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No discurso abaixo, pronunciado na Câmara Federal pelo deputado comunista pelo Estado de S. Paulo, Diógenes Arruda, na sessão de 9 de junho p.p. é estudado, de maneira concreta e justa, o problema do aumento de cem por cento nos salários mínimos para o trabalhador e sua famílias, de vital interesse para o proletariado e para o progresso nacional.
O Sr. Diógenes Arruda — Sr. Presidente, Srs. Deputados. Tenho a honra de ocupar a tribuna desta Casa, a fim de apresentar um importante projeto de lei para o qual solicito a máxima atenção de todos os nobres colegas, pertencentes aos diversos partidos.
Trata-se de um projeto de lei que institui o salário mínimo para o trabalhador e sua família, dando, ao mesmo tempo, outras providências necessárias.
Ao ocupar, Sr. Presidente, pela primeira vez a tribuna parlamentar, era meu intuito tratar de problemas do Estado de São Paulo, do qual me orgulho ser representante nesta Casa. Na verdade, existem problemas especificamente paulistas, como o problema da energia elétrica ou o da imigração dos chamados "desajustados de guerra", que exigem ser debatidos com urgência, não só pela sua importância, como pela orientação errada que o governo vem seguindo. Apresentando, porém,, um projeto de lei sobre o salário mínimo, creio estar também levantando problema de real importância para São Paulo, porque, vai ao encontro das necessidades da grande massa trabalhadora.
Sr. Presidente, Senhores Deputados. Efetivamente, a instituição do salário mínimo foi uma importante conquista do proletariado, através de duras lutas. O salário mínimo também constitui, inegavelmente, um avanço nas conquistas sociais de nosso tempo. Mas, não se poda negar que, entre nós brasileiros, a sua adoção muito deixou a desejar. Ao invés de enfrentar o problema, trataram de contorná-lo habilmente com paliativos. E isto podemos provar com relativa facilidade. Em nossa Justificação ao projeto de lei apresentamos três fatores fundamentais que esclarecem os erros cometidos por ocasião da instituição do salário mínimo em nossa Pátria. São os seguintes:
Mas, Sr. Presidente, os três fatores fundamentais que assinalamos para mostrar quanto foi arbitrária a fixação do salário mínimo, foram ainda mais agravados pelo encarecimento vertiginoso do custo da vida verificado nestes últimos anos. Algumas das utilidades que entraram no cálculo do salário mínimo registraram aumentos de 300 a 400%. a partir de 1941, enquanto esse salário sofreu apenas acréscimo insignificante.
Foi, portanto, para corrigir tais deficiências que os ilustres constituintes de 1946, instituíram na nova Carta Constitucional, o salário mínimo familiar em oposição ao salário individual ainda em vigor no momento atual. Assim foi que o art. 157, item I, estabeleceu,
"salário mínimo capaz de satisfazer, conforme as condições de cada região, as necessidades normais do Trabalhador e de sua família".
Sr. Presidente, Senhores Deputados. Trata-se, pois, de regulamentar, com a máxima urgência, o dispositivo constitucional, estabelecendo também a nova remuneração mínima devida ao trabalhador. Tal é o objetivo do projeto de lei que ora apresentamos à consideração da Casa, pedindo para o mesmo a atenção de todos que, dentro ou fora do Parlamento, se interessam por tão importante problema.
Na Justificação do projeto de lei, procuramos mostrar o exemplo de outros países, como a Austrália, onde
"o salário mínimo é calculado tomando-se por base a unidade familiar média constituída de quatro pessoas, o casal e dois filhos''.
Vejamos também o exemplo do México, onde a sua Constituição investiu salário mínimo capaz de satisfazer
"as necessidades normais da vida do operário, à sua educação e aos seus prazeres honestos, considerando-o como chefe de família".
Quanto ao nosso caso parece-nos ser útil recorrer — apesar dos defeitos apontados — ao material de que dispomos e determinar, para efeito do cálculo do salário familiar, a majoração de 100% do que hoje vigora com caráter individual, acrescentando-se-lhe mais um adicional variável por filho menor, até o limite de três. Pensamos, assim que o projeto é bem modesto na sua pretensão de regulamentar o texto amplo da constituição e visa atender a problemas imediatos de ordem econômico-social. Com isso visamos proteger a família do trabalhador não especializado e que por isso mesmo luta com maiores dificuldades; possibilitar uma ampliação, embora pequena, do mercado interno; e, indiretamente, contribuir para aumentar a produção, dado que melhora a qualidade da mão de obra.
Sr. Presidente: por todas as justas razões que trazemos ao conhecimento da Casa e da opinião pública, estamos convictos de que o projeto de lei que tenho a honra de encaminhar à Casa em nome da bancada comunista, encontra toda a oportunidade no momento. E se alguma modificação deve sofrer, certamente será no sentido de elevar os índices do salário mínimo que propomos para as diversas regiões do país, tal a situação aflitiva em que vive uma enorme parcela da massa trabalhadora das cidades e dos campos.
Sr. Presidente, Senhores Deputados. Encaminhando o presente pronto de lei não desejo me alongar na leitura de todos os seus artigos, nem proceder, em torno dos mesmos, comentários mais largos, ou maior argumentação. Entretanto, não posso deixar de chamar a atenção dos nobres Deputados para aqueles artigos fundamentais, porque o seu prévio conhecimento, com os esclarecimentos necessários, por certo tornará mais claro o alcance nacional e patriótico do projeto de lei que institui o salário mínimo para o trabalhador e sua família.
Examinando o art. 2.° do projeto, por exemplo, conheceremos a maneira pela qual deve ser determinado o salário mínimo, isto é, levando em conta o valor das despesas diárias com alimentação, habitação, vestuário, higiene, recreação e transporte necessários à vida de um trabalhador e de sua família, "tomando por base um núcleo familiar de duas pessoas". Vejam, senhores Deputados, que apresentamos a questão de um modo, aliás, bem modesto. Sim, porque, em geral, os cálculos de uma família brasileira se fazem sempre à base de cinco pessoas; e nós procuramos fixar o salário mínimo tomando por base duas pessoas por família. Nada mais razoável, portanto, uma vez que na Austrália, como já foi acentuado, o salário mínimo foi estabelecido por uma família de quatro pessoas.
O Sr. Tristão da Cunha — V. Excia. ignora que a taxa do salário resulta da relação entre a disponibilidade de capitais e a população operária?
O Sr. Diógenes Arruda — Infelizmente V. Excia. está equivocado. Não se trata de estabelecer taxa de salário, mas de regular o salário mínimo, conforme preceitua a Constituição. Mas posso lhe esclarecer esta questão: a taxa do salário é estabelecida pela oferta e a procura de mão de obra e pelo grau de organização e de consciência da classe operária. Sem dúvida está também condicionada pelo progresso do País.
O Sr. Tristão da Cunha — Se assim é, se V. Excia. admite esse princípio econômico, não pode estabelecer o salário mínimo, pois tal salário traz como consequência fatal o desemprego de parte da população.
O Sr. Diógenes Arruda — Com tais palavras tenho dúvida se o nobre Deputado conhece o assunto. Por que o salário mínimo traz o desemprego? Nem V. Excia. nem qualquer outra pessoa pode responder a minha interpelação. A verdade é uma só: o salário mínimo traz a proteção para um enorme setor dos trabalhadores.
O Sr. Tristão da Cunha — No Brasil, é concedido aos trabalhadores da cidade em detrimentos dos trabalhadores do interior, da roça, que têm o salário diminuído na mesma proporção.
O Sr. Diógenes Arruda — Mais uma vez está equivocado o nobre Deputado. O projeto de lei que apresentamos estabelece o salário mínimo para o trabalhador urbano e rural.
O Sr. Tristão da Cunha — A lei natural não pode ser alterada.
O Sr. Diógenes Arruda — Que lei natural? Para V. Excia. existe lei para se morrer de fome? V. Excia. levantou uma questão que desejo esclarecer: foi ao ter afirmado que o salário mínimo só vigora para os trabalhadores da cidade. Não padece dúvida que isso acontece, devido, porém a burla da lei em vigor. Quando foi estabelecido o salário mínimo, os assalariados agrícolas, que não pagavam casa e podiam ter, às vezes, sua pequena horta foram obrigados, pelos proprietários da terra, a pagar a casa e proibidos de plantar qualquer coisa. Mais do que um abuso, isto é um crime. E o pior é que as autoridades não punem os infratores, os culpados.
Sr. Presidente, Senhores Deputados. Há ainda mais em nosso projeto de lei. Tomemos, por exemplo, o artigo 3.°, que diz:
"Ao salário mínimo do trabalhador que tiver filho menor de quatorze anos será adicionado um salário variável por filho até o máximo de três, não se fazendo, para esse efeito, distinção entre filhos legítimos ou ilegítimos".
Quero pedir, para esse artigo, a máxima atenção dos nobres deputados de todos os partidos. Trata-se de defender realmente a família brasileira. Com tal dispositivo iremos conhecer quem defende a família por princípio e quem defende da boca para fora. Ser contra esse artigo é perpetuar a miséria e a fome; ser a favor é levar um pouco mais de pão e de conforto aos lares pobres. Ser contra é pregar a dissolução irremediável da família; ser a favor é garantir uma prole mais sadia a fim de proporcionar-lhe mais vida, mais saúde, mais energia para engrandecer nossa economia e nosso povo.
Assistimos inúmeros e verdadeiros dramas no seio das famílias pobres do Brasil pela situação de miséria em que vivem. Vamos agora, senhores, dar um pouco mais de amparo a quem precisa: às famílias necessitadas, cujos filhos passam sem pão, sem escola, vivem nus, andam descalços e atacados pela verminose.
Sr. Presidente, um dos problemas mais sérios no Brasil é aquele que trata de amparo ao trabalhador nas indústrias insalubres. Conhecemos bem as miseráveis, desumanas, mesmo, condições de trabalho nas minas romo, por exemplo, Morro Velho e São Jerônimo, respectivamente em Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Por isso é que no art. 4.° estabelecemos que "o trabalhador ocupado em serviços insalubres terá o seu salário mínimo acrescido de 20%, 40% e 80% conforme se trate dos graus mínimo, médio ou máximo, respectivamente" .
O Sr. Tristão da Cunha — Não está na vontade de quem quer que seja fixar salários. Ele resulta de uma lei natural irremovível. Só se pode melhorar o salário de alguém à custa do de outrem.
O Sr. Diógenes Arruda — V. Excia. que tanto defende o aumento da produção nacional, está agora claramente contra tal aumento de produção. Porque a verdade é que os atuais salários, salários de fome, estão afetando diretamente o mercado interno.
O Sr. Tristão da Cunha — Não estou combatendo o aumento da produção nacional, mas, repito, só se pode aumentar o salário de um, à custa do de outro.
O Sr. Diógenes Arruda — Não é verdadeira essa história de aumentar o salário de um, à custa do salário de outro. Isso não passa de jogo de palavras, com o intuito de abrir confusão numa coisa tão simples. O que visamos com o nosso projeto de lei é elevar o salário mínimo. V. Excia. estará, por acaso, a favor do salário mínimo de fome ora em vigor no país?
O Sr. Tristão da Cunha — Se elevarmos os salários de todos, criaremos o problema dos sem-trabalho.
O Sr. Diógenes Arruda — Avalie como V. Excia. está equivocado. Os sem-trabalho já existem sem o aumento do salário mínimo. E que a causa é outra: os sem-trabalho surgem agora pelo fechamento das fábricas em virtude da concorrência do imperialismo ianque, pela política errada e suicida do atual governo, se é que se pode chamar de política econômica a atual orientação da ditadura.
O Sr. Tristão da Cunha — As elevações do salário trazem, como consequência, menor inversão do capital.
O Sr. Diógenes Arruda — Isto pode ser certo de acordo com os princípios econômicos de V. Excia. ou com a prosaica aritmética que V. Excia. usa para os seus argumentos nesta Casa. O nobre Deputado leu a entrevista do Senador Luis Carlos Prestes? Se tivesse lido, talvez se convencesse da necessidade de uma melhor distribuição da riqueza nacional, como também que isto só é possível conseguir pelo imediato aumento geral dos salários, com uma nova e' justa regulamentação do salário mínimo. Unicamente os senhores dos lucros extraordinários podem estar contra tal política de salvação nacional. Veja o caso do Sr. Guilherme da Silveira que obtêm em suas indústrias lucros fabulosos, enquanto os seus operários aqui na Capital da República, e Bangu passam as piores privações. Veja o caso da "Light and Power" que teve, nos quatro primeiros meses deste ano de 47, um lucro líquido de cerca de 155 milhões de cruzeiros e não atende às justas reivindicações da "tabela constitucional'' apresentada pelos seus operários. Veia, finalmente, o caso dos maiorais da Companhia Minas de Butiá, no Rio Grande do Sul, que, não contentes em abocanhar quase 800 mil cruzeiros para quatro diretores, lançam-se violentamente contra os operários, chamando-os de preguiçosos, vagabundos e sabotadores. São também estes os "princípios econômicos" do nobre Deputado mineiro?
O Sr. Tristão da Cunha — O que digo está de acordo com os princípios de todos os economistas, sem exceção, dos homens que estudaram a economia política e não a praticam por mero palpite.
O Sr. Diógenes Arruda — Longe de mim a suposição de que V. Excia. não seja um estudioso da economia política. Sou, aliás, um dos que muito admiram os seus conhecimentos. Tanto assim que estou me sentindo honrado com os apartes do nobre colega, aos quais estou respondendo com a máxima satisfação. Mas, temo que os princípios econômicos defendidos com tanto ardor por V. Excia., se aplicados, levariam o país a uma situação contrária àquela que certamente desejo. Infelizmente esta é a verdade: os seus princípios econômicos não estão de acordo com os interesses nacionais, pois leva o país não ao progresso, mas ao atraso, não ao bem-estar, mas à miséria. Esses princípios econômicos aliás não são novos, são bastante antigos. E estão de acordo com os interesses de uma pequena minoria que vive à custa da grande maioria do nosso povo. Talvez isto para V. Excia. seja também palpite, mas para nós são princípios.
Sr. Presidente, Senhores Deputados. Estou convicto que o nosso projeto de lei que institui o salário mínimo para o trabalhador e suo família terá, enorme repercussão nacional. Aqui mesmo estamos tendo oportunidade de ouvir e responder a inúmeros apartes, embora contrários aos interesses dos trabalhadores e à fixação de um justo salário mínimo. Isto indica que o projeto de lei é de uma importância fundamental, não apenas para a classe operária mas para todas as camadas de nossa população.
Há ainda mais, Sr. Presidente, no parágrafo único do art. 6.°, afirmamos o seguinte:
"O salário mínimo pago em dinheiro não será inferior a 50% do salário mínimo fixado para a região ou zona".
Visamos aqui ir ao encontro das necessidades mais imediatas dos assalariados agrícolas, fixando em normas justas o pagamento do salário mínimo. Trata-se de questão importante, porque no campo, o empregador para fugir ao cumprimento da lei, alega sempre o fornecimento ao empregado das utilidades que constituem o salário mínimo e, assim, nada ou quase nada lhe paga em dinheiro. Conhecemos bem essa realidade e quero invocar o testemunho insuspeito do sociólogo patrício, Sr. Vasconcelos Torres, sobre as condições de trabalho no campo:
"Ainda possuímos regiões onde o fazendeiro é o supremo ditador, exercendo como nos tempos coloniais, as funções de polícia e de juiz. Até há bem pouco tempo, no Sul da Bahia, nas terras do cacau, a servidão era tal que o homem se anulava por completo, perdendo até o direito de viver, trocando pela obrigação de trabalhar. O mesmo acontecia na Amazônia, onde o explorado seringueiro nada recebia, ficando devendo sempre ao gerente do barracão, impossibilitado de abandonar o seringal".
Por isso estabelecemos taxativamente que qualquer que seja o pagamento em utilidades nunca o trabalhador deverá receber menos de 50% em dinheiro.
Já o Sr. Vasconcelos Torres, fazendo um estudo nas regiões canavieiras do País, verificou que a grande massa de operários das usinas de açúcar vem sendo prejudicada nos benefícios decorrentes da atual lei de salário mínimo. Com efeito, logo após ser baixada a lei, em 1940, as usinas de açúcar passaram a cobrar aos trabalhadores aluguéis pelas casas em que residiam e pelas quais antes nada pagavam. O aluguel é sempre correspondente ao salário que o trabalhador deveria receber, de modo que o salário continuou o mesmo, sendo agravado pela elevação considerável do custo da vida. São salários miseráveis, insuficientes para as necessidades mais prementes dos assalariados agrícolas que, além do mais são vítimas dos famosos barracões das usinas. São salários de 2,30 cruzeiros para o trabalhador rural e de 4,10 cruzeiros para o operário industrial. Esse é o salário pago na usina de Terra Nova, no Estado da Bahia, de propriedade da firma Magalhães & Cia. que monopoliza o açúcar baiano da qual o Sr. Clemente Mariani é advogado. Numa tal situação, o trabalhador nunca recebe nada; fica sempre devendo e na miséria.
Sr. Presidente, não poderíamos, num projeto referente ao salário mínimo, esquecer que 53,5% *de nossa população são constituídos de brasileiros menores de 19 anos que trabalham em todos os setores da produção. Quatro milhões, ou seja 40% trabalham na agricultura e na pecuária na indústria, no comércio e nas atividades sociais. E são quatro milhões de menores que percebem salários miseráveis, sem ter direito a aprendizagem. Por isso, procuramos defender no artigo 8.° os direitos dos jovens:
"O salário mínimo do menor ou aprendiz não poderá ser inferior a 50% do fixado para o trabalhador adulto, equiparando-se, entretanto, o salário do menor ao do adulto quando igual for o trabalho."
Procuramos, com isso, corrigir, de acordo com os atuais preceitos constitucionais, um dos maiores erros de nossa legislação trabalhista que é de não elevar o salário mínimo do menor ou aprendiz à altura da remuneração do adulto, quando o trabalho for igual. Por outro lado, determinamos que o salário mínimo do menor não poderá ser inferior a 50% do fixado para o adulto, porque não podemos fechar os olhos diante dos salários de fome pagos aos trabalhadores jovens. Vejamos um só exemplo: em 42, os dados obtidos no Instituto dos Industriários indicavam que o salário médio dos menores de 14 anos não passava de três cruzeiros por dia. Ainda mais: em 235 mil operários, 33% ou sejam 85 mil, todos menores de 18 anos, recebiam salários variando entre 100 e 180 cruzeiros por mês. Como se pode viver assim sem morrer de fome? O professor Josué de Castro afirma, com sua autoridade, que só há uma resposta, se bem que um tanto desconcertante: Como? Morrendo de fome. Nada mais necessitamos dizer, senão que temos que modificar essa situação dolorosa, porque ela não condena somente a nossa juventude, mas o futuro da própria nacionalidade .
O Sr. Campos Vergal — Lamento que V. Excia. não tenha apresentado esse projeto há alguns meses antes de se instituir aos operários das fábricas. Ainda ontem estive na cidade de Salto, Estado de São Paulo, e verifiquei que os operários da "Brasiltal", importantíssima fábrica daquela localidade, ganham, em média, 500 cruzeiros por mês, lutando tristemente para manter sua vida. Pois bem, os proprietários dessa fábrica obtiveram, o ano passado, para mais de Cr$ 10.000.000,00 de lucros! Veja V. Excia. o grave erro da legislação social ainda vigente.
O Sr. Diógenes Arruda — Sr. Presidente. Pelo aparte do nobre Deputado Campos Vergal, nosso colega do Estado de São Paulo, fica ainda mais ressaltada a importância do nosso projeto de lei, bem como a sua urgência, para não acontecer o mesmo verificado com a atual lei do salário minimo, que levou dez anos para ser elaborada e posta em prática.
Mas o que V. Excia. declarou sobre o interior de São Paulo, ocorre também aqui, na Capital da República, onde a maioria dos salários não ultrapassa de 500 cruzeiros. Sejamos mais precisos: existiam, em 44, no Distrito Federal, 146.721 operários industriais e é de 410 cruzeiros o salário mínimo. Pois bem, existiam 84.934 operários que não ganhavam além de 500 cruzeiros. Sendo o salário minimo de 410,00 cruzeiros, temos 58.605 operários com salários que variam entre 400 a 500 cruzeiros, senhores deputados. E somente 7.423 operários ganham mais de mil cruzeiros! Que mais é preciso dizer? O projeto de Lei apresentado agora, por nós comunistas, tomando em consideração o elevado custo da vida, representará, efetivamente providências das mais patrióticas, porque dotará uma enorme parcela de nossa população de maior poder aquisitivo.
Sr. Presidente, há ainda mais: no art. 13 estabelecemos os nossos pontos de vista sobre a necessidade de elevação imediata do salário mínimo. O art. 13 diz o seguinte:
"Para os efeitos desta lei, e a partir da data da sua publicação os valores constantes das tabelas anexas aos Decretos-leis ns. 5.977 e 5.978 ambos de 10 de novembro de 1943, vigorarão acrescidos de 100% .
Esta é uma das medidas mais importantes no que se refere ao problema dos salários do país, pois procuramos fazer com que os salários mínimos atuais sejam dobrados, a fim de elevar o nível de vida da grande massa trabalhadora e, em consequência, seu poder de compra e sua produtividade.
E no parágrafo único do mesmo art. 13, determinamos que o salário adicional que o trabalhador deve perceber, de acordo com o art. 3.° do presente projeto de lei, é fixado em 100 cruzeiros por menores. O parágrafo tem como objetivo amparar efetivamente a família dos que trabalham.
Tanto no art. 13, como o seu parágrafo único, não exigimos muito. Visamos melhorar um pouco mais a situação do trabalhador e de sua família. Sim, visamos melhorar, porque isto não vai resolver todas as suas dificuldades. Não temos ilusões, conhecemos a realidade com todas as suas cores.
Temos mesmo a convicção que o aumento do salário mínimo deveria ser ainda muito maior, porque maiores são as necessidades das massas. Sou levado a essa conclusão pelo que verifico no dia a dia de minhas atividades como Deputado e como dirigente comunista. Vejamos, entretanto, senhores deputados, as estatísticas oficiais: segundo o Instituto dos Industriários o salário médio no País é de 325 cruzeiros para os homens e de 290 cruzeiros para as mulheres. Será preciso maior documentação? Quero fazer minhas as palavras do ilustre técnico Rafael Xavier:
"O quadro dos salários agrícolas do País, bem nos mostra a miserável remuneração paga ao trabalhador do campo e a necessidade imperiosa de darmos novas condições de vida ao camponês para aumentar sua capacidade aquisitiva e restaurar o trabalho rural pela fixação das massas humanas dos campos nas atividades agrícolas".
Faço minhas também as palavras do escritor católico, Sr. Hanibal Porte:
''É certo que os salários do homem do campo não bastem presentemente às suas necessidades, sendo necessário um acréscimo para o equilíbrio da sua afanosa vida".
Sr. Presidente, a posição dos comunistas não é nova, no que se refere ao aumento de salário mínimo. É uma posição de princípio que vimos defendendo de há muito. Tanto isto é verdade que já em agosto de 45, quando realizamos, legalmente, o Pleno do Comitê Nacional do Partido Comunista, apresentamos ao povo e às correntes políticas "onze pontos do nosso programa, contra a carestia e a inflação". E, então, afirmamos: uma das providências mais urgentes para combater a carestia e a inflação era a "elevação ponderável, isto é, de cento per cento pelo menos dos salários mínimos". Por isso, nada mais natural do que apresentarmos agora um projeto de lei que institui o salário para o trabalhador e sua família. Aliás, trata-se de regulamentar um dispositivo da Constituição de 46.
A instituição e o aumento do salário mínimo em todo o País não vão somente aliviar as necessidades de grande, maioria de trabalhadores, mas é também medida altamente progressista. O Senador Luis Carlos Prestes já dizia na III Conferência Nacional do nosso Partido, em 46:
"A luta por melhores salários é, no momento, a forma mais eficiente de que dispõe o proletariado para exigir do governo medidas práticas e imediatas contra a carestia e a inflação".
Isto significa que o aumento e a regulamentação do salário mínimo não só interessam aos trabalhadores, como também aos industriais progressistas, que desejam, não a liquidação da indústria nacional, como parece querer o Sr. Roberto
Simonsen com sua política reacionária, mas a sua prosperidade, de tal modo que possa atender ao mercado interno e mesmo à exportação para outros países.
Evidentemente, Sr. Presidente, tratando do problema do salário mínimo, não podemos deixar desapercebida a posição do Sr. Simonsen quando, por ocasião do discurso do Senador José Américo, afirmou que viu muitos menores no Senai, em São Paulo, desfalecerem de fome. Sim, o Sr. Simonsen é muito contraditório, porque logo em seguida, como que esquecendo as suas afirmações, proferiu um discurso no Se- nodo Federal, que é uma desonra para sua condição de representante do povo paulista, pois, além de calunioso, é falso do princípio ao fim. O Sr. Simonsen, diante do pedido de aumento de salários ou da necessidade patriótica de defender a indústria nacional, prefere caluniar os operários ou despedi-los injustamente, prefere ficar com seus patrões estrangeiros, pugnando por medidas ditatoriais. E faz afirmações que não pode provar em momento algum. Uma delas é que os comunistas, que são uma fôrça progressista e lutam intransigentemente pela defesa da indústria nacional, estão entravando e sabotando o desenvolvimento de nosso parque industrial, particularmente em São Paulo.
Sr. Presidente, isto é uma infâmia digna de Von Tissen ou de Beta. Todas as consciências livres não poderão deixar de se revoltar diante de tão monstruosa calúnia ao glorioso proletariado paulista.
Sr. Presidente, o Sr. Simonsen jamais poderá provar a sua afirmativa, nem mesmo com os relatórios de seus beleguins policiais. Como representante do proletariado e do povo de São Paulo, répito o Sr. Simonson a provar o que afirmou, porque, do contrário, ficará conhecido como um caluniador vulgar.
O Sr. Tristão da Cunha — Permita-me V. Excia. um aparte. O Sr. Simonsen também é comunista, e sem saber. É partidário da economia planificada.
O Sr. Diógenes Arruda — O Sr. Simonsen ao contrário é um dos líderes mais reacionários da Federação das Indústrias, sendo, ao mesmo tempo um dos tubarões dos lucros extraordinários que sustentaram o Estado Novo e apoiam agora o atual governo ditatorial do Sr. Dutra. Governo que proíbe a exportação de tecidos e de arroz, que permite a elevação constante dos preços dos gêneros de primeira necessidade, que permite a liquidação de nosso saldo ouro no estrangeiro com a importação de bugigangas, que fecha sindicatos, que proíbe a juventude de se organizar, que assiste de braços cruzados o desemprego de milhares de operários, enfim, que rasga a Constituição que jurou defender. Isto que o Sr. Simonsen apoia não é governo, é desgoverno, é ditadura.
A afirmação do Sr. Simonsen sobre sabotagem na indústria é igual àquela outra, também caluniosa, sobre a posição dos comunistas, em São Paulo, em 1945, quando da visita de um contingente de marinheiros americanos. Declarou S. Excia. que foram os comunistas que insuflaram o povo contra os ianques. Isto não é verdade. Naquele momento, os comunistas, que nunca foram desordeiros, estavam lutando pelo esforço de guerra, lutando para que fosse dada ajuda efetiva às nossas gloriosas Fôrças Expedicionárias. Foram, sim, os italianos adeptos de Mussolini, foram os integralistas, foram os traidores da Pátria ou talvez os agentes do Sr. Simonsen, quem promoveram desordens contra marinheiros da Pátria de Roosevelt, desordens que foram condenadas pelos comunistas e por todos os patriotas.
Ora, estas afirmações caluniosas, são iguais às que fez o Sr. Simonsen relativamente à posição dos comunistas dentro das fábricas. A nossa posição em defesa da indústria nacional, pelo aumento da produção e por uma política de cooperação entre operários e patrões, ficou claramente definida no Pleno do Comitê Nacional do Partido Comunista, em Dezembro de 46.
O Senador Luis Carlos Prestes, nosso líder máximo, tinha, inteira razão quando afirmou que a nossa orientação iria mostrar na
"prática a toda a Nação de que lado estão os patriotas, os que mais se sacrificam pelo progresso do Brasil e, de outro lado, quais os traidores, os sabotadores da produção nacional, os que se colocam contra a solução pacífica dos problemas nacionais, os que defendem seus interesses egoístas e imediatistas contra os interesses superiores da Nação."
O Sr. Simonsen, portanto, não nos atinge, com suas calúnias e provocações. Ele não fez senão desmascarar-se. E na prática não é difícil verificar de que lado nos encontramos e de que lado se encontra o Sr. Simonsen.
Sr. Presidente, apresentando o projeto lei sobre salário mínimo, creio que é o momento preciso para colocarmos claramente a nossa posição de patriotas intransigentes, posição que indica que os comunistas, fora ou dentro do Parlamento, lutaram e lutarão sempre, pelo aumento de salários, pela livre organização da classe operária, pelas reivindicações mais sentidas das grandes massas, pelo cumprimento dos princípios constitucionais, porque essa é a melhor maneira de defender a nossa indústria, o bem-estar de nosso povo, a soberania de nossa Pátria.
Sr. Presidente, com a aprovação do projeto de lei da bancada comunista, poderemos repetir o que se lê no anuário "Brasil", de 1941, do Ministério do Exterior:
"Os fatos revelam o acerto da decretação do salário mínimo, que veio concorrer para a melhoria das condições do mercado interno, determinando um ligeiro aumento da riqueza pela aceleração no giro das utilidades".
Sr. Presidente, era este o discurso que me cabia proferir nesta Casa, como representante do povo, encaminhando o projeto de lei que institui o salário mínimo para o trabalhador e sua família em todo o território nacional. (Muito bem; muito bem. Palmas).
Contrariamente à expectativa dos reacionários chineses e estrangeiros — a Inglaterra, os Estados Unidos e a União Soviética permanecem unidos. Existiram e podem existir no futuro disputas entre essas democracias, mas, encarando as coisas dum prisma mais amplo, a unidade reinará, suprema. Essa condição, decisiva acima de todas, que se evidenciou finalmente na Conferência da Crimeia, foi criada no momento mais crítico da história do mundo na última década. Foi criada quando, num momento em que a guerra fascista de agressão ameaçava a existência dos povos amantes da paz, as forças reacionárias em muitas das mais importantes nações (não todas as nações), — que haviam ajudado os agressores fascistas, fazendo oposição à unidade Anglo-Americano-Soviética, — foram afastadas em massa da arena política, e as fôrças favoráveis à unidade Anglo-Americano-Soviética subiram ao poder. Todo o aspecto do mundo mudou desde que surgiu essa condição. todas as fôrças fascistas e seus apêndices devem ser extirpados; os problemas internacionais devem ser resolvidos por conferências entre as três ou cinco principais nações; os problemas internos de várias nações terão de ser resolvidos, sem exceção, de acordo, com os princípios democráticos; o mundo será conduzido no sentido do progresso e não da reação. Tal é o novo aspecto do mundo. Mas, quem quer que não esteja plenamente alerta ante as possibilidades de certas vicissitudes transitórias ou mesmo graves da história, ou deixe de compreender a força ainda considerável dos reacionários isolacionistas, que odeiam ver a unidade, o progresso e a libertação de seu próprio povo e nos outros povos e não gostam da nova ordem mundial conduzida conjuntamente pela Inglaterra, Estados Unidos, União Soviética, França e China, estará cometendo um erro político. Entretanto, o rumo geral da história está fixado e não pode ser alterado. O mundo assumiu um novo aspecto.
Trecho do informe de Mao Tse-Tung ao 7.° Congresso do Partido Comunista Chinês, em 24 de abril de 1945.
Inclusão | 04/12/2013 |