"A metáfora que dá título a este livro leva de volta à origem semântica um dos mais importantes marcos históricos da construção dos Direitos Humanos. Em 1215, o habeas corpus nasceu na Inglaterra para conter o poder ilimitado dos reis e como exigência de justo processo legal. Ter o corpo levado à presença de um juiz queria dizer, simplesmente, apresente a pessoa com vida. No Brasil de 2010, ao lado dos grandes avanços democráticos acumulados desde 1988, com maior nitidez nos últimos 16 anos e, sobretudo, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o tema da metáfora segue ainda cercado de dor, dúvidas, hesitações, mistérios, ocultações e impunidade. Ter o corpo, neste livro, significa literalmente devolver às famílias, companheiros e amigos os restos mortais de um número expressivo de brasileiros e brasileiras que foram mortos - quase todos sob torturas - por resistir a um regime ditatorial que violou as regras da vida constitucional republicana durante 21 anos. Acima de qualquer controvérsia ideológica a respeito daquele regime, desponta como certeza a persistência de uma dívida inegável do Estado brasileiro, ainda não resgatada. O reconhecimento da responsabilidade do Estado pelas violações de Direitos Humanos praticadas durante a ditadura já está consolidado. Mas ainda faltam alguns passos indispensáveis para que se considere plenamente concluída a longa transição para uma democracia irreversível. Faltava também um livro-relatório como este, com o foco concentrado exclusivamente nos desaparecidos políticos em seu sentido mais amplo: quem não teve o corpo entregue à família conforme determinam as leis, mesmo as leis ilegítimas de um regime autoritário."