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Fonte: Os Comunistas - Bento Gonçalves.
Transcrição: João Filipe Freitas
HTML: Fernando A. S. Araújo.
Tarrafal! Campo da Morte Lenta!
A 11 de Setembro de 1942, no rectângulo de arame farpado erguido entre as montanhas e o mar, no plaino que se estende desde a pequena enseada por mais de cinco quilómetros de comprimento, sucumbia Bento Gonçalves, secretário geral do Partido Comunista e uma das mais lúcidas inteligências do movimento operário português.
Na história das violências do regime salazarista, a morte de Bento Gonçalves assinala os criminosos processos utilizados pelo fascismo, através dos frios métodos da morte lenta, do terror, dos longos anos de cárcere, nas mais desumanas condições, contra combatentes destacados, que não renunciam à luta e marcam a sua vida com actos de inteira fidelidade à classe operária e ao socialismo.
Nesse dia trágico, em que a classe operária perdia um dos seus legítimos representantes e um dos seus mais denodados defensores, os comunistas presos no sinistro campo do Tarrafal, desfilaram um a um, diante do seu leito de morte, numa comovida homenagem ao camarada que desaparecia, ao dirigente inesquecível.
Na sua actividade de militante, Bento ajudara a forjar um Partido de tipo novo, fora o seu principal obreiro. A sua vida estava marcada por uma reconfortante coerência. Ele «consagrara à revolução não só dias livres mas toda a sua vida».
O seu nome, e a sua actividade glorificam o movimento operário português, são um legado precioso que se perpetuará como testemunho de altos serviços prestados aos trabalhadores, na sua difícil marcha para a conquista do poder, para a construção do socialismo e do comunismo.
O golpe de estado de 28 de Maio de 1926 deu início a uma nova etapa histórica. A correlação de forças define-se em favor da reacção. As suas tentativas para se assenhorear do poder acabam por sair vitoriosas. O aparelho democrático do Estado burguês, dirigido pelos políticos da pequena burguesia e das classes médias, mostra-se ineficiente para servir os interesses dos grandes capitalistas. É instaurada uma ditadura militar, que se transformará em ditadura fascista. A revolução de 1910 estabelecera uma democracia política, mas não procedera às reformas democráticas na velha estrutura da sociedade portuguesa. As forças capitalistas, os grandes agrários, o imperialismo estrangeiro não se limitaram a adaptar-se às novas circunstâncias. Progrediram economicamente, alargaram os seus planos de penetração e de domínio em Portugal e nas colónias. Agitaram na vida política, buscando os partidos e homens políticos que melhor os podiam servir.
Depois das tentativas fracassadas da Ditadura de Pimenta de Castro, de Sidónio Pais, depois do golpe sem êxito de 18 de Abril de 1925, as forças reaccionárias acabaram por destruir o regime parlamentar e democrático e por encontrar novos rumos políticos na vida nacional.
O descrédito político dos governos republicanos, a sua incapacidade para resolver os mais prementes problemas do país, num sentido democrático, levaram as classes médias a uma atitude de expectativa e de descrença, com igual reflexo na pequena burguesia urbana, que dera um acentuado apoio ao regime republicano, nos primeiros anos da sua existência.
A estas duas camadas da burguesia faltavam partidos políticos capazes de tomar a sério a defesa dos seus interesses. O Partido Republicano Português, que quase ininterruptamente ocupara o poder até ao golpe de estado de 1926, não realizara uma política consequente em favor das classes médias e da pequena burguesia, que o haviam gerado e lhe tinham dado o impulso inicial para a sua acção governativa. Os partidos saídos do seu seio ou criados à margem da sua existência não lograram transformar-se em partidos activos e creditados entre a pequena e média burguesia, por falta de um pensamento político bem definido e de uma estrutura orgânica que possibilitasse as transformações democráticas requeridas pelas classes médias.
Estes importantes sectores da vida nacional vogaram à mercê da demagogia de políticos sem escrúpulos, de tribunos sem consistência ideológica, que esqueciam as promessas e as afirmações lançadas a público para remediar os males da governação republicana.
A classe operária portuguesa que, sob a direcção da Confederação Geral do Trabalho, de tendência anarco-sindicalista, travara durante anos uma dura luta contra a política reaccionária de vários governos da República, não criara ainda um verdadeiro Partido de classe, apto a assegurar-lhe uma direcção política capaz e uma orientação acertada em momentos cruciais como os que se desenrolaram entre os anos de 1924 e 1926, quando a reacção levantara cabeça e vibrara os primeiros golpes.
O pequeno Partido Comunista, criado em Março de 1921, saíra do anarco-sindicalismo e do movimento socialista enfraquecido. Inseguro nos seus objectivos políticos e tácticos, mal armado da doutrina do marxismo-leninismo, penetrado de conceitos ideológicos pequeno-burgueses e por querelas internas não podia assegurar ao proletariado português a orientação justa e a organização capaz de barrar a rota ao fascismo.
O anarco-sindicalismo na sua forma organizada e dirigente — a CGT — dera mais uma prova do seu oportunismo larvar, do seu sectarismo, que várias vezes redundou em oscilações e transigências em face dos golpes de estado reaccionários. Incapaz de assegurar uma direcção efectiva à luta da classe operária, inapta na determinação das alianças com as forças políticas democráticas que podiam ainda agir contra o golpe de estado, a CGT contenta-se com umas vagas diligências dos seus dirigentes junto dos responsáveis do golpe reaccionário, para deles obter garantias de respeito pela organização e direitos dos trabalhadores. Essas «garantias», é útil dizê-lo, não foram difíceis de conseguir em palavras e num momento em que a Ditadura iniciava a ocupação do poder e sabia que a força mais poderosa e provada na luta era a classe operária, se ela fosse devidamente orientada naquele momento em que a expectativa era uma atitude política das forças democráticas.
O Partido Comunista iniciou os trabalhos do seu II Congresso no dia 29 de Maio de 1926 e prolongou-se até ao dia 30. Embora com as limitações de um partido politicamente débil e de reduzida influência de massas, o Congresso assinalou os perigos do golpe militar, caracterizou-o como golpe fascista, denunciou as suas consequências para as massas trabalhadoras e tomou medidas concretas para intensificar a luta da classe operária contra as forças reaccionárias que acabavam de subir ao poder. Mas a sua acção não encontrou eco na CGT, cujo oportunismo a levou não somente a subestimar as consequências do golpe militar, mas a aceitá-lo como uma medida salutar dirigida contra a governação republicana. A sua posição sectária e anticomunista tornou-a surda às propostas de accão destinadas a mobilizar os trabalhos contra a ditadura que acabava de triunfar.
Em face da inacção das forças democráticas e do movimento operário dividido e sem uma direcção dinâmica e apta às novas batalhas de classe, a Ditadura Militar iniciou a sua acção ilegalizando partidos, encerrando o parlamento, estabelecendo a Censura, prendendo e perseguindo os elementos mais representativos da governação democrática e dos partidos políticos, abrindo o caminho à instauração do fascismo. É Salazar, chamado ao poder, que estabelece as linhas fundamentais da nova orientação política, vencendo as vacilações dos generais reaccionários, a sua ignorância política e incapacidade administrativa. Discípulo de Mussolini, educado nos princípios corporativos de Leão XIII, Salazar imprimiu ao golpe militar a orientação fascista, que precisou no seu famoso discurso de 30 de Junho de 1930.
Entre os anos de 1926 e 1929, o movimento operário português caracteriza-se pelo oportunismo que conduz à inacção e à expectativa e pela colaboração nas conspirações dos putchistas burgueses, colocando deste modo a classe operária a reboque dos grupos de conspiradores que desejavam evitar uma movimentação popular contra as forças reaccionárias.
O movimento sindical português sofre um declínio sensível, tocado pelo marasmo político, pelo refluxo da luta de classes. A CGT perde a sua influência de massas.
Foram feitas tentativas para reerguer o Partido da situação em que o deixara a política arrivista de Carlos Rates e a sua traição posterior. Em 1927, José de Sousa, Silvino Ferreira e outros procuram reavivar a luta e a organização do Partido. Falha, porém, uma tal diligência. Escasseava aos dirigentes do Partido dessa época, a capacidade política necessária para reorganizarem o Partido, determinarem as tarefas imediatas, a linha política requerida pelas novas condições, que se defrontavam com a existência de uma Ditadura militar e com um oportunismo declarado, que pretendia neutralizar o espírito combativo dos trabalhadores e afastava o Partido cada vez mais das massas laboriosas sem direcção política.
Em fins de 1927, Augusto Machado, que havia sido eleito para o Comité Central do Partido no 2.° Congresso, recebe o encargo de proceder à reorganização do Partido, depois do seu regresso das comemorações do aniversário da grande revolução socialista de Outubro em Moscovo. Mas a falta de espírito de organização, de noção dos problemas essenciais que se punham à criação de um Partido leninista, levaram Augusto Machado e os outros dirigentes do Partido a cair numa actividade predominantemente teórica, que mantinha o pequeno núcleo partidário isolado, debruçado sobre si mesmo, sem visão dos acontecimentos e das tarefas imediatas que era indispensável realizar, para fazer sair o movimento operário do marasmo oportunista em que se encontravam sem uma vanguarda organizada capaz de dirigi-los num momento em que a exploração capitalista crescia, sob a protecção da Ditadura, em que o desemprego se acentuava e a situação económica oferecia perspectivas mais dramáticas, marcadas pela crise. O golpe militar criara uma situação financeira catastrófica sob a direcção de Sínel de Cordes, que colocou as finanças públicas ao serviço das forças capitalistas, procedendo a empréstimos de emergência para as salvar da crise ou para lhes fomentar a riqueza. A situação da agricultura agravou-se, submetida ao domínio dos grandes agrários, à carência de medidas adequadas para proteger os pequenos e médios camponeses sujeitos à especulação dos novos senhores, à acção dos bancos, à nova política de impostos. Toda a vida económica do país se embaraçou na teia criada pelo poder capitalista, que tinha a dirigi-lo uma ditadura militar que actuava de forma desconexa mas ruinosa, permitindo as manobras escuras e fraudulentas dos senhores da banca., da indústria e da agricultura, que actuavam por detrás do novo poder, fazendo tombar os efeitos da sua política sobre os ombros da classe operária e das massas trabalhadoras em primeiro lugar.
Em face da nova situação impunha-se armar a classe operária com um partido de vanguarda, apto aos grandes combates, capaz de dirigi-la na complexa situação política que se criara, de elevar o espírito de luta dos trabalhadores, de fazer face à ofensiva da reacção, de elaborar uma linha política justa e de aplicá-la na prática.
Para construir um tal Partido tornava-se necessário vencer o oportunismo, o doutrinarismo sem expressão prática, sem trabalho de organização, pôr cobro à inactividade, à expectativa política, que castrava a combatividade dos trabalhadores, os colocava na dependência dos pequenos grupos de conspiradores da pequena ou da média burguesia.
Para armar a classe operária de um partido de vanguarda impunha-se dar combate ao extremismo e ao sectarismo da CGT, que embora enfraquecida e no repouso da expectativa, mantinha a sua influência dominante entre os trabalhadores.
Tornava-se igualmente necessário dar batalha aos socialistas, que ressurgiam para a actividade, estimulados pelos dirigentes da Ditadura, que diligenciavam transformá-los em elementos activos da sua política contra a classe operária, num momento em que as correntes fundamentais do proletariado português aguardavam que a Ditadura caísse para só então continuarem a luta pela defesa dos trabalhadores.
Com a idade de 26 anos, Bento Gonçalves, operário do Arsenal de Marinha, tomou em suas mãos a pesada e honrosa tarefa de forjar o Partido do proletariado, de armar os trabalhadores com uma poderosa arma de combate, sem a qual não é possível pôr cobro à exploração capitalista, dirigir as lutas económicas e políticas pela conquista do poder, pela edificação do socialismo.
Em meados de 1928, Bento deu os primeiros passos para a reorganização do Partido. A Conferência de Abril de 1929, no balanço da actividade realizada, assinalava a existência de 40 militantes, apenas, nos efectivos do Partido. Mas este pequeno número, animado de um entusiasmo revolucionário e de um novo espírito de luta ia lançar-se à tarefa de alargar o Partido, de chamar a ele o que havia de mais combativo e de mais esclarecido na classe operária, para criar uma forte vanguarda de luta.
As condições objectivas eram-lhe favoráveis. Abria-se no mundo um novo ciclo da crise capitalista, com reflexos profundos na vida nacional. Agravava-se a situação de miséria das massas trabalhadoras, crescia o desemprego, diminuía o poder de compra do povo, acumulavam-se potentes factores de descontentamento e de luta.
Bento e os seus companheiros tiveram a justa percepção de que o Partido se fortaleceria e se radicaria nas massas, se a actividade que desenvolviam se apoiasse no movimento sindical, caído numa perigosa inacção. O agravamento da situação de miséria, os novos problemas criados pelo desemprego e pela ofensiva do capital determinavam um novo esforço do Partido, que podia ser ampliado através da actividade nos sindicatos e do reforço destes, como organismos de massas que o golpe militar não ousara ainda dissolver.
Na base da luta contra o desemprego, sob as palavras de ordem «Pão e Trabalho», Bento desenvolveu uma enorme actividade sindical, com o apoio do núcleo de activistas do Partido, com base nas posições conquistadas no Sindicato do Pessoal do Arsenal da Marinha. Uma tal actividade permitiu alargar a acção do Partido, conquistar posições em vários sindicatos, revigorar a actividade de outros, chamá-los à luta sob uma plataforma concreta, iniciar a mobilização da classe operária para a defesa dos seus interesses. Ao mesmo tempo que se desenvolvia a unidade sindical com a participação de comunistas, anarco-sindicalistas, socialistas e sindicatos autónomos, procedia-se à criação de um organismo dirigente e coordenador, em Lisboa, a Comissão Inter-Sindical, que assegurou a actividade sindical, contribuindo para o reforçamento da luta de massas e havia de transformar-se numa nova central sindical, ligada à Internacional Sindical Vermelha, em oposição à CGT cujo prestígio e actividade continuavam a decrescer.
A criação da Comissão Inter-Sindical define ainda um outro aspecto da actividade política conduzida pelo Partido: a luta contra o espírito de colaboração de classe, que a Ditadura Militar procurou criar quase desde o seu início no movimento operário português, servindo-se de agentes seus ou utilizando os socialistas na aceitação e divulgação dos seus princípios políticos. O governo propôs, em Março de 1930, em face da actividade sindical que se desenvolvia e das perspectivas de grandes lutas, que fossem criadas comissões paritárias, compostas de operários e patrões, na proporção de 1 para 2, para se pronunciarem sobre os conflitos de classe e convidava os sindicatos a nomear os seus delegados, procurando aliciá-los à sua causa. Os socialistas aceitaram as propostas do governo e dispunham-se a colaborar, mas a acção esclarecedora do Partido nas reuniões dos delegados de vários sindicatos de Lisboa, fez abortar a manobra, prevalecendo o espírito de independência do movimento sindical, contra o ponto de vista de colaboração de classes e as ideias oportunistas.
Do confronto de ideias e da necessidade de intensificar a acção, por parte da grande maioria dos representantes dos sindicatos presentes nas reuniões de Lisboa nasceu a proposta para que a Comissão Inter-Sindical (CIS) se transformasse num organismo coordenador à escala nacional da actividade dos sindicatos, com o objectivo de desenvolver a luta pela defesa dos interesses dos trabalhadores, em particular das questões mais candentes: cumprimento do horário de trabalho e luta contra o desemprego.
«A Comissão Inter-Sindical, que havia nascido com objectivos bem modestos — escreve Bento Gonçalves — em breve foi colocada, pelo desejo expresso de muitos e muitos sindicatos, em Comissão Inter-Sindical Nacional».
Foi em volta da CIS, com o activo apoio dos comunistas ao movimento sindical, que se processou um novo período de reorganização da actividade dos sindicatos, se desenvolveram largas acções de massas, se criaram um novo espírito de luta e uma maior consciência de classe, se fortaleceu a unidade dos trabalhadores, se constituíram novos organismos sindicais, ante a perda acentuada de prestígio e de efectivos da CGT.
Nesse amplo trabalho sindical dos comunistas salienta-se a criação da Federação Nacional dos Trabalhadores dos Transportes, que veio a ter uma grande projecção entre os operários dos transportes e no movimento sindical português.
A criação da FNTT reflecte perfeitamente o esforço do Partido para o fortalecimento e desenvolvimento da Unidade da classe operária, vencendo o espírito de compartimentação que dirigentes anarco-sindicalistas opunham à concretização de um largo espírito de trabalho em comum para a defesa dos interesses das massas trabalhadoras. Os comunistas deram provas de capacidade política, de largueza de vistas, de realismo revolucionário, actuando, com flexibilidade e com coerência numa luta onde entravam, de mistura com problemas de orientação e de táctica, os conceitos de organização do movimento sindical defendidos e mantidos a todo o custo pela CGT. Sob palavras de ordem tais como «não colaboracionismo, mas sim luta de classes», «democracia sindical», «socorro aos desempregados» e outras, o Partido Comunista conseguiu levar a cabo a unidade sindical, fundindo na mesma Federação e apesar das manobras e da luta de tendências, os sindicatos dos marítimos, entre os quais havia profundas rivalidades, os sindicatos dos ferroviários da CP, Sul e Sueste e Minho e Douro, entre os quais havia igualmente dissenções, do Pessoal da Carris e dos motoristas.
Foi na Federação Marítima Velha, que englobava o pessoal do tráfego do Tejo, descarregadores, etc., que o Partido se apoiou para multiplicar os seus esforços de unificação, bem como noutros sindicatos.
A Federação Nacional dos Trabalhadores dos Transportes, ao realizar a unidade deste sector sindical, coroou uma batalha ideológica entre os partidários do movimento sindical vermelho e as correntes do anarco-sindicalismo e do reformismo, que continuavam gozando de certa influência e se opunham à unidade da classe operária. O espírito que animou a Federação não foi de modo nenhum de transigência ideológica com as correntes estranhas aos interesses dos trabalhadores, mas de reforço da unidade e de defesa consequente e activa de classe operária. Em tomo da Federação desenvolveu-se um amplo trabalho de esclarecimento, em reuniões públicas e assembleias sindicais, para desenvolver a consciência de classe dos trabalhadores, para lhes demonstrar o alto valor da Federação como organismo unitário que inscrevera nas suas consignas a luta pela defesa dos seus interesses.
O Congresso constitutivo da FNTT adiou a solução da sua filiação em organismos internacionais, com o objectivo de contribuir para o reforço da unidade e de não criar embaraços à realização de uma ampla actividade sindical em moldes unitários noutros sectores da classe operária e de intensificar o trabalho nos sindicatos que se mantinham ainda nas mãos da CGT, mas que haviam caído numa lamentável inacção.
A FNTT passou a ter um órgão próprio, «O Reduto», que exerceu uma crescente influência na combatividade dos trabalhadores, os orientou e esclareceu na defesa dos seus interesses, divulgando, ao mesmo tempo, questões referentes ao movimento internacional e às realizações sociais da União Soviética. A sua tiragem oscilou entre 25 000 a 30 000 exemplares.
O trabalho sindical empreendido pelo Partido havia de consubstanciar-se ainda na criação do Sindicato dos Operários Vidreiros da Marinha Grande, que tão grande projecção conseguiu nas lutas reivindicativas dos operários deste importante centro industrial e nas greves que empreenderam até à fascização dos sindicatos em 1934.
O Sindicato do Pessoal do Arsenal da Marinha havia de transformar-se, sob a direcção de Bento Gonçalves, no bastião de organização levado a cabo pelo Partido, depois de 1928. O novo impulso organizativo conduziu à criação do Sindicato do Pessoal do Arsenal do Exército, que havia de ter também uma importante acção no fortalecimento da actividade sindical e na reorganização do Partido.
Sob a influência do Partido criam-se os primeiros sindicatos de trabalhadores rurais do Alentejo e forma-se a sua respectiva Federação, que havia de representar a alteração operada no movimento sindical, em desfavor da CGT e do anarco-sindicalismo, que fora durante anos a corrente dominante entre os assalariados rurais do Sul.
Na zona industrial do Algarve criam-se os sindicatos dos corticeiros e dos operários das conservas, cuja existência assinalava também a crescente participação dos comunistas no movimento sindical e no revigoramento deste.
A luta pela criação de um partido marxista-leninista em Portugal implicou uma tenaz batalha ideológica, em que a clarividência política de Bento e a sua capacidade de dirigente determinaram os sucessos alcançados.
Contra a influência orgânica e ideológica do anarco-sindicalismo, o Partido teve de conduzir uma acção persistente, para atrair a classe operária à sua influência e organizar e intensificar a luta contra a exploração capitalista e a ditadura.
O Partido sofreu, desde a sua criação, os mais violentos ataques dos dirigentes da CGT e da sua imprensa. Em período da ditadura, impotente para a acção, pagando os seus velhos pecados oportunistas e sectários, o anarco-sindicalismo empenhava-se na campanha de descrédito dos objectivos do Partido, do marxismo-leninismo, a cujo estudo os dirigentes cegetistas não haviam procedido, utilizando as calúnias, os argumentos, as mesmas armas de desinformação de que se serviam as forças capitalistas para desacreditar a Revolução Socialista de Outubro, as conquistas do proletariado soviético, os princípios políticos que o orientavam.
Se houve exageros a lamentar na batalha ideológica contra o anarco-sindicalismo, o essencial da acção conduzida pela CGT representa, para um Partido do proletariado recentemente reorganizado, composto de quadros jovens, um testemunho da sua capacidade política, da justeza da orientação que animou os elementos mais responsáveis.
Era necessário demonstrar aos trabalhadores portugueses o que significava a existência de um Partido de vanguarda, servido pela doutrina do marxismo-leninismo. Para concretizar uma tal acção no domínio concreto, na luta das massas pelas suas reivindicações, impunha-se uma batalha consequente e objectiva contra o oportunismo cegetista, contra o seu pretenso esquerdismo, contra a tentativa para conservar a direcção do movimento operário, a par do combate contra os seus processos tácticos, que pretendiam substituir as lutas de massas pelos actos individuais de terrorismo,
A batalha ideológica contra o anarco-sindicalismo visava destruir os argumentos utilizados contra a ditadura do proletariado, a construção do socialismo e o papel do Estado, a existência das forças armadas, que contrariavam os conceitos utópicos do anarquismo.
Organizando o Partido, dirigindo os trabalhadores, estudando e educando politicamente a classe operária, os activistas do Partido, sob a direcção de Bento, combatiam os princípios do anarco-sindicalismo, através da divulgação do socialismo científico, dos ensinamentos de Lénine, demonstrando na actividade sindical e nas lutas reivindicativas as diferenças tácticas e de princípios que opunham os partidários da CGT, caídos na inacção, no oportunismo e no extremismo, aos comunistas que se encontravam nas primeiras filas da luta pela salvaguarda dos interesses dos trabalhadores, pela conquista do socialismo. Aos conceitos cegetistas, que pretendiam manter os sindicatos profissionais, os comunistas opunham os sindicatos únicos de indústria, como forma de acção sindical mais ampla e mais capaz de envolver na luta largas massas laboriosas.
A acção do Partido pelo reforço e alargamento da Unidade da classe operária defrontava-se com a sistemática recusa da CGT. As propostas para pactos de Unidade, quando não ficavam sem resposta, recebiam como argumento as costumadas calúnias, acompanhadas de uma negativa, quando não formulavam a exigência de que a Unidade só era possível pela renúncia aos princípios do marxismo-leninismo e pela aceitação dos conceitos anarquistas e das normas da CGT.
Só quando o Partido se desenvolveu e a CGT se encontrou numa posição de inferioridade, os dirigentes cegetistas, sem desarmarem das suas calúnias e dos seus ataques, se viram forçados, ante o desenvolvimento das lutas de massas e a pressão destas, a estabelecer um pacto de acção com a Comissão Inter-Sindical e o Partido Comunista para lutarem em comum contra a fascisação dos sindicatos e para prepararem a greve de 18 de Janeiro de 1934.
Coube a Bento Gonçalves o grande mérito de combater com argumentos políticos e provas práticas as posições sectárias no anarco-sindicalismo, revolvendo o seu velho arsenal de calúnias, demonstrando a inconsequência dos seus métodos de luta, que em vez de conduzirem os trabalhadores pelo caminho da sua emancipação os afastavam da meta ambicionada, pois os seus conceitos tácticos ignoravam a realidade nacional, estabeleciam-se sobre princípios dogmáticos, que não tinham em conta a situação concreta do país e acabavam por isolá-los das massas, por conduzi-los pelo caminho do terrorismo individual ou de grupo em vez de largas acções da classe operária, pela satisfação das suas reivindicações imediatas, contra a ofensiva do capital e o governo da Ditadura.
À inactividade da CGT, o Partido, sob a direcção de Bento, opôs uma política combativa e realista, toda voltada para a acção, buscando apoio cada vez mais amplo na classe operária.
Em vez do sectarismo e do oportunismo anarquista, o Partido tinha uma posição objectiva, buscando as formas de luta e palavras de ordem que se ajustavam às circunstâncias, sem transigências com o pensamento político da burguesia liberal, trabalhando firmemente para unir os trabalhadores numa só frente de luta, para criar a Unidade da classe operária, contra a resistência obstinada e prejudicial da CGT.
A luta contra a influência ideológica da pequena burguesia não se manifestou somente na acção que o Partido conduziu face aos pecados oportunistas e ao extremismo pretensamente revolucionário do anarco-sindicalismo. Ela tomou outros aspectos.
Sob a dominação fascista, o pensamento político da pequena burguesia e das classes médias, reduzidas à impotência, tomou um carácter particular. Incapaz de se manifestar sob a forma de partidos políticos, de dar expressão organizada e sistemática à luta contra a Ditadura, gerou um ambiente de expectativa e de crença na acção milagrosa dos golpes militares, que ficou conhecida pelo nome de reviralhismo. O «reviralho», todos os dias preparado e todos os dias adiado, ao mesmo tempo que expressava a incapacidade política dos dois sectores sociais, visava submeter a classe operária a essa «crença revolucionária», à impotência e à inacção, seguindo a corrente de um pensamento que lhe era estranho, por falta de uma vanguarda de luta que fosse determinante dos seus combates contra a ditadura e o poder do capital.
O reviralhismo limitou o espírito combativo da classe operária e das forças democráticas, numa época em que a repressão fascista entorpecia a acção organizada. As ideias do reviralho limitavam a luta contra o fascismo à actividade de pequenos grupos de conspiradores, que preparavam o «eterno amanhã» e repudiavam a acção organizada das massas populares pela defesa dos seus interesses e na luta contra a ditadura, convencidos, como ainda hoje estão os seus continuadores, que o conflito se podia e devia resolver através de golpes de audácia que não chegavam a ter sequer um carácter... audacioso. O reviralhismo opunha à unidade das forças democráticas e populares, à sua acção concertada e revolucionária contra o fascismo, a acção dos grupos de conspiradores.
A luta do Partido Comunista, sob a direcção de Bento Gonçalves, contra o reviralhismo não foi menos importante do que a luta conduzida contra a ideologia anarco-sindicalista, pois uma e outra tinham penetrado a classe operária e dificultavam a luta desta contra a exploração capitalista e o fascismo, como entravavam a unidade das massas trabalhadoras e das forças democráticas. Constituía tarefa do Partido do proletariado combater com intransigência as ideias de expectativa, de golpismo, de substimação do papel da luta de massas, de aventureirismo político em que se consumiram energias e tempo inútil. Uma tal luta no terreno político permitia forjar uma verdadeira consciência de classe entre os trabalhadores, alicerçar a influência do Partido Comunista, difundir as ideias do marxismo-leninismo, desenvolver a combatividade da classe operária, dirigir esta na luta pela defesa dos seus interesses e pela realização das suas tarefas históricas.
O combate à expectativa reviralhista não foi uma tarefa fácil para os reorganizadores do Partido. O eco dò reviralhismo no movimento operário não resultava apenas da influência dos conspiradores e da impotência pequeno-burguesa. Ele deve-se também à acção de dirigentes sindicais e operários, descrentes do poder revolucionário das massas, viçiados no oportunismo, de mentalidade pequeno-burguesa, que voltavam as costas à luta do proletariado, mas que não queriam perder o contacto com este. Sendo veículos das ideias do reviralho, esses pseudo-dirigentes cultivavam entre os trabalhadores conceitos de expectativa e de inacção e aguardavam que novos tempos lhes trouxessem os benefícios da sua fidelidade ao pensamento burguês democrático e lhes assegurassem uma posição preponderante, uma vez derrubada a ditadura.
Bento Gonçalves soube assegurar ao Partido do proletariado a justa direcção da luta contra o pensamento político reviralhista. Ele dissecou os perniciosos efeitos dessa corrente no movimento operário, pôs a nu o seu carácter inoperante e castrador, defendeu a independência do Partido do proletariado em face das forças democráticas burguesas, concretizou a linha de orientação dos comunistas em relação à unidade, combatendo os conceitos reviralhistas que queriam transformar o Partido Comunista em apêndice da luta democrática, servindo de trampolim a uma luta política de objectivos duvidosos e de êxitos inseguros.
Em 1933, no Congresso de Coimbra, o Partido Socialista decretou a sua auto-dissolução, prova evidente do estado caótico a que chegara, das dissensões que o minavam, da renúncia à luta. Durante os primeiros anos da Ditadura, a actividade dos socialistas fora escassa e sem projecção, limitando-se a conservar algumas posições em sindicatos sem influência de massas, no movimento cooperativo e entre o funcionalismo público. Quase desde a sua criação, os socialistas fizeram eco de pontos de vista políticos estranhos aos verdadeiros interesses da classe operária, quer quando difundiam as ideias de Proudhon, seu ideólogo dos primeiros anos, quer quando enveredaram pelo oportunismo, pelas ideias de colaboração de classe, estranhos inteiramente à influência do pensamento marxista.
Até à sua dissolução no Congresso de Coimbra, o Partido Socialista provou a enorme distância a que se colocara em relação aos interesses do proletariado e das massas trabalhadoras. A sua ideologia de compromisso e de colaboração de classes levara-os a defender nas reuniões dos representantes dos sindicatos de Lisboa as posições da ditadura na criação das comissões paritárias para a solução dos conflitos sociais, tendo um dos seus dirigentes, o advogado Ramada Curto, aceitado o convite que lhe foi dirigido pelas autoridades fascistas para redigir uma Carta do Trabalho, no modelo da que havia sido elaborada em Itália pelo regime fascista de Mussolini. O impulso do movimento sindical e a luta ideológica do Partido contra as posições oportunistas levaram os socialistas a renunciar a estes intentos.
Foi no terreno prático, na defesa dos interesses dos trabalhadores, que o Partido Comunista conduziu a sua campanha contra o espírito de colaboração de classes dos socialistas, mostrando a que situações levava uma tal orientação e num momento em que a classe operária sofria as consequências da crise capitalista e do domínio da Ditadura.
Mas a luta do Partido contra o oportunismo não se dirigiu apenas à actividade dos socialistas. Essa luta tinha de ser conduzida, em primeiro lugar, contra os conceitos estranhos ao marxismo, que tinham dominado a vida do Partido antes da reorganização de 1929. Tais conceitos esbateram o papel de vanguarda do Partido, substimaram as lutas de massas, colocaram estas a reboque de correntes estranhas aos interesses da classe operária, preconizaram a inacção em face do golpe militar reaccionário, ignoraram o trabalho de organização e os aspectos essenciais da doutrina marxista-leninista e a sua aplicação prática na situação política que se criara.
Quebrar esse oportunismo que assentava numa falta de confiança na capacidade revolucionária do proletariado e no valor da aliança destes com os camponeses, que se colocava à margem da luta pela unidade das forças democráticas, que permitia que se avolumasse a força da reacção agora no poder, era tarefa imperiosa, que requeria capacidade política e ideológica, firmeza revolucionária, dedicação profunda aos interesses da classe operária, ligados a um conhecimento da vida política nacional e das novas tarefas que se colocavam aos comunistas e às outras forças democráticas.
Esta batalha foi ganha sob a direcção de Bento Gonçalves, que deu provas, mais uma vez, dos seus elevados dotes de dirigente comunista.
Na luta contra o oportunismo, o Partido ganhou forças para se estruturar e alargar, para se erguer como vanguarda da classe operária, combatendo o seguidismo, a expectativa política que conduz à inacção, demonstrando aos trabalhadores que a organização e a luta são elementos decisivos para a conquista da sua emancipação.
Em fins de 1933, a ditadura fascista elaborou os decretos que levaram à destruição dos sindicatos independentes da classe operária e à proibição da existência legal das centrais sindicais, bem como da imprensa operária. Em seu lugar foram criados os sindicatos fascistas, os chamados «Sindicatos Nacionais», e as Casas do Povo e dos Pescadores, submetendo uns e outros à direcção do governo, através do Subsecretário das Corporações. O ano de 1933 assinala a consolidação do poder das forças reaccionárias, marca o período da fascisação completa do país. Mas já antes desta data o governo da Ditadura iniciara a sua acção com o objectivo de substituir a influência dos comunistas e do anarco-sindicalismo no movimento operário. Em 1930 lançara a proposta, que foi repudiada, das comissões paritárias. Em 1931 realizou novos esforços para «harmonizar» os interesses dos operários e dos patrões, através do Conselho Superior da Economia Nacional, criado por decreto público, sob cuja direcção se devia efectuar a organização dos trabalhadores e do patronato, de modo a tomar efectiva a «colaboração» entre ambos através de laços orgânicos.
Estas diligências defrontam-se com a reacção da Comissão Inter-Sindical e da Federação Nacional dos Trabalhadores dos Transportes, que esclareceram a classe operária sobre os intentos do governo e denunciaram as medidas repressivas tomadas por este no Porto, onde mandou encerrar vários sindicatos e proceder à prisão dos seus activistas.
O fascismo surgiu armado de uma demagogia pretensamente revolucionária, que filiava o seu arsenal na escola fascista de Mussolini e no nacional-socialismo de Hitler. À teoria da luta de classes opunha a sua «doutrina» de colaboração de classes. «Enquanto houver um lar sem pão a revolução continua», gritavam os fascistas nos comícios e nos cartazes. «Tudo pela Nação, nada contra a Nação» expressava a ideia de que o novo regime tinha em vista o bem de todos e não o bem de alguns, que a Nação era a suprema aspiração da sua política. Em torno da existência dos Sindicatos Nacionais e das Casas do Povo teceu-se todo um esquema de pseudo-reformas de assistência social, divulgado aos quatro ventos, para equivocar os trabalhadores, para os desviar do caminho da luta, para os entregar docilmente à exploração capitalista, sob a protecção do Estado Novo.
Contra esta política devidamente orquestrada, o Partido Comunista, sob a direcção de Bento Gonçalves, teve de terçar as suas armas. A luta ideológica era uma premente necessidade.
Em artigos no «Avante!», que começou a publicar-se em Fevereiro de 1931, Bento conduziu uma campanha sistemática de esclarecimento sobre a política fascista, denunciando esta,, pondo a nu a sua estrutura económica capitalista, alertando a classe operária, os camponeses sobre os resultados da organização corporativa, sobre a acção dos sindicatos e das casas do povo, sobre as consequências que advinham para os pequenos e médios proprietários agrícolas da criação da Federação Nacional dos Produtores de Trigo, da Federação Vinícola e no domínio da Indústria da criação do Consórcio das Conservas e de outros organismos corporativos.
O Partido passou ao crivo da sua crítica a Constituição fascista de 1933, desmascarando o funcionamento da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa, demonstrando o significado da legislação reaccionária, dirigida contra os interesses dos trabalhadores, contida no Estatuto de Trabalho Nacional, que foi elaborado nos moldes da Carta del Lavoro de Mussolini.
Esta campanha de esclarecimento fez sentir os seus efeitos na classe operária e nas massas trabalhadoras, que reforçaram a sua combatividade contra o regime, que não aderiram à sua campanha demagógica, que não lhes concederam uma base de massas, como sucedeu em Itália e na Alemanha. Os trabalhadores hostilizavam a organização corporativa, resistiam à participação obrigatória nos sindicatos fascistas, estabeleciam à sua volta o vazio da resistência.
Para que os sindicatos não se tornassem associações sem filiados., o fascismo teve de usar de formas compulsórias. Decretou a obrigatoriedade de filiação nos organismos sindicais corporativos, determinou que os patrões descontassem dos salários, na altura do pagamento, a verba correspondente à cota para o sindicato e ao desconto para as Caixas de Previdência.
No combate à ideologia e à política do fascismo salazarista, o Partido Comunista reforçou a capacidade dos seus quadros e a sua influência entre as massas e tornou-se o inimigo mais esclarecido e mais tenaz que os governantes fascistas tiveram de defrontar.
Bento Gonçalves não pode conduzir, no terreno prático, a luta contra o sectarismo, que se manifestava no seio do Partido em relação ao trabalho nas organizações sindicais fascistas. Era assinalada já, como um erro, a existência de pequenos núcleos de comunistas e simpatizantes, que persistiam num trabalho sindical estreito e desligado das massas. O VII Congresso da Internacional Comunista, realizado em Agosto de 1935, fornecera uma riqueza de ensinamentos que iria dar um novo impulso ao trabalho sindical e de massas, nas condições da ditadura fascista.
«É-nos preciso vencer os restos do nosso sectarismo e empreender uma larga actividade — afirmou Bento Gonçalves no seu relatório ao VII Congresso — no seio das organizações de massas trabalhadoras, os sindicatos, as cooperativas, as sociedades desportivas, as mutualidades, etc., mesmo naquelas que estão sob o controlo directo dos fascistas, com vistas a tomar contacto com as largas massas e levar para diante as lutas destas últimas pelas suas reivindicações concretas imediatas».
Uma tal actividade não pôde ser levada à prática por Bento Gonçalves, em resultado da sua prisão, em Novembro de 1935. Tão pouco pôde promover a sua discussão no Partido, como era seu desejo. Coube essa tarefa a outros camaradas.
A reorganização do Partido de 1929 correspondeu à fase aguda da crise capitalista, que entre nós se estende entre 1928-1932, com todas as consequências sobre a situação das massas trabalhadoras. O desemprego cresceu. As classes médias sofreram os embates da crise, reduzindo a laboração, encerrando empresas, submetendo-se ao poder dos bancos e dos monopólios, que o estado fascista protegia favorecendo a concentração, apoiando-os financeiramente.
A luta contra os efeitos da crise, contra o desemprego, os baixos salários, os despedimentos, os roubos e outros abusos do patronato, tornou-se o eixo da acção do Partido, o motivo central das suas palavras de ordem, em volta das quais desenvolveu a sua actividade mobilizadora quer no terreno político quer no campo sindical.
Logo no ano de 1929-30 o Partido conduziu uma greve de manipuladores de pão e desenvolveu uma acção de propaganda e de esclarecimento entre os trabalhadores, aproveitando as condições legais, com o objectivo de orientá-los na defesa dos seus interesses.
Em 5 de Outubro de 1929 e no ano seguinte as manifestações comemorativas da implantação da República tiveram um cunho nova. Ao apelo do Partido Comunista, os trabalhadores de Lisboa participaram no desfile que subiu a Avenida da Liberdade, até à Rotunda, erguendo ao vento, ao lado da bandeira da República, a bandeira vermelha dos trabalhadores.
Desde os primeiros passos da reorganização que o Partido se empenhou na luta contra o flagelo do desemprego. Sob a base das palavras de ordem de «Pão e Trabalho», os comunistas desenvolveram uma larga agitação, mobilizaram a classe operária utilizando várias formas de acção de modo a pressionar o patronato e as autoridades fascistas, que se viram forçadas a tomar medidas após as lutas dos desempregados em 25 de Fevereiro de 1931 e em 29 de Fevereiro de 1932, lutas que exprimem já a capacidade de luta do Partido e a sua influência de massas, e a combatividade dos trabalhadores.
As acções dos desempregados impuseram ao governo medidas tendentes a iludir a solução do problema. Por determinação governativa foi criado o Fundo do Desemprego, como resposta às consignas lançadas pelo Partido de «Socorro aos Desempregados-». A partir de 1932, o governo da Ditadura passa a extorquir dos salários e ordenados 2% para o desemprego. Mas este dinheiro, em vez de surgir como ajuda aos desempregados, tornou-se receita regular para o financiamento das obras de fachada do fascismo e obras de interesse local, sem qualquer ligação com o desemprego.
Durante os anos de 1931-32 outras lutas da classe operária se desenrolaram no país sob a direcção do Partido Comunista e dos sindicatos livres então ainda existentes.
O desnível mais acentuado entre o aumento do custo de vida e o nível dos salários auferidos pelos trabalhadores levaram os operários das construções navais a uma greve prolongada, que se estendeu pelo período de um mês, abarcando entre 2000 e 2500 carpinteiros e calafates, com êxito marcado para os trabalhadores em luta, que conseguiram ver aumentados os salários.
No centro conserveiro e piscatório de Setúbal estalam outras acções de protesto dos trabalhadores. Cinco mil pescadores, seguindo as consignas de luta do Partido pela melhoria das suas condições de vida, lançaram-se na greve, defrontando corajosamente a acção do patronato e das forças repressivas, que quiseram fazê-los render pela fome. Durante perto de três meses o movimento grevístico manteve-se mercê da unidade e da firmeza dos pescadores e do apoio que encontraram da parte do Partido Comunista. A vitória foi parcial, mas marcou o desenvolvimento da luta da classe operária, na fase cíclica da crise capitalista em que o país se encontrava.
Os operários das construções navais de Lisboa, da Companhia Nacional de Navegação, na sequência da luta dos carpinteiros e calafates, paralisaram igualmente o trabalho numa greve de dois meses, que ganhou o apoio dos trabalhadores do porta de Lisboa, numa acção conjugada que defronta a resistência das forças capitalistas dispostas a não ceder à pressão combativa das massas. Mas aqui também a unidade da classe operária, em que assentou esta luta reivindicativa, e a resistência às intimidações e brutalidades das forças repressivas acabaram por assegurar uma vitória completa dos trabalhadores.
A Federação Nacional dos Trabalhadores dos Transportes organizou e dirigiu a luta dos trabalhadores do porto de Lisboa, alimentando de novas energias a combatividade da classe operária.
Em 1932, os fragateiros entraram também na batalha reivindicativa formulando as suas reivindicações mais instantes e lutando por elas com firme espírito combativo. Durante 15 dias mantiveram-se em greve. Os outros trabalhadores do porto de Lisboa levaram-lhes a sua solidariedade, declarando-se igualmente em greve.
Na Universidade, os anos de 1931-32 são particularmente agitados. A influência do Partido começa a fazer-se sentir entre os estudantes, em substituição da influência dos democratas burgueses. Estalam greves e manifestações de protesto nas Faculdades de Direito e de Medicina, em Lisboa e no Porto. Nesta última cidade, perde a vida em resultado da intervenção policial o estudante Branco. A sua morte provocou uma nova onda de protestos. Na vida política do país os estudantes tomam-se uma força política activa, em luta contra a ditadura fascista, sob a influência do Partido Comunista. Em 1932-33 é criada a primeira organização de unidade dos estudantes — os Grupos de Defesa Académica (GD A) — sob a influência directa do Partido.
No campo surgem as primeiras lutas, não somente dos trabalhadores rurais, mas dos camponeses, que começam a conhecer os resultados da política fascista no domínio da agricultura e a acção proteccionista do governo aos grandes agrários e capitalistas. O fascismo lança os fundamentos da organização corporativa com a criação da Federação Nacional dos Produtores de Trigo e da Federação Vinícola, que irão permitir uma mais rápida concentração da propriedade agrícola e o enriquecimento fácil dos grandes senhores da terra, que passam a ser o eixo da nova organização. Os impostos são aumentados. A venda do trigo torna-se um motivo de revolta, não só pelos roubos e escândalos que provoca, como pelos prejuízos evidentes que acarreta aos pequenos e médios camponeses. A Federação Nacional dos Produtores de Trigo, tendo à sua frente os grandes proprietários agrícolas, concentra nas suas mãos o monopólio da compra e venda de trigo, previamente tabelados pelo governo.
A Federação Vinícola obtém o monopólio da compra e venda de vinho, com excepção do vinho do Porto. Ao mesmo tempo que se lança nos mais sujos negócios, fomentando a baixa dos preços numa fase de crises para determinar uma alta de conveniência que levou a um escandaloso enriquecimento de alguns dos mais representativos figurantes do regime — asssinalemos o caso, entre outros, da família Timóteo Pereira — a Federação Vinícola ditou ao governo uma nova política que consistiu na limitação da zona vinheteira, como forma de resolver a crise vinícola.
Para objectivar uma tal política, o governo mandou proceder ao arranque da vinha em certas zonas do país e proibiu a plantação destas noutros terrenos. Estas medidas provocaram a revolta dos camponeses nas regiões atingidas pela acção governativa. Na região de Torres Vedras e noutros pontos da Extremadura e do Ribatejo os camponeses levantaram-se contra as autoridades encarregadas da execução das novas medidas e resistiram violentamente às forças da repressão cuja presença foi requisitada. O governo viu-se forçado a desistir do arranque da vinha.
As crises cíclicas de desemprego no campo, aumentadas pelos efeitos da política fascista e da crise, levedaram novas lutas dos trabalhadores agrícolas do Alentejo, sobretudo do Baixo-Alentejo, onde o Partido havia criado as primeiras organizações e os sindicatos dos trabalhadores rurais, sob a influência dos comunistas, se haviam transformado em centros activos de defesa das massas laboriosas no campo. A luta por «Pão e Trabalho», por melhores salários, por melhores condições de vida, tornaram-se palavras de ordem dos operários agrícolas, mobilizaram-nos e lançaram-nos no combate contra os grandes agrários e o fascismo, forçando estes à aceitação de algumas das suas mais instantes reivindicações.
No conjunto das lutas conduzidas pelo Partido Comunista, merece uma atenção particular a greve de 18 de Janeiro contra os decretos-lei do governo que visavam a fascização dos sindicatos e impunham à classe operária o Estatuto de Trabalho Nacional.
Estabelecendo a nova lei, o governo fazia desaparecer os sindicatos independentes dos trabalhadores, as centrais sindicais, que tão importante papel estavam desempenhando nas lutas sindicais da classe, e em seu lugar impunha a nova orgânica fascista, que tomava os sindicatos órgãos de colaboração da política do governo, submetidos à autoridade deste, através do Subsecretariado das Corporações.
A luta contra tais medidas significava não somente um justificado movimento de protesto dos trabalhadores, mas uma forma activa de defesa da independência das organizações sindicais e de massas, em que se baseia a luta da classe operária contra os seus exploradores. Essas organizações estavam ameaçadas pela acção do fascismo e a sua liquidação repressiva representava um grave prejuízo para a defesa dos interesses das massas laboriosas.
Lutar contra tais medidas, mobilizar os trabalhadores, encarar as formas de acção que permitissem desenvolver a luta de massas, eram tarefas que se impunham ao Partido do proletariado, sob a base da unidade da classe operária. Foi a actividade dos comunistas, sob a direcção de Bento Gonçalves, que levou à formação de uma frente única de luta, na qual participaram além da Comissão Inter-Sindical, a Confederação Geral do Trabalho, os Sindicatos Autónomos e os Sindicatos dos Trabalhadores do Estado.
A unidade das organizações sindicais foi a primeira consequência positiva ante a ofensiva do fascismo. Transplantada para largos sectores da classe operária através da acção dos sindicatos independentes, essa unidade poderia ter sido o caminho para largas acções de protesto, para a mobilização dos trabalhadores, para uma ampla agitação e para formas várias de luta, que aproveitando as condições legais e desenvolvendo uma actividade organizada pudessem conduzir a greves de protesto e manifestações de rua.
Esta foi a orientação delineada, desde o principio, por Bento Gonçalves e apresentada sob a forma de manifesto a dirigir aos trabalhadores pelo Comité de Unidade das organizações sindicais.
Esclarecedora coincidência esta: o extremismo anarquista e pequeno-burguês, que não queria ouvir falar de pactos de unidade com os políticos das classes médias e da pequena burguesia, levava o movimento operário para a prática de uma colaboração activa com esses sectores, sujeitando-se ao seu jogo perigoso, atrelando os trabalhadores ao carro da conspiração reviralhista, tornando-se um instrumento desta.
Se o movimento grevístico se gorasse ou tivesse uma reduzida repercussão, os conspiradores dos golpes de estado preservariam as suas forças para momentos mais oportunos. E foi na realidade o que sucedeu. O «reviralho» ficou adiado para o seu histórico «amanhã».
O 18 de Janeiro revelou a imaturidade política do movimento operário português. Caracterizou-se, é certo, por uma grande dose de coragem e abnegação, mas estas qualidades de pouco valem se não são servidas por um pensamento político realista, se não assentam na experiência da luta de massas, se esta luta não é orientada pela doutrina do proletariado revolucionário, o marxismo-leninismo.
As críticas ao 18 de Janeiro, após prolongadas e agitadas discussões, foram frutuosas para a acção do Partido, para a continuação da luta contra os conceitos pequeno-burgueses, que se expressavam no sectarismo, no terrorismo e no trabalho isolado das massas. Essas críticas foram igualmente frutuosas para a luta contra a influência reviralhista no movimento operário, contra o golpismo e a falta de independência das organizações sindicais e proletárias face aos agrupamentos dos conspiradores reviralhistas, que desejavam transformá-las em trampolim das suas aspirações de poder.
O pensamento anarco-sindicalista recebeu um rude golpe. É certo que a unidade da CGT com a Comissão Inter-Sindical e o Partido Comunista se desfez. As críticas do Partido tocavam fundo os elementos dirigentes da central anarquista. A CGT, seriamente diminuída nos seus efectivos, recebeu no 18 de Janeiro a sua coroa de finados. A guerra civil espanhola dar-lhe-ia ainda algum alento, mas foi a última prova da sua escassa vitalidade. O movimento operário português escapava-lhe definitivamente das mãos. A realidade política nacional, surgida do domínio fascista, encarregou-se de demonstrar que o anarco-sindicalismo tinha feito a sua época e que novos rumos surgiram para o proletariado e as massas trabalhadoras, sob a direcção do Partido Comunista.
Os insucessos do 18 de Janeiro ajudaram o Partido do proletariado a libertar-se dos conceitos estranhos aos interesses da classe operária, a assegurar a sua independência orgânica e de princípios, a definir uma estratégia e táctica ajustadas à realidade nacional, que colocaram, a partir de então, o Partido Comunista e a classe operária na vanguarda do movimento democrático de que são a força fundamental.
Bento Gonçalves tinha ideias objectivas e precisas sobre a reorganização do Partido. Ele baseava a sua acção na grandiosa experiência do Partido Comunista da União Soviética e nos princípios do marxismo-leninismo. O esforço essencial da reorganização voltara-se para a classe operária, mas o Partido criara também as primeiras organizações de camponeses e Bento desenvolveu um esforço pessoal nesse sentido, pois ele sabia que a luta vitoriosa dos trabalhadores assentava sobre a sólida aliança dos operários e camponeses. A juventude comunista foi reorganizada na Federação das Juventudes Comunistas Portuguesas (FJCP) e tornou-se uma força viva entre os jovens trabalhadores. Nas escolas técnicas, liceus e universidades criou-se, em 1932, a primeira organização unitária — os Grupos de Defesa Académica (GDA) — que encontrou um favorável ambiente entre os estudantes e dirigiu várias das suas lutas, incluindo manifestações de rua contra a Ditadura. Foi criada a Liga Contra a Guerra e o Fascismo, que educou homens na luta contra estes dois flagelos da Humanidade,
Bento sabia que a luta da classe operária e das massas trabalhadoras pela conquista do poder pressupunha a participação das forças armadas, dos soldados e marinheiros, ao lado do Povo.
Em 1930 o Partido iniciou a sua actividade entre as forças armadas. Criaram-se as primeiras organizações nos quartéis e na Marinha de Guerra. É sobretudo nesta que se assinalam os maiores êxitos do Partido.
Nos quartéis, o período limitado do serviço militar, a dispersão dos regimentos, as debilidades orgânicas do Partido, a inexperiência dos militantes e a multiplicidade de tarefas a seu cargo não haviam permitido grandes êxitos.
A marinha de guerra, pela própria composição social dos marinheiros e pela sua prolongada permanência no serviço, favorecia uma acção mais efectiva. Em Lisboa estacionava a grande maioria dos elementos chamados às fileiras da Armada. O quartel dos marinheiros ficava perto do Arsenal, donde saíra uma parte do núcleo de comunistas que se lançara com Bento Gonçalves na reorganização do Partido. O contacto não foi difícil. Lançada a semente, o trabalho inicial deu os seus frutos. Criou-se a Organização Revolucionária da Armada (ORA), que ficou sob o controlo directo de Bento Gonçalves. A sua capacidade política manifestou-se igualmente neste trabalho. Bento imprimiu-lhe uma orientação acertada e dedicou-lhe uma atenção especial. A Organização Revolucionária da Armada educou os seus membros dentro do espírito do Partido e das tarefas dos comunistas nas forças armadas.
Força de vanguarda, a ORA tinha como objectivo a defesa dos interesses dos marinheiros, pois nessa actividade residia um meio de educação política, que levava os marinheiros à luta contra as injustiças que os atingiam, contra os actos arbitrários dos oficiais fascistas ou prepotentes, contra a má alimentação, as precárias condições de alojamento, as exigências enxovalhantes de certos trabalhos de bordo, contra o atraso no recebimento do pré e outros motivos de reclamação. Assentando a sua acção na defesa dos mais instantes problemas dos marinheiros, a ORA progrediu rapidamente e pôde ganhar um crédito político crescente, que atemorizou as autoridades fascistas, pois a consciência revolucionária transplantara-se dos marinheiros comunistas e dos simpatizantes para o quadro quase geral da Marinha de Guerra. Os marinheiros conseguiram fazer vingar muitas das suas reivindicações e impuseram em muitas unidades um tratamento respeitoso por parte dos oficiais.
Os quadros fascistas alarmaram-se com a actividade do Partido Comunista entre os marinheiros. O próprio ministro da Marinha de então, Ortins de Bettencourt. fez referência, várias vezes, à acção revolucionária, que ganhara a Armada e se opunha à política de guerra da Ditadura e à criação de uma mentalidade fascista entre os soldados e marinheiros.
Para reforçar os laços de colaboração entre as forças armadas e os trabalhadores, para elevar o grau da sua consciência política, Bento considerou útil a participação da ORA na semana de agitação que o Partido empreendeu em princípios de 1935, com o objectivo de divulgar as palavras de ordem do Partido, de atrair mais a classe operária à sua influência, de reforçar a sua posição de vanguarda.
Enquanto em Lisboa, na zona industrial da Margem Sul e noutros centros operários se procedia à distribuição massiva de agitação — manifestos, tarjetas, cartazes, inscrições, hasteamento de bandeiras vermelhas — os marinheiros estacionados no Porto de Lisboa difundiam a propaganda do Partido nos navios e no quartel de marinheiros ou lançavam-na ao Tejo em boias improvisadas, de modo a torná-la visível dos barcos mercantes, de pesca ou de passageiros que circulavam ou estacionavam no rio. Esta semana de agitação provocou a repressão policial que atingiu também a Organização Revolucionária da Armada. Vários marinheiros foram presos e enviados para a fortaleza de Peniche. Mas a ORA havia ganho raízes e recompôs-se dos golpes sofridos, alargando mesmo a sua organização.
O trabalho do Partido Comunista na Marinha de Guerra contou com um excelente instrumento de acção: o jornal «MARINHEIRO VERMELHO», órgão clandestino da ORA, que surgiu quase desde o começo da organização. Nas suas colunas inseriam-se os problemas relacionados com a situação política nacional, com o domínio fascista e os seus resultados sobre a vida da classe operária e do povo, denunciando-lhe os malefícios, o carácter de classe de modo a tirar as conclusões políticas que interessavam aos filhos do povo chamados a prestar serviço militar na Marinha de Guerra, criando-lhes ao mesmo tempo a noção da necessidade de luta organizada contra um tal regime. Nas páginas do «MARINHEIRO VERMELHO» figuravam os problemas concretos que tocavam de perto os marinheiros, as reivindicações imediatas e os motivos de descontentamento que surgiam a cada passo ditados pela disciplina militar fascista, pelos abusos dos oficiais, pela diferenciação de classes no seio da Marinha de Guerra. A política de guerra dos fascistas, os perigos que oferecia, surgiam em ligação com a necessidade de uma política de Paz, de que a União Soviética era o grande bastião. Defender esse bastião das ameaças que se acumulavam em resultado da conspiração capitalista e da cruzada anti-soviética constituía um dever das forças militares sob a influência do Partido Comunista. Nesse sentido, o «MARINHEIRO VERMELHO» desenvolveu uma consequente acção de esclarecimento que forjou nos militantes da ORA uma noção objectiva de admiração pelas conquistas do povo soviético na construção da sociedade socialista.
Numa corporação que não contava mais de 5000 praças, o «MARINHEIRO VERMELHO» tinha em 1935 uma tiragem de 1000 exemplares, e posteriormente essa tiragem aumentou ainda mais, denunciando a crescente influência do Partido e o alargamento da organização.
A prisão de Bento Gonçalves e do Secretariado do Partido em Novembro de 1935 reflectiu-se grandemente em toda a actividade. Faltou o dirigente mais esclarecido e mais apto, possuidor de uma capacidade política invulgar, que se havia enriquecido com a participação no VII Congresso. Bento Gonçalves acabava de regressar do estrangeiro quando a polícia o deteve. Não pôde por isso transmitir ao Partido essa inestimável recolha de ensinamentos recolhida na grande assembleia de comunistas em Moscovo.
A projecção de Bento Gonçalves no movimento operário português está estreitamente ligada à sua consciência de classe, à sua condição de explorado, que no quadro da vida nacional onde o capitalismo florescia sobre a miséria acrescida dos trabalhadores, soube aperfeiçoar os dotes naturais, pelo desenvolvimento da sua cultura, ganhar o nível de um dirigente comunista dos mais aptos e esclarecidos.
Nascido em 1902, filho de camponeses de Trás-os-Montes, Bento começou a trabalhar aos 12 anos, como aprendiz de torneiro de madeiras, numa oficina do Bairro da Sé, em Lisboa.
Órfão desde tenra idade, recolheu-o uma mulher do Povo, cega e cheia de generosa ternura, que Bento considerava como sua mãe adoptiva. Com ela repartia o salário, servindo-lhe de amparo e estímulo.
O jovem operário deu boa conta de si. Era exemplar no trato, sóbrio e leal. Aprendeu com facilidade a profissão e sentia um imperioso desejo de saber. Fizera o exame de instrução primária, mas os seus interesses não se acomodavam à vida diária uniforme. Já operário arsenalista resolveu matricular-se na escola industrial Afonso Domingues, onde frequentou o curso nocturno. Estudava com uma vontade invulgar e em tais condições de aproveitamento, que chamou sobre si a atenção dos professores e estudantes.
No Arsenal da Marinha, o jovem foi igualmente alvo de simpatia. Bento amava a sua profissão de torneiro mecânico e nela revelou excelente capacidade manual. Num meio onde os operários haviam ganho uma consciência política activa. Bento foi assimilado pelo ambiente. A sua capacidade profissional ligada aos rápidos progressos da sua consciência política elevaram-no no consenso geral dos seus companheiros, que o elegeram para dirigente do seu sindicato. Neste cargo Bento Gonçalves deu elevadas provas do seu devotamento aos trabalhadores, da sua capacidade de organizador, de dirigente sindical, de activista, que encara a multiplicidade de tarefas de um sindicato, para melhor servir os interesses da classe operária.
A biblioteca do sindicato, que ele enriqueceu com a compra de novos livros, tomou-se-lhe familiar. Aí tomou contacto com os problemas do socialismo, estudou os livros marxistas, apoderou-se das questões teóricas essenciais que se colocavam ao movimento operário português.
Se a actividade sindical foi a sua grande escola, a viagem que fez à União Soviética, em 1927, como membro de uma delegação de operários arsenalistas, para participar nas comemorações do 10.° aniversário da grande Revolução de Outubro, transformou-se num acontecimento decisivo da sua vida. No regresso pediu a adesão ao Partido Comunista, através da célula do Arsenal da Marinha. Rapidamente se viu contra a direcção oportunista do Partido.
Os quadros superiores do Arsenal da Marinha tentaram desviar Bento Gonçalves do caminho da luta. Insistiram várias vezes para que ele aceitasse o cargo de mestre, na secção onde trabalhava. Bento sempre recusou. Ele não podia imaginar-se no exercício dessa ingrata missão, nas condições em que era exercida no Arsenal. Uma tal atitude reforçou ainda mais os laços que prendiam Bento aos seus companheiros de trabalho.
Em 1931 a polícia política salazarista dirigiu-se ao Arsenal da Marinha para prender Bento Gonçalves. Os operários tomaram imediatamente conhecimento do que se passava. O trabalho parou e os trabalhadores acorreram em massa ao local onde se encontravam os agentes, que deviam conduzir Bento à prisão.
Nesse mesmo ano Bento foi deportado pela primeira vez. A bordo do navio que o conduzia aos Açores, o militante operário escutava, encostado à amurada, uma conversa que lhe despertava o interesse. Um ex-ministro das finanças da República, deportado como ele, discutia com um grupo de correligionários sobre a situação económica do país, sobre a política financeira. Bento não fazia parte do grupo. Limitava-se a ouvir. Mas a conversa interessava-o de sobremaneira. O ex-ministro expressava ideias que se encontravam em antagonismo com os pontos de vista de Bento. Este hesitou mas resolveu-se a intervir. Por que não?
O ex-ministro olhou-o com ironia e pretendeu desarmá-lo. Mas Bento não era homem para se deixar intimidar ou vencer com tais processos. Foi claro e preciso. O círculo que o escutava perdeu o ar irónico.
O ex-ministro viu-se em face de um argumentador esclarecido. Sentiu-se entre confundido e admirado. Com espanto dos seus correligionários afirmou: — Não sabia que a classe operária tinha homens com a sua cultura e a sua capacidade.
Dos Açores, Bento Gonçalves segue para as ilhas de Cabo Verde.
É encerrado com outros antifascistas no campo de concentração da Ilha do Fogo, onde habitará a pequena vila de S„ Filipe. Estuda sempre. Está ao corrente da situação do movimento operário nacional e internacional.
Em toda a parte onde a sua presença surge Bento faz-se amar e respeitar. A sua cultura e a sua capacidade são por demais evidentes.
Deportado sem julgamento, sem condenação, por puro arbítrio, Bento voltou à liberdade em Fevereiro de 1933, para se integrar na luta, para ajudar o Partido a avançar.
Este homem de estatura mediana, de rosto anguloso e sardento, de cabelos ruivos, que marchava com um andar pesado, possuía uma vontade indomável. Não se sabia adaptar à rotina, e o seu dinamismo, que nada tinha de irreflectido, levava-o a um progresso contínuo no alargamento da sua cultura.
Frequentou o escola naval e obteve o diploma de piloto. Este facto nada teria de excepcional, se nele, também, as qualidades superiores de Bento se não revelassem. Concluído o curso quis fazer o seu primeiro ensaio. Rumo à Madeira, a bordo de um navio, ele havia já calculado tudo com a sua precisão de matemático: tantas horas de viagem, por x de combustível. Os colegas experimentados na carreira, riram-se da sua ousadia. Decidiram-se pela prova, depois de animada discussão. A justeza do cálculo de Bento mostrou-se exemplar.
Apesar do êxito não se sentiu atraído para a vida do mar. A actividade política, a luta pela emancipação dos trabalhadores tinham-no ganho inteiramente.
Para construir o Partido não se poupou aos momentos mais difíceis. Abandonou o Arsenal da Marinha para se tornar um revolucionário profissional, integrado nessa tarefa com apaixonante devotamento. Não media os sacrifícios. Percorria a pé distâncias incalculáveis, mal alimentado, mal vestido, os sapatos rotos, o ar fatigado e mal cuidado, para o trabalho de controlo e de organização, gastando o tempo de marchas prolongadas em longas conversas de carácter político, que armavam os camaradas para o cumprimento das suas tarefas e faziam crescer o Partido.
Calcorreava Lisboa, deslocava-se à região do Sado, à zona industrial da Margem Sul, descia ao Alentejo, onde, pela noite, reunia com os trabalhadores rurais nos montados, para os esclarecer e orientar, subia ao Porto, onde se juntava ao núcleo de camaradas que se lançaram na reorganização do Partido.
Mal alojado, escrevia os artigos teóricos que jogavam na estruturação do Partido, na batalha política contra as tendências oportunistas e de «esquerda», o papel de ponta de lança e de definidores de princípios. Esses artigos surgiram primeiro no «Proletário», durante o período da sua publicação legal, no Porto, e depois de 1931 no «Avante!», que se tornou o órgão central do Partido, sob a direcção de Bento Gonçalves.
No meio da sua actividade absorvente estudava com aturada persistência. Aprendera, pelo esforço pessoal, o espanhol e o francês e essas duas línguas permitiam-lhe aprofundar os seus conhecimentos do marxismo-leninismo. Gastava em livros, durante os últimos anos do Arsenal da Marinha, tudo o que lhe sobrava do seu salário e dos gastos com a sua existência mais do que modesta. O socialismo científico tornou-se-lhe familiar. Dominou-o com agudeza de raciocínio e profundidade. Soube orientar-se por ele e torná-lo uma ciência viva quer na elaboração da linha política do Partido quer na análise dos fenómenos políticos nacionais e internacionais.
Em 1935 participou no VII Congresso da Internacional Comunista. O seu relatório a esta magna assembleia assinala importantes progressos registados na actividade do Partido.
O VII Congresso foi um acontecimento de extraordinária projecção no movimento comunista internacional. Ele definiu uma linha política, adaptada às novas condições provocadas pela ofensiva da reacção, pelo avanço do fascismo, pela ameaça de um conflito mundial.
Bento Gonçalves levou a esta assembleia dos comunistas a experiência do Partido na condução da luta da classe operária, camponeses, intelectuais e juventude pela defesa dos seus interesses. Situou essa luta na conjuntura fascista, definiu o carácter de classe desta, assinalou as mudanças que se operaram no panorama político nacional, para acentuar o crescente papel que nele tinha o partido do proletariado, enquanto a influência do anarco-sindicalismo se esbatia, perdendo a função dominante que tivera entre a classe operária.
Ao definir as tarefas que se colocavam ao Partido Comunista, Bento Gonçalves não se esqueceu de assinalar a que diz respeito à luta contra o imperialismo e em defesa dos povos coloniais.
«É preciso também que consagremos uma atenção particular ao trabalho anti-imperialista do ponto de vista da luta contra a submissão política e económica de Portugal à Inglaterra — afirmou Bento na tribuna do VII Congresso — e ao mesmo tempo vencer as debilidades da nossa actividade em relação à luta pela defesa dos interesses dos povos coloniais oprimidos pelo imperialismo português, ajudá-los a conduzir a luta à sua libertação completa».
A 11 de Novembro de 1935, mal chegado ainda do VII Congresso, Bento Gonçalves é preso em Lisboa. O governo apressou-se a enviá-lo para a fortaleza de S. João Baptista, tenebroso bastião do fascismo, onde o manteve em completo isolamento. Julgou-o quase secretamente numa pequena sala da prisão dos Açores, para que o eco da sua voz não repercutisse entre a classe operária e os trabalhadores portugueses. Mas no silêncio da sua cela Bento pôde elaborar uma contestação escrita, que enviou ao tribunal e que permanece como um documento histórico da sua corajosa posição de comunista, diante dos juízes que o condenaram.
«A ilegalidade do nosso Partido — escreveu Bento Gonçalves — não se encontra prescrita em qualquer lei. A ilegalidade do Partido Comunista Português é um arbítrio do poder executivo ditatorial do Estado Novo.»
E mais adiante, assinalando o esforço progressivo de gerações que se celebrizaram na História Pátria, definindo as lutas de classes que provocaram as grandes mudanças na sociedade portuguesa, Bento Gonçalves concluía com justificado orgulho de patriota e de comunista:
«O Partido Comunista é o herdeiro das tendências liberais e dos valores intelectuais progressivos do povo português.»
Condenado a 4 anos de prisão pelo Tribunal Militar Especial, Bento passa da Fortaleza de S. João Baptista, para o Campo da Morte Lenta do Tarrafal, onde chegou a 29 de Outubro de 1936, no fundo dos porões do velho paquete «Luanda», com perto de 200 presos políticos.
Ia começar um dramático capítulo da sua vida, o final da sua generosa luta, pela emancipação dos trabalhadores, pelo triunfo do socialismo.
Partindo do conhecimento do marxismo-leninismo, Bento penetrou noutras ciências. A economia política apaixonou-o. Estudou «O Capital» de Marx, que se tornou uma pedra angular da sua cultura e lhe permitiu compreender os fenómenos do capitalismo português e da economia capitalista contemporânea.
Com a bússola do marxismo empreendeu o estudo da História de Portugal. Dela tinha um conhecimento profundo. Não pudera realizar investigação histórica, mas soubera interpretar, com a ajuda do materialismo histórico, a longa cadeia de acontecimentos que vinham da formação da nacionalidade até à época contemporânea.
Estudou matemática, álgebra superior. A sua intuição de auto-didacta levava-o a pesquisar o sentido prático das ciências que estudava. Assim agiu em relação à matemática, cujos fundamentos devassou, para lhe encontrar a base objectiva e real. O mesmo fez em relação ao estudo da física, que o interessou sobremaneira. Esta ciência era-lhe igualmente familiar. Durante os anos de prisão no campo do Tarrafal lançou-se ao estudo da física nuclear, da teoria dos dois infinitos e da teoria dos quanta, aprofundando ainda mais os seus conhecimentos, que planavam a um nível superior.
A biologia absorvera-lhe igualmente a atenção. Estudou-a com afinco e profundidade, de modo a encontrar-se apto à compreensão dos fenómenos que se colocavam aos especialistas da matéria. É difícil determinar em que época Bento Gonçalves iniciou os seus estudos de biologia, mas é possível precisar que nos últimos anos da sua vida esta ciência o interessara tanto como a física ou a matemática e que dela tinha um conhecimento vasto e ordenado, que lhe permitia deter-se sobre as lições de biologistas consagrados., para em sua volta tecer longos comentários.
Durante o tempo que permaneceu isolado numa cela da Fortaleza de S. João Baptista aprendeu sozinho o alemão. No campo do Tarrafal iniciou o estudo do inglês. Vinte e um dias depois fazia a primeira tradução de um artigo de uma revista.
À sua inteligência de execução juntava-se uma capacidade de trabalho fora do comum. Resistia horas sucessivas mergulhado na actividade intelectual, estudando e escrevendo, nas condições mais precárias, abstraindo-se do que se passava à sua volta, esquecido de si mesmo, até para as funções imediatas inevitáveis, como o comer e dormir. Era uma peça única de cérebro e vontade, agindo em bloco e penetrando no fundo das situações, dos factos científicos ou políticos.
Infelizmente, a vastidão dos seus conhecimentos, a sua profunda inteligência não deixaram uma obra escrita correspondente à sua capacidade e ao vasto saber. A classe operária, o Partido do proletariado, o marxismo-leninismo viram-se privados de uma contribuição que honraria o tesouro comum da classe operária internacional e elevaria o nível político do nosso combate em Portugal.
As suas qualidades de carácter, o traço moral da sua vida marchavam paralelamente com o valor da sua inteligência e com a sua tenacidade.
Nos seis anos passados no Tarrafal, nas mais difíceis condições de repressão e de terror, Bento Gonçalves manteve uma inteireza de atitudes que o impuseram até aos olhos dos próprios carrascos. Suportou tudo com a grandeza de um combatente que tem a noção exacta dos intentos do inimigo e sabe que ele se empenha em consumar os seus planos criminosos. Nesse antro de premeditadas brutalidades que foi o Campo da Morte Lenta do Tarrafal, Bento encontrou-se sempre no primeiro plano das acções de protesto, das reivindicações dos presos, na busca de soluções para intrincados problemas que urgia resolver, contrariando a acção concertada da direcção do campo e dos carcereiros. Nunca renunciou a essa difícil e perigosa tarefa. Nas situações mais complexas e explosivas, Bento sabia erguer a sua voz e actuar com firmeza e equilíbrio. Mas nunca o fazia sem consulta prévia aos camaradas.
A simplicidade e modéstia eram traços marcados da sua personalidade. Impunha-se pela conduta e pelo saber. Ao seu lado ninguém se sentia diminuído e se a timidez tomava alguns dos que dele se acercavam, era uma atitude momentânea, que desaparecia logo que a conversa se prolongava. Nele não havia atitudes autoritárias ou sobranceiras. Sabia ouvir e sabia explicar, falando à razão com argumentos convincentes.
Em sua actividade de dirigente, Bento tomou-se notável pela sua atenção e carinho pelos quadros, pelos homens que se mostravam aptos ao trabalho político. A sua presença fraterna posta na solução dos problemas práticos e na elevação do nível teórico tomou-se uma constante da sua actividade. Tinha um raro talento de saber determinar o valor dos militantes e de elevar as suas qualidades ao nível de uma consciência política de vanguarda e do trabalho de direcção.
Bento era um homem seguro de si. Em circunstância nenhuma voltava as costas às dificuldades. Confiava na sua capacidade para vencer para ultrapassar obstáculos. Quando discutia, quando tinha de confrontar opiniões, argumentava com uma lucidez a que não faltava entusiasmo, mas onde havia sobretudo a segurança no seu saber.
A sua moral de comunista manifestava-se no profundo sentimento de solidariedade que o animava. Solidário para com os seus camaradas, para com os companheiros de trabalho ou de prisão.
Bento Gonçalves morreu aos 40 anos. Aos 26 iniciava a reorganização do Partido. Aos 27 era eleito secretário geral. Entre o início da sua actividade, em 1928, e a sua última prisão, em Novembro de 1935, medeia um escasso período de 7 anos, entrecortado pela deportação para os Açores e Cabo Verde.
Rico e trabalhoso período!
As tarefas que Bento empreendeu, a obra que realizou com a colaboração do núcleo de comunistas que em começos de 1929 não iam além de quarenta, revelaram um esforço e uma capacidade invulgares.
Foi ainda com o seu apoio e sob a sua orientação, mesmo nas condições de encarceramento, que se iniciou a reorganização de 1940-41, numa fase difícil da vida do Partido.
Aos 40 anos, Bento estava em plena maturidade política. Era um dirigente provado e reflectido, gozando de autoridade e prestígio, forjado nas mais difíceis condições, possuindo qualidades excepcionais.
O crime que roubou ao Partido, ao proletariado revolucionário, um filho seu, dos mais lúcidos, dos mais capazes, dos mais fortemente enraizados na luta, é um crime monstruoso, que manterá presente na memória de gerações que lutam pelo socialismo, a violência e a bestialidade do regime fascista.
Perda irreparável de um sábio timoneiro, do forjador do nosso Partido!
Bento Gonçalves não preencheu apenas um período crucial da luta da classe operária portuguesa. Exemplo das grandes virtudes do proletariado revolucionário, armou este com os instrumentos mais activos da sua libertação: a sua vanguarda de luta, a teoria do marxismo-leninismo e apontou-lhe o caminho que conduz à sua emancipação completa.
Hoje, tudo o que a classe operária possui de mais consciente, milhares e milhares de trabalhadores da cidade e do campo, milhares de jovens ardorosos, milhares de mulheres que labutam e sofrem, os melhores valores da Literatura, da Ciência e da Arte, voltam a sua atenção e a sua confiança para o Partido a cuja organização Bento Gonçalves deu contribuição decisiva.
Nas mais duras batalhas, ao preço de sacrifícios ignorados e anónimos, de uma tenacidade que é condição para os grandes combates, de um devotamento inspirado em grandes exemplos, o Partido do proletariado mergulhou fundo as suas raízes nas massas trabalhadoras, tornou-se mais forte e experiente.
Marcha hoje na vanguarda da luta contra a ditadura fascista, pela conquista da Democracia, pelo triunfo do Socialismo, orientado pela doutrina do marxismo-leninismo, fiel ao grande exemclo de Bento Gonçalves.
Inclusão | 12/04/2014 |