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No momento atual, existem relações econômicas que recebem várias interpretações. Para explicá-las, surgem diversas doutrinas econômicas. Nem sempre essas doutrinas têm sido sinceramente realistas e científicas. Pelo contrário, em muitas delas, notam-se critérios finalistas tendenciosos.
Os fins são bastante diversos. Entre esses, naturalmente, a o desejo de investigar a verdade, porém, a verdade é imparcial?
Suponhamos um fato econômico. Um ato de compra-e-venda. O objeto de compra e venda, por exemplo, será a força de trabalho do operário. O operário, vendedor de sua força procurará ganhar mais, exagerando ou não as suas qualidades de produtor, ou o custo de produção dessa força de trabalho (sua subsistência e da sua família). Dirá, então: “Sou ótimo trabalhador” ou “a vida está cara”, etc., etc. Por seu lado, o patrão alegará que tem poucos lucros e possibilidade de contratar outro operário tão bom por um salário menor, etc., etc.
Chamemos então um ‘"técnico em economia”. Suponhamos que ele deseje realmente investigar a verdade. Se a verdade é que o operário sempre produz um excedente de produção (isto é, mais valor do que recebe para produzi-la), do qual o patrão se apropria, o simples fato de expressar essa realidade coloca o economista argumentando a favor do operário. Se a realidade por ele encontrada significasse que o operário explorava o patrão, a “verdade’ argumentaria a favor do patrão.
Entretanto a verdade burguesa não é imparcial, intervem na contenda e é a arma-teórico-prática mais poderosa que pode defender uma determinada posição.
O técnico-economista é uma pessoa que está sob a influência de fatores econômicos. Suponhamos que seja um patrão ou esteja a soldo de um patrão. Neste caso, se a verdade não convém aos interesses dos patrões, ela não será dita e será deformada. Pode acontecer que o economista pertença à classe média, que se sente ameaçada pelo grande capital absorvente, e, por outro lado, teme que o proletariado, socializando os meios de produção, destrua suas esperanças (enfim, somos homens e na maioria ignorantes!) de tornar-se um grande capitalista. Nosso economista vacilará. Frente ao patrão, defenderá o direito a um salário “justo”, pensando, nesse caso, como um futuro proletário. Frente ao proletariado defenderá a propriedade privada, não querendo despojar-se de sua ilusão: ser futuramente um capitalista. Dirá, pois, que a verdade não está nem com o patrão, que deseja pagar menos, nem com o operário, que não deseja absolutamente ser explorado. Não. Para ele, a verdade esta no meio termo, como ele mesmo o está. Esta é a sua verdade. E o economista da classe média lutará com o sentimentalismo, que se caracteriza pelo “solidarismo”. Que o patrão seja humano”, “solidário” e que explore menos, pagando um salário melhor. Que o proletário seja também decente e aceite uns centavos a mais, deixar-se explorar in aeternum, renunciando a seu papel histórico e conformando-se com a ordem atual.
Partindo desse exemplo, diremos duas palavras sobre cada uma das escolas econômicas (as principais), para, desenvolver a exposição geral da escola marxista.
A Escola Liberal resolve o nosso problema desta maneira :
As relações humanas — diz ela — são regidas por leis naturais, imutáveis, que são as melhores possíveis. O salário favorece o operário, porque o liberta dos riscos da empresa. Não nega que o salário é frequentemente insuficiente e é de desejar vê-lo aumentar, mas, para isso, é necessário que o contrato de trabalho seja mais livre (isto é, que o Governo não proteja o operário com salários mínimos). Liberdade de contrato. Laissez faire, laissez passer(3).
Não é necessário ser marxista para notar que esta teoria defende os interesses da classe industrial, com argumentos infantis, principalmente quando diz que os “operários não sofrem os riscos da empresa” e, embora haja desigualdade social e econômica, o operário ganha no que se refere à igualdade-jurídica (Liberdade de contrato).
A Escola Liberal é conservadora e otimista. Conservadora porque os privilegiados desejam que nada se modifique, que se detenha a evolução histórica; é otimista porque não se pode pensar da mesma maneira dentro de um palácio e dentro de uma cabana.
A Escola Marxista, frente a esse nosso problema, estuda honesta e corajosamente as leis da produção capitalista. Demonstra, cientificamente, a existência da exploração do homem pelo homem. Ao lutar contra a exploração, defende os interesses classe trabalhadora. Lutando ao mesmo tempo pela abolição completa do regime do salariado e, portanto, das classes sociais, defende as aspirações dos não exploradores, isto é, da imensa maioria de homens, de todos os que não têm interesses anti-humanos: defende as aspirações de toda a humanidade.
Doutrinas intermediárias — Entre essas duas escolas encontra-se uma quantidade de doutrinas intermediárias.
O Cristianismo Social pretende resolver o nosso problema procurando conciliar patrões e operários, mas sob um regime de privilégios para o patrão. Afirma que o salariado é um estado normal e até providencial. “Pelo salário, o rico faz o pobre viver” — dizem eles. Deseja conservar a ordem atual com a propriedade privada, a herança, o salariado, etc. Esta doutrina procura levar a classe média à defesa de “corporações de patrões e operários”, onde, no fim de contas, predominaria o patrão. Além disso, essa doutrina acalenta o povo na fé de um mundo eterno extra-terreno, frente ao qual o mundo terreno nada vale, é insignificantemente reduzido e nele devemos sofrerresignados pois seremos por isso recompensados no outro mundo. À custa de uma promessa de felicidade no outro mundo, exige em troca que nos deixemos explorar impiedosamente neste mundo.
O Solidarismo resolve o problema do salariado de maneira característica da classe média: a vacilação, o ecletismo. Deseja a abolição do salariado e do regime capitalista; mas, por outro lado, preconiza a conservação da ordem social atual, do individualismo econômico, pretendendo negar a luta de classes “Uma República livre, de proprietários iguais”, como disse o bom Rousseau. Tal era o programa do Partido Radical da França (Congresso de Nancy 1907; art. 15: “Fomentar todas as instituições pelas quais pode fazer valer seus direitos o proletariado: conseguir o desaparecimento do salariado e chegar à propriedade individual, condição mesma de sua liberdade sua dignidade”. ) Hoje, este partido da classe média, dirigido por líderes, entre os quais já existem grandes capitalistas, não consegue iludir ninguém.
Estas doutrinas demonstram claramente os interesses de classes. Mas existem outras, que aparecem devido à luta das classes dominantes entre si.
Há economistas que sustentam ser a agricultura a única fonte de riqueza de um país, e os impostos e cargas fiscais deverem recair sobre a indústria, que nada mais faz senão transformar os produtos da agricultura. Defende os possuidores de terra contra os industriais.
Henry George afirma o contrário: que a terra é um dom da natureza e produz por si mesma, e é injusto que os possuidores de terra explorem a sociedade. Preconiza um imposto único sobre a terra até chegar à nacionalização da mesma e... se se liberte a indústria de todo e qualquer imposto...
David Ricardo, desejando diminuir os salários, quer diminuir os preços dos produtos rurais, etc.
Por fim, existe uma categoria de "economistas" salafrários que semeiam a confusão, pois deformam a doutrina econômica marxista, usando uma fraseologia marxista, para depois refutá-la com êxito, etc. Temos aqui os seguintes exemplos:
Stanley Jevons, como sabemos, afirma que as crises são provocadas pelas manchas do sol. Com que fim usa essa expressão? Apenas para disfarçar o fato de que provêm do atual regime de produção capitalista.
Spann deforma a doutrina de Marx. Afirma (como burguês que é) que o regime capitalista é melhor do que o socialista (pág. 210); que o marxismo contém uma essência diabólica (que horror!) (pág. 212) e o divino Spann arranja uma solução divina: o regime corporativo hierárquico (pág. 230 — História das doutrinas econômicas).
Gustavo Cassell fez um livro de 900 páginas (Economia Social Teórica), em que ele desenvolve ideias partindo não do valor, mas da formação do preço.
— E o preço de que depende?
— Do custo de produção.
— Bem! E que é custo de produção? Que é força de trabalho?
— Querer definir isso — grita Cassell indignado — é o resultado do escolasticismo de um Marx!
A seguir, Cassell escreve capítulos e mais capítulos sobre o salário, o preço, etc., supondo um regime socialista “puro”. Poderia impressionar, se, pela sua própria definição, num regime socialista “puro” (comunismo) existisse preço, salário, etc.
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Mas, por que todo esse interesse? Não há erros de bem intencionados? Sim, há. Por exemplo, alguns economistas são sinceros quando preconizam o pagamento de “um salário justo” ou “do produto integral da produtividade do operário”. Mas os erros, criando ilusões, favorecem a qualquer setor social, menos à classe operária.
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Tendo-se uma orientação geral sobre o objetivo político das escolas econômicas, ser-nos-á fácil orientarmo-nos sobre as grandes verdades, grandes sofismas, grandes deformações e estéreis ecleticismos que, em seu conjunto, compõem o estudo da Economia Política.
Karl Marx estudou cientificamente a realidade. Não se conformou em explicar o mundo, mas quis colaborar na sua transformação. Sendo a sua doutrina uma doutrina realista da Economia Política, estabeleceu, como principal argumento a seu favor, a realidade econômica. Sendo o marxismo, por sua vez, uma doutrina dialética, não pretende fornecer verdades eternas e imutáveis. Mas a doutrina marxista despreza os sofismas e deformações interessadas, porque considera que os interesses da classe operária e o futuro da humanidade estão de acordo com a evolução dialética da realidade econômica, isto é, com a verdade científica.,
Acusam a doutrina marxista de ser “tendenciosa”. Se, com isso, pretendem afirmar que representa uma tendência, nada se afirma de extraordinário. Com efeito, é a única doutrina econômica cujos partidários se contam por dezenas de milhões. Mas se, com isso, desejam afirmar que deforma a realidade para servir a fins determinados, isso não passa de uma acusação desprovida de fundamento, inspirada em profunda ignorância ou interesses bastardos de uma classe dominante.
O proletariado não precisa deformar a realidade para demonstrar que é explorado, que existem crises capitalistas, desocupações, etc. e que o regime socialista supera o capitalista.
Os intelectuais burgueses têm que fazer prodígios de argumentação falsa para demonstrar o contrario.
Notas de rodapé:
(3) Deixai fazer, deixai passar. (retornar ao texto)
Inclusão | 14/07/2016 |