando a China. Em Junho de 1939, na altura em que o camarada Mao Tsetung redigia o presente artigo, prosseguiam conversações entre a Inglaterra e o Japão, no sentido de retomar-se essa conspiração. Como tudo isso lembrava as maquinações urdidas em Munique pela Inglaterra, França, Alemanha e Itália, passou a falar-se em “Munique do Oriente”. (retornar ao texto)

(4) Ao dizer “esse o conjunto de opiniões, atitudes e manobras secretas dos partidários da paz, dos capitulacionistas chineses”, o camarada Mao Tsetung pensava nas opiniões, atitudes e manobras secretas de Tchiang Kai-chek. Na época, Uam Tsim-vei era o chefe principal dos partidários declarados da capitulação e Tchiang Kai-chek, o chefe principal dos partidários camuflados da capitulação no seio da frente anti-japonesa, quer dizer, um “Uam Tsim-vei escondido” ou os “Tcham Tsim-vei e Li Tsim-vei”, referidos também pelo camarada Mao Tsetung. (retornar ao texto)

(5) Para o camarada Mao Tsetung, as relações entre as atividades de Tchiang Kai-chek e Uam Tsim-vei lembravam o chuanghuam (duo em que um dos intérpretes fala ou canta coberto pelas costas do outro, que se limita a gesticular, de acordo com o que vai afirmando o primeiro — N.T.). (retornar ao texto)

(6) Nessa altura, os partidários da paz, chefiados por Tchiang Kai-chek no seio do Kuomintang, faziam um jogo duplo: por um lado fingiam desejar uma resistência ao Japão e, por outro, recorriam a todas as formas de atividade capitulacionista, a semelhança dos atores da ópera clássica chinesa, que ora se pintam de vermelho ora de branco. (retornar ao texto)

(7) Em Janeiro de 1939, na Quinta Sessão Plenária do Comité Executivo Central eleito pelo V Congresso Nacional do Kuomintang, Tchiang Kai-chek declarou abertamente que o que entendia por “até ao fim”, na palavra de ordem “levar até ao fim a Guerra de Resistência”, era “restabelecer o statu quo anterior ao Incidente de Lucouquiao”. Ao contrário da política capitulacionista de Tchiang Kai-chek, o camarada Mao Tsetung sublinhou especialmente que essa palavra de ordem significava “combater até ao rio Ialu e recuperar todo o território perdido”. (retornar ao texto)

(8) Expressão frequentemente usada na altura, para designar as várias ações contra-revolucionárias, dos reacionários kuomintanistas, em sabotagem a Frente Única Nacional Anti-Japonesa e combate ao Partido Comunista e demais forças progressistas. (retornar ao texto)

(9) A 13 de Dezembro de 1937, o exército japonês ocupou Nanquim. A 16 de Janeiro de 1938, o governo japonês publicou uma declaração em que anunciava a decisão de “não mais reconhecer o Governo Nacional como interlocutor em negociações e esperar pela formação dum novo governo”. Quando, em Outubro desse mesmo ano, o exército nipónico ocupou Cantão e Vuhan, o governo japonês aproveitou-se das hesitações de Tchiang Kai-chek na questão da resistência para adotar uma nova política tendente a incitar Tchiang Kai-chek à capitulação. Com esse objetivo, publicou então outra declaração, a 3 de Novembro, onde dizia: “no que respeita ao Governo Nacional, desde que renuncie a política errada que tem prosseguido até aqui e se empenhe, com o concurso de homens novos, a renovar o país e a manter a ordem, o Império não se recusará negociar com ele”. (retornar ao texto)

Inclusão 20/01/2013