Às classes trabalhadoras da Grã-Bretanha

Dedicatória de A Condição da Classe Operária em Inglaterra

Friedrich Engels

15 de março de 1845


Primeira publicação: Die Lage der arbeitenden Klasse in England, 1845. Traduzido para o inglês por Florence Kelley, sob a revisão de Friedrich Engels, em 1887.

Fonte para a tradução: To The Working-Classes of Great-Britain, seção inglesa do Arquivo Marxista na Internet.

Tradução: Vitória Teixeira.

Revisão e HTML: Lucas Schweppenstette.

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Trabalhadores!

A vocês eu dedico uma obra na qual eu tentei apresentar aos meus compatriotas alemães um retrato fiel de sua condição, de seus sofrimentos e lutas, de suas esperanças e perspectivas. Vivi tempo suficiente no meio de vocês para saber algo sobre suas circunstâncias; dediquei ao seu conhecimento a minha mais séria atenção, estudei vários documentos oficiais e não oficiais tanto quanto pude obtê-los — não estava satisfeito com isso, queria mais do que um mero conhecimento abstrato do meu tema, queria vê-los em suas casas, observá-los em sua vida cotidiana, conversar com vocês sobre suas condições e queixas, testemunhar suas lutas contra o poder social e político de seus opressores. O que eu fiz: abandonei a companhia e os jantares, o vinho do Porto e o champagne das classes médias, e dediquei minhas horas de lazer quase exclusivamente ao convívio com simples operários; estou feliz e orgulhoso de ter feito isso. Feliz, porque assim fui induzido a passar muitas horas alegres obtendo conhecimento das realidades da vida — muitas horas que, de outra forma, teriam sido desperdiçadas em conversas fúteis e formalidades sociais cansativas; orgulhoso, porque tive a oportunidade de fazer justiça a uma classe de homens oprimidos e caluniados que, apesar de seus defeitos e sob todas as desvantagens de sua situação, ainda assim conquistam o respeito de todos, exceto do negociante inglês; orgulhoso, também, porque assim tive a oportunidade de defender o povo inglês do crescente desprezo que no continente tem sido consequência necessária da política brutal e egoísta e da conduta geral de suas classes médias dominantes.

Ao mesmo tempo, tendo ampla oportunidade de observar as classes médias, seus oponentes, logo cheguei à conclusão de que vocês estão certos, inteiramente certos, em não esperar nenhum apoio deles. Os interesses deles são diametralmente opostos aos seus, embora eles sempre busquem dizer o contrário e fazer vocês acreditarem em sua mais sincera simpatia pela sua sorte. As ações deles desmentem o que dizem. Espero ter reunido provas mais do que suficientes do fato de que — quaisquer que sejam seus discursos — as classes médias não possuem na realidade outra intenção além de enriquecer-se com o trabalho de vocês enquanto puderem vender seu produto e abandoná-los à fome assim que não puderem lucrar com esse comércio indireto de carne humana. O que eles fizeram para provar essa boa vontade declarada para com vocês? Eles já deram alguma atenção significativa às suas queixas? Eles fizeram mais do que pagar as despesas de meia dúzia de comissões de inquérito, cujos volumosos relatórios estão condenados ao sono eterno entre pilhas de papel usado nas prateleiras do Ministério do Interior? Eles já fizeram ao menos o trabalho de compilar daqueles Livros Azuis(1) apodrecidos um único livro legível do qual qualquer um pudesse facilmente obter alguma informação sobre a condição da grande maioria dos “livres cidadãos britânicos”? Certamente não, essas são coisas de que eles não gostam de falar — deixaram para um estrangeiro informar ao mundo civilizado sobre a situação degradante a que vocês são submetidos a viver.

Um estrangeiro para eles, não para vocês, espero. Embora meu inglês não seja perfeito, espero que vocês o considerem compreensível.  Nenhum trabalhador na Inglaterra — nem na França, aliás — jamais me tratou como estrangeiro. Com o maior prazer observei que vocês estão livres da terrível maldição que são o preconceito e o orgulho nacionais, que afinal de contas não são nada mais do que egoísmo generalizado — observei que vocês simpatizavam com todos que se dedicam com sinceridade suas forças ao progresso da humanidade — seja ele um inglês ou não — e admiravam tudo que é grande e bom, cultivado em seu solo nativo ou não — descobri que vocês eram mais que meros ingleses, membros de uma única nação isolada, descobri que vocês eram homens, membros da grande e universal família da humanidade, que sabem que seus interesses e os de toda a humanidade são os mesmos. E como tal, como membros dessa família da humanidade “una e indivisível”, como seres humanos no sentido mais afirmativo, tal eu, e muitos outros no continente, saudamos o seu progresso em todas as direções e desejamos-lhe êxito rápido.

Sigam em frente, como têm feito até agora. Ainda há muito a ser feito; sejam firmes, não se intimidem — seu triunfo é certo, e nenhum passo que vocês terão que dar em sua marcha adiante será em vão para nossa causa comum, a causa da humanidade!

Friedrich Engels

Barmen (Prússia Renana)

15 de março de 1845