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Já afirmei que entre Marx e Engels, de um lado, e Lênin, de outro, se estende todo o período em que domina o oportunismo da II Internacional. Para ser mais exato, devo acrescentar que não se trata de um domínio formal do oportunismo, mas de um domínio de fato. Formalmente, à frente da II Internacional se encontravam marxistas "ortodoxos", como Kautsky e outros. Na realidade, porém, a atividade fundamental da II Internacional se desenvolvia sobre a linha do oportunismo. Os oportunistas se adaptavam à burguesia, em virtude da sua natureza pequeno-burguesa; os "ortodoxos", por sua vez, se adaptavam aos oportunistas no interesse da "manutenção da unidade" com os oportunistas; no interesse da "paz no Partido". O resultado era o domínio do oportunismo, pois se estabelecia uma cadeia ininterrupta entre a política da burguesia e a política dos "ortodoxos".
Atravessava-se um período de desenvolvimento relativamente pacífico do capitalismo, um período, por assim dizer, de pré-guerra, em que as contradições catastróficas do imperialismo ainda não haviam chegado a manifestar-se em toda a evidência; em que as greves econômicas dos operários e os sindicatos se desenvolviam mais ou menos "normalmente", a luta eleitoral e os grupos parlamentares obtinham êxitos "vertiginosos", as formas legais de luta eram postas nas nuvens e se pensava em poder "matar" o capitalismo por meio da legalidade, um período, em suma, em que os partidos da II Internacional se abastardavam e não se queria pensar seriamente na revolução, na ditadura do proletariado, na educação revolucionária das massas.
Em lugar de uma teoria revolucionária coerente, afirmações teóricas contraditórias e fragmentos de teoria, divorciados da luta revolucionária viva das massas e transformados em dogmas caducos. Para salvar as aparências, é certo, invocava-se a teoria de Marx, mas para despojá-la do seu espírito revolucionário vivo.
Em lugar de uma política revolucionária, filisteísmo flácido e politicalha mesquinha, diplomacia parlamentar e combinações parlamentares. Para salvar as aparências, é certo, se aprovavam resoluções e palavras de ordem "revolucionárias", mas para metê-las no arquivo.
Em lugar de educar e instruir o Partido na justa tática revolucionária à base dos seus próprios erros, fugia-se cuidadosamente às questões espinhosas, que eram encobertas e postas de lado. Para salvar as aparências, é certo, não se deixava de falar das questões espinhosas, mas para terminar com assunto com alguma resolução "elástica".
Tais eram a fisionomia, o método de trabalho e o arsenal da II Internacional.
Avizinhava-se, entretanto, um novo período de guerras imperialistas e de batalhas revolucionárias do proletariado. Os velhos métodos de luta se revelavam claramente insuficientes, impotentes, diante da onipotência do capital financeiro.
Era preciso rever todo o trabalho da II Internacional, todo o seu método de trabalho, pôr de lado o filisteísmo, a estreiteza mental, a politicalha, a traição, o social-chauvinismo, o social-pacifismo. Era necessário revisar todo o arsenal da II Internacional, jogar fora tudo o que estava enferrujado e obsoleto, forjar novos tipos de armas. Sem este trabalho preliminar seria inútil partir para a guerra contra o capitalismo. Sem este trabalho o proletariado correria o risco de encontrar-se mal armado e, mesmo, inerme diante de novas batalhas revolucionárias.
A honra de levar a cabo esta revisão geral e a limpeza geral dos estábulos de Augias da II Internacional coube ao leninismo.
Tais foram as circunstâncias em que nasceu e se forjou o método do leninismo.
Quais são as exigências deste método?
Em primeiro lugar, comprovar os dogmas teóricos da II Internacional no fogo da luta revolucionária das massas, no fogo da prática viva, isto é, restabelecer a unidade perdida entre a teoria e a prática, eliminar a ruptura entre ambas, pois somente assim se pode formar um partido verdadeiramente proletário, armado de uma teoria revolucionária.
Em segundo lugar, comprovar a política dos partidos da II Internacional, partindo não das suas palavras de ordem e das suas resoluções (às quais não se pode dar crédito), mas dos seus atos, das suas ações, pois somente assim é possível conquistar e merecer a confiança das massas proletárias.
Em terceiro lugar, reorganizar todo o trabalho do Partido para dar-lhe orientação nova, revolucionária, no sentido da educação e da preparação das massas para a luta revolucionária, pois somente assim se podem preparar as massas para a revolução proletária.
Em quarto lugar, a autocrítica dos partidos proletários, a sua educação e instrução à base dos seus próprios erros, pois somente assim se podem formar verdadeiros quadros e verdadeiros dirigentes de partido.
Tais são os fundamentos e a essência do método do leninismo.
Como se aplicou, na prática, esse método?
Os oportunistas da II Internacional professam uma série de dogmas teóricos, que repetem como o rosário. Vejamos alguns deles:
Primeiro dogma: sobre as condições da tomada do Poder pelo proletariado. Os oportunistas afirmam que o proletariado não pode e não deve tomar o Poder se não constitui a maioria dentro do país. Não oferecem prova alguma, pois não é possível, nem do ponto-de-vista teórico nem do ponto-de-vista prático, para justificar esta tese absurda. Admitamos que seja assim, responde Lênin aos senhores da II Internacional. Mas onde se produzisse uma situação histórica (guerra, crise agrária, etc..) em que o proletariado, embora sendo a minoria da população, tenha a possibilidade de agrupar em torno de si a maioria das massas trabalhadoras, por que ele não deveria tomar o Poder? Por que o proletariado não deveria aproveitar-se da situação internacional e interna favorável para romper a frente do capital e acelerar o desenlace geral? Porventura já não disse Marx, entre 1850 e 1860, que a revolução proletária alemã se encontraria em "excelentes" condições, se fosse possível assegurar para a revolução proletária o apoio, "por assim dizer, de uma segunda edição da guerra camponesa"?[N24]
Não é por acaso do conhecimento geral que àquela época, na Alemanha, os proletários eram relativamente menos numerosos do que, por exemplo, na Rússia em 1917? A experiência da revolução proletária russa não demonstrou porventura que esse dogma, caro aos heróis da II Internacional, não tem a menor significação vital para o proletariado? Acaso não está claro que a experiência da luta revolucionária das massas refuta e destrói esse dogma caduco?
Segundo dogma: o proletariado não pode manter-se no Poder se não dispõe de suficiente número de quadros já formados, de intelectuais e de administradores, capazes de assegurar a administração do país. Primeiro é preciso formar esses quadros, sob o capitalismo, e depois tomar o Poder. Admitamos que seja assim, respondeu Lênin. Mas, por que não se pode agir em sentido contrário: começar pela tomada do Poder, criar as condições favoráveis ao desenvolvimento do proletariado e, depois, avançar a passos de gigante, para elevar o nível cultural das massas trabalhadoras, para formar numerosos quadros dirigentes e administrativos, recrutados no seio dos operários? A experiência russa não demonstrou por acaso que os quadros dirigentes, recrutados entre os operários, crescem sob o Poder proletário cem vezes mais rapidamente e melhor do que sob o Poder do capital? Não é porventura claro que a experiência da luta revolucionária das massas desfaz implacavelmente também este dogma teórico dos oportunistas?
Terceiro dogma: o método da greve geral política não pode ser aceito pelo proletariado, porque teoricamente é inconsistente (vide a crítica de Engels), é perigoso na prática (pode desorganizar a marcha normal da vida econômica do país, pode deixar vazias as caixas dos sindicatos) e não pode substituir as formas parlamentares de luta, que constituem a forma principal da luta de classe do proletariado. Bem, respondem os leninistas. Mas, em primeiro lugar, Engels não criticou toda greve geral, mas somente uma determinada espécie de greve geral, a greve geral econômica dos anarquistas[N25], preconizada pelos anarquistas em lugar da luta política do proletariado. Que tem a ver com isso o método da greve geral política? Em segundo lugar, quem demonstrou, e onde, que a luta parlamentar é a principal forma de luta do proletariado? A história do movimento revolucionário não demonstra, porventura, que a luta parlamentar é apenas uma escola, um auxílio para a organização da luta extraparlamentar do proletariado, que as questões fundamentais do movimento operário, no regime capitalista, se resolvem pela força, com a luta direta das massas proletárias, com a greve geral, com a insurreição? Em terceiro lugar, de onde saiu a questão da substituição da luta parlamentar pelo método da greve geral política? Onde e quando os partidários da greve geral política tentaram substituir as formas parlamentares de luta pelas formas extraparlamentares? Em quarto lugar, por acaso a revolução russa não demonstrou que a greve geral política é a maior escola da revolução proletária e um meio insubstituível de mobilização e de organização das mais amplas massas do proletariado nas vésperas do assalto às fortalezas do capitalismo? Que têm a ver com isso as lamentações hipócritas sobre a desorganização do curso normal da vida econômica e sobre caixas de sindicatos? Não é claro, porventura, que a experiência da luta revolucionária destrói também este dogma dos oportunistas?
E assim sucessivamente.
Por isso, Lênin dizia que "a teoria revolucionária não é um dogma", que "ela só se forma de modo definitivo em estreita ligação com a prática de um movimento verdadeiramente de massa e verdadeiramente revolucionário" ("A doença infantil"[N26]), porque a teoria deve servir à prática, porque, "a teoria deve dar resposta às questões suscitadas pela prática" ("Os amigos do povo"[N27]), porque ela deve ser confirmada, com dados fornecidos pela prática.
Quanto às palavras de ordem políticas e às decisões políticas dos partidos da II Internacional, basta relembrar a história da palavra de ordem de "guerra à guerra", para compreender toda a hipocrisia, toda a podridão da prática política desses partidos, que encobrem a sua atividade contra-revolucionáría com palavras de ordem e resoluções revolucionárias pomposas. Todos se recordam da pomposa manifestação da II Internacional, no Congresso de Basiléia, em que os imperialistas foram ameaçados com todos os horrores da insurreição, se ousassem desencadear a guerra, quando se formulou a temível palavra de ordem: "guerra à guerra". Mas quem não se lembra de que, algum tempo depois, antes do próprio começo da guerra, a resolução passou aos arquivos e os operários receberam nova palavra de ordem: exterminai-vos mutuamente para glória da pátria capitalista? Não é claro, porventura, que as palavras de ordem e as resoluções revolucionárias não valem nada se não são apoiadas pelos fatos? Basta comparar a política leninista de transformação da guerra imperialista em guerra civil com a política de traição, seguida pela II Internacional, durante a guerra, para compreender toda a trivialidade dos politiqueiros do oportunismo e toda a grandeza do método leninista.
Não posso deixar de referir, aqui, uma passagem do livro de Lênin: "A revolução proletária e o renegado Kautsky", em que ele fustiga duramente a tentativa oportunista do chefe da II Internacional, K. Kautsky, por não julgar os partidos pelas suas ações, mas pelas suas palavras de ordem e pelos seus documentos:
«Kautsky faz uma política tipicamente pequeno-burguesa, filistéia, quando imagina... que o fato de lançar uma palavra de ordem muda a realidade. Toda a história da democracia burguesa põe a nu esta ilusão; para enganar o povo, os democratas burgueses sempre lançaram e sempre lançam toda espécie de «palavras de ordem». Trata-se de comprovar a sua sinceridade, de confrontar as palavras com os fatos, de não contentar-se com frases idealistas ou charlatanescas, mas de procurar descobrir a realidade de classe». (Vide vol. XXIII, pág. 377).[N28]
E não falo do medo da autocrítica, que é próprio dos partidos da II Internacional, do seu costume de esconder os seus erros, de não tocar nas questões espinhosas, de dissimular os seus defeitos, dando a falsa impressão de que tudo corre às mil maravilhas, o que sufoca o pensamento vivo e impede a educação revolucionária do partido sobre a base da experiência dos seus próprios erros. Lênin pôs em ridículo e levou ao pelourinho esse costume. Vejamos o que escreve Lênin no livro "A doença infantil", a propósito da autocrítica dos partidos proletários:
«A atitude de um partido político diante dos seus erros é um dos critérios mais importantes e mais seguros para julgar se um partido é sério, se cumpre de fato os seus deveres para com a sua classe e para com as massas trabalhadoras. Reconhecer abertamente o erro, descobrir-lhe a causa, analisar a situação que o gerou, estudar atentamente os meios para corrigi-lo: isto é indício da seriedade de um partido, a isto se chama cumprir o seu dever, educar e instruir a classe e depois as massas», (Vide vol. XXV, pág. 200).[N29]
Há quem diga que a revelação dos próprios erros e a autocrítica são coisas perigosas para o Partido, pois disso se pode aproveitar o inimigo contra o Partido do proletariado. Lênin considerava destituídas de seriedade e completamente errôneas semelhantes objeções. Eis o que dizia a propósito, já em 1904, no folheto "Um passo à frente", quando o nosso Partido ainda era fraco e pouco numeroso:
«Eles (os adversários dos marxistas, J. St.) se agitam e manifestam alegria maligna quando observam, as nossas discussões; procuram certamente extrair, para seus fins, passagens isoladas do folheto em que falo das deficiências e lacunas do nosso Partido. Os social-democratas russos já estão suficientemente temperados nas batalhas para não se deixarem, perturbar por semelhantes alfinetadas, para continuar, apesar disso, o seu trabalho de autocrítica e desmascaramento implacável dos seus defeitos, que serão segura e inevitavelmente superados com o desenvolvimento do movimento operário». (Vide vol. VI, pág. 161).[N30]
Tais são, em geral, os traços característicos do método do leninismo.
O que se encontra no método de Lênin já se encontrava, no fundamental, na doutrina de Marx, que, segundo as palavras do próprio Marx, é, “por sua essência, crítica e revolucionária".[N31] Precisamente esse espírito crítico e revolucionário impregna do princípio ao fim o método de Lênin. Mas seria um erro pensar que o método de Lênin é uma simples restauração do que foi dado por Marx. Na realidade, o método de Lênin não é apenas a restauração, mas também a concretização e o desenvolvimento ulterior do método crítico e revolucionário de Marx, da sua dialética materialista.
Notas de fim de tomo:
[N24] Vide K. Marx e F. Engels, «Correspondência», vol. II, Edizioni Rinascita, Roma, 1950, pág. 423. (retornar ao texto)
[N25] Vide K. Marx e F. Engels, «Contra o anarquismo», págs. 17-48, Edizioni Rinascita, Roma, 1950. (retornar ao texto)
[N26] Vide «A doença infantil do «esquerdismo» no comunismo», pág. 11, Editorial Vitória, Rio, 1946. (retornar ao texto)
[N27] Vide Lênin, «Quem são os «amigos do povo» e como lutam contra os social-democratas?», in «Obras Escolhidas», vol. I, págs. 105-187, Editorial Vitória, Rio, 1955. (retornar ao texto)
[N28] Vide Lênin, «A revolução proletária e o renegado Kautsky», pág. 81, Edizioni Rinascita, Roma, 1949. (retornar ao texto)
[N29] Vide «A doença infantil...», ed. cit, pág. 57. (retornar ao texto)
[N30] Vide «Um passo adiante, dois passos atrás», pág. 8, Editorial Vitória, Rio, 1946. (retornar ao texto)
[N31] Vide K. Marx, «O Capital», vol. I, pág. 28, Edizioni Rinascita, Roma, 1951. (retornar ao texto)
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Inclusão | 16/06/2008 |
Última revisão | 22/04/2023 |