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Primeira Edição: Inédito, possivelmente de 2007
Fonte: Francisco Martins Rodrigues - Escritos de uma vida
Transcrição: Ana Barradas
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
A corrente internacional que se autodesignou como “marxista-leninista” em reacção à deriva abertamente revisionista encetada pelo PCUS no seu XX Congresso de 1956 e que no nosso país se iniciou em 1964 com o Comité Marxista-Leninista Português e a sua revista Revolução Popular chega hoje ao fim.
É certo que organicamente continua presente nos dois ramos, maoísta e stalinista, em que se dividiu. Mas a sua intervenção política vive amparada na repetição de dogmas que pouco têm a ver com a luta de classes real da nossa época. Ideologicamente os “M-L”, como se tornaram conhecidos, estão há muito esgotados. É tempo de ensaiar um balanço a esta infeliz trajectória que em poucas décadas desmentiu as esperanças de reanimação revolucionária contidas no manifesto “Viva o leninismo”, na época lançado pelo PC da China como sinal de ruptura com o PCUS.
Em Portugal, o balanço é conhecido: apesar do papel apreciável da maioria dos grupos “M-L” durante a crise social de 1974-76, a culminar na formação de um novo partido comunista, o PCP(R), este retomou a breve prazo os trilhos do reformismo e acabou por se dissolver em meados dos anos 80.
Se durante a crise revolucionária a extrema-esquerda marxista-leninista manifestou confusão ideológica e seguidismo face ao movimento espontâneo, perante a contra-ofensiva burguesa de 76 ela revelou toda a sua fragilidade interna, iniciando um processo de dispersão e decomposição que levou ao seu prático desaparecimento como força política no início dos anos 80. Houve diversas causas externas que para isso contribuíram, desde a juventude do movimento ao descalabro do maoísmo à escala internacional, passando pelos efeitos da implacável campanha “anti-esquerdista” do PCP. Mas a causa principal do fracasso estava na própria gestação da nova corrente.
Com efeito, o chamado “marxismo-leninismo” combinou desde o início três tendências diferentes: um esboço de crítica marxista à política do PCP e do movimento comunista internacional, lançado na Revolução Popular do CMLP; em obediência à corrente “pró- chinesa”; esta tendência foi sufocada pela reabilitação do stalinismo entrelaçado com novos conceitos do maoísmo; por último, a este entrelaçamento veio somar-se o revolucionarismo pequeno-burguês de inspiração guevarista e castrista então florescente na juventude. As três tendências não entraram em choque, casaram-se e o resultado foi anularem-se. O produto do CMLP/FAP e do conjunto da corrente “M-L” não foi nem o partido comunista que se anunciava nem a força de tipo guevarista que muitos anteviam. O produto mais consistente desta corrente, o PC(R), evoluiu de forma imparável para a esterilização ideológica, o oportunismo e o dogmatismo, encobertos com declamaçõcs “bolcheviques”. Nem a injecção de energias recebida do movimento de massas de 74-75 foi suficiente.
Através de tremendas vicissitudes e limitações, tem vindo a afirmar-sc no nosso país uma corrente marxista revolucionária, que traçou as suas demarcações não só com o “marxismo” dogmatizado e reformista do PCP como com o “marxismo” social-democratizantc e o pseudo- revolucionarismo “basista”. Tirar as lições desse percurso, afirmar a identidade de uma corrente de pensamento e de acção com contornos próprios, é uma tarefa que nos cabe realizar. Para lhe dar continuidade.
Passados tantos anos, que significado pode ter a plataforma M-L dos anos 60? A transformação a que estamos assistindo à escala mundial, com as vagas incessantes de situações novas criadas pela globalização, fazem esquecer a muitos marxistas que o problema da revolução continua a colocar-se em termos da capacidade do proletariado de se dcsenganchar da burguesia democrática e progressista, a sua capacidade de se orientar para o derrube do aparelho de Estado e a conquista do poder. Por muito difícil que esse objectivo apareça, está mais que demonstrado que nenhuma transformação real é possível fora dele.
Inclusão | 16/11/2018 |