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Fonte: www.marxists.org/espanol/trotsky/ceip/permanente/tareasypeligrosdelarevolucionenlaindia.htm
Tradução do espanhol: Ramsés Eduardo Pinheiro de Morais Sousa.
HTML de: Fernando A. S. Araújo.
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A Índia é o país colonial clássico e a Grã-Bretanha é a metrópole clássica. Toda a perversidade das classes dominantes e todas as formas de opressão que o capitalismo tem usado contra os povos atrasados do Oriente encontra sua síntese mais completa e atroz na história da gigantesca colônia a que os imperialistas britânicos prenderam como sanguessugas há um século e meio. A burguesia inglesa se esforçou para cultivar todos os vestígios da barbárie e todas as instituições medievais que servem a exploração do homem pelo homem. Obrigou seus agentes feudais a adaptarem-se a exploração colonial capitalista e fez deste vínculo, o seu corpo, a sua correia de transmissão para as massas.
Os imperialistas britânicos gabam-se de suas ferrovias, canais e empresas industriais na Índia, que tiveram investimento de cerca de quatro bilhões de dólares em ouro. Entre muita fanfarra, os exegetas do imperialismo compararam a Índia contemporânea com a Índia antes da ocupação colonial. Mas quem pode duvidar por um momento que uma nação privilegiada de 320 milhões de habitantes, se desenvolveria de forma infinitamente mais rápida e mais próspera se fosse sacudido o jugo da pilhagem sistemática e organizada? Basta mencionar os quatro bilhões de dólares que representam o investimento britânico na Índia, para imaginar o que a Grã-Bretanha retira deste país em cinco ou seis anos.
Apesar de não dar a Índia, mais doses de tecnologia e cultura para facilitar a exploração das riquezas do país, o Shylock do Tâmisa não poderia evitar a propagação, crescente, das idéias de independência econômica e nacional entre as massas.
Como ocorre nas nações burguesas mais velhas, as numerosas nacionalidades da Índia só podem ser fundidas em uma única nação através da revolução que as unifique cada vez mais estreitamente. Mas, ao contrário dos países mais velhos, esta revolução na Índia é uma revolução colonial dirigida contra a opressão estrangeira. É, também, a revolução de uma nação historicamente atrasada em que a servidão feudal, as divisões de casta e da escravidão ainda existem ao lado dos antagonismos de classe da burguesia e do proletariado, que agravou-se muito no último período.
O caráter colonial da revolução na Índia contra um dos opressores mais poderosos mascara, para alguns, o alcance dos antagonismos sociais internos do país, especialmente aos olhos daqueles que se aproveitam desta máscara. Na verdade, a necessidade de livrar-se de um sistema de opressão colonial, cujas raízes estão embutidos na velha exploração nativa, exigem das massas indianas um tremendo esforço revolucionário, o que por si só outorga uma enorme envergadura a luta de classes. O imperialismo britânico não abandonará voluntariamente suas posições, como ele humildemente abana o rabo para os Estados Unidos, se esforçará até a última gota de energia maldade para esmagar a Índia insurgênte.
Esta é, certamente, uma grande lição de história. A revolução indiana, mesmo nesta fase que não escapou a liderança traiçoeira da burguesia nacional, é esmagada pelo governo "socialista" de Mac Donald. As represálias sangrentas por esses canalhas da Segunda Internacional, que se comprometem a instituir o socialismo pacificamente em seus próprios países, são um sinal do que o imperialismo britânico tem reservado para a Índia. As discussões da social-democracia sobre a forma de conciliar os interesses da Inglaterra burguesa com os da Índia democrática são o complemento necessário à repressão sangrenta de Mac Donald, que sempre está disposto, entre massacre e massacre, a enviar ainda uma outra comissão de reconciliação.
A burguesia britânica compreende perfeitamente bem que a perda da Índia não só significaria o colapso estrondoso do seu poder mundial, que já está em avançado estado de decomposição, mas também uma catástrofe social interna. Trata-se de uma luta de vida ou morte. Todas as forças começam a agir. Isto significa que a revolução deve mobilizar todos os seus recursos. Milhões de pessoas têm-se colocado em movimento. Tal implantaram o poder espontâneo que a burguesia nacional foi forçada a agir para controlar o movimento e cortar seu fio revolucionário.
O movimento de resistência passiva de Gandhi é o nó tático que amarra a ingenuidade e a abnegada cegueira das massas pequeno-bueguesas dispersas às traiçoeiras manobras da burguesia liberal. O fato de o Presidente da Assembléia Legislativa da Índia, a instituição oficial de conluio com o imperialismo, ter deixado seu posto para assumir o boicote aos produtos britânicos é profundamente simbólica.
"Vamos provar — diz a burguesia nacional para os senhores do Tâmisa — eles são indispensáveis, que não podem silenciar as massas sem o nossa concurso, mas este concurso tem o seu preço."
Mac Donald responde aprisionando Gandhi. É possível que o lacaio exceda as intenções do mestre, porque ele exibe um zelo que excede o seu dever de provar que está acima de qualquer suspeita. É possível que os conservadores, imperialistas sérios e experientes, não tenham ido tão longe nesta fase. Mas por outro lado, os líderes nacionais da resistência passiva necessitam dessa repressão para dar brilho às suas enfermas reputações. Mac Donald irá fornecer este serviço. Enquanto massacra os trabalhadores e camponeses, prende Gandhi depois de avisá-lo com suficiente antecipação, tal como fez o Governo Provisório Russo com os Kornilovs Denikins.
Se a Índia é um componente do domínio interno da burguesia inglesa, a dominação imperialista do capital britânico sobre a Índia não é menos componente de ordem interna indiana. A questão não pode ser reduzida à mera expulsão de dezenas de milhares de exploradores estrangeiros. Não se pode separá-los dos opressores internos, e quanto mais se fortalece a pressão das massas, menor será o desejo dos opressores nacionais de separar-se dos estrangeiros. Como na Rússia a liquidação do czarismo e de suas dívidas ao capital financeiro mundial só foi possível porque os camponeses tiveram de abolir a monarquia para abolir o latifúndio, na Índia a luta contra a opressão estrangeira deriva, para as massas inumeráveis de camponeses oprimidos e semipauperizados, da necessidade de liquidar os latifundiários feudais, e seus agentes e intermediários, os funcionários locais e os usurários predatórios.
O camponês indiano quer uma distribuição "eqüitativa" da terra. Essa é a base da democracia. E é, ao mesmo tempo, a base social da revolução democrática em seu conjunto.
Na primeira etapa de sua luta, os camponeses atrasados, inexperientes e dispersos, que em todas as aldeias se opõem aos representantes individuais do regime odiado, sempre recorrem a resistência passiva. Deixam de pagar o arrendamento ou os impostos, escapam para a selva, desertam do serviço militar, e assim por diante. As fórmulas tolstoianas de resistência passiva foram, em certo sentido, a primeira etapa do despertar revolucionário das massas camponesas russas. Gandhismo é o mesmo em relação às massas da Índia. Quanto mais "sincero" se mostra Gandhi pessoalmente, mais útil é aos amos para disciplinar as massas. O apoio prestado pela burguesia à resistência passiva ao imperialismo é apenas pré-condição para sua resistência sangrenta diante das massas revolucionárias.
A história registra mais de uma ocasião em que os camponeses passaram de formas passivas de luta para as guerras mais amargas e sangrentas contra seus inimigos imediatos: os proprietários, autoridades locais, os usurários predatórios. Na Idade Média houve muitas guerras camponesas na Europa, também abundaram represálias cruéis contra elas. Tanto a resistência passiva como a insurreição sangrenta dos camponeses só podem se tornar uma revolução sob a liderança de uma classe urbana, que logo assume a liderança da nação revolucionária, depois da vitória, torna-se a depositária do poder revolucionário. Nos tempos modernos, essa classe é unicamente o proletariado, também no Oriente.
É verdade que o proletariado indíano é numericamente menor que o proletariado russo, às vésperas de 1905 e 1917. Esta realidade de um proletariado relativamente pouco numeroso foi o principal argumento de todos os filisteus, todos os Martinovs, todos os mencheviques contra a perspectiva da revolução permanente. A concepção de que o proletariado russo, empurrando a burguesia para o lado, poderia ser colocado à frente da revolução agrária dos camponeses e promoveria sobre esta onda a ascenção da ditadura revolucionária parecia fantástica. Acreditavam-se realistas quando confiavam em que a burguesia liberal, contando com as massas da cidade e do campo, realizaria a revolução democrática. Mas descobriu-se que as estatísticas da população não são um índice do papel econômico e político das diversas classes. A Revolução de Outubro o demonstrou de uma vez por todas, e de maneira mais convincente.
Se hoje o proletariado indiano é numericamente menor do que o russo, isso não significa que suas possibilidades revolucionárias são menores; a fraqueza numérica do proletariado russo, em comparação com o norte-americano e o britânico não foi um obstáculo para o estabelecimento da ditadura do proletariado na Rússia. Pelo contrário, todas as peculiaridades sociais que tornaram possível e inevitável a Revolução de Outubro existem na Índia e de forma agravada. Neste país de camponeses pobres, a hegemonia da cidade não é menor do que na Rússia czarista. A concentração do poder industrial, comercial e bancário nas mãos da grande burguesia, especialmente nas mãos da burguesia estrangeira, e o rápido crescimento do proletariado industrial, excluem a possibilidade de que a pequena burguesia urbana, e até mesmo intelectuais, desempenhem um papel independente. Isso transforma o mecanismo político da revolução em uma luta entre o proletariado e a burguesia pela liderança das massas camponesas. Falta uma "simples" condição: um partido bolchevique. E que é, neste momento, o ponto crucial do problema. Vimos como Stalin e Bukharin aplicaram na China a concepção menchevique da revolução democrática. Armado com um aparato poderoso, foram capazes de aplicar as fórmulas mencheviques na ação e, portanto, foram forçados a levá-las até as suas últimas consequencias. Para garantir o protagonismo da burguesia na revolução burguesa (esta é a concepção fundamental do menchevismo russo), a burocracia stalinista transformou o jovem Partido Comunista Chinês em uma seção subordinada do partido burgues nacional. Segundo o acordo formal assinado por Stalin e Chiang Kai-shek (através do atual Comissário do Povo da Educação, Bubnov), os comunistas receberam apenas um terço dos lugares do Kuomintang. Com isto o partido do proletariado entrou na revolução como cativo oficial da burguesia, com a bênção do Comintern. O resultado é conhecido: a burocracia stalinista destruiu a revolução chinesa. Foi um crime político sem precedentes na história.
Junto com a idéia reacionária do socialismo num só país, em 1924, Stalin levantou a palavra de ordem de "partidos biclasistas operários e camponeses” para a Índia, bem como para todos os países do Oriente. Com esta palavra de ordem procurou-se novamente impedir que o proletariado tivesse um partido e uma política independentes. Desde então, o pobre Roy se tornou um apóstolo do partido "popular" ou "democrático" supraclasista que engloba tudo. A história do marxismo, os processos do século XIX, a experiência de três revoluções russas, nada, nada disto teve seus efeitos sobre estes senhores. Todavia, ainda não compreendi porque o "partido dos trabalhadores e camponeses" só é concebível sob a forma de um Kuomintang, isto é, um partido burguês que arrasta os operários e camponeses para traí-los e esmagá-los mais tarde. A história nunca conheceu outro tipo de partido supraclasista, global. Depois de tudo, Roy – o agente de Stalin na China, o profeta da luta contra o "trotskismo" e o executor do "bloco de quatro classes" Martynovista — foi um bode expiatório para os crimes da burocracia stalinista após inevitável derrota da revolução chinesa.
Na Índia, seis anos foram desperdiçados em experimentos desgastantes e desmoralizantes para realizar a fórmula stalinista dos partidos biclasistas de trabalhadores e camponeses. Os resultados são claros: partidos de “trabalhadores e camponeses" provinciais débeis, que vacilam, avançam aos tropeços ou simplememente se desintegram ou desaparecem no preciso momento em que supõe-se que deveriam atuar, no momento de ascenço revolucionário. Mas não há um partido proletário. Deverá ser formados no calor dos acontecimentos. E para isto é necessário remover a montanha de escombros criados pela direção burocrática. Essa é a situação! Desde 1924 a direção do Comintern fez todo o possível para que o proletariado indiano permanecesse impotente, para enfraquecer a vontade da vanguarda proletária, para cortar as asas.
Enquanto Roy e outros discípulos de Stalin desperdiçavam anos valiosos no desenvolvimento de um programa democrático para um partido supraclasista, a burguesia nacional aproveitou essas circunstâncias ao máximo para assumir o controle total dos sindicatos.
Na Índia está-se criando um Kuomintang, não como um partido político, mas como um "partido" dentro dos sindicatos. Agora, no entanto, assustados com sua própria obra, seus criadores a deixaram de lado, caluniando os "executores". Desta vez, os centristas saltaram para a "esquerda", mas a situação não melhorou com isso. A posição oficial da Internacional Comunista sobre os problemas da revolução na Índia é uma confusão tão miserável que parece ser criado especialmente para desorientar a vanguarda proletária e levá-la ao desespero. A metade das vezes ocorre porque a direção tenta constantemente e conscientemente esconder seus erros de ontem. A outra metade da confusão pode ser atribuída à incapacidade do centrismo.
Aqui não nos referimos ao programa da Internacional Comunista, que atribui um papel revolucionário à burguesia colonial e apoia plenamente as invenções de Brandler e Roy, que continuam a usar o disfarce de Martynov e Stalin. Tampouco nos referimos a inumeráveis edições do livro de Stalin Problemas do leninismo, em que continua, em todas as línguas do mundo, a exposição sobre os partidos biclasistas de trabalhadores e camponeses. Não. Nós limitamo-nos ao presente, como a questão é colocada hoje no Oriente, em consonância com os erros de terceira da Internacional Comunista.
A palavra de ordem central dos stalinistas, tanto na Índia como na China, continua a ser a ditadura democrática dos operários e camponeses. Ninguém sabe, ninguém explica, porque ninguém entende, o que significa agora esta palavra de ordem, no ano 1930, após a experiência dos últimos 15 anos. Qual é a diferença entre ditadura democrática dos operários e camponeses da ditadura do Kuomintang, que massacraram os trabalhadores e camponeses? Os Manuilskis e Kuusinens responderão, talvez, que falavam da ditadura de três classes (trabalhadores, camponeses e pequena burguesia urbana) e não quatro, como na China, onde Stalin foi tão bem sucedido em atrair ao bloco o seu aliado Chiang Kai-shek.
Se assim for, nós respondemos, tratem de explicar por que rejeitam a burguesia nacional como um aliada na Índia, a mesma burguesia nacional pela qual expulsaram e depois prenderam o Partido Comunista Chinês, e os bolcheviques que a repudiaram. A china é um país semi-colonial. Na China não existe uma casta poderosa de senhores feudais e seus agentes. Mas a Índia é um país colonial clássico, com poderosos remanescentes do sistema de castas feudal. Se Stalin e Martinov deduzem o papel revolucionário da burguesia chinesa da presença da opressão estrangeira e dos restos feudais neste país, na Índia, cada uma dessas razões atua com força dobrada. Isto significa que a burguesia indiana, de acordo com uma interpretação estrita do programa da Internacional Comunista, tem um direito infinitamente maior de exigir a sua integração no bloco stalinista (de quatro classes) que a burguesia chinesa, com seu inesquecível Chiang Kai-shek e seu "fiel" Wan Tin-wei. Mas visto que este não é o caso, porque, apesar da opressão do imperialismo britânico e do legado da Idade Média, a burguesia indiana só é capaz de desempenhar um papel contra-revolucionário e não revolucionário vocês devem repudiar implacavelmente a política traiçoeira aplicada na China e corrigir imediatamente o seu programa, em que esta política deixou vestígios pusilânimes, mas sinistros!
Mas isso não esgota o problema. Se a Índia está construindo um bloco sem a burguesia e contra a burguesia, quem vai dirigir? Os Kuusinens e Manuilskis responderão talvez com a indignação arrogante de sempre: "Pois o proletariado, é claro!" Bem, respondemos, perfeitamente. Mas se a revolução indiana é desenvolvida com base em um bloco de trabalhadores, camponeses e da pequena burguesia; se este bloco combaterá não só o imperialismo e o feudalismo, mas também a burguesia nacional, estreitamente ligada a eles em todos os problemas fundamentais; se a cabeça deste bloco é o proletariado; se este bloco somente chega a vitória varrendo os seus inimigos por uma insurreição armada e, assim, eleva o proletariado ao papel do verdadeiro líder da nação, neste caso surge a pergunta: quem vai exercer o poder após a vitória, se não o proletariado? E neste caso, qual é a diferença entre a ditadura democrática dos operários e camponeses e a ditadura do proletariado, que lidera os camponeses? Em outras palavras, qual é a diferença entre a hipotética ditadura de operários e camponeses e o regime que estabeleceu a Revolução de Outubro?
Não há resposta para esta pergunta. Não pode havê-la. O curso do processo histórico converteu a "ditadura democrática", em uma ficção oca, e também uma armadilha traiçoeira para o proletariado. Bela palavra de ordem, que dá origem a duas interpretações diametralmente opostas: uma, a ditadura do Kuomintang, outra, a ditadura de outubro! Pois se excluem mutuamente. Na China os stalinistas interpretam a ditadura democrática de duas maneiras, primeiro como uma ditadura do Kuomintang de direita, depois, como uma ditadura de esquerda. Como explicá-la na Índia? Eles permanecem em silêncio. Eles são forçados a ficar em silêncio por medo de abrir os olhos dos seus adeptos para os seus crimes. Esta conspiração de silêncio é de fato uma conspiração contra a revolução indiana. E todo o clamor extremamente esquerdista ou ultra-esquerda atual na melhor das coisas é um apêndice, porque as vitórias da revolução não são atendidas com gritos e barulho, mas sim com clareza política.
Mas isso não é suficiente para desenrolar o novelo. Alguns tópicos são enredados precisamente neste ponto. Ao mesmo tempo que conferem a revolução um caráter democrático abstrato e permitem chegar à ditadura do proletariado somente após estabelecida alguma espécie de "ditadura democrática" mística ou supersticiosa, nossos estrategistas rejeitam a palavra de ordem política central de todo o movimento democrático revolucionário, precisamente a palavra de ordem de uma assembléia constituinte. Por quê? em que base? É absolutamente incompreensível. Para o camponês, a revolução democrática significa igualdade, especialmente partilha igual da terra. A igualdade perante a lei depende desta igualdade prévia. A Assembleia Constituinte onde formalmente os representantes de todo o povo ajustam suas contas com o passado, mas onde a realidade das diversas classes ajustam suas contas reciprocas, é a expressão generalizada, natural e inevitável das tarefas democráticas da revolução, não apenas na consciência das massas camponesas que despertam, mas também na consciência da própria classe trabalhadora. Nos estendemos neste ponto com relação à China, e não vemos necessidade de repetir aqui. Acrescentemos apenas que a multiplicidade provinciana da Índia, as variadas formas governamentais e sua não menos variada interpenetração com as relações feudais e de castas, conferem a palavra de ordem de uma assembléia constituinte um conteúdo democrático revolucionário particularmente profundo.
Atualmente, o teórico da revolução indiana no Partido Comunista da União Soviética é Safarov, que, graças a uma feliz capitulação, passou com sua desastrosa música para o campo do centrismo. Em um artigo programático sobre as forças e as tarefas da revolução na Índia, publicada no bolchevique, Safarov gira cuidadosamente em torno da questão da Assembléia Constituinte como um rato experiente em torno de um pedaço de queijo posto em uma armadilha. Este sociólogo quer evitar a todo custo cair na armadilha do trotskismo. Resolve o problema sem a maior preocupação, para se opor à Assembléia Constituinte da seguinte perspectiva:
"O desenvolvimento de um novo ascenço revolucionário sobre a base [!] da luta pela hegemonia proletaria leva à conclusão [a quem? Como? Por quê?] de que a ditadura do proletariado e do campesinato na Índia só é possível sob a forma Soviética." (Bolchevique, No. 5, 1930, pg. 100).
Parágrafo incrível! Martinov multiplicado por Safarov. A Martinov o conhecemos. E quanto a Safarov, Lênin disse uma vez, não sem certa ternura, que "Safarchik irá para a esquerda, Safarchik vai cair de cara." A perspectiva apresentada por Safarov não invalida essa caracterização. Tem sido bem à esquerda e deve ser reconhecido que não violou a segunda parte da previsão de Lênin. Vejamos em primeiro lugar o problema de que o ascenso revolucionário das massas é desenvolvido "com base" na luta dos comunistas pela hegemonia proletaria. Isso é colocar o processo de cabeça para baixo. Acreditamos que a vanguarda proletaria inicia, ou se prepara para iniciar, ou deveria iniciar, a luta pela hegemonia na base de um novo ascenço revolucionário. A perspectiva de luta, de acordo com Safarov, é a ditadura do proletariado e do campesinato. Aqui ele elimina a palavra "democrático" por causa do esquerdismo. Mas não se afirma claramente de que tipo de ditadura biclasista se trata: Kuomintang ou Outubro. Ele nos dá sua palavra de honra de que esta ditadura pode ser alcançada "apenas na forma de sovietes". Parece muito nobre. Por que queremos a palavra de ordem de uma assembléia constituinte? Safarov só está disposto a aceitar a "forma" soviética.
A essência do epigonismo — sua essência desprezível e sinistra — reside em abstrair dos processos reais do passado e suas lições tão somente a forma, que se torna um fetiche. Isto é o que aconteceu com os sovietes. Sem dizer nada sobre o caráter de classe da ditadura — a ditadura da burguesia sobre o proletariado tipo Kuomintang? Ou ditadura do proletariado sobre a burguesia tipo em Outubro? — Safarov entorpece alguém, principalmente a si mesmo, com a forma soviética da ditadura. Como se os soviéts não pudessem ser uma arma para enganar os operários e camponeses! O que mais foram, se não, os soviéts mencheviques e social-revolucionários de 1917? Uma arma para reforçar o poder da burguesia e preparar a sua ditadura. O que foram os sovietes social-democratas da Alemanha e Áustria em 1918-1919? Organizações para salvar a burguesia e para enganar os trabalhadores. Com o maior desenvolvimento da movimentação revolucionária na Índia, com um ascenço maior das lutas de massas e o enfraquecimento do Partido Comunista – e isso é inevitável, se impor-se o embroglio safaroviano — , é possível que a burguesia nacional indiana crie soviets operários e camponeses para dirigí-los, assim como agora dirige os sindicatos, para estrangular a revolução como os social-democratas alemães fizeram quando ela se tornou chefe dos soviets. A natureza traiçoeira da palavra de ordem da ditadura democrática é que não fecha aos inimigos de uma vez por todas essa possibilidade.
O Partido Comunista da Índia, cuja criação demorou seis anos - e que anos! - Vê-se privado, em meio ao ascenso revolucionário, de uma das armas mais importantes para mobilizar as massas, precisamente o slogan democrático da assembléia constituinte. Em vez disso, este jovem partido, que ainda não deu os seus primeiros passos, padece do slogan abstrato de sovietes como forma de uma ditadura abstrata, isto é, uma ditadura que ninguém sabe que tipo é. A apoteose da confusão! E tudo isso vem acompanhado, como sempre, pelo repugnante retoque e embelezamento de uma situação bastante grave e nada agradável.
A imprensa oficial, e o mesmo Safarov em particular, apresentam a situação como se o nacionalismo burgues indiano fosse um cadáver, como se o comunismo tivesse vencido ou estivesse em processo de conquistar a aliança do proletariado e este por sua vez já arrastara o campesinato. Com a maior irresponsabilidade os líderes e sociólogos falam sobre seus desejos como uma coisa já realizada. Para colocá-lo mais corretamente, em vez de afirmar a realidade resultante da sua política errônea, afirmam como real o que poderia haver sido, de ter aplicado uma política correta nos últimos seis anos. Mas quando a incoêrencia da fantasia e da realidade vier à luz, a culpa recairá sobre os comunistas indianos por executar mal esta incoerência geral que recebe o nome de linha geral.
A vanguarda do proletariado indiano esta apenas no limiar da sua grande obra e tem um longo caminho a percorrer. Uma série de derrotas será o preço a pagar não só pelo atraso do proletariado e do campesinato, mas também pelos pecados da direção. A tarefa principal, neste momento, é conseguir obter uma compreensão marxista clara das forças motrizes da revolução e uma perspectiva correta, uma política previdente para rejeitar fórmulas estereotipadas da burocracia e que, para realizar as magnas tarefas revolucionárias, ajusta-se cuidadosamente às etapas reais do despertar político e crescimento revolucionário da classe operária
Inclusão | 25/12/2011 |