MIA> Biblioteca> Francisco Martins Rodrigues > Novidades
Primeira Edição: Em Marcha, 7 Agosto 1980
Fonte: Francisco Martins Rodrigues — Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
“O capital privado não deve querer recuperar aquele sector que lhe fugiu com a revolução democrática”. Esta advertência cortês, que pode ser lida numa entrevista do dr. Álvaro Cunhal ao “Jornal”, na outra semana, rasgou-me novas perspectivas sobre os rumos da política nacional.
Efectivamente, ainda ninguém, que eu saiba, se lembrara deste método tão simples e tão revolucionário (salvo seja!): explicar à burguesia o que deve ou não deve fazer. Quantos contratempos teriam sido evitados se tivéssemos compreendido há mais tempo as vantagens deste método! Em vez de lutas e ataques que só servem para agravar a desestabilização e fazer o jogo à reacção, teríamos imposto um clima de civismo e sã convivência entre os portugueses.
Se adoptarmos essa perspectiva, como espero, um vento de mudança varrerá o nosso “Em Marcha” e o leitor poderá ler com agrado títulos deste género: “Sá Carneiro não deve continuar a negar a burla ao Banco Espírito Santo”. “O prof. Freitas não deveria ter gasto 240 contos para ir a Bruxelas em taxi aereo”. “Espancamento indevido de trabalhadores de Vendas Novas, por uma força da GNR”, “Não é próprio que Israel continue a matar palestinianos”, “Deve o general Soares Carneiro continuar a insinuar ameaças de golpe?”
Francamente, dr. Cunhal! Desde quando pensa a burguesia no que deve ou não deve fazer? Você já tinha tempo de saber que o capital só conhece um preceito moral: a taxa de lucro máxima; só conhece um freio: a luta dos trabalhadores; só receia um inferno: a revolução proletária. Que diabo fez você a tantas leituras de Marx?
Você devia saber que pregar moral à burguesia é tão inepto como ensinar os evangelhos a um tigre. Você devia sentir o escabroso que é sugerir à burguesia boas perspectivas de lucro “honesto”, como quando diz na mesma entrevista, a propósito do comércio com Angola e Moçambique que “os capitalistas portugueses estão a perder grandes e únicas oportunidades para os seus negócios”. Essa, não, doutor! Consultor de negócios não liga com comunismo!
Aqui para nós, você quer que eu lhe diga o que está mal consigo? É que você nunca saltou para o outro lado. Nunca foi capaz de sair do universo burguês onde formou o seu pensamento, nunca se atreveu a lutar para deitar abaixo os alicerces desta sociedade, que são os verdadeiros ninhos donde saem as ratazanas venenosas: a exploração, o imperialismo, a guerra, o fascismo, a GNR. os Carneiros.
Por isso você continua, no meio das trevas desta agonia capitalista, a drogar os operários com o seu marxismo de cuspo. E para os convencer a não assaltarem as estruturas do edifício podre, apresenta-lhes de vez em quando uma ratazana morta, como um grande troféu de vitória.
Observação: Tiro ao Alvo - Coluna de FMR no jornal Em Marcha e no jornal Política Operária.
Inclusão | 06/02/2018 |