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Enquanto o novo ministério do império, como informamos ontem, foi confirmado também por outras fontes, e talvez já hoje ao meio dia recebamos a notícia de sua configuração definitiva, a crise ministerial continua em Berlim. Essa crise só pode ser solucionada por dois caminhos:
Ou um ministério Waldeck, reconhecimento da autoridade da Assembléia Nacional alemã, reconhecimento da soberania do povo;
Ou um ministério Radowitz-Vincke, dissolução da Assembléia de Berlim, negação das conquistas revolucionárias, constitucionalismo de fachada ou mesmo — a Dieta Unificada.(1)
Não o ocultemos de nós mesmos: o conflito que irrompeu em Berlim não é um conflito entre os ententistas e os ministros, é um conflito entre a Assembléia, que pela primeira vez se apresenta como constituinte, e a Coroa.
Terão coragem de dissolver a Assembléia, ou não? Tudo depende disso.
Mas a Coroa tem o direito de dissolver a Assembléia? É certo que, nos estados constitucionais, a Coroa, em caso de conflito e sobre a base da Constituição, tem o direito de dissolver a câmara legislativa convocada e apelar ao povo por meio de novas eleições.
A Assembléia de Berlim é uma câmara constitucional, legislativa?
Não. Ela foi convocada para "entender-se com a Coroa sobre a constituição prussiana", sobre a base não de uma constituição, mas de uma revolução. Não recebeu de modo algum seu mandato da Coroa ou de seus ministros responsáveis, mas sim somente de seus eleitores e de si mesma. A Assembléia era soberana como a legítima expressão da revolução, e o mandato que o sr. Camphausen, junto com a Dieta Unificada, lhe expediu na lei eleitoral de 8 de abril,(2) não passava de um voto piedoso, sobre o qual a Assembléia tinha de deliberar.
No início, a Assembléia acolheu em maior ou menor medida a teoria ententista.(3) Ela viu como, desse modo, foi lograda pelos ministros e pela camarilha. Finalmente, realizou um ato de soberania — por um momento, apresentou-se como Assembléia Constituinte, não mais como Ententista.
Como Assembléia soberana da Prússia, tinha pleno direito para isso.
Mas uma assembléia soberana não é dissolúvel por ninguém, não está submetida às ordens de ninguém.
E mesmo como mera Assembléia Ententista, mesmo de acordo com a própria teoria do sr. Camphausen, ela se encontra em posição de igualdade com a Coroa. Ambas as partes celebraram um acordo nacional, ambas as partes têm a mesma cota de soberania, esta é a teoria de 8 de abril, a teoria Camphausen—Hansemann, portanto a teoria oficial reconhecida pela própria Coroa.
Se a Assembléia está em posição de igualdade ante a Coroa, a Coroa não tem nenhum direito de dissolver a Assembléia.
Caso contrário, conseqüentemente, a Assembléia teria do mesmo modo o direito de depor o rei.
A dissolução da Assembléia seria, pois, um golpe de estado. E o 29 de julho de 1830 e o 24 de fevereiro de 1848 mostraram como se responde a um golpe de estado.
Dir-se-á que a Coroa poderia, sim, apelar novamente aos mesmos eleitores. Mas quem não sabe que hoje os eleitores elegeriam uma Assembléia totalmente diferente, uma Assembléia que faria muito menos cerimônias com a Coroa?
É evidente: se após a dissolução desta Assembléia só é possível o apelo a eleitores muito diferentes dos de 8 de abril, então não é mais possível nenhuma outra eleição, a não ser a que será proposta sob a tirania do sabre.
Portanto, não tenhamos ilusões:
Se a Assembléia vencer, se impuser o ministério da esquerda, então o poder da Coroa ao lado da Assembléia será quebrado, o rei voltará a ser apenas o servidor pago do povo, e estaremos novamente na manhã de 19 de março — caso o ministério Waldeck não nos traia, como tantos antes dele.
Se a Coroa vencer, se impuser o ministério do príncipe da Prússia, então a Assembléia será dissolvida, o direito de associação suprimido, a imprensa amordaçada, uma lei eleitoral censitária decretada, talvez até mesmo, como dissemos, a Dieta Unificada evocada mais uma vez — tudo sob a proteção da ditadura militar, dos canhões e das baionetas.
A vitória de uma das partes dependerá da atitude do povo, especialmente da atitude do partido democrático. Os democratas têm de optar.
Estamos em 25 de julho. Ousar-se-á decretar as ordenanças que são preparadas em Potsdam? O povo será provocado a dar o salto de 26 de julho a 24 de fevereiro em um dia?(4)
Boa vontade com certeza não falta, mas a coragem, a coragem!
Leia o terceiro artigo da série
Notas de rodapé:
(1) A primeira Dieta Unificada se reuniu, graças a uma patente real, de 11 de abril de 1847 a 26 de junho de 1847. Representava a união de todas as oito Dietas Provinciais existentes, era convocada a critério do rei e se dividia em duas câmaras. A câmara do estamento senhorial consistia em 70 representantes da alta nobreza, a câmara dos três estamentos restantes abrangia 237 representantes da cavalaria, 182 das cidades e 124 dos municípios rurais. As atribuições da Dieta Unificada limitavam-se à autorização de novos empréstimos em tempos de paz e à votação de novos impostos ou aumento de impostos. Com sua instituição, o monarca prussiano queria evitar o cumprimento das promessas constitucionais que fizera e as determinações da lei sobre as dívidas estatais. Na Dieta manifestou-se uma forte oposição liberal, vinda dos representantes da grande burguesia renana (Hansemann, Camphausen, Von Beckerath) e de uma parte da nobreza da Prússia oriental (Von Vincke, Von Auerswald). Como a Dieta se declarou incompetente para autorizar um empréstimo, o rei mandou-a de volta para casa. (retornar ao texto)
(2) A "Lei eleitoral para a Assembléia convocada para entender-se sobre a constituição prussiana" foi, por proposta do ministério Camphausen, aprovada em 8 de abril de 1848 pela segunda Dieta Unificada e baseava-se no sistema eleitoral indireto em duas etapas. (retornar ao texto)
(3) A "teoria ententista", com a qual a burguesia prussiana, na pessoa de Camphausen e Hansemann, procurou justificar sua traição à revolução, consistia em que a Assembléia Nacional prussiana, permanecendo "no terreno do direito", devia se limitar à fundação de uma ordem constitucional por meio da conciliação com a Coroa. (retornar ao texto)
(4) Em 26 de julho de 1830 foram publicados os decretos (ordenanças) reais que, na França, suprimiam a liberdade de imprensa, declaravam dissolvida a Câmara e alteravam a lei eleitoral de modo que reduzia os eleitores em três quartos. Essas medidas extraordinárias do governo de Carlos X foram o motivo da revolução burguesa de 1830 na França, a qual, em 29 de julho, suprimiu o domínio dos Bourbon. (retornar ao texto)
Inclusão | 12/09/2014 |