MIA > Biblioteca > Stálin > Novidades
17 de janeiro
Camaradas: É comum que os nossos oradores, nas reuniões em que se discute este problema, comecem pela sua história: como surgiu o problema da democracia no seio do Partido, quem primeiro disse A, quem depois disse B, etc.. Creio que este método não nos serve, porque contém elementos de intriga, dá motivo a acusações recíprocas e não produz nada de positivo. Creio que seria muito melhor começarmos com o exame de como o Partido acolheu a resolução do Birô Político sobre a democracia[N2], resolução aprovada em seguida pelo Pleno do C.C.
Devo dizer que esta resolução é talvez a única na história do nosso Partido que, depois de encarniçada discussão sobre a questão da democracia, encontrou aprovação completa — diria, literalmente unânime — de todo o Partido. Até mesmo as organizações e as células oposicionistas, que, em geral estavam contra a maioria do Partido e contra o C.C., até mesmo estas, não obstante todo o seu desejo de procurar pretextos, não tiveram ocasião nem motivo para descobri-los. Em geral, essas organizações e células reconheceram, nas suas resoluções, que as teses fundamentais da resolução do Birô Político sobre a democracia interna do Partido eram justas, porém quanto ao resto, procuravam distinguir-se de algum modo, das outras organizações, com pequenos adendos, como, por exemplo: sim, tudo está bem na vossa resolução, mas não deveis ofender Trotski; ou então: tudo o que dissestes é justo, mas estais com algum atraso, e melhor seria que tudo isso tivesse sido feito antes. Não abordarei aqui a questão de saber quem ofende e quem é o ofendido. Pensando bem, cabe dizer de Trotski o que se diz de Tit Titítch.[N3] "Quem te ofende, Tit Tititch? Tu, sim, é que és capaz de insultar todo o mundo". (Risos). Mas, eu já disse que não me vou estender sobre esta questão. Chego mesmo a admitir que alguém possa falar mal de Trotski. Seria esta, por acaso, a questão? Teria alguma coisa a ver com princípios esta questão? Do que se trata aqui é da resolução, do ponto-de-vista dos princípios, e não de quem ofende e de quem é ofendido. Quero dizer com isso que nem mesmo as células e as organizações oposicionistas mais definidas e violentas se decidiram a fazer qualquer objeção de princípio à resolução do Birô Político do C. C. e do Presidium da Comissão Central de Controle. Devo salientar este fato para frisar uma vez mais que é difícil encontrar em toda a história do nosso Partido caso semelhante, em que uma resolução, que passou pela prova de fogo de uma discussão encarniçada, tenha encontrado, não só entre a maioria, mas literalmente em todo o Partido, uma aprovação tão unânime.
Tiro daí duas conclusões. A primeira é que a resolução do Birô Político e da Comissão Central de Controle responde plenamente às exigências e às necessidades do Partido, no momento atual. A segunda conclusão é que o Partido sairá dessa discussão sobre a democracia interna ainda mais forte e unido. Esta conclusão atinge em cheio as pessoas que nos são hostis e que, no estrangeiro, de há muito esfregam as mãos de alegria, supondo que a nossa discussão terá como conseqüência o debilitamento do nosso Partido e a desagregação do Poder.
Não me alongarei sobre a essência da democracia interna do Partido. As bases desta democracia estão expostas na resolução; a resolução foi discutida sob todos os prismas por todo o Partido. Por que razão deveria eu repeti-las aqui? Direi apenas urna coisa: que evidentemente não haverá uma democracia ampla, uma democracia completa. Evidentemente, essa democracia não ultrapassará os limites traçados pelos X, XI e XII Congressos. Sabeis muito bem que limites são esses e, por isso, não os repetirei aqui. Tampouco me estenderei para explicar que a garantia fundamental de que a democracia interna do Partido se torne para o nosso Partido carne da sua carne e sangue do seu sangue consiste em acentuar a atividade e em reforçar a consciência das massas do Partido. Também disso fala a nossa resolução com pormenores suficientes.
Passo a outra questão: alguns camaradas e algumas organizações transformam em fetiche o problema da democracia, considerando-o como qualquer coisa de absoluto, fora do tempo e do espaço. Quero dizer com isso que a democracia não é algo dado de uma vez para sempre, para todos os tempos e condições, pois há momentos em que não é possível nem justo exercê-la. Para que ela, a democracia interna do Partido, se torne possível, são necessárias duas condições ou duas séries de condições externas e internas, sem as quais é inútil falar de democracia.
É necessário, em primeiro lugar, que a indústria se desenvolva, que não piore a situação material da classe operária, que a classe operária cresça numericamente, que o seu nível cultural se eleve e que ela se desenvolva também qualitativamente. É necessário que o Partido, como vanguarda da classe operária, também cresça, sobretudo qualitativamente e em primeiro lugar graças ao ingresso, nele, dos elementos proletários do país. Estas condições de caráter interno são absolutamente necessárias para que se possa levantar o problema da aplicação efetiva, e não formal, da democracia interna do Partido.
Mas estas condições, por si sós, não bastam. Já disse que há uma segunda série de condições, de caráter externo, sem as quais se torna impossível a democracia interna do Partido. Refiro-me a certas condições internacionais, que assegurem mais ou menos a paz, o desenvolvimento pacífico, sem o qual é inconcebível a democracia no Partido. Noutras palavras: se fôssemos atacados e tivéssemos de defender o país de armas na mão, não se poderia falar de democracia, posto que seria necessário limitá-la. O Partido seria mobilizado, provavelmente o militarizaríamos, e deixaria de existir por si mesma a questão da democracia no Partido.
Creio, por isso, que a democracia deve ser considerada de acordo com as condições e que não deve haver fetichismo nas questões relativas à democracia interna no Partido, porque o exercício da democracia interna no Partido depende, como vedes, das condições concretas de tempo e de lugar em cada momento dado.
Para que não haja entusiasmos sem motivo nem acusações infundadas, devo relembrar os obstáculos que surgem diante do Partido na aplicação da democracia, obstáculos que impedem a aplicação da democracia, mesmo quando existem as duas principais condições favoráveis, internas e externas, acima descritas. Camaradas, esses obstáculos existem, exercem profunda influência sobre o nosso trabalho de partido e não tenho o direito de passar sobre eles em silêncio. Em que consistem esses obstáculos?
Esses obstáculos, camaradas, consistem em primeiro lugar no fato de que nas cabeças de uma parte dos nossos militantes ainda persistem sobrevivências do velho período de guerra, quando o Partido estava militarizado, sobrevivências que geram certas concepções não marxistas, segundo as quais o nosso Partido seria não um organismo dotado de iniciativa própria, com sua vida ideológica e prática independente, mas uma espécie de sistema de instituições, inferiores, médias e superiores. Este ponto-de-vista, absolutamente não marxista, não assumiu, é verdade, em parte alguma, uma forma acabada, não foi expresso em nenhum lugar em toda plenitude, muito embora elementos desta concepção subsistam nas cabeças de uma parte dos nossos militantes que ocupam postos no Partido e os impeçam de aplicar de modo coerente a democracia no seio do Partido. Por isso, a luta contra tais concepções, a luta contra as sobrevivências do período de guerra nas organizações centrais, assim como nas organizações locais, é uma tarefa atual do Partido.
O segundo obstáculo que se ergue no caminho da aplicação da democracia no Partido é a pressão exercida pelo aparelho burocrático estatal sobre o aparelho do Partido, sobre os nossos militantes. A pressão desse enorme aparelho sobre os nossos quadros nem sempre é perceptível, nem sempre salta à vista, mas nem por isso se interrompe por um só momento. Esta pressão maciça do aparelho burocrático estatal se revela no final de contas no fato de que alguns dos nossos funcionários, tanto nas organizações centrais como nas locais, com freqüência sem o querer e de modo por completo inconsciente, se distanciam da democracia interna do Partido, da linha em cuja justeza acreditam, mas que muitas vezes são incapazes de aplicar conseqüentemente. Podeis imaginar o aparelho burocrático estatal, que conta com nada menos de um milhão de empregados, composto de elementos na maioria estranhos ao Partido, e o nosso aparelho de Partido, que não tem mais de vinte ou trinta mil pessoas, com a missão de subordinar ao Partido o aparelho estatal, com a missão de torná-lo um aparelho socialista. Que valor tem o nosso aparelho estatal sem o apoio do Partido? Sem a ajuda, sem o apoio do nosso aparelho de Partido, vale, infelizmente, muito pouco. E eis que, toda vez que o nosso Partido mergulha em todos os ramos da administração estatal, vê-se obrigado, com freqüência, a imprimir ao seu trabalho de partido nestes organismos a mesma orientação que adotam na sua atividade os aparelhos do Estado. Concretamente: o Partido deve desenvolver o trabalho para educar politicamente a classe operária, para tornar mais profunda a sua consciência, e, ao mesmo tempo, é necessário recolher o imposto em espécie, realizar uma determinada campanha, pois sem tal campanha e sem a ajuda do Partido os organismos estatais não podem cumprir a sua missão. Aqui os nossos funcionários se encontram entre dois fogos: entre a necessidade de corrigir a linha do trabalho dos organismos estatais, que agem à maneira antiga, e a necessidade de manter a sua ligação com os operários. E freqüentemente eles mesmos se burocratizam.
Esse é o segundo obstáculo, difícil de vencer, mas que deve ser vencido, custe o que custar, para facilitar o exercício da democracia interna do Partido.
Finalmente, existe um terceiro obstáculo no caminho da realização da democracia, e este é o baixo nível cultural de uma série de organizações nossas, das nossas células, particularmente nas regiões periféricas (não o tomem a mal), que impede as nossas organizações de aplicar conseqüentemente a democracia no seio do Partido. Sabeis que a democracia exige um mínimo de cultura dos membros da célula e de toda a organização e a existência de um mínimo disponível de militantes ativos, que possam ser eleitos e designados para os diversos cargos. Mas, se na organização não se conta com esse mínimo de militantes ativos, se o nível cultural da própria organização é baixo, que se deve fazer? Naturalmente, nestes casos, é preciso afastar-se da democracia, é preciso recorrer à nomeação dos dirigentes, etc..
Tais são os obstáculos que surgem diante de nós, que continuarão a surgir e que devemos superar para exercer honesta e conseqüentemente a democracia interna do Partido. Relembrei-vos os obstáculos que surgem diante de nós, bem como as condições externas e internas sem as quais a democracia se torna uma vazia palavra demagógica, porque alguns camaradas fazem da democracia um fetiche, uma entidade absoluta, pensando que a democracia é possível sempre e sob todas as condições e que o único obstáculo à sua aplicação é a "má" vontade dos "burocratas do Partido". Para refutar este ponto-de-vista idealista, alheio a nós, não marxista, não leninista, relembrei, camaradas, as condições necessárias ao exercício da democracia e os obstáculos que surgem diante de nós no momento atual.
Talvez pudesse, camaradas, terminar aqui o meu Informe, mas creio que devemos fazer o balanço da discussão e tirar deste balanço algumas conclusões, que podem ter para nós grande importância. Poderia dividir toda a nossa luta, no curso da discussão sobre a democracia interna, em três períodos.
O primeiro período foi aquele em que a oposição atacou o C. C. e o acusou de ter seguido nos últimos dois anos e, em geral, no período da N.E.P., uma linha por completo errada. Esse foi o período que precedeu a publicação da resolução do Birô Político e do Presidium da Comissão Central de Controle. Não vou tratar aqui de quem tinha razão e de quem não tinha. Os ataques foram ásperos e, como sabeis, nem sempre justificados. Mas uma coisa é clara: esse pode ser caracterizado como o período em que a oposição desferiu os seus mais fortes ataques contra o C.C.
O segundo período começou no momento da publicação da resolução do Birô Político e da Comissão Central de Controle, quando a oposição foi obrigada a contrapor à resolução do C.C. alguma coisa de orgânico, de concreto, e não achou nada, nem de orgânico nem de concreto. Foi esse o período de maior aproximação entre o C. C. e a oposição. A situação, evidentemente, evoluía ou podia evoluir para uma certa reconciliação da oposição com a linha do C.C. Recordo bem que, em Moscou, no ponto culminante de uma discussão encarniçada, a 12 de dezembro, parece-me, Preobrazhenski propôs na reunião da Sala das Colunas uma resolução que, por motivo que ignoro, foi rejeitada e que divergia pouco da resolução do C.C. Em essência e também em alguns pontos de secundária importância, esta resolução não divergia de modo algum da resolução do C. C. E então me pareceu que no fundo talvez não houvesse mais razão para continuar a luta: tínhamos a resolução do C.C. que, pelo menos em nove décimas partes, satisfazia a todos; a própria oposição, segundo parecia, compreendia desse modo as coisas e vinha ao nosso encontro, e talvez fosse possível pôr fim às divergências. Foi o segundo período, o período de conciliação.
Mas veio em seguida o terceiro período. Este período se iniciou com a intervenção de Trotski, com o seu apelo às organizações distritais, que eliminou num abrir e fechar de olhos a tendência para a conciliação e virou tudo de cabeça para baixo. A intervenção de Trotski assinalou o início de um período de luta encarniçadíssima no seio do Partido, luta que não se teria verificado, não fosse a carta de Trotski, no dia seguinte ao seu voto favorável à resolução do Birô Político. Sabeis que à primeira intervenção de Trotski seguiu-se outra e ainda uma terceira, em conseqüência do que a luta se tornou mais áspera.
Creio, camaradas, que, nessas intervenções, Trotski cometeu pelo menos seis erros graves, que levaram ao recrudescimento da luta no seio do Partido. Passo a analisá-los.
O primeiro erro de Trotski consiste no próprio fato de ter publicado o seu artigo no dia seguinte ao da publicação da resolução do Birô Político do Comitê Central e da Comissão Central de Controle, artigo que não pode ser considerado senão como uma plataforma contrária à resolução do C. C. Repito e friso que foi um artigo que não se pode considerar senão como uma nova plataforma contrária à resolução do C.C., que fora aprovada por unanimidade. Pensai um pouco, camaradas: certo dia se reúnem o Birô Político e o Presidium da Comissão Central de Controle para discutir a resolução sobre á democracia interna do Partido; a resolução é aprovada por unanimidade, e apenas um dia depois, independentemente do C.C., contra a vontade do C.C., passando por cima do C.C., é enviado às organizações distritais o artigo de Trotski, isto é, uma nova plataforma, que levanta mais uma vez a questão do aparelho e do Partido, dos quadros e da juventude, das frações e da unidade do Partido, etc., etc., plataforma que toda a oposição apóia e se contrapõe à resolução do C. C. Não se pode considerar isso senão como uma oposição ao Comitê Central. Assim Trotski se contrapõe aberta e bruscamente a todo o Comitê Central. Ao Partido se apresentou a questão: existe entre nós um Comitê Central, como órgão dirigente, ou já não existe? Existe um C.C. cujas decisões unânimes devem ser respeitadas pelos membros deste C.C. ou apenas existe um super-homem, que está acima do C.C. um super-homem para o qual não foram escritas leis, que pode permitir-se votar hoje pela resolução do C.C e amanhã publicar e apresentar uma nova plataforma contra esta resolução? Camaradas, não se pode pretender que os operários se submetam à disciplina do Partido quando um membro do C.C. ignora abertamente, aos olhos de todos, o Comitê Central e a sua resolução aprovada por unanimidade. Não pode haver duas disciplinas diversas: uma para os operários e outra para os grão-senhores. A disciplina deve ser uma só.
O erro de Trotski consiste justamente em ter oposto a sua própria pessoa ao C.C. em julgar-se um super-homem, acima do C.C. das suas leis, das suas decisões, dando assim pretexto a uma parte do Partido para desenvolver atividade tendente a minar a confiança no C.C
Certos camaradas manifestaram descontentamento, porque esse ato de Trotski, dirigido contra o Partido, foi denunciado em alguns artigos da "Pravda" e por alguns membros do C.C. Devo responder a estes camaradas que nenhum partido poderia respeitar um C.C. que, em semelhante momento difícil, não se revelasse capaz de defender a dignidade do Partido, quando um membro do C.C. procura colocar-se acima de todo o C.C. O C.C. cometeria um suicídio moral se deixasse passar em silêncio essa tentativa de Trotski.
O segundo erro cometido por Trotski consiste em se ter comportado, durante todo o período da discussão, de modo equívoco, ignorando, com desfaçatez, a vontade do Partido, que desejava conhecer a sua verdadeira posição, e se esquivando diplomaticamente à pergunta formulada sem rodeios por várias organizações: com quem, afinal, está Trotski, com o C.C. ou com a oposição? Não se abre uma discussão para recorrer a subterfúgios, mas para expor franca e honestamente diante do Partido toda a verdade, como o sabe fazer Ilitch, como todo bolchevique tem o dever de fazer. Dizem que Trotski está gravemente enfermo. Admitamo-lo. Mas durante a sua enfermidade ele escreveu três artigos e mais quatro capítulos do seu folheto hoje publicado. Não é porventura claro que Trotski pode perfeitamente escrever duas linhas às organizações que lhe perguntam se ele é a favor da oposição ou contra a oposição? Há necessidade de provar que esse menosprezo pela vontade expressa dessas organizações não poderia deixar de aguçar a luta no seio do Partido?
O terceiro erro cometido por Trotski consiste em ter contraposto, nas suas intervenções, o aparelho do Partido ao próprio Partido, lançando a palavra de ordem da luta centra os "burocratas do aparelho". O bolchevismo não pode aceitar a contraposição do Partido ao aparelho do Partido. De que se compõe, na realidade, o nosso aparelho de partido ? O aparelho do Partido se compõe do C.C., dos comitês regionais, dos comitês provinciais e dos comitês distritais. Esses comitês estão subordinados ao Partido? Certamente, pois noventa por cento dos seus membros são eleitos pelo Partido. Incorrem em erro os que dizem que os comitês provinciais são constituídos por nomeação. Não têm razão ao afirmá-lo. Sabeis, camaradas, que no nosso Partido os comitês provinciais são eleitos, do mesmo modo que os comitês distritais e o C.C. Estão subordinados ao Partido. Mas, uma vez eleitos, devem dirigir o trabalho: eis o nó da questão. De que modo se poderia conceber o trabalho de partido se, uma vez eleito o C.C. pelo Congresso, ou o comité provincial pela Conferência Provincial, o C.C. e o comité provincial não dirigissem o trabalho? Sem isso o nosso trabalho de partido seria inconcebível. É um modo de ver irresponsável, anarco-menchevique, que nega o próprio princípio da direção do trabalho de partido. Temo que Trotski, que não pretendo, certamente colocar no mesmo plano dos mencheviques, contrapondo desse modo o aparelho do Partido ao próprio Partido, anime certos camaradas menos experimentados a adotarem o ponto-de-vista do relaxamento anarco-menchevique e da desordem em matéria de organização. Temo que esse erro de Trotski exponha aos ataques dos membros menos experimentados do nosso Partido todo o aparelho do Partido, aparelho sem o qual não se pode conceber o Partido. O quarto erro cometido por Trotski consiste em ter contraposto os jovens aos quadros do nosso Partido, em haver lançado a acusação infundada de degeneração dos nossos quadros. Trotski pôs o nosso Partido no mesmo plano do Partido Social-Democrata alemão, citou exemplos de degeneração de alguns discípulos de Marx, velhos social-democratas, e daí tirou a conclusão de que também os nossos quadros de partido se acham diante de um semelhante perigo de degeneração. No fundo, faz rir este membro do C.C., que ainda ontem lutava contra o bolchevismo, de braço dado com os oportunistas e os mencheviques, e que hoje, no sétimo ano de existência do Poder Soviético, procura afirmar, embora de forma hipotética, que os quadros do nosso Partido, nascidos, desenvolvidos e fortalecidos na luta contra o menchevismo e o oportunismo, estão no caminho da degeneração. Causaria riso, repito, semelhante tentativa. Mas como esta afirmação se faz, não num período normal, mas durante a discussão, e como nos encontramos aqui diante de certa contraposição entre os quadros, que se achariam diante do perigo de degeneração, e os jovens que estariam imunes, ou quase imunes, em face de tal perigo, tal suposição, no fundo ridícula e destituída de seriedade, poderia assumir, e já assumiu, uma certa importância prática. Por isso, creio que nos devemos deter nesta questão. Diz-se, às vezes, que é preciso respeitar os velhos, porque viveram mais do que os jovens, sabem mais e podem aconselhar melhor. Devo dizer, camaradas, que esta opinião é inteiramente errónea. Nem todos os velhos merecem respeito e nem todas as experiências, são para nós importantes. A questão reside em saber de que espécie de experiência se trata. Os social-democratas alemães possuem os seus quadros, e muito experimentados: Scheidemann, Noske, Wels, etc., quadros por demais experimentados, adestrados na luta. Mas, na luta contra quê? Contra quem? De que gênero é a sua experiência? Eis o nó da questão. Ali, os quadros são formados na luta contra o que é revolucionário, na luta não pela ditadura do proletariado, mas contra a ditadura do proletariado. É uma enorme experiência, mas uma experiência negativa. A juventude, camaradas, tem o dever de combater essa experiência, de destruí-la, de repelir os velhos que a possuem. Na social-democracia alemã, onde a juventude está imune à experiência da luta contra o que é revolucionário, ali a juventude se acha mais próxima do espírito revolucionário, mais próxima do marxismo do que os velhos quadros, sobre os quais pesa a experiência da luta contra o espírito revolucionário do proletariado, sobre os quais pesa a experiência da luta pelo oportunismo contra o espírito revolucionário. E necessário combater esses quadros, e toda a nossa simpatia deve estar ao lado dos jovens, os quais, repito, estão livres dessa experiência de luta contra o espírito revolucionário e assimilam mais facilmente os novos modos e os novos métodos de luta pela ditadura do proletariado, contra o oportunismo.
Na Alemanha, semelhante maneira de colocar a questão seria clara para mim. Se Trotski falasse da social-democracía alemã e dos quadros de semelhante partido, eu subscreveria com ambas as mãos a sua declaração. Mas entre nós, ao contrário, trata-se de outro Partido: do Partido Comunista, do Partido bolchevique, cujos quadros surgiram na luta contra o oportunismo, fortaleceram-se na luta contra o oportunismo, desenvolveram-se e tomaram o Poder na luta contra o imperialismo, na luta contra toda espécie de lacaios oportunistas do imperialismo. Não é talvez claro que se trata aqui de uma diferença de princípio? Como se podem pôr no mesmo plano quadros desenvolvidos na luta revolucionária, quadros que dirigiram a luta revolucionária, quadros que alcançaram o Poder nas batalhas contra o imperialismo, quadros que estão abalando as próprias bases do imperialismo mundial, como é possível, falando honestamente, com toda sinceridade, pôr estes quadros no mesmo plano dos quadros social-democratas alemães, os quais antes se entendiam com Guilherme contra a classe operária e agora se entendem com Seeckt; que se formaram e fortaleceram na luta contra o espírito revolucionário do proletariado? Como se podem pôr no mesmo plano estes quadros que, pelos seus princípios, são essencialmente diversos, como é possível confundir uns com outros? Será difícil compreender que entre estes quadros existe um abismo intransponível? Será difícil compreender que essa grosseira falsificação e essa grosseira confusão, feitas por Trotski, têm por fim minar a autoridade dos nossos quadros revolucionários, do núcleo fundamental do nosso Partido? Não é porventura claro que essa falsificação só poderia atiçar paixões e exacerbar a luta no seio do Partido?
O quinto erro cometido por Trotski consiste em ter, nas suas cartas, dado o pretexto e lançado a palavra de ordem de se voltar para a juventude estudantil, para "o mais fiel barômetro do nosso Partido". "A juventude, o mais fiel barômetro do nosso Partido, reage mais decididamente do que ninguém contra o burocratismo no Partido" — diz ele no seu primeiro artigo. E para não deixar dúvidas quanto à juventude a que se refere, Trotski, na segunda carta, acrescenta:
"Como vimos, a juventude estudantil reage com particular sensibilidade ao burocratismo".
Se partíssemos de tal suposição, absolutamente errônea, teoricamente falsa, praticamente nociva, teríamos de ir mais longe e lançar a palavra de ordem: "O maior número possível de jovens estudantes no nosso Partido; abramos de par em par as portas do Partido à juventude estudantil".
Até agora nós nos orientávamos para o setor proletário do nosso Partido e dizíamos: abramos de par em par as portas do Partido aos elementos proletários, que cresça o nosso Partido com o aumento da sua parte proletária. Agora, Trotski põe esta fórmula de pernas para o ar.
O problema dos intelectuais e dos operários no nosso Partido não é novo para nós. Foi levantado já no II Congresso do nosso Partido, quando se procurava formular o primeiro artigo dos Estatutos sobre a qualidade de membro do Partido. E sabido que, então, Mártov pretendia estender a admissão no Partido aos elementos não proletários, contrariamente ao camarada Lênin, o qual exigia que se limitasse rigorosamente a admissão no Partido dos elementos não proletários. Em seguida, no III Congresso do nosso Partido, esse problema foi de novo levantado e com maior vigor. Recordo como o camarada Lênin situou francamente o problema dos operários e dos intelectuais no nosso Partido. Eis o que disse, então, o camarada Lênin:
«Assinalou-se que as cisões são em geral capitaneadas pelos intelectuais. Esta indicação é muito importante, mas não decide a questão... Creio que é necessário considerar a coisa de um ponto-de-vista mais amplo. Fazer com que os operários ingressem nos comitês é não somente uma tarefa pedagógica, mas também política. Os operários possuem o instinto de classe e quando adquirem uma pequena experiência política se tornam com rapidez social-democratas conseqüentes. Eu veria com grande simpatia que nos nossos comitês houvesse para cada dois intelectuais oito operários.» (Vol. VII, pág. 282).[N4]
Desse modo se colocava o problema, já em 1905. Desde então esse ensinamento de Lênin foi para nós a idéia diretriz na obra de edificação do Partido. Agora, Trotski propõe, no fundo, que se rompa com a linha do bolchevismo em matéria de organização.
E, finalmente, o sexto erro de Trotski, que consiste em ter proclamado a liberdade de grupos. Sim, liberdade de grupos! Recordo como, já na subcomissão que elaborava o projeto de resolução sobre a democracia, discutimos com Trotski sobre grupos e frações. Trotski, embora não sendo contrário à proibição das frações, defendia resolutamente a idéia de se permitir a existência de grupos no seio do Partido. A oposição sustenta um ponto-de-vista idêntico. Essa gente não compreende, ao que parece, que, permitindo-se a liberdade de grupos, se abre uma brecha para a infiltração dos elementos miasnikovistas[N5], aos quais se oferece a possibilidade de enganar o Partido e de fazer passar uma fração por um grupo. Na verdade, que diferença existe entre um grupo e uma fração? A diferença é apenas aparente. Eis de que modo o camarada Lênin define a fração, incluindo-a na categoria de grupo:
«Mesmo antes de se iniciar no Partido a discussão geral sobre os sindicatos, já se manifestavam no Partido alguns indícios de fracionismo, isto é, surgiam grupos com as suas próprias plataformas e inclinados, até certo ponto, a isolar-se e a criar a sua própria disciplina de grupo.» (Vide Atas taquigráficas do X Congresso do P. C. (b) da Rússia, pág. 309).
Como vedes, não há, no essencial, diferença entre fração e grupo. Quando aqui, em Moscou, a oposição criou um birô especial, tendo à frente Serebriákov, e mandou os seus oradores para diferentes lugares com a incumbência de falar nessa ou naquela reunião, de fazer objeções por todos os modos possíveis; quando, no curso da luta, os oposicionistas, obedecendo à ordem recebida, resolveram recuar e modificar as suas resoluções, tratava-se, certamente, de um grupo e de uma disciplina de grupo. Não era uma fração, diz-se. Mas, que é, então, uma fração? Que o explique Preobrazhenski. As intervenções de Trotski, as suas cartas e os seus artigos sobre o problema das gerações e das frações tinham por objetivo levar o Partido a tolerar a existência de grupos no seu seio. Tratava-se de uma tentativa para legalizar as frações e, sobretudo, a fração de Trotski.
Afirma Trotski que os grupos surgem em conseqüência do regime burocrático instaurado pelo Comitê Central e que, se não existisse entre nós um regime burocrático, tampouco haveria grupos. Esta maneira de focalizar a questão não é marxista, camaradas. Os grupos surgem e continuarão a surgir no nosso Partido, porque existem no país as mais diversas formas de economia: desde as formas embrionárias do socialismo até as formas medievais. Isto, em primeiro lugar. Depois, temos a N.E.P., isto é, admitimos o capitalismo, o ressurgimento do capital privado e o ressurgimento das idéias a ele correspondentes, idéias que se infiltram no Partido. Isto, em segundo lugar. E, em terceiro lugar, três elementos compõem o nosso Partido: no nosso Partido há operários, há camponeses e há intelectuais. Eis, de acordo com a maneira marxista de colocar o problema, as razões que fazem surgir no Partido determinados indivíduos, em torno dos quais se criam grupos, que às vezes devemos extirpar com uma intervenção cirúrgica e outras vezes reabsorver ideologicamente, por meio de uma discussão.
Não se trata aqui de regime. Se tivéssemos um regime que oferecesse o máximo de liberdade, os grupos seriam muito mais numerosos. Por isso, a culpa não é do regime, mas das condições em que vivemos, das condições que existem no nosso país, das condições de desenvolvimento do próprio Partido.
Se numa situação tão, complexa admitíssemos a existência de grupos, arruinaríamos o Partido, transformando-o, de organização coesa e monolítica, numa aliança de grupos e frações, que se poriam de acordo entre si para formar uniões e blocos temporários. Não seria o Partido, mas o desmoronamento do Partido. Jamais, nem por um instante, os bolcheviques conceberam o Partido senão como uma organização monolítica, esculpida num só bloco, dotada de uma só vontade e que une no seu trabalho todos os matizes do pensamento num só fluxo de atividade prática.
Ao contrário, o que Trotski propõe é profundamente errôneo, diametralmente oposto aos princípios bolcheviques de organização, e conduziria a uma desagregação inevitável do Partido, ao seu enfraquecimento, ao seu amolecimento, à transformação do partido único num conjunto de grupos. Nas condições do cerco capitalista em que vivemos, temos necessidade não só de um partido único, coeso, mas de um verdadeiro partido de aço, capaz de resistir ao ataque dos inimigos do proletariado, capaz de conduzir os operários à batalha decisiva.
Quais são os resultados?
O primeiro resultado é que elaboramos uma resolução concreta sobre o balanço desta discussão, e dizemos: não podemos tolerar grupos nem frações; o Partido deve ser único e monolítico; não se pode contrapor o Partido ao aparelho; não se pode tagarelar sobre o perigo de degeneração dos quadros, porque estes quadros são revolucionários; não se pode andar a cata de brechas entre estes quadros revolucionários e a juventude, a qual marcha ombro a ombro com eles e continuará a marchar no futuro.
Tiramos também algumas conclusões positivas. A primeira e a principal é que, doravante, o Partido deve orientar-se decididamente de acordo com seu setor proletário, identificar-se com ele, deve restringir, limitar ou impedir de todo o acesso aos elementos não proletários, abrindo de par em par as portas aos proletários.
Quanto aos grupos e frações, creio que chegou a hora de dar a público o ponto da resolução sobre a unidade, que, por proposta do camarada Lênin, foi aprovado pelo X Congresso do nosso Partido e que não era destinado à publicidade. Os membros do Partido esqueceram-no. Temo que nem todos o recordem. Este ponto, mantido até agora em sigilo, deve ser dado a público e figurar na resolução que devemos aprovar em conclusão do debate. Se me permitis, eu o lerei. Diz assim:
«A fim de estabelecer uma rigorosa disciplina no seio do Partido e em todo o trabalho dos organismos soviéticos e para conseguir a máxima unidade, eliminando todo fracio-nismo, o Congresso dá ao C.C. plenos poderes para aplicar, em caso (ou nos casos) de infração da disciplina ou de «constituição das frações ou de tolerância para com as mesmas, todas as sanções do Partido, inclusive a expulsão do próprio Partido, e, no que diz respeito aos membros do C. C., o seu rebaixamento à categoria de suplentes e, mesmo como medida extrema, a expulsão do Partido. Esta medida extrema não pode ser aplicada (aos membros do C.C., aos membros suplentes do. C.C. e aos membros da Comissão de Controle) sem a convocação do Pleno do C.C. do qual devem participar todos os suplentes do C.C. e todos os membros da Comissão de Controle. Se, por dois terços dos votos, esta assembléia geral dos dirigentes mais responsáveis do Partido considerar necessário passar um membro efetivo do C.C. à categoria de suplente, ou expulsá-lo do Partido, tal providência deverá ser imediatamente aplicada.»
Creio que devemos incluir este ponto na resolução sobre o balanço da discussão e dá-lo a público.
E, finalmente, uma pergunta que a oposição faz constantemente e que, ao que parece, nem sempre recebe uma resposta satisfatória. Que estado de espírito refletimos, nós, da oposição? — pergunta-se, com freqüência. Creio que a oposição exprime o estado de espírito do setor não proletário do nosso Partido. Creio que a oposição, talvez de modo inconsciente, contra seu próprio desejo, tornou-se veículo involuntário do estado de espírito dos elementos não proletários do nosso Partido. Creio que a oposição, na sua desenfreada agitação pela democracia, que às vezes considera de modo absoluto e fetichista, desencadeia o elemento pequeno-burguês.
Conheceis a mentalidade de camaradas como os estudantes Martínov, Kazarian e outros? Lestes o artigo de Khodorovski na "Pravda", em que cita trechos dos discursos desses camaradas? Eis, por exemplo, o que diz Martínov (segundo parece, é membro do Partido) :
"A nossa tarefa consiste em tomar decisões, enquanto a tarefa do C.C. consiste em aplicá-las e em discutir o menos possível."
Trata-se, aqui, da célula do Instituto Superior, adjunto ao Comissariado do Povo das Vias de Comunicação. Mas, camaradas, temos, em conjunto, no Partido, nada menos de 50.000 células; se cada célula tratar o C.C. desse modo, declarando que a tarefa das células é decidir e a tarefa do C.C. é não discutir, receio que jamais cheguemos a alguma decisão. De onde emana este estado de espírito dos Martínov? Que há nele de proletário? Os Martínov apóiam a oposição, lembrai-vos disso. Há alguma diferença entre Martínov e Trotski? A diferença é somente que Trotski foi o iniciador do ataque contra o aparelho do Partido, enquanto Martínov lhe aplica o golpe de misericórdia.
Vejamos o que diz Kazarian, outro estudante, que, segundo parece, é também membro do Partido:
"Que temos — pergunta ele — ditadura do proletariado, ou ditadura do Partido Comunista sobre o proletariado?"
Quem diz isso, camaradas, não é o menchevique Mártov, mas o "comunista" Kazarian. A diferença entre Trotski e Kazarian é que, segundo Trotski, os quadros degeneram, enquanto segundo Kazarian é preciso expulsar os quadros, porque, segundo lhe parece, os quadros montaram às costas do proletariado.
E eu pergunto: Os Martínov e os Kazarian exprimem o estado de espírito de quem? Do proletariado? Certamente não. De quem, então? Dos elementos não proletários do Partido e do país. É por acaso que esses intérpretes de estados de espírito não proletários votam pela oposição? Não, não é por acaso. (Aplausos.)
Já disse no Informe que não queria referir-me à história da questão; e não o queria porque isso, como adverti, traria elementos de intriga, daria motivo a acusações mútuas. Mas já que assim o quer Preobrazhenski, já que o exige, estou disposto a ceder e a dizer duas palavras sobre a história da questão da democracia interna do Partido.
Como surgiu no C.C. a questão da democracia interna do Partido? Surgiu pela primeira vez no Pleno do C.C. realizado em setembro; surgiu em conseqüência dos conflitos que se verificaram nas empresas, em conseqüência, do desligamento das massas de certas organizações do Partido e sindicais, isolamento que então denunciamos. O C.C. concluiu então que a situação era grave, que as deficiências se haviam acumulado no Partido e se impunha formar uma comissão especial, devidamente autorizada, para estudar o assunto, analisar os fatos e apresentar propostas concretas para melhorar a situação no Partido. O mesmo se pode dizer da crise de vendas, das "tesouras".[N6] O debate desses problemas, a eleição da comissão que deveria ocupar-se da situação interna do Partido e da questão das "tesouras", tudo isso foi feito sem qualquer participação da oposição. Onde se achava então a oposição? Se não me engano, Preobrazhenski estava na Criméia, Saprônov em Kislovodsk e Trotski concluía em Kislovodsk os seus artigos sobre arte, preparando-se para regressar a Moscou. Antes mesmo da sua chegada, o C.C. debateu a questão na sua reunião. Chegando quando tudo estava feito, não disseram palavra, não fizeram objeção alguma ao plano do C.C. Sobre a situação no Partido foi lido, em setembro, o Informe do camarada Dzerzhinski perante a reunião dos secretários dos comitês provinciais. Afirmo que nem no Pleno de setembro, nem na reunião dos secretários os atuais membros da oposição fizeram alusão alguma quer à "gravíssima crise econômica", quer à "crise no Partido", ou à "democracia".
Como vedes, os problemas da democracia e das "tesouras" foram levantados pelo próprio Comitê Central; a iniciativa estava inteiramente nas mãos do C.C. enquanto os membros da oposição, ou calavam ou estavam ausentes.
É esse, por assim dizer, o primeiro ato, a primeira etapa da história da questão.
O segundo ato se abre com o Pleno do C. C. e da Comissão Central de Controle, realizado no mês de outubro. A oposição, com Trotski à frente, percebendo que a situação cheirava a deficiências no seio do Partido e que o C.C. já havia posto mãos à obra, havia criado comissões, e que — não o permitisse Deus! — a iniciativa ficaria nas mãos do C.C. tentou, propôs-se como objetivo, arrebatar a iniciativa ao C.C. e montar o cavalo de batalha da democracia, pois é um fogoso corcel, como se sabe, e com ele se poderia passar por cima do C.C. E nessa base foram compilados os documentos sobre os quais tanto se estendeu Preobrazhenski: o documento dos 46[N7] e a carta de Trotski. O próprio Trotski, que em setembro, dias antes da sua intervenção fracionista, calava no Pleno, ou, de qualquer modo, não fazia objeções às decisões do C. C. duas semanas depois descobria, de inopino, que o Partido e o país estavam a perecer e que ele, Trotski, este patriarca dos burocratas, não podia viver sem democracia.
Era um tanto ridículo ouvir da boca de Trotski discursos sobre a democracia, do mesmo Trotski que no X Congresso do Partido exigia que os sindicatos fossem sacudidos de cima. Sabíamos, porém, que entre o Trotski do período do X Congresso e o Trotski dos nossos dias não há grande diferença, pois agora, como então quer sacudir os quadros leninistas. A única diferença é que no X Congresso ele sacudia os quadros leninistas de cima, no campo sindical, enquanto agora sacode os mesmos quadros leninistas de baixo, no campo do Partido. Precisa da democracia como cavalo de batalha, como manobra estratégica. Essa é toda a música.
Se a oposição desejasse realmente ajudar, enfrentar o problema seriamente, como é justo proceder entre camaradas, teria, antes de tudo, apresentado a sua declaração às comissões do Pleno de setembro, dizendo mais ou menos assim:
"Consideramos o vosso trabalho insatisfatório e exigimos que se ofereça ao Birô Político informe sobre os resultados do vosso trabalho e que se convoque um Pleno do C.C., ao qual desejamos submeter as nossas novas propostas", etc..
Se as comissões não lhe tivessem dado ouvidos, se o Birô Político não lhe tivesse dado ouvidos, se este não levasse em conta as opiniões da oposição ou se se negasse a convocar o Pleno para examinar as propostas de Trotski e da oposição em geral, então, e somente então, a oposição teria pleno direito de agir publicamente, passando por cima do C. C., de lançar um apelo aos membros do Partido e de dizer ao Partido:
"O país se encontra à beira da ruína, a crise econômica se agrava cada vez mais, o Partido perece; propusemos às comissões do C.C. que estudassem estas questões, mas as comissões se negaram a ouvir-nos e tentamos levantar o, problema junto ao Birô Político; foi tudo em vão, e agora somos obrigados a apelar para o Partido, a fim de que ele mesmo trate do assunto."
Não duvido de que o Partido teria respondido:
"Sim, estes são revolucionários de verdade, porque põem a
essência das coisas acima da forma".
Mas, a oposição agiu por acaso desse modo? Tentou por acaso, ainda que uma só vez, apresentar as suas propostas às Comissões do C.C.? Por acaso pensou, por acaso tentou levantar e resolver as questões no seio do C.C. ou dos seus órgãos? Não, a oposição não fez semelhantes tentativas. Evidentemente, para a oposição, não se tratava de melhorar a situação interna do Partido, de ajudar o Partido a melhorar a situação econômica, mas de antecipar-se ao trabalho da Comissão e do Pleno do C.C. de arrebatar a iniciativa ao C.C. de montar o cavalo de batalha da democracia e, antes que fosse tarde, armar barulho para minar a confiança no C.C. A oposição tinha, evidentemente, pressa em fabricar "documentos" contra o C.C. — a carta de Trotski e a declaração dos 46 — para poder levá-los aos estudantes do Instituto Sverdlov e aos distritos e dizer que ela, a oposição, é pela democracia, pelo melhoramento da situação econômica, e que o C.C. lhe cria obstáculos, que ela precisa de ajuda contra o C.C. etc., etc..
Estes são os fatos.
Exijo que Preobrazhenski refute estas minhas afirmações. Exijo que as conteste pelo menos na imprensa. Conteste Preobrazhenski o fato de que o Pleno do C.C criou, em setembro, as comissões, sem que a oposição participasse da sua criação, antes que a oposição se manifestasse. Conteste Preobrazhenski o fato de que nem Trotski nem os outros oposicionistas procuraram apresentar suas propostas a essas comissões. Conteste Preobrazhenski o fato de que a oposição sabia da existência dessas comissões, mas ignorava intencionalmente a sua atividade, que a oposição não procurou resolver as questões no seio do C.C.
Por isso, quando, em outubro, Preobrazhenski e Trotski declararam no Pleno que queriam salvar o Partido através da democracia e que o C.C. estava cego e nada via, o C.C. riu-se deles e disse: não, camaradas, nós, o Comitê Central, somos plenamente pela democracia, mas não confiamos na vossa democracia, porque consideramos a vossa "democracia" como uma manobra estratégica contra o C. C., ditada pelo vosso espírito fracionista.
Que decidiram, então, os Plenos do C.C. e da Comissão Central de Controle sobre o problema da democracia interna do Partido? Eis o que decidiram:
"Os Plenos aprovam integralmente a linha a respeito da democracia interna do Partido, oportunamente traçada pelo Birô Político, assim como a intensificação, proposta pelo Birô Político, da luta contra os excessos e abusos gerados pela N.E.P. e contra a influência perniciosa da N.E.P. sobre alguns elementos do Partido.
Os Plenos encarecem ao Birô Político que faça tudo o que for necessário para acelerar o trabalho das comissões nomeadas pelo Birô Político e pelo Pleno de setembro: 1) comissões sobre o problema das «tesouras», 2) sobre salários, 3) sobre a situação interna do Partido.
Uma vez que tenham sido elaboradas as medidas necessárias, em relação com estas questões, o Birô Político deve levá-las imediatamente à prática e apresentar informe sobre o assunto no próximo Pleno do C. C."
Numa das suas cartas ao C.C. Trotski escreve que o Pleno de outubro "foi a suprema expressão da orientação burocrática do aparelho." Não é porventura claro que esta declaração de Trotski representa uma calúnia contra o C.C? Somente uma pessoa que tenha perdido a cabeça e se deixado cegar pelo espírito de fração pode afirmar, depois do documento que li, que o Pleno de outubro foi uma expressão suprema de burocratismo.
Que decidiram, então, os Plenos do C.C. e da Comissão Central de Controle sobre as manobras "democráticas" de Trotski e dos 46? Eis o que decidiram:
«Os Plenos do C.C. e da Comissão Central de Controle, com a participação dos representantes de dez organizações do Partido, julgam que a intervenção de Trotski, em momento tão cheio de responsabilidades como o que ora atravessam a revolução mundial e o Partido, foi um profundo erro político, particularmente porque o ataque de Trotski ao Birô Político assumiu, objetivamente, o caráter de intervenção fracionista, que ameaça desferir um golpe contra a unidade do Partido e provoca uma crise no Partido. Os Plenos verificam, com pesar, que Trotski preferiu, para levantar os problemas por ele abordados, o caminho do apelo a estes ou àqueles membros do Partido, ao invés de escolher o único caminho admissível, o qual consiste em submeter previamente esses problemas ao exame dos organismos coletivos de direção de que Trotski participa.
O caminho escolhido por Trotski serviu de sinal para a formação de um grupo fracionista (a declaração dos 46).
Os Plenos do C.C. e da Comissão Central de Controle e os representantes das dez organizações do Partido condenam energicamente a declaração dos 46 como um ato de política fracionista, de cisão, política que assumiu esse caráter talvez sem que o desejassem, os signatários da declaração. Essa declaração ameaça colocar toda a vida do Partido, nos próximos meses, sob o signo da luta interna do Partido e debilitar, assim, o Partido num momento da máxima importância para os destinos da revolução internacional."
Como vedes, camaradas, os fatos que expus dizem que o quadro da situação apresentado por Preobrazhenski é inteiramente falso.
O terceiro ato, isto é, a terceira fase da história da questão, é o período que se segue ao Pleno de outubro. O Pleno de outubro decidiu propor ao Birô Político que tomasse todas as medidas necessárias para assegurar a harmonia no trabalho. Devo declarar, camaradas, que no período que se seguiu a outubro tomamos todas as medidas para trabalhar em harmonia com Trotski, embora, devo afirmar, a tarefa não fosse das mais fáceis. Tivemos duas reuniões privadas com Trotski, examinamos todos os problemas de caráter econômico e do Partido e chegamos a fixar certos critérios que não suscitavam nenhuma divergência. Em seguida a essas reuniões privadas e às tentativas para tornar possível um trabalho em harmonia no seio do Birô Político, criou-se, como já informei, ontem, uma subcomissão composta de três membros. Foi esta subcomissão encarregada de elaborar o projeto de resolução que posteriormente se tornou a resolução do C. C. e da Comissão Central de Controle sobre a democracia.
Assim se passaram as coisas.
Parecia-nos que, uma vez aprovada a resolução, por unanimidade, não haveria mais motivos de discussão, nem de luta interna do Partido. E assim foi, na realidade, enquanto Trotski não interveio de novo com o seu apelo às organizações distritais. Mas a intervenção de Trotski um dia após a publicação da resolução do C.C., intervenção feita independentemente do C.C. e passando por cima do C.C., lançou tudo por terra, mudou radicalmente a situação e fez o Partido recuar a novas discussões, a uma nova luta, mais áspera do que antes. Diz-se que o C.C. deveria ter proibido a publicação do artigo de Trotski. Não é certo, camaradas. Teria sido, de parte do C.C. um passo perigosíssimo. Como proibir o artigo de Trotski, se já havia sido dado a público nas organizações distritais de Moscou? O C.C. não poderia dar um passo tão irrefletido.
Esta é a história da questão.
De tudo o que foi dito se depreende que a oposição não estava tão interessada na democracia como em utilizar a idéia da democracia para abalar as bases do C.C; que esta oposição não é formada por homens dispostos a ajudar o Partido, mas por uma fração que procura colher o C.C. numa emboscada: "talvez erre, talvez não seja bastante vigilante, e assim nós lhe daremos um belo golpe." Uma fração é precisamente isto: um grupo de membros do Partido que fica de tocaia, contra os órgãos centrais do Partido, para aproveitar-se da má colheita, ou da baixa do "tchervonets",[N8] ou de outras dificuldades do Partido, e depois aparecer na curva da estrada, onde se acha oculto, a fim de golpear o Partido na cabeça. Sim, razão tinha o C.C. em outubro, camaradas oposicionistas, quando vos dizia que uma coisa é a democracia e outra, fazer intrigas contra o Partido: uma coisa é a democracia e outra aproveitar contra a maioria do Partido o barulho que se faz em torno da democracia.
É esta, Preobrazhenski, a história da questão, da qual eu não desejava falar aqui, mas que fui obrigado a expor, cedendo a vossa insistência.
Para a oposição tornou-se regra exaltar o camarada Lênin como o gênio dos gênios. Temo que esses elogios não sejam sinceros e que também aqui se oculte uma astúcia estratégica: fazendo grande estardalhaço em torno da genialidade do camarada Lênin, querem dissimular que se afastam de Lênin e, ao mesmo tempo, sublinhar a debilidade dos seus discípulos. Naturalmente, não seremos nós, discípulos do camarada Lênin, que deixaremos de compreender que ele é o gênio dos gênios e que homens assim surgem apenas de século em século. Mas, permiti-me, Preobrazhenski, que vos pergunte por que assumistes uma posição contrária à desse homem genialíssimo na questão da paz de Brest-Litovsk? Por que abandonastes esse homem genialíssimo num momento difícil e não lhe destes ouvido? Onde, em que campo vos encontráveis, então?
E Saprônov, que agora exalta hipócrita e farisaicamente o camarada Lênin, é o mesmo Saprônov que num dos Congressos teve a impudência de tratar o camarada Lênin de "ignorante" e "oligarca"! Por que não apoiou o genial Lênin, por exemplo, no X Congresso? Por que nos momentos difíceis sempre esteve no campo oposto, se na realidade acha que o camarada Lênin é o gênio dos gênios? Sabe ele que o camarada Lênin, ao propor ao X Congresso a resolução sobre a unidade, que exigia a expulsão dos fracionistas do Partido, se referia, entre outros, também a Saprônov?
Mais ainda: por que Preobrazhenski, não somente no período da paz de Brest-Litovsk, mas também depois, no período da discussão sindical, se achava no campo dos adversários do genial Lênin? Tudo isso ocorreu por acaso? Não há nisso certa regularidade?
— Preobrazhenski: "Eu procurava pensar com a minha cabeça."
É muito louvável, Preobrazhenski, que tenhais procurado pensar por vós mesmo. Vede, porém, o resultado: na questão de Brest-Litovsk pensastes com a vossa cabeça, e fracassastes; depois, durante a discussão sobre os sindicatos, novamente tentastes pensar com a vossa cabeça, e voltastes a fracassar; agora, não sei se pensais com a vossa cabeça ou com cabeça alheia, mas, segundo parece, fracassastes mais uma vez. (Risos.) Creio, não obstante, que, se Preobrazhenski pensasse mais com a sua cabeça do que com a cabeça de Trotski — que lhe inspirou a carta de 8 de outubro — estaria agora mais próximo de nós do que de Trotski.
Preobrazhenski fez censuras ao C. C., dizendo que até o momento em que Ilitch estava à nossa frente as questões se resolviam oportunamente e sem atraso, pois Ilitch percebia os novos acontecimentos ainda em gestação e lançava com antecipação as palavras de ordem, enquanto que, agora, na ausência de Ilitch, o C.C. começou a deixar-se superar pelos próprios acontecimentos. Que quer Preobrazhenski dizer com isso? Que Ilitch estava acima dos seus discípulos? Por acaso alguém tem dúvidas a respeito? Porventura alguém duvida de que Ilitch seja um Golias em comparação com os seus discípulos? Se se trata do chefe do Partido — e não de um chefe que se deixa embalar pela publicidade que lhe dão alguns jornais, em montes de saudações, mas de um verdadeiro chefe — o nosso chefe é um só: o camarada Lênin.
Por isso já dissemos mais de uma vez que na situação atual, na ausência temporária do camarada Lênin, é necessário trabalhar na base da direção coletiva. Quanto aos discípulos do camarada Lênin, poderíamos citar, a título de exemplo, os acontecimentos relacionados com o ultimato de Curzon,[N9] que constituíram para eles uma espécie de exame, de prova. Vencemos as dificuldades sem prejudicar a nossa causa: este fato demonstra indubitavelmente que os discípulos do camarada Lênin já aprenderam alguma coisa do seu mestre.
Preobrazhenski comete erro quando afirma que o nosso Partido, nos anos anteriores, não se deixou superar pelos acontecimentos. Errou porque esta afirmação peca contra a realidade dos fatos e é teoricamente falsa, Poderíamos citar vários exemplos. Tomemos, por exemplo, a paz de Brest-Litovsk. Porventura não nos decidimos com atraso em relação a Brest-Litovsk? Por acaso não foram precisos fatos como a ofensiva alemã e a debandada dos nossos soldados para que compreendêssemos finalmente a necessidade da paz? O desmoronamento do "front", a ofensiva de Hoffmann,[N10] a sua marcha sobre Petrogrado, a pressão dos camponeses: não foram, necessários porventura todos esses fatos para que compreendêssemos que o ritmo da revolução internacional era menos rápido do que desejávamos, que o nosso exército era menos forte do que supúnhamos, que os camponeses não eram tão pacientes como acreditávamos alguns de nós, que desejavam a paz e a conquistariam pela força?
Ou tomemos o exemplo da abolição do sistema de entrega dos excedentes de gêneros alimentícios. Por acaso não nos atrasamos na abolição de tal sistema? Acaso não foram necessários fatos como Kronstadt e Tambov[N11] para que compreendêssemos que era impossível continuar a viver nas condições do comunismo de guerra? Por acaso não reconheceu o próprio Ilitch que havíamos sofrido nessa frente uma derrota mais grave do que qualquer das derrotas nas frentes contra Deníkin e Koltchak?
É acidental o fato de que em todos esses casos o Partido ficou atrás dos acontecimentos, atrasando-se um pouco? Não, não é acidental. Isso ocorreu sistematicamente. É evidente que, como não se trata aqui de previsões teóricas gerais, mas da direção prática imediata, o Partido governante, que empunha o timão e está absorvido pelos acontecimentos do dia, não pode perceber e captar de súbito os processos que se desenvolvem na profundidade da vida, e se torna necessário um impulso exterior, é preciso que os novos processos alcancem certo desenvolvimento, para que o Partido os perceba e se oriente levando-os em consideração. Precisamente por isso o nosso Partido marchava um pouco atrás dos acontecimentos, no passado, e continuará marchando no futuro. O problema não reside em marchar a reboque dos acontecimentos, mas em compreender o seu sentido, o sentido dos novos processos para depois dirigi-los, com habilidade, segundo a tendência geral do desenvolvimento. Precisamente assim se coloca a questão, se encararmos as coisas com olhos de marxista, e não com olhos de fracionista, que procura culpados por todos os lados. Preobrazhenski se indigna porque os representantes do C.C. dizem que Trotski se desvia do leninismo. Indigna-se, mas ainda não apresentou objeção séria e, em geral, não procurou justificar a sua indignação, esquecendo-se de que indignação não é argumento. Sim, é verdade que Trotski se desvia do leninismo nas questões de organização. Temos afirmado isto e continuamos a afirmá-lo. Os conhecidos artigos publicados na "Pravda", intitulados "Abaixo o fracionismo", artigos devidos à pena de Bukharin, são inteiramente dedicados à questão dos desvios de Trotski em relação ao leninismo. Por que Preobrazhenski não fez nenhuma objeção substancial às idéias principais expostas nesses artigos? Por que Preobrazhenski não procurou corroborar a sua indignação com argumentos ou pelo menos com uma aparência de argumentos? Eu disse ontem, e devo repetir hoje que os atos de Trotski, como contrapor-se ao Comitê Central, fazer caso omisso da vontade de uma série de organizações, as quaís exigem de Trotski uma resposta clara, opor o Partido ao aparelho do Partido, opor a juventude aos quadros do Partido, orientar o Partido no sentido de apoiar-se na juventude estudantil e proclamar a liberdade de grupos, tais atos são incompatíveis com os princípios de organização do leninismo. Por que Preobrazhenski não tenta refutar esta minha afirmação?
Fala-se de perseguições contra Trotski. Sobre isso falaram Preobrazhenski e Radek, Camaradas, devo declarar que as afirmações desses camaradas sobre perseguições não correspondem à realidade. Vou recordar-vos dois fatos para que tenhais a possibilidade de julgar. O primeiro fato é o incidente ocorrido no Pleno do C.C., em setembro, quando Trotski, em resposta à declaração de Komárov, membro do C. C., de que os membros do C.C. não podem esquivar-se às decisões do C.C., se levantou de repente e abandonou a sessão do Pleno. Recordareis que o Pleno do C.C. enviou então a Trotski uma "delegação", rogando-lhe que voltasse à reunião. Recordareis que Trotski se negou a aquiescer ao convite do Pleno, demonstrando com isso que não tinha o menor respeito ao C.C.
Ou o caso em que Trotski se recusou decididamente a trabalhar nos órgãos centrais soviéticos, no Conselho do Trabalho e da Defesa e no Conselho de Comissários do Povo, não obstante a decisão, duas vezes tomada pelo C.C. de que Trotski começasse finalmente a trabalhar nos órgãos soviéticos. Sabeis que Trotski não moveu um dedo para cumprir a decisão do C. C. E, efetivamente, por que Trotski não poderia trabalhar no Conselho do Trabalho e da Defesa, no Conselho de Comissários do Povo? Por que Trotski, que tanto gosta de falar de planos, não poderia vez por outra aparecer na nossa Comissão Estatal de Planificação? Pode-se considerar normal uma situação em que um membro do C.C. faz caso omisso das decisões do C.C.? Não evidenciam todos esses fatos que o palavrório sobre perseguições não passa de mexerico e que, se há aqui um culpado, trata-se do próprio Trotski, cuja conduta não pode ser considerada senão como uma burla ao C.C?
Não têm fundamento algum as considerações de Preobrazhenski sobre a democracia. Preobrazhenski levanta a questão do seguinte modo: ou teremos grupos, e então haverá democracia, ou proibis os grupos e então não haverá democracia. Liberdade de grupos e democracia são para ele coisas indissolüvelmente ligadas entre si. Compreendemos de outro modo a democracia. Entendemos por democracia a elevação da atividade e da consciência das massas, a um nível mais elevado, para fazer com que as massas do Partido, não somente participem sistematicamente da discussão dos problemas, mas também da direção do trabalho. A liberdade de grupos, isto é, a liberdade de frações — pois se trata da mesma coisa — representa um mal que ameaça desintegrar o Partido e transformá-lo num clube de discussões. Estais desmascarado, Preobrazhenski, porque defendestes a liberdade das frações. A democracia, a massa do Partido a entende como criação das premissas para garantir a participação ativa dos membros do Partido na direção do nosso país, enquanto um punhado de intelectuais da oposição entende a coisa desse modo: haver a possibilidade de formar uma fração. Estais desmascarado, Preobrazhenski.
Por que o sétimo ponto sobre a unidade do Partido vos inspira tanto medo? Que há nele que possa causar susto? Diz o sétimo ponto:
"A fim de manter no seio do Partido e em todo o trabalho soviético uma severa disciplina e obter o máximo de unidade, eliminando todo fracionismo..."
Mas, camaradas oposicionistas, sois porventura contra uma "severa disciplina no seio do Partido e no trabalho soviético", sois porventura contra tudo isto? Eu ignorava que assim fosse, camaradas, que éreis contra isto. E vós, Saprônov e Preobrazhenski, sois contrários a que se alcance a máxima unidade e que se "elimine o fracionismo"? Dizei-o francamente, que talvez introduzamos algumas emendas. (Risos.)
Prossigamos:
"O Congresso confere ao C.C. plenos poderes para aplicar as sanções do Partido, no caso de infração da disciplina do Partido ou de ressurgimento do fracionismo"...
Será que também isso vos assusta? Será que vós, Preobrazhenski, Radek, Saprônov, pretendeis transgredir a disciplina do Partido, fazer ressurgir o fracionismo? E, se não tendes essas intenções, por que, então, tendes medo? É o próprio pânico que vos domina, camaradas, que vos desmascara. É evidente que, se temeis o sétimo ponto da resolução sobre a unidade, sois pelo fracionismo, pela transgressão da disciplina, contra a unidade. E se não sois contra tudo isso, por que vos deixastes dominar pelo pânico? Se tendes a consciência limpa, se sois pela unidade e contra o fracionismo e a transgressão da disciplina, não é porventura claro que a mão justiceira do Partido não vos atingirá? De que tendes medo, pois?
— Uma voz na sala: "E para que tratais disso, se não é para causar medo?"
Para vos refrescar a memória. (Risos, aplausos)
— Preobrazhenski: "Desejais intimidar o Partido."
Queremos intimidar os fracionistas e não o Partido. Por acaso supondes, Preobrazhenski, que o Partido e os fracionistas são a mesma coisa? Vê-se que tendes rabo de palha. (Risos.)
Prossigamos:
"No que se relaciona aos membros do C.C., este poderá passá-los à categoria de membros suplentes e, mesmo, como medida extrema, expulsá-los do Partido. A condição para aplicar esta medida aos membros do C.C., aos membros suplentes do C. C. e aos membros da Comissão Central de Controle é a convocação do Pleno do C.C."
Que há de terrível nisso? Se não sois fracionistas, se sois contra a liberdade de grupos, se sois pela unidade, então, camaradas da oposição, deveis votar pelo sétimo ponto da resolução do X Congresso, pois é dirigido exclusivamente contra os fracionistas, exclusivamente contra aqueles que querem despedaçar a unidade do Partido, a sua força, a sua disciplina. Não é talvez claro?
Passo a Radek. Há pessoas que têm a língua para dominá-la e governá-la. São as pessoas comuns. Há, além disso, pessoas que são escravas da própria língua e que se deixam dominar por ela. São pessoas fora do comum. Radek pertence a essa espécie de pessoas fora do comum. O homem a quem se deu a língua, não para dominá-la, mas para ser por ela dominado, jamais poderá saber quando e quais serão as palavras que lhe escaparão da boca. Se tivésseis a oportunidade de ouvir os discursos de Radek, em diferentes reuniões, ficaríeis assombrados com a sua intervenção de hoje. Numa reunião dedicada a debates, Radek afirmou que a questão da democracia interna do Partido é uma questão de somenos importância, que ele, Radek, é no fundo contra a democracia, que se trata, agora, em essência, não da democracia, mas do que o C.C. pretende fazer com Trotski. Noutra reunião de debates, o mesmo Radek declarou que a democracia no seio do Partido não é uma coisa séria, enquanto que a democracia no seio do C.C. é da maior importância, porque no C.C. segundo ele, se formou um diretório. E, hoje, o mesmo Radek declara com toda tranqüilidade que a democracia interna do Partido é tão necessária como o ar e a água, porque, sem democracia não se pode, segundo parece, dirigir o Partido. Em qual desses três Radek devemos crer: no primeiro, no segundo, ou no terceiro? Que garantia podemos ter de que Radek, ou a sua língua, não faça em futuro próximo novas declarações inesperadas, refutando todas as suas declarações anteriores? Será possível confiar num homem como Radek? Depois disso, pode-se dar algum valor, por exemplo, à declaração de Radek sobre o afastamento de Boguslavski e Antônov dos postos que ocupavam, por "motivos fracionistas"?
De Boguslavski já falei, camaradas... Mas quanto a Antônov-Ovseienko permiti-me que vos diga o seguinte. Antônov foi destituído do seu posto na Direção Política do Exército Vermelho operário e camponês por decisão do Birô de Organização do C.C. decisão confirmada pelo Pleno do C.C. Foi destituído sobretudo por ter enviado uma circular sobre a conferência das células dos Institutos Superiores do exército e da força aérea com a seguinte ordem do dia: situação internacional, edificação do Partido, etc., às ocultas e sem prévia aprovação do C.C., muito embora Antônov soubesse que a Direção Política do Exército Vermelho operário e camponês funciona na qualidade de seção do C.C. Foi destituído daquela Direção por ter enviado a todas as células militares uma circular sobre as formas de aplicação da democracia interna do Partido, contra a vontade do C.C. e apesar da advertência do C.C. de que ajustasse esta circular aos planos do C.C. E, finalmente, foi destituído por ter enviado ao C. C. e à Comissão Central de Controle uma carta absolutamente inconveniente pelo tom e absolutamente inadmissível pelo conteúdo, em que ameaçava o C.C. e a Comissão Central de Controle de chamar à ordem "os chefes que haviam perdido o senso de medida".
Camaradas: Pode e deve permitir-se que os oposicionistas ocupem postos de responsabilidade. Pode e deve permitir-se a crítica ao trabalho do C.C. por parte dos dirigentes das seções do C.C. Mas não se pode admitir que o dirigente da Direção Política do Exército Vermelho, que funciona como seção do C.C. se recuse sistematicamente a estabelecer contatos de trabalho com o próprio C.C. não se pode admitir que um dirigente responsável possa pisotear as regras mais elementares da decência. Não se pode confiar a semelhante camarada a educação do Exército Vermelho. Eis, no que diz respeito a Antônov, como se passaram as coisas.
E finalmente devo dizer algumas palavras sobre outra questão: que estado de espírito exprimem, nas suas intervenções, os camaradas da oposição? Devo voltar ao "caso" dos camaradas Kazarian e Martínov, alunos dos cursos do Comissariado do Povo das Vias de Comunicação. Este "caso" demonstra que numa parte dos estudantes, nem tudo vai bem, que o espírito de partido, neles, apodreceu há tempos, que no seu íntimo já romperam com o Partido e precisamente por isso votam com prazer em favor da oposição. Permiti-me que vos diga, camaradas, que gente dessa espécie, completamente apodrecida do ponto-de-vista de partido, não figura nem pode figurar entre aqueles que votaram em favor da resolução do C.C. Entre nós, não há gente dessa espécie, camaradas. Entre nós, nas nossas fileiras, não há pessoas que possam dizer: "Que temos: a ditadura do proletariado ou a ditadura do Partido Comunista sobre o proletariado?" Esta é uma frase de Mártov e de Dan. é uma frase dos "Dni"[N12] socialistas revolucionários, e se entre vós, nas vossas fileiras, tendes semelhantes defensores, que pode valer a vossa posição, camaradas da oposição? Ou, por exemplo, outro camarada, o camarada Martínov, que pensa que o C.C. deve calar e as células decidir. Vós, do C.C. diz ele, podeis cumprir o que nós, das células, tivermos decidido. Mas temos 50.000 células. Se tivessem de decidir, por exemplo, a questão do ultimato de Curzon, não alcançaríamos uma decisão em dois anos. Isso é anarco-menchevismo do mais puro. Se essa gente, que perdeu a cabeça e está apodrecida até a medula, apodrecida do ponto-de-vista de partido, figura na vossa fração, que pode valer a vossa fração?
— Uma voz: "Não somos membros do Partido?"
Sim, infelizmente, sois membros do Partido, mas estou disposto a tomar as medidas para que pessoas, dessa espécie deixem de sê-lo. (Aplausos.) Declarei que a oposição exprime o estado de espírito e as aspirações dos elementos não proletários no Partido e fora do Partido. A oposição, sem que tenha consciência do que faz, abre as portas as idéias e às aspirações pequeno-burguesas. A atividade fracionista da oposição leva água ao moinho dos inimigos do nosso Partido, ao moinho daqueles que querem enfraquecer, derrubar a ditadura do proletariado. Disse-o, ontem, e o repito hoje.
Mas, desejaríeis ouvir outros testemunhos? Bem, posso proporcionar-vos este prazer referindo-me, por exemplo, às declarações de S. Ivanóvitch, que bem conheceis. Quem é S. Ivanóvitch? É um menchevique, ex-membro do Partido, da época em que nós formávamos com os mencheviques um só partido. Depois de entrar em divergências com o C.C. menchevique, ele se tornou menchevique de direita. Os mencheviques de direita são um grupo de mencheviques intervencionistas, cujo objetivo atual consiste em derrubar o Poder Soviético, mesmo que seja com a ajuda das baionetas estrangeiras. O seu órgão é a "Zariá".[N13] O diretor desse órgão é S. Ivanóvitch. Qual a atitude deste menchevique em face da nossa oposição? Que mérito lhe reconhece? Ouvi:
«Devemos ser gratos à oposição por ter pintado com tão vivas cores o quadro da horripilante cloaca moral que se chama Partido Comunista Russo. Devemos ser-lhe gratos por ter desferido contra o Partido Comunista Russo um rude golpe moral e orgânico. Devemos ser-lhe gratos pelo fato de que a sua atividade facilita a obra de todos os que vêem na derrubada do Poder Soviético a tarefa do Partido Socialista»
Eis um reconhecimento dos vossos méritos, camaradas da oposição.
Ao concluir o meu discurso, desejaria exprimir aos camaradas da oposição o desejo de que esse beijo de S. Ivanóvitch não deixe neles marca indelével. (Prolongados aplausos.)
Notas:
[N1] Da XIII Conferência do P.C. (b) da Rúsçia, que se realizou em Moscou de 16 a 18 de janeiro de 1924, participaram 128 delegados com voz e voto e 222 com voz. Foram discutidos os problemas da edificação do Partido e da situação internacional, e as tarefas imediatas da política econômica. Após o Informe de Stálin sobre o primeiro ponto, a Conferência aprovou duas resoluções. «A construção do Partido» e «O balanço da discussão e do desvio pequervo-burguês no Partido». A Conferência condenou, ademais, a oposição trotskista, definindo-a como desvio pequeno-burguês do marxismo, e propôs ao Comitê Central a publicação do sétimo ponto da resolução, «A Unidade do Partido», aprovado pelo X Congresso do P.C. (b) da Rússia, por proposta de Lênin. As decisões da Conferência foram em seguida aprovadas pelo XIII Congresso do Partido e pelo V Congresso da Internacional Comunista. (retornar ao texto)
[N2] A resolução sobre a construção do Partido foi aprovada na reunião de 5 de dezembro de 1923 pelo Birô Politico do C.C. e pelo Presidium da Comissão Central de Controle do P.E. (b) da Rússia e publicada na «Pravda», a 7 de dezembro de 1923. Por sua vez, o Pleno do C.C. do P.C. (b) da Rússia, de 14-15 de janeiro de 1924, aprovou a resolução que foi em seguida apresentada à XIII Conferência do Partido. (retornar ao texto)
[N3] Tit Titic, rico comerciante, personagem da comédia «Entre os dois litigantes o terceiro goza», de Alexandre Ostrovski (1823-1886). (retornar ao texto)
[N4] Vide Lênin, «Obras Completas», IV ed. em língua russa (1941-1950), vol. VIII, pág. 376. (retornar ao texto)
[N5] J. l. Miasníkov (n. 1886) foi expulso do Partido em 1921 por sua atividade menchevique. Em 1923, aderiu à organização contra-revolucionária chamada «Grupo Operário». (retornar ao texto)
[N6] Vide «Questões do leninismo», pág. 293 e seg., Edizioni Rinascita, 1952. (retornar ao texto)
[N7] Sobre a plataforma dos 46, vide «História do P.C. (b) da U.R.S.S.», 2ª ed. bras. Ed. Horizonte, Rio, 1947, pág. 106-107. (retornar ao texto)
[N8] O papel-moeda desvalorizado foi substituído pelo tchervoniets, moeda firme e estável com equivalente em ouro. A reforma monetária foi levada a termo em 1924. (retornar ao texto)
[N9] O Ministro do Exterior britânico, Curzon, enviou a 8 de maio de 1923, um ultimato ao governo soviético, em que se exigia, entre outras coisas, a retirada dos plenipotenciários soviéticos da Pérsia e do Afganistão e a soltura dos pesqueiros ingleses, detidos por pescar em águas territoriais setentrionais da U.R.S.S. Caso o governo soviético não cumprisse no prazo de dez dias as condições do ultimato, Curzon fazia a ameaça de romper relações comerciais. Delineou-se, assim, o perigo de nova intervenção. O governo soviético rejeitou o ultimato inglês, declarando-se ao mesmo tempo disposto a regular pacificamente as relações entre os dois países. Simultaneamente, tomou medidas paia reforçar a defesa da União. (retornar ao texto)
[N10] Sobre a ofensiva lançada em fevereiro de 1918 pelo general alemão Hoffmann, vide Stálin, «Obras», vol. IV, pág. 52 (O Nó Ucraniano) e seguintes, Editorial Vitória, Rio, 1954. (retornar ao texto)
[N11] A revolta de Kronstadt, sob a chefia dos guardas brancos, dos social-revolucionários e dos mencheviques e fomentada do exterior, verificou-se em março de 1921. Na província de Tâmbov, na Ucrânia, os kulaks fomentaram uma série de sublevações, no período de 1919-1921. (retornar ao texto)
[N12] «Dni» («Dias»), diário dos social-revolucionários emigrados. Apareceu em Berlim, a partir de outubro de 1922. (retornar ao texto)
[N13] «Zariá» («A Aurora»)», revista dos mencheviques de direita emigrados. Publicou-se em Berlim de abril de 1922 a janeiro de 1924. (retornar ao texto)
Este texto foi uma contribuição do |
Inclusão | 11/06/2008 |