MIA > Biblioteca > Marcel Willard > Novidades
1870-1914. Bismarck e Guilherme II. A monarquia militar da Prússia, vitoriosa dos povos alemães, do Império austríaco, do Império francês. Depois o segundo ciclo de invasões, a derrota e a revolução abortada.
Esse meio século de história alemã é dominado por uma grande linhagem revolucionária: contra Bismarck e Guilherme, os dois Liebknecht, Wilhelm e Karl, o pai e o filho, igualmente irredutíveis. Ao seu lado, duas outras figuras que são inseparáveis deles: August Bebel, o irmão de armas de Wilhelm, e Rosa Luxemburgo, a companheira de luta (até na morte) de Karl.
1848-1919. É o velho Liebknecht que, em sua juventude, tomou parte no movimento de 1848 e na insurreição de Baden de 1849, tal como, 70 anos mais tarde, seu filho se devotará à revolução de 1918 e dirigirá a insurreição berlinense em consequência da qual sucumbirá.
1870-1914. É o velho Liebknecht, que, em 1870 e 1871, com Bebel, recusa por duas vezes votar os créditos de guerra, tal como, quarenta e três anos mais tarde, o recusará seu filho.
E essa recusa vale a Wilhelm e a Bebel um processo de alta traição. São acusados de querer mudar a Constituição e destronar o rei por meios violentos. Os debates, abertos a 11 de março de 1872, irão durar quinze dias e terminarão pela condenação dos dois chefes socialistas a dois anos de reclusão num recinto fortificado.
O procurador (um precursor, também ele, porém, desses Werner e Parisius hitlerianos, sobre os quais Dmitrov triunfará) não hesita em atirar-se contra o socialismo marxista, o próprio Marx, o congresso internacional de Genebra (1866); contra os congressos alemães de Nuremberg (1868) e de Eisenach (1869), e até contra a Comuna de Paris, com a qual o órgão social-democrata, o Volksstaat, se declarara solidário.
Wilhelm Liebknecht réplica à ofensiva com ofensiva. Já na quarta audiência, acusa o sistema capitalista, analisa-lhe os efeitos:
“Aqueles cujo trabalho produz o valor e cria a riqueza nacional permanecem pobres e os que fazem os outros trabalhar são os que se tornam ricos e monopolizam em seus bolsos a riqueza nacional”.
Mas o que, de preferência, visou o procurador, não é bem a doutrina, mas a ação empreendida pelos acusados para pôr em ação, para instituir a nova ordem social. É, sobretudo, seu internacionalismo que ele taxa de traição para com a pátria. E é precisamente esse internacionalismo operário que inspira a Liebknecht suas mais belas palavras:
“Só quem, no interesse da manutenção das deploráveis condições atuais, só quem é inimigo do progresso humano, se pode opor ao princípio do internacionalismo e sentir-se ameaçado por ele. É porém, empreendimento desesperado lançar-se contra ele! O princípio internacional é imortal como a humanidade. E as calúnias com que é cumulado, os entraves que se lhe antepõem, os assaltos que se lhe fazem, não farão senão purificá-lo e temperá-lo ainda mais, como o metal que passa pela prova do fogo. Nada o impedirá de fazer a volta ao mundo. Mas, os que o combatem, pronunciam seu próprio julgamento e aquele que qualifica nossa atividade de alta traição contra o Estado não faz mais que dar provas da justeza de nossa concepção, segundo a qual a humanidade não poderá atingir seu destino, a não ser na república universal, e também que o bem do povo, a paz do povo, são inconciliáveis com a manutenção das monarquias”.
Ora, será que não é preciso derrubar a “ordem” existente aqui para realizar esse ideal internacionalista, esta República universal? Será derrubada, essa “ordem”, por uma lei natural:
“Um Estado como a Alemanha bismarquiana e prussiana”, diz ele no curso da segunda audiência, “está, desde sua origem, votada à necessidade fatal de uma destruição violenta. A sorte do Império francês, do qual é uma cópia servil, prenuncia-lhe o futuro. Nascido no campo de batalha, filho de um golpe de Estado, da guerra e da revolução de cúpula, está destinado a declinar sem trégua, de golpe de Estado em golpe de Estado, de guerra em guerra, e a cair em pedaços no campo de batalha e a ser vencido pela revolução de baixo”.
“Esta é a lei da natureza”.
Na décima quarta audiência, o tribunal entrava a tal ponto a defesa, que Liebknecht, fatigado, declara que se absterá, daí em diante, de falar. Mas, nem ele nem Bebel tinham dito tudo. E são as palavras da defesa, que eles tinham a dizer, as que foram publicadas depois do processo.
Eis alguns extratos dessas defesas “recolhidas’' — (Ungehaltene Rede):
Wilhelm Liebknecht:
“Aonde se espera chegar com processos como estes pela sistemática perseguição de nosso Partido? Confirmam nossa convicção de que temos razão. Não seriamos perseguidos se não fossemos temidos. E por que, perguntamos ao nosso adversário, por que nos temeis? Não temos dinheiro, não temos soldados; faltava-nos todos os meios cia força exterior. E, se tivéssemos dinheiro por milhões, ainda poderíeis opor-lhe os vossos bilhões, e, se tivéssemos uma centena de milhares de soldados treinados, poderíeis opor-lhes milhões de soldados. Então, por que nos temeis? Que é que, em nós, vos faz medo? Nada temos além dos nossos princípios, de nossas ideias, e são as nossas ideias que temeis, porque não tendes ideias que lhes opor, e é esta a razão por que nos quereis exterminar pela força brutal. Até agora, nunca se guilhotinou ou fuzilou uma ideia. Senhores jurados, e vosso temor é, sem que tenhais consciência disso, uma confissão involuntária dessa verdade.
“Mas um veredito em nada mudará as nossas convicções. Enviai-nos por anos a uma masmorra e, no dia em que dela sairmos, tereis que nos condenar de novo, porque, então, seremos tão culpados quanto hoje. Podeis meter nossas pessoas na cadeia, mas não o socialismo. Ele está acima de vós, como está acima de nós!”
August Bebel:
“Acabamos de empregar vinte e dois meses de repouso forçado para fazer e completar o que a luta continua e a atividade esgotante, que tivemos no estado de ‘liberdade’, não nos permitiram fazer. O cativeiro foi para nós um tempo de recolhimento e de recomposição de nossas forças. Temos necessidade dele para levar avante, com novo impe*o e armas aguçadas, nosso objetivo: a libertação da humanidade dos laços da ignorância, da opressão e da exploração”.
Foi Rosa Luxemburgo quem, com Karl Liebknecht, retomou e brandiu a flama por conta de sua geração, geração de entre duas guerras.
Alguns meses antes do grande choque que ia dizimar a Europa, em novembro de 1913, Rosa, falando aos operários de Frankfurt, lhes dissera:
— “Se nos pedirem para pegarmos em armas contra nossos irmãos franceses, ou contra nossos irmãos dos outros países, declararemos: não e não, não faremos isso!”
Escândalo. Campanha da imprensa nacionalista. Alta traição. Propaganda “subversiva”. Processo. Rosa retruca ao procurador:
— “Senhor procurador, nós, socialistas, não fazemos propaganda ‘subversiva’. A que vem isso de propaganda subversiva? Preguei eu, porventura, aos operários, que tinham vindo ouvir-me, o orgulho nacional, o chovinismo, o ódio das outras raças e dos outros povos? Isso é que teria sido propaganda subversiva. Mas não foi assim que falei e não é assim que fala um socialista consciente. O que fiz, nessas reuniões de Frankfurt, e o que todo socialista se esforça sempre por fazer, pela palavra escrita ou falada, foi esclarecer os espíritos, tornar as massas trabalhadoras conscientes de seus deveres de classes e de seus deveres históricos, mostrar-lhes as grandes linhas da evolução, as tendências das transformações econômicas, politicas e sociais, que se esboçam em nossa sociedade atual e conduzem, por uma lei de bronze, a que essa ordem social atual, chegada a certo grau de desenvolvimento, seja destruída e ceda o lugar a uma ordem superior, a ordem socialista. É desta maneira que fazemos propaganda, é assim que elevamos o nível moral das massas, abrindo-lhes vastas perspectivas históricas. É partindo dos mesmos pontos de vista, pois, para nós, socialistas, tudo se vem fundindo numa concepção harmoniosa e cientificamente baseada, que movemos nossa propaganda contra a guerra e contra o militarismo. E, se o senhor procurador concebe toda nossa propaganda como ‘subversiva’, essa asserção grosseira e rudimentar deve-se unicamente ao fato do senhor procurador não ser capaz de pensar de acordo com os métodos socialistas”.
O procurador dera a entender que Rosa, para se furtar à pena que lhe ia ser infligida, poderia muito bem fugir. Mas Rosa réplica:
— “Senhor procurador, é indigno de mim responder a todos os vossos ataques; mas ainda há uma coisa que vos tenho a dizer: Ignorais o que é a social-democracia. (Nisto, o presidente interrompe e diz: ‘não queremos ouvir discurso político’). Em 1913, para citar só este ano, numerosos foram dentre vossos colegas os que deixaram correr suor do rosto para infligir sessenta meses de prisão a meus camaradas da imprensa socialista. Será que o senhor já ouviu dizer que um só desses pecadores tenha fugido para escapar ao castigo? Credes que essa acumulação de penas tenha agido ainda que sobre um só deles, de modo a perturbá-lo em suas convicções ou no senso que tem do seu dever de classe? Certamente que não! Nossa obra ri-se das armadilhas que vossos artigos e parágrafos constroem. Ela cresce e próspera apesar de todos os procuradores. Para terminar, ainda uma palavra sobre a inqualificável acusação que recai sobre aquele que a formulou. O procurador disse textualmente — eu tomei nota — que pedia meu imediato encarceramento, porque, disse ele, “será incompreensível que a acusada não fuja”. “Isso quer dizer, por outras palavras, isto: se eu, o procurador, tivesse que cumprir um ano de cadeia, fugiria. Mas um socialista não foge. Responde por seus atos e ri-se de vossas punições! E, agora, condenai-me!”.
Rosa Luxemburgo foi condenada a um ano de prisão. Quando, porém, cumpriu a pena, durante a guerra, o governo não a pôs em liberdade. Contentou-se com mudá-la de prisão. Permaneceu encarcerada até novembro de 1918. A revolução é que a libertou. Sabe-se como a Louise Michel alemã, em janeiro de 1919, foi assassinada com seu irmão de combate e de heroísmo, Karl Liebknecht.
Karl, filho de Guilherme, é que renovou a tradição, por duas vezes, de seu ilustre pai: em 1914, a de 1871; em 1918, a de 1848. Isso, porém, acrescentando a de Lênin, seu pai espiritual.
Foi Karl quem, sozinho, no Reichstag histérico de dezembro de 1914, se levantou contra o voto dos créditos de guerra. Mobilizado, recusa-se a pegar em armas. Enviam-no para o front para fazer trabalhos de terraplenagem.
A 1.° de maio de 1916, ei-lo de licença em Berlim. Às 8 horas da noite, na Potsdamer Platz, distribue um boletim gritando: “Abaixo a guerra! Abaixo o governo!” Chega a polícia para espancá-lo, para prendê-lo. Acusam-no de alta traição para com a pátria (tal como seu pai outrora fora acusado).
De sua prisão, dirige ao tribunal da Kommandatur berlinense duas petições:
“A guerra atual”, escreve na primeira, datada de 3 de maio, “não é uma guerra de defesa nacional ou de libertação dos povos oprimidos ou de luta pelo bem-estar das massas. Do ponto de vista do proletariado, não passa do apogeu da opressão política, do vampirismo econômico, da carnificina das classes operárias, em proveito do capitalismo e do absolutismo. A tal crime, só uma resposta pode ser dada pela classe operaria de todos os países: a luta internacional contra os governos capitalistas e as classes dominantes de todos os países, para liquidar essa opressão e essa exploração, para pôr fim à guerra por meio de uma paz concluída dentro do espírito socialista”.
Na segunda petição, datada de 8 de maio, escreve:
“Nos documentos do processo, que se intenta contra mim, encontro a seguinte expressão: ‘traição para com a pátria’. Ora, para o socialista internacional, esta expressão é perfeitamente absurda. O socialismo não conhece potência inimiga a quem possa favorecer. Sua atitude para com qualquer governo capitalista, sem embargo de qual seja ele, é revolucionária, pelo mesmo motivo que para com seu próprio governo. Não se trata de ‘favorecer uma potência estrangeira’, mas, ‘por uma ação recíproca internacional com as forças socialistas dos outros países, trabalhar pela destruição das potências imperialistas’. Eis a que deve tender, por definição, todo socialista. Combate em nome do proletariado internacional, contra o capitalismo internacional. Ataca-o onde o encontra e onde pode atacá-lo, de maneira eficaz, isto é, em seu próprio país. É em seu próprio país que combate, em nome do proletariado internacional, seu próprio governo e as classes dominantes, na medida em que representam o capitalismo internacional”.
A 3 de junho, perante o tribunal, dá-se conhecimento a Karl da ata de acusação. É, então, que ele acusa, por sua vez... Em sua admirável resposta, desmascara os verdadeiros traidores da pátria.
— “... Não tenho de que me defender, diz. “Afirmo aqui, sem restrição, minha fé no socialismo internacional, minha fé na politica que pratiquei, publicamente, perante todo o país, de há anos a esta parte; sustento cada sílaba do boletim que distribuí na Potsdamer Platz. Repito, com todas as minhas forças, o grito que lancei: ‘Abaixo o governo! Abaixo a guerra!’ Sublinho cada palavra de minha petição enviada ao Kommandatur a 3 de maio, cada palavra que pronunciei no Parlamento sob as vaias de ódio de meus adversários. Não tenho de que me defender. Mas, uma vez que se trata de traição para com a pátria, direi o que penso sobre isso. A traição para com a pátria foi, em todos os tempos, privilegio das classes dirigentes, dos príncipes, dos aristocratas: está em suas tradições. Os verdadeiros traidores da pátria não estão hoje sentados no banco dos réus. Estão sentados por detrás dos caixas da indústria pesada, por detrás dos caixas dos fornecedores de munições, nos grandes bancos, nas propriedades rurais dos junkers. São vistos na Wilhelmstrasse, na alameda das Tílias, nos palácios dos ministros e dos príncipes, nos castelos e nos tronos”.
E acrescenta:
— “Os verdadeiros traidores da pátria são, na Alemanha, os membros responsáveis e irresponsáveis do governo... Esses caçadores de espólios, políticos e capitalistas, esses jogadores de bolsa, esses agiotas e esses financistas de toda sorte que, em troca de vis vantagens, puseram em cena a guerra com uma leviandade que ultrapassa em criminalidade a de todos os que, até agora, foram promotores de guerra. Estes são os que lançaram a humanidade num caos de violência barbara, que transformam a Europa num monte de escombros, envolvendo-a numa atmosfera de mentirá e de hipocrisia, em que se cega e sufoca a verdade. São os que continuam e continuarão essa ação infernal até que as massas feridas e escravizadas cruzem os braços. Os verdadeiros traidores da pátria são esses de que falei em minha petição de 3 de maio, esses que, no final do meu boletim, aponto como os verdadeiros inimigos do proletariado alemão, aqueles sobre quem pesa a terrível e sangrenta culpabilidade da guerra, e que quiseram transformar o suor, a miséria, o descalabro e a própria substância de um povo em ouro e em meios de poder; são aqueles que, tendo interesse na própria guerra e em seus fins imperialistas, esconderam sua avidez § sua necessidade de domínio sob um barulhento zelo patriótico; são aqueles que não podem tolerar ver um povo livre, mesmo noutros países; que se decidiram a lesar o povo alemão, ainda hoje, em suas esperanças de libertação; e que têm tão poucos escrúpulos que podem descrever esta guerra como uma guerra de libertação. Se ainda não chegou, para eles, a hora de prestar contas, é porque a massa do povo ainda é, hoje, vítima de suas manobras, tendentes a criar a confusão e porque, ainda hoje, o povo não sabe a verdade”.
No dia 28 de junho é que começam os debates. Apesar dos protestos de Karl, ordena-se que o mesmo seja feito a portas fechadas. Ao requisitório, retruca com as declarações seguintes:
— “Ora! Continuai, não tenhais cerimonia! Prossegui até ao fim a nova ação gloriosa do militarismo alemão, que quer conquistar o mundo e cuja má consciência precipita mm terror pânico o seu próprio povo! É precisamente o caso de um governo blefador que, ao mesmo tempo que se empenha pela popularidade, encarcera a liberdade, trata a verdade como contrabando e vende a mentira pelas ruas. É claro que o temor experimentado pela acusação ante o perigo que corre nosso governo capitalista, o temor de que nasceu todo esse processo, tem bastante fundamento. Mas é nele que depósito toda minha esperança”.
Condenado aos trabalhos forçados, Liebknecht apela. Comparece perante a Corte a 23 de agosto de 1916. Não perde essa ocasião de expôr seu programa e seus objetivos de guerra:
— “O objetivo da guerra que movo é que todos os Estados imperialistas, seus governos e suas classes dirigentes sejam vencidos, vencidos pela massa de seus próprios povos. É na realização desse desígnio que vejo a única possibilidade de estabelecer-se uma paz duradoura que possa vir em beneficio das grandes massas populares de todos os países”.
O procurador pede contra ele uma condenação a seis anos e meio de trabalhos forçados e a dez de privação de seus direitos cívicos.
Nova contraofensiva de Karl, que brada:
— “Trabalhos forçados! Perda dos direitos cívicos! Seja! Vossa honra não é minha honra! Mas eu vos digo: nunca houve general que tenha podido usar seu uniforme com mais honra do que eu usarei o meu uniforme de forçado! Estou aqui para acusar, não para me defender!... Abaixo a guerra! Abaixo o governo!”
O procurador, perde a calma e não pode dominar a cólera. Ousa invocar contra o herói popular o julgamento que o “povo” lhe faria. É, então, que Liebknecht, pegando a palavra, lhe lança o desafio que, por cima de sua cabeça, além do tribunal e de suas portas fechadas, vai ressoar lá fora como um apelo ao povo:
— “Não, mas compreendei! O procurador descreve-me como um homem sem honra; pede para mim seis anos e alguns meses de trabalhos forçados e dez anos de privação dos meus direitos cívicos. Digo algumas palavras para criticar seu requisitório e é ele quem cai em crise. Fala em, ‘povo’ contra mim. Ousai, então, fazer apelo ao povo, não apenas em palavra, não por detrás das portas de um tribunal dez vezes aferrolhado e que vos esconde do povo! Tirai, pois, ao povo as cadeias e os garrotes do estado de sítio! Reuni-o, a esse povo, aqui ou em qualquer outra parte. Reuni os soldados no campo de batalha ou onde quiserdes. E fazei-me comparecer perante essa assembleia, perante esse tribunal. De um lado, todos vós, o tribunal, o procurador-geral e também esses senhores do estado-maior, do ministério da Guerra e do bureau da imprensa e quem mais quiserdes ainda por cima! Do outro, eu, só eu, ou um de meus amigos. De que lado estará a massa do povo, uma vez que o véu da mentira seja arrancado de seus olhos? Do vosso lado ou do meu? Não tenho dúvidas, quanto à resposta! Abaixo o governo! Abaixo a guerra!”
Não será em vão, Karl, que te dirigiste ao povo. Serás encarcerado por dois anos; mas esse povo em que tu crês e que, também ele, crê em ti, e, por ti, em sua causa, é o povo que, dois anos depois, virá libertar-te, como virá libertar Rosa.
Serão as jornadas revolucionárias de novembro de 1918, depois, em vista da traição social-democrata, os esforços heróicos desse grupo Spartakus de que serás o chefe.
Em janeiro de 1919, esmagada a insurreição berlinense, Karl e Rosa, sereis abatidos pelos inimigos do povo e pelos que o traem.
Mas não mais será em vão que, a cada ano, todos os proletariados do universo celebrarão piedosamente vossa memória: sereis dois desses “três L”, o terceiro dos quais será Lênin, que os trabalhadores associarão num amor comum,
Será, certamente, martirizado esse nobre povo da Alemanha do qual sois os melhores campeões, do qual por tão pouco não ereis os libertadores, como ele tinha sido o vosso. Ainda sereis, certamente, por muito tempo, supliciados na carne de vossa posteridade politica, dos Thaelmann, dos Klaus, dos Fiete Schultze, dos Edgar André e de seus milhares de êmulos.
Mas, quando “o véu da mentira for arrancado de seus olhos”, quando ele souber unir-se contra os que o espancam, de que lado estará esse povo?
Fostes vós que, em primeiro lugar, vistes claro: e é porque, então, ele vos terá compreendido, porque, então, ele estará do lado bom, do vosso, que libertará vossos filhos e se libertará a si mesmo.