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1. As questões de organização estão hoje colocadas no centro de nossos debates, consideradas como questões políticas de grande importância.
Vivemos numa situação internacional cuja principal tendência é o avanço geral do movimento revolucionário. No Brasil, o quadro político é marcado pelo crescente descontentamento do povo contra a ditadura militar-fascista.
Diversas forças políticas do país, instituições importantes e personalidades de destaque na vida nacional possuem programas de luta contra a ditadura ou expressam suas opiniões de desacordo com o fascismo. São muitas manifestações, algumas isoladas, outras já se constituindo em acções conjuntas, mas quase todas tendem a convergir, podendo, em determinado estágio, transformar-se em acções coordenadas de uma ampla frente antifascista.
Toma-se, por isso, mais necessária do que nunca, a existência no país de um forte partido comunista. Um partido que tanto por sua estratégia e táctica revolucionárias, quanto por sua estrutura orgânica e estilo de trabalho adequado ao momento em que vivemos, seja capaz de unir as mais amplas massas que se opõem à ditadura. E, em primeiro lugar, a classe operária. Um partido capaz de orientar a luta contra o fascismo até à sua derrota final, e, simultaneamente, conquistar um regime de amplas liberdades democráticas. E abrindo, assim, o caminho à realização das tarefas relativas à etapa actual da revolução brasileira — passo importante no caminho do socialismo.
2. No momento exacto em que surge tal exigência, nosso Partido, o PCB, encontra-se profundamente golpeado pelo inimigo, não obstante a vitória obtida nas eleições de Novembro de 1974.
Os golpes vibrados contra o Partido são explicados, em grande medida, pelo ódio da ditadura pelo papel positivo por ele desempenhado no pleito de 1974.
Nos últimos tempos a reacção fascista assestou golpes profundos em nossa estrutura orgânica. Cerca da metade dos membros do CC, entre efectivos e suplentes, foi encarcerada, barbaramente torturada, tendo havido muitos assassinatos. Inúmeros militantes, amigos e simpatizantes do Partido estão permanentemente sob a mira da polícia, o que os impede de exercer actividades na organização clandestina do partido.
3. A situação actual do Partido se deve a factores objectivos e subjectivos. É uma situação que deve ser considerada, se desejamos nos pôr em condições de utilizar com prudência e racionalidade as reservas de que dispomos.
Assinalamos, em primeiro lugar, o regime fascista, com todo o seu cortejo de violências e terror, como o principal factor no agravamento das limitações que sofre hoje o povo brasileiro no plano das liberdades democráticas. Essas limitações, actualmente como no passado, muito vêm contribuindo para as dificuldades que sempre encontrou em todo o processo de formação de sua consciência política e elevação de seu nível organizativo o povo brasileiro.
O Partido, como parte de nosso povo, enraizado na realidade brasileira, não poderia ficar infenso a estas influências negativas.
Destacamos também o facto de que houve um aperfeiçoamento, uma mudança qualitativa no trabalho dos órgãos de repressão. E, ante isso, nossos métodos de trabalho e de organização, outrora suficientes, se tomaram hoje obsoletos.
O nível do aparelho policial é actualmente técnica e organicamente muito mais eficiente que há dez anos atrás, e isso exige métodos técnicos de organização e de trabalho clandestino mais aperfeiçoados.
Enfrentamos agora não só a polícia brasileira, mas também organizações como a CIA, que assessoram, financiam e agem directamente no país, aplicando a experiência acumulada na prática de crimes no Vietname, Coreia, África do Sul, Oriente Próximo e Portugal. O inimigo conhece e aplica as mais modernas e sofisticadas técnicas de repressão, estudadas na RFA, USA, etc., sob a direcção de organizações internacionais especializadas na repressão ao comunismo.
É preciso ainda assinalar que algumas debilidades, intrínsecas à nossa própria organização, permitiram a profundidade dos golpes sobre nós desfechados. As dificuldades objectivas e a repressão não devem, assim, servir de escudo à limitação da crítica.
Entre estas debilidades, destacamos as seguintes:
a) — Subestimação das modificações qualitativas introduzidas na vida política brasileira, depois do golpe militar de 1964, e que abriram caminho à implantação do fascismo no país.
Apesar de qualificarmos o actual regime político como fascista, em geral actuamos sem levar isso em conta.
Não fomos igualmente capazes de perceber o grau de aperfeiçoamento dos órgãos repressivos. Daí as vacilações para romper com a devida audácia e em tempo útil com certas formas orgânicas e estilos de trabalho consolidados por uma rotina criada em situação diferente, no passado. Trata-se nas condições actuais de criar novas formas de organização e trabalho adaptadas a um Partido que, a partir do golpe de 64, teve que trabalhar sob o terror fascista.
Não fizemos esforços para criar organismos de defesa indispensável à segurança da direcção do Partido e de seus quadros e militantes. Não cuidamos da educação ideológica e preparo dos quadros para uma actuação em condições cada vez mais duras.
b) — Subestimação da necessidade e do papel do Partido como instrumento capaz de unificar a maioria do povo brasileiro contra o regime fascista, a fim de conseguir o isolamento e a derrota deste. E, assim, criar as condições básicas, não só para as grandes transformações exigidas pelo actual estágio de desenvolvimento da sociedade brasileira, como também pela abertura do caminho para o socialismo — objectivo pelo qual lutam os comunistas. Não acompanhamos, por isso mesmo, nossas acções políticas de maiores esforços para aperfeiçoar o Partido como organização. Nem no que tange à quantidade e qualidade de sua militância; nem quanto ao preparo dos quadros política, teórica e praticamente capazes; e nem quanto ao aperfeiçoamento de seu trabalho de direcção, com base num maior conhecimento da realidade brasileira e num planejamento realista e controlo sistemático.
No cumprimento das tarefas e decisões não temos demonstrado espírito de disciplina consciente, de entusiasmo revolucionário e de criatividade ao nível desejável. E ante o inimigo de classe, nem sempre temos dado prova da decisão e coragem que devem nos caracterizar.
c) — Subestimação do papel das massas no processo revolucionário e, em primeiro lugar, da classe operária, o que se revela no pouco empenho em organizar a actividade política dos comunistas que actuam nas organizações de massa, como sindicatos e outras organizações de trabalhadores, nas associações de bairro, nas escolas e universidades, nas associações culturais e desportivas. Isso nos impede de conhecer os problemas específicos das massas os mais sentidos, que afectam a vida do povo, e de traçar uma política acertada para elas.
d) — Subestimação da solidariedade internacional ao nosso povo e ao nosso Partido, que pode e deve ser desenvolvida pelos partidos irmãos, aliados e organizações democráticas internacionais e os povos de todo o mundo.
4. As debilidades assinaladas e muitas outras revelam que, até agora, apesar dos esforços feitos neste sentido, o Partido ainda não é orientado por uma firme ideologia proletária. A ideologia pequeno-burguesa ainda persiste entre nós e, em diferentes momentos, nos tem levado a posições de aventureirismo ou de liberalismo, golpistas ou de passividade. Isso tanto no terreno político, quanto no de organização.
Estas posições têm se manifestado nas ideias da revolução a curto prazo; da organização para um dado momento, e não tendo em vista o processo revolucionário; na falta de previsão científica, tanto no que concerne ao planejamento, à organização da aplicação dos planos aprovados e o controlo dos mesmos; na subestimação da criação de um Partido que possa levar a cabo suas tarefas históricas com a maior economia possível de bens materiais e sobretudo de vidas humanas; na subestimação do inimigo de classe.
Essa situação, determinada por inúmeros factores de ordem objectiva, se agrava enormemente por nosso desligamento da classe operária, única força capaz de dirigir consequentemente o processo revolucionário em nossa pátria.
5. A compreensão de nossos erros e de suas causas, assim como a busca dos caminhos para corrigi-los, é um processo permanente, no qual devem se empenhar não apenas a direcção central do Partido, mas todos os seus quadros, dirigentes e militantes, que devem contribuir com seus conhecimentos e experiência para o êxito desta tarefa. Inegavelmente, se trata de uma tarefa difícil, que exige um esforço colectivo de elaboração, de carácter permanente, uma vez que tantos factores históricos como sociais da formação da sociedade brasileira exercem influência na formação e desenvolvimento do Partido. Por isso mesmo, devem ser estudados e pesquisados.
Este trabalho não deve estar desvinculado da rica experiência acumulada por nosso Partido em 54 anos de luta revolucionária, de esforços pela assimilação da experiência dos partidos irmãos, do estudo permanente do marxismo-leninismo. Sem isso, qualquer tentativa autocrítica estaria fadada ao fracasso.
6. Actualmente, a política de organização do Partido, mais do que nunca, deve estar voltada para as tarefas do processo revolucionário em curso. A estrutura orgânica do Partido, inclusive a estrutura de sua direcção, deve estar colocada em função das tarefas concretas de cada momento. Ao mesmo tempo, não se pode perder de vista o facto de que a tarefa principal de nosso Partido é conduzir a luta revolucionária até seu objectivo final: a tomada do poder pelo proletariado, a implantação de sua ditadura de classe e, consequentemente, do socialismo no Brasil.
É, portanto, em função das tarefas políticas e de organização do momento actual, assim como de seu desenvolvimento posterior, que devemos adoptar as medidas que emanam das conclusões políticas a que o CC chegou nesta reunião.
7. Vivemos hoje uma situação excepcional. Paralelamente à brutal repressão que se abateu sobre nós, desenvolve-se no país um movimento de massas de oposição p ditadura, que se manifesta pelas mais diferentes formas, envolvendo milhões de brasileiros, de todas as classes e camadas sociais, como ficou demonstrado nas eleições de 74. Isso também se revelou nas recentes manifestações de protesto contra as torturas e o assassinato de comunistas, democratas e patriotas, nos cárceres da reacção.
É nesta situação objectiva que o partido pode e deve actuar, não obstante as difíceis condições em que nos encontramos.
A justa combinação do trabalho legal com o ilegal, que nem sempre tem sido observada por nós, deve ser uma de nossas principais preocupações, a partir de agora.
Mais do que nunca é actual o princípio do marxismo-leninismo segundo o qual quanto maior a actividade política das massas, maiores também as possibilidades para a actuação do Partido.
Milhões de brasileiros, em sua prática, se orientam pelas posições políticas de nosso Partido, incorporando-se, de diferentes maneiras, à luta contra o fascismo. Isso nos dá condições para prosseguir o desenvolvimento de nossa actividade política, em quaisquer condições e inclusive sob a repressão fascista.
A segurança do Partido e da sua direcção necessita ser garantida nas circunstâncias actuais. E para isso existem condições. Os militantes comunistas devem actuar estreitamente ligados às massas. Somente assim os golpes da reacção poderão ser neutralizados.
8. São grandes as dificuldades que o Partido enfrenta no momento actual. Entretanto, contando com a combatividade de nossos militantes, com a solidariedade do movimento comunista internacional, defendendo e reforçando cada vez mais a unidade em tomo da orientação política do VI Congresso e da direcção do Partido poderemos cumprir com êxito as tarefas a que nos propomos.
1. Assegurar, por todos os meios possíveis, a orientação política do Partido nas organizações de massa em que temos influência, principalmente às da classe operária, de jovens e mulheres. Neste sentido, desenvolver esforços junto a todas as organizações e personalidades políticas, religiosas e culturais que possam participar da luta antifascista, em maior ou menor medida.
A ditadura fascista quer evitar, por meio da violência a mais brutal, que a orientação política do Partido chegue ao povo brasileiro. É nosso dever impedir que isso aconteça.
2. Determinar que a reorganização do trabalho de direcção e do Partido esteja voltado para o interior do país. Neste processo de reorganização, o centro da actividade recairá, prioritariamente, na construção do Partido nas grandes empresas.
Devemos organizar os comunistas que vivem no exterior, de acordo com os princípios de organização de nosso Partido.
Ainda como elemento importante de nossa política de organização, devemos iniciar um trabalho planificado de formação de quadros marxistas-leninistas, a fim de que possamos, num futuro não muito distante, passar a conhecer melhor a realidade brasileira e aplicar correcta e criadoramente o marxismo-leninismo.
É um dos pontos importantes de nossa política de organização este trabalho ideológico. Visa também combater os erros e desvios por nós constatados, tais como: a concepção errónea do papel da classe operária na revolução; a subestimação do Partido, o não vê-lo como um partido operário por sua essência, indispensável à realização da ligação da teoria do comunismo científico com o movimento espontâneo da classe operária.
3. Nossa política no continente: organizar nossa actuação no continente, junto aos partidos irmãos e as organizações democráticas e patrióticas, com o objectivo de contribuir para a unidade de acção dos povos dos países irmãos, na luta contra o imperialismo norte-americano e sua ponta-de-lança no continente, a ditadura fascista do Brasil.
4. Solidariedade internacional. Desenvolver a luta pela intensificação da solidariedade internacional, em todas as regiões do mundo, visando criar, também no exterior, um grande movimento de opinião pública mundial contra o fascismo no Brasil. Esse trabalho deve estar voltado para os partidos irmãos e organizações de massa de âmbito internacional.
Dezembro de 1975
O Comité Central do Partido Comunista Brasileiro
Inclusão | 30/03/2015 |