Clonagem

Francisco Martins Rodrigues

Novembro/Dezembro de 1993


Primeira Edição: Política Operária nº 42, Nov-Dez 1993

Fonte: Francisco Martins Rodrigues Escritos de uma vida

Transcrição: Ana Barradas

HTML: Fernando Araújo.

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Pouco a pouco, vai metendo água por todos os rombos a nau embandeirada da “democracia de sucesso” — a equipa do professor tinha-se esquecido de explicar que ia ser preciso mandar metade do país para casa.

Face a um tal fiasco, há quem julgue iminente uma reviravolta e divise já a aurora duma nova era pós-cavaquista, sem negocismo, sem tubarões, sem máfias financeiras. Os que assim pensam não se dão conta que a nossa sociedade sofreu mudanças irreversíveis; não há retomo possível ao capitalismo caseiro e caserneiro do general Ramalho Eanes.

A oposição também o sabe: grita muito contra as chagas do regime para angariar votos, mas aplica-se em preparar soluções de recurso, dentro da mesma linha de rumo. E por isso, olha para os barões do PSD, com quem estaria disposta a concluir as mais inesperadas alianças, se Cavaco entrasse em derrapagem. As jogadas poderiam variar ao infinito: um PSD “renovado” partilhando o poder com o CDS; um governo “suprapartidário” de iniciativa presidencial; um “novo” Bloco Central... A diferença entre elas seria praticamente irrelevante. Trata-se, em suma, de engendrar um clone de Cavaco, apto a prosseguir a tarefa europeia, que é de todos.

Por isso, ficar na expectativa de qual será a próxima jogada do Presidente ou da Oposição parlamentar é o pior que os trabalhadores podem fazer.


Inclusão 26/08/2019