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Há alguns dias ocorreu o encontro anual da Câmara de Comércio de Manchester. Ela representa Lancashire, o maior distrito industrial do Reino Unido e posto principal da manufatura algodoeira britânica. O presidente do encontro, o senhor E. Potter, e seus principais oradores, os senhores Bazley e Turner, representam Manchester e uma parcela de Lancashire na Câmara Baixa. Com base nas negociações do encontro, chegou a nosso conhecimento, portanto, qual é a postura oficial do grande núcleo da indústria algodoeira inglesa em relação à crise americana, direto dos bastidores do “Senado da nação”.
Na reunião da Câmara de Comércio do ano passado, Ashworth, um dos maiores barões do algodão na Inglaterra, celebrou a expansão inédita da indústria do algodão do último decênio. Ele ressaltou, a saber, que mesmo as crises comerciais de 1847 e 1857 não desencadearam uma queda na exportação algodoeira e de têxteis ingleses. Ele explicou esse fenômeno atribuindo-o ao poder milagroso do sistema de livre comércio introduzido em 1846. Ainda assim, soou curioso o fato de que o mesmo sistema, apesar de incapaz de salvar a Inglaterra das crises de 1847 e 1857, pudesse isolar uma indústria inglesa específica, a indústria do algodão, do impacto da crise.
Mas o que se ouve hoje? Todos os palestrantes, incluindo Ashworth, admitem que uma transformação inaudita dos mercados asiáticos vem se realizando desde 1858, e que, como resultado de uma superprodução maciça e contínua, a atual estagnação deveria ter ocorrido — mesmo sem a Guerra Civil Americana, sem as tarifas de Morrill e os embargos. Se, sem essas circunstâncias agravantes, o déficit de exportações do ano passado teria atingido £ 6 milhões, é obviamente discutível. Contudo, a possibilidade não parece improvável quando ouvimos que os principais mercados da Ásia e da Austrália estão sendo abastecidos com algodão inglês há 12 meses.
A crise anterior no setor algodoeiro inglês é, segundo a admissão da Câmara de Comércio de Manchester a respeito deste quesito, resultado não do bloqueio americano, mas da superprodução inglesa. Quais seriam, contudo, as consequências de uma continuação da Guerra Civil Americana? Novamente, obtemos uma resposta unânime para tal pergunta: o sofrimento desmesurado da classe trabalhadora e a ruína dos pequenos fabricantes.
“Em Londres”, observou Cheetham, “dizem que ainda temos algodão o bastante para continuar produzindo. Mas não é só o algodão que está em jogo. Acima de tudo, é o seu preço. A preços atuais eventualmente consumirão o capital dos fabricantes”.
No entanto, a Câmara de Comércio afirma estar decididamente contra qualquer sorte de intervenção nos Estados Unidos, embora a maioria de seus membros seja suficientemente controlada pelo Times para considerar a dissolução da União algo inevitável.
“A última coisa”, diz Potter, “que poderíamos recomendar seria a intervenção. O último lugar de onde essa proposta viria é Manchester. Nada nos fará recomendar algo moralmente reprovável como isso”.
O senhor Bazley:
“O conflito americano deve aderir ao princípio mais severo de não-intervenção. O povo desse grande país deve acertar seus próprios assuntos sem tamanha perturbação.”
O senhor Cheetham:
“A opinião predominante neste distrito resiste da forma mais resoluta a qualquer intervenção no conflito americano. É necessário declará-lo com clareza, pois, em caso de dúvida, uma pressão extraordinária seria exercida sobre o governo pela oposição”.
O que, então, a Câmara de Comércio recomendou? Que o governo inglês removesse todos os obstáculos da parte da administração que ainda impediam a cultura do algodão na Índia. Ou seja, ele deveria cancelar o imposto de importação em 10% que incide sobre os fios e tecidos de algodão ingleses na Índia. Mal o regime da Companhia das Índias Orientais for eliminado, a Índia Oriental foi incorporada ao Império Britânico e Palmerston, através do Sr. Wilson, introduziu o imposto de importação nas marcas inglesas ali, ao mesmo tempo em que vendia Savoy e Nice no acordo comercial anglo-francês.(1) Enquanto o mercado francês estiver aberto para a indústria inglesa, o mercado das Índias Orientais lhe permanecerá, em grande parte, fechado.
O Sr. Bazley notou, nesse tocante, que grandes quantidades de máquinas inglesas haviam sido exportadas para Bombaim e Calcutá desde a introdução desse imposto, e que fábricas ao estilo inglês haviam sido ali construídas. Elas estavam preparadas para surrupiar o melhor algodão indiano para si. Se você adicionar 15% de frete aos 10% de imposto de importação, os rivais artificialmente evocados pela iniciativa do governo inglês terão uma tarifa de proteção [alfandegária] de 25%.
De certa maneira, fala-se de um amargo descontentamento na reunião dos grandes dignitários da indústria inglesa, a saber, a respeito da tendência protecionista que está se tornando cada vez mais comum nas colônias, especialmente na Austrália. Os cavalheiros esquecem que as colônias protestaram por um século e meio em vão contra o “sistema colonial” da metrópole. Já naquela época as colônias exigiam livre comércio. A Inglaterra insistiu na proibição. Agora, a Inglaterra está pregando o livre comércio e as colônias acham a proteção contra a própria Inglaterra mais adequada aos seus interesses.
Notas:
(1) A Companhia Holandesa das Índias Orientais, outrora um dos empreendimentos imperialistas mais rentáveis da Europa, foi à falência em 1798. Boa parte de seu território (a atual Malásia, Filipinas, Papua Nova Guiné e a parcela das ilhas Molucas, na Indonésia) foi tomada pela Grã-Bretanha logo após as Guerras Napoleônicas, facilitando o domínio sobre as importantes rotas comerciais que ligam a Índia ao Sudeste Asiático. Nice e Savoy, territórios atualmente pertencentes à França, foram anexados pelo Império Britânico em 1860, mas devolvidos como parte dos trâmites no acordo comercial anglo-francês ao qual o autor se refere. (retornar ao texto)
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