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O desenvolvimento da filosofia burguesa atingiu o apogeu na dialética de Hegel e no materialismo de Feuerbach. Em meados do século XIX, Marx e Engels, superando o idealismo de Hegel e o caráter contemplativo e metafísico da filosofia de Feuerbach, criaram o materialismo dialético.
Na revolução dê 1848, o proletariado apareceu pela primeira vez como força política independente, como coveiro da burguesia. A revolução de 1848 é, como mostra Engels, o momento crucial na história da burguesia. Desde então, a burguesia perde definitivamente seu caráter revolucionário anterior e torna-se reacionária. Por isso termina também a linha ascendente na filosofia burguesa. Todo o seu desenvolvimento ulterior constitui já um quadro de movimento retrógrado, decadência e decomposição. A filosofia burguesa, em conjunto, rompe com o materialismo e divulga cada vez mais as pequenas escolas idealistas anticientíficas. A medida que a luta de classes se aprofunda, e particularmente durante a época do imperialismo, a filosofia burguesa toma-se cada vez mais reacionária e anticientífica transformando-se em simples criada do clericalismo.
No presente capítulo faz-se uma breve exposição de algumas correntes, as mais características, da filosofia burguesa na Europa ocidental e na América dos meados do século XIX.
O chamado positivismo conseguiu uma ampla divulgação na filosofia burguesa no século XIX.
Uma série de filósofos e sábios burgueses começou a pregar a filosofia "positivista" (afirmativa). Tal filosofia "positivista" deve, a seu ver, renunciar às tentativas, segundo eles, "metafísicas" e "escolásticas", de resolver os problemas fundamentais da filosofia sobre a essência do mundo, sobre o que é primário: a matéria ou o espírito, e se existe em geral uma realidade objetiva independente do homem. A filosofia deve tomar como ponto de partida apenas os dados que nos proporcionam a experiência, e confundir-se com a ciência. Assim, os positivistas, sob a bandeira da luta contra a metafísica e a escolástica, pela unidade da filosofia e da ciência, exigiam na realidade a supressão da filosofia, sua diluição nas diversas ciências concretas.
Contudo as ciências naturais não podem existir sem uma fundamentação metodológica; por isso, a luta dos positivistas contra a existência autônoma da filosofia, acarretava de fato a luta contra o materialismo. Os positivistas adotaram o agnosticismo e o idealismo abertos.
O fundador do positivismo e autor do próprio termo "positivismo" foi o filósofo francês Augusto Comte (1798-1857). Comte aparece em 1832-1842 com uma grande obra em seis volumes "Curso de Filosofia Positiva". No fundamental, Comte coloca-se na posição do ceticismo e do idealismo de Hume, a qual tenta unir às ideias vulgarizadas por Saint-Simon sobre as fases progressivas da evolução da humanidade. Comte nega a possibilidade de conhecer-se a essência das coisas. Para ele, tudo o que se acha fora da esfera das percepções sensíveis é inaccessível ao conhecimento científico "positivo", e assim afirma serem questões "metafísicas" que devem ser expulsas da ciência. No domínio da sociologia, o idealismo de Comte manifesta-se de forma inteiramente clara. Afirma que as ideias governam o mundo e que a evolução da inteligência determina todo o desenvolvimento social da humanidade. Em relação com isto, Comte divide a história da humanidade em três estados: o teológico — o império da religião; o metafísico — o império da filosofia; e o positivo — o império da ciência. Segundo Comte, a missão da sociologia consiste em "mitigar" o antagonismo das classes e assegurar o "equilíbrio" do organismo social; arremete furiosamente contra todas as teorias e doutrinas revolucionárias, declarando-as "metafísicas" e procurando demonstrar-lhes a falta de base científica, etc.
O positivismo de Comte significava um retrocesso em comparação com a filosofia da burguesia progressista e revolucionária, com o materialismo francês do século XVIII e com a dialética de Hegel. Comte expressava o ponto de vista da burguesia já convertida numa classe reacionária, preocupada em esmagar a luta revolucionária da classe operária. Nos últimos anos de sua vida, Comte passou-se definitivamente para o campo da reação e do clericalismo, pregando a organização religiosa da sociedade com um "papa" positivista a frente.
Outro grande representante do positivismo foi o inglês Herbert Spencer (1820-1903). Spencer era agnóstico. Reconhecendo a existência de alguma coisa independente da nossa consciência. Spencer afirmou como Comte, que esta "coisa" era absolutamente incognoscível ignorada". Segundo Spencer, a ciência conhece apenas os "fenômenos"; porém a essência das coisas é incognoscível. Spencer passa cuidadosamente do "incognoscível" ao serviço do clericalismo, como domínio da fé religiosa e não da ciência. Spencer é conhecido por sua vulgar teoria da evolução, na qual não têm lugar os saltos, mas em compensação desempenha um grande papel a chamada "teoria do equilíbrio".
"A evolução, em todas as suas formas, diz Spencer, aproxima-se constantemente do equilíbrio em movimento e, em maior ou menor grau, mantêm-se nele".
Em sua teoria social, Spencer tenta impingir a mesma ideia do "equilíbrio entre as forças antagônicas". Defende a "teoria organicista" da sociedade, teoria que identifica a sociedade humana com o organismo biológico e declara a sociedade de classes a mais perfeita e mais semelhante ao organismo animal mais perfeito, com grande desenvolvimento na diferenciação dos diversos órgãos e membros e com a subordinação das partes "inferiores" às superiores". O sentido de classe desta falsa "teoria" salta à vista: a defesa do regime de exploração capitalista e sua proclamação como estado perfeito e natural da sociedade. Para justificar a perpetuidade da luta de classes a da exploração, Spencer trata de apoiar-se no darwinismo vulgarizado, na teoria da luta pela existência.
No século XIX, o agnosticismo foi a corrente filosófica dominante nos círculos científicos da Inglaterra. Grandes sábios como o biólogo Huxley, autor do próprio termo "agnosticismo", apoiava essa corrente. Nos problemas que se ligavam às ciências especiais, os agnósticos, como Huxley, eram materialistas convencidos; porém nos problemas filosóficos gerais abjuravam do materialismo e declaravam o mundo incognoscível, pois não podíamos saber qual seu fundamento, se o espírito ou a matéria, e, portanto, devíamos renunciar à própria proposição desses problemas.
Engels assinala que, naquela época, o agnosticismo era a miúdo um "materialismo ruborizado". O materialismo era objeto de perseguição por parte da burguesia reacionária; por isso, muitos experimentadores naturalistas, sendo na realidade materialistas, encobriam seu materialismo com o agnosticismo. Engels sobre eles dizia que
"praticamente não é mais que uma maneira vergonhosa de aceitar o materialismo atrás da cortina e renegá-lo em público"(117).
Entretanto, à medida que aumentava o caráter reacionário da burguesia, o agnosticismo ia-se convertendo num "idealismo ruborizado". Atualmente os agnósticos se ligam mais ou menos abertamente ao idealismo subjetivo e ao fideísmo (os neo-kantianos, os machistas, que reconhecem à religião direitos iguais aos da ciência, entregando à primeira o terreno do "incognoscível".
O materialismo vulgar (Büchner, Vogt, Moleschot) obteve uma ampla divulgação na Alemanha da segunda metade do século XIX. Depois da revolução de 1848, a Alemanha começou a evoluir rapidamente na senda do capitalismo. Por isso, tiveram ali grande desenvolvimento as ciências naturais, porém o pensamento filosófico burguês, nas condições da reação política iniciada depois de 1848, não só deixou de elevar-se para o materialismo dialético, como nem sequer esteve em condições de manter-se à altura do materialismo feuerbachiano. O materialismo vulgar não desenvolveu a teoria filosófica geral dos materialistas franceses do século XVIII e de Feuerbach, não a emancipou da limitação específica do século XVIII (o mecanicismo, o caráter metafísico) em consonância com os grandes progressos realizados pelas ciências no século XIX, mas rebaixou o materialismo com seu simplismo extremado.
A obra mais conhecida dos materialistas vulgares, "Força e Matéria" de Büchner, apareceu em 1855 e foi reeditada diversas vezes. Büchner nada introduz de novo na interpretação da matéria em comparação com o que já fora feito pelos materialistas franceses do século XVIII; dá apenas um ou outro complemento na fisiologia, que no século XIX fez grandes progressos. Os materialistas vulgares não conseguiram explicar a fonte do movimento da matéria, não compreenderam sua energia interna, seu auto-movimento. O conceito da força como causa do movimento tinha para eles um caráter pouco claro e metafísico, e os levava constantemente à confusão e à contradição, ao agnosticismo e ao idealismo (Büchner, por exemplo, dizia que "a natureza da força, como a da matéria, nos é desconhecida"). Os materialistas vulgares, ao refutarem acertadamente qualquer espécie de substância espiritual, imaginavam todavia de forma extremamente simplista a relação existente entre o cérebro e o pensamento. A seu ver, o pensamento é uma secreção do cérebro, exatamente e no mesmo sentido em que a bílis é a secreção do fígado.
Os materialistas vulgares estendiam esta formulação fisiológica grosseira a todos os fenômenos da vida social. Fizeram grande uso da teoria da luta pela existência, de Darwin, aplicando de maneira falsa as leis biológicas à sociedade. Ao biologizar a vida social, os materialistas vulgares reduziram todas as diferenças de classe, assim como as diferenças entre as nações adiantadas e atrasadas a fatores tais como o caráter da alimentação adotada pelos homens. Este condicionaria a riqueza ou a pobreza da substância cerebral. Afirmavam, além disso, que as aptidões e a preponderância adquiridas nesta base, transmitiam-se hereditariamente de geração em geração, reforçando assim e perpetuando o abismo entre "cultos" e "incultos".
Os materialistas vulgares eram os ideólogos da burguesia radical e da pequena-burguesia. Pronunciavam-se contra a revolução socialista e contra o comunismo. Afirmavam que "o reino dos incultos sobre os cultos é absurdo". É verdade que criticavam também as formas feudal-burguesas existentes na Alemanha e propunham certas reformas sociais; as reivindicações contidas, porém, em tais reformas não iam além da abolição da renda territorial, da limitação da herança de grandes propriedades, do seguro estatal para a velhice e a enfermidade. Nos problemas políticos sociais, o materialismo grosseiro dos materialistas vulgares acolhe-se no idealismo e revela a cada momento sua natureza burguesa.
Se o materialismo vulgar das décadas de 50 e 60 era, em comparação com o materialismo dialético, e mesmo com o feuerbachiano, uma corrente indiscutivelmente atrasada, tinha, porém, contudo, certo valor progressista, pois defendia o direito da ciência e propagava (por certo, inconsequentemente) o ateísmo. Mais adiante, entretanto, a burguesia abandonou até esse materialismo burguês inconsequente e vulgar, como o de Büchner, Vogt e Moleschot. Depois da Comuna de Paris (1871), primeira forma de ditadura do proletariado, começou a decadência gradual do capitalismo. Nos fins do século XIX o capitalismo entrou em sua última etapa, a etapa imperialista, etapa do capitalismo monopolista e putrefato, situação que se refletiu também na ideologia burguesa. A luta cada vez mais furiosa contra o materialismo, a complacência sempre mais refinada com o clericalismo, constituem a característica da filosofia burguesa dos fins do século XIX e dos princípios do século XX. A burguesia não pôde nem pode já criar nenhuma nova teoria filosófica original; desenterra, pois, do passado, pedaços de sistemas idealistas já há muito ultrapassados; amputa, além disso, seus aspectos mais frágeis e os combina ecleticamente entre si, encobrindo-os novamente sob uma terminologia pseudo-científica.
Durante esse período, os pontos de vista materialistas na ciência burguesa, aparecem apenas sob a forma de materialismo espontâneo dos experimentadores naturalistas. A pesquisa materialista nas investigações científicas da natureza é, como assinala Lenin, algo que se compreende por si mesmo; contudo, apenas alguns experimentadores naturalistas atreveram-se a defender abertamente o materialismo. Entre os que nos fins do século XIX e no início do século XX não receavam manifestar-se contra o poder do idealismo e do clericalismo, conta-se o famoso biólogo Ernest Haeckel (1834-1919). Em 1899 apareceu seu livro "O Enigma do Universo", que despertou contra o autor a raivosa perseguição de todos os círculos reacionários. Entre as grandes massas trabalhadoras, em compensação, este livro teve uma acolhida de completa simpatia, sendo traduzido em vinte e quatro idiomas (na Rússia Tzarista foi proibido e queimado). O próprio Haeckel chama-se monista e mesmo panteísta, renegando a denominação de materialista. Não obstante a inconsequência e a estreiteza de seu materialismo, Haeckel foi um dos maiores defensores do materialismo nas ciências naturais. Demonstrou de uma forma clara e convincente que as ciências naturais só podem desenvolver-se sobre a base do materialismo e são incompatíveis com o idealismo.
"Ridiculariza os filósofos que têm um ponto de vista materialista, sem perceber que ele próprio coloca-se num ponto de vista materialista"(118).
A concepção do mundo de Haeckel formou-se sob a influência das grandes descobertas do século XIX: a lei da conservação e da transformação da energia, e a teoria da evolução de Darwin. Haeckel defendeu ardentemente essas descobertas contra os ataques dos reacionários, e enriqueceu-as com novas investigações. Compreendia o valor filosófico enorme dessas revelações científicas que constituem uma brilhante confirmação do materialismo e assestam um golpe mortal no idealismo e no clericalismo. O princípio diretor fundamental na concepção do mundo de Haeckel é o do nascimento e da evolução naturais. Haeckel, por profissão biólogo, dedica-se principalmente aos problemas da origem e evolução da vida orgânica, e faz nesse terreno uma série de investigações valiosíssimas. É de um valor particularmente importante sua lei biogenética, segundo a qual o desenvolvimento embrionário do ser vivo individual é uma repetição abreviada (que muda de forma) do desenvolvimento da espécie, de uma larga série de formas biológicas que se substituem umas às outras na história da terra. Contudo, também no terreno da natureza inorgânica, a posição materialista geral de Haeckel e sua interpretação materialista da matéria e do movimento conduziram-no a conclusões que, por vezes, prognosticavam até mesmo o desenvolvimento ulterior da ciência (por exemplo, no problema da origem e transformação mútua dos elementos químicos, no problema da inconsistência da teoria de Clausius referente à "entropia" — "a morte calorífica do universo", etc.).
Contudo, apesar do seu valor científico progressista, o materialismo de Haeckel não era mais que o materialismo espontâneo dum sábio burguês. A dialética materialista consciente de Marx e Engels era completamente desconhecida de Haeckel. Daí a inconsequência, o caráter incompleto do seu materialismo, e os elementos de agnosticismo existentes nos conceitos de Haeckel.
Em 1906 fundou Haeckel uma sociedade ateia, a "União dos Monistas", de caráter burguês (em parte pequeno-burguês); seu ateísmo era muito limitado e inconsequente, razão que o fez exercer pouca influência.
Apesar de todas as perseguições e de todos os assédios, o materialismo naturalista científica goza hoje de grande divulgação nas ciências naturais modernas. O idealismo não pode triunfar plenamente nas ciências naturais. Referindo-se à crise da física nos fins do século XIX e no começo do século XX, Lenin acentua:
"A esmagadora maioria dos experimentadores naturalistas, tanto em geral como neste ramo especial, ou seja na física, tem invariavelmente o ponto de vista materialista"(119).
Além de Haeckel, grandes sábios como Mendelev, Timiriazev, Pavlov, Thompson-Kelvin, Michurin, atualmente Langevin e outros grandes físicos, sustentavam e sustentam o ponto de vista do materialismo natural científico.
Durante o último terço do século XIX o neo-kantismo foi consideravelmente divulgado entre a intelectualidade burguesa e pequeno-burguesa.
O neo-kantismo era a filosofia da burguesia liberal do período imediatamente anterior à época do imperialismo e do seu começo. O neo-kantismo tinha várias e diversas escolas. Lenin deu a característica geral comum a todo o neo-kantismo, quando indicou que os neo-kantianos "depuraram a doutrina de Kant em favor da de Hume(120), abandonando os elementos de materialismo contidos na doutrina de Kant (por exemplo, sua "coisa em si" material).
Os primeiros representantes do neo-kantismo, O. Liebman e F. A. Lange, estavam mais próximos do Kant verdadeiro que os seguintes. Não renunciavam ainda totalmente ao reconhecimento da "coisa em si" como uma realidade objetivamente existente, e assinalavam, em particular, seu caráter de absoluta incognoscibilidade. Os neo-kantianos posteriores deram, em compensação, mais um passo para "a direita" de Kant, para o idealismo subjetivo, afirmando que a "coisa em si" era apenas uma noção condicional "fora dos limites", que não tinha existência a não ser no raciocínio. Nos fins do século XIX havia entre os neo-kantianos duas escolas principais: a marbugiana e a friburgiana. Os representantes da primeira (Kohen, Natorp, Kassirer) dedicaram sua atenção principalmente a interpretar (ou melhor a falsificar) de forma idealista as ciências naturais (a matemática, a mecânica, a física, a biologia). Pertenceu a esta escola a maioria dos oportunistas da Segunda Internacional (Bernstein, Forlander e outros), entre os quais o neo-kantismo foi considerado durante muito tempo sua filosofia quase oficial. Os revisionistas substituíram o materialismo dialético pelo neo-kantismo. Os representantes da segunda escola, a friburgiana (Windelband, Rickert), especializaram-se nos problemas históricos. Procuraram estabelecer uma vala intransponível entre as ciências naturais e as sociais, e, por meio de uma falsificação idealista destas últimas, "demonstrar" que no campo da história não existem leis objetivas a regê-la.
Os neo-kantianos da escola marbugiana "esforçaram-se" por fundamentar filosoficamente o idealismo físico desnaturalizando os progressos mais recentes realizados nas ciências, tais como a física-matemática. Tratavam de apresentar a coisa como se as ciências naturais reduzissem cada vez mais a matéria — os átomos, o éter, a energia material — a um nível exclusivamente matemático. Desfiguravam a própria natureza da matemática negando que esta última refletisse as leis e as relações do mundo material. Os neo-kantianos reduzem todas as formas qualitativas, múltiplas e variadas, do mundo real, a uma quantidade abstrata, a uma relação matemática. Negam que as sensações sejam a fonte do conhecimento; os marbugianos acreditam que todo o conhecimento verdadeiramente científico extrai seu conteúdo só e exclusivamente do "pensamento puro", por suposição independente da experiência.
Em suas teorias sociológicas os neo-kantianos da escola marbugiana dividem a sociedade em uma economia espontânea, que se desenvolve de maneira fatalista e o homem, que dispõe de tudo e ao qual declara uma personalidade absolutamente livre, independente de toda a lei e necessidade, o qual deve proceder conforme o "imperativo categórico" de Kant. A ética idealista kantiana é considerada ciência da sociedade. Os neo-kantianos afirmam, mais ou menos, que a atividade consciente dos homens não é condicionada por nenhuma causa objetiva, nenhuma necessidade econômica, constituindo apenas a aspiração livre dos homens em relação a seus objetivos ideais. Por objetivos ideais entendem não estes e outros objetivos concretos, mas o "imperativo categórico" de Kant, o "ideal ético" segundo o qual atuam, na opinião deles, todos os homens.
Os neo-kantianos exigem a fundamentação ética do socialismo. Negam que o triunfo do socialismo seja preparado pelas leis objetivas do desenvolvimento social. O socialismo é, para eles, um objetivo ideal ao qual aspiram os homens, a encarnação do imperativo categórico em forma de Estado ideal kantiano equitativo, ou seja a república burguesa liberal com a qual de fato identificam o socialismo. Ao desejar um ideal socialista inaccessível, conseguem os homens na sua luta conquistas práticas de "cinco centavos". Nisto se baseia a famosa fórmula do chefe dos revisionistas alemães, o neo-kantiano Bernstein:
"o objetivo final nada é, o movimento é tudo".
Deste modo, os neo-kantianos da Segunda Internacional castram o socialismo, despojam-no de todo o valor revolucionário prático e convertem-no numa espécie de ideal inatingível, extraterreno. Assim se compreende também por quê os revisionistas de toda a espécie, que substituem o socialismo pelo liberalismo burguês e pregam a renúncia à luta de classes do proletariado, à revolução socialista e à ditadura da classe operária, acham-se aferrados a este falso "socialismo ético".
Os neo-kantianos da escola friburgiana adotam uma posição não menos reacionária; lutam contra o materialismo valendo-se dos velhos sofismas idealistas de que "não há objeto sem sujeito" e da doutrina mística do império dos valores ideais, ou "normas" (o bem, a justiça, o belo, a verdade, etc.) segundo as quais o homem cria os objetos do material que fornecem as representações sensíveis e introduzem no inundo a ordem, as leis, etc. Se os marbugianos estabeleciam uma separação de princípio entre ciências naturais, que reduziam à matemática, e às ciências sociais, nas quais, segundo eles, impera a ética idealista de Kant, essa separação afunda-se ainda mais nos friburgianos. Rickert afirma que as ciências naturais, só se interessam pelos problemas gerais e devem "afastar os elementos históricos de seus conceitos", ou seja que as ciências naturais são anti-históricas (isto, é claro, não é justo no fundo) e por outro lado a história interessa-se só pelos problemas individuais, uma vez que os mesmos não se repetem historicamente nem podem ser estabelecidas leis gerais (tampouco isto é certo).
Em vista da sociedade compor-se de homens que procedem por livre arbítrio, não pode haver leis objetivas na história. "A história não tem leis", diz Rickert. A tarefa da história consiste em descrever os fenômenos individuais em sua originalidade irrepetível. Entre a inumerável quantidade de acontecimentos, o historiador deve selecionar, segundo a opinião de Rickert, os fatos mais importantes. São sucessos históricos importantes os que têm "um valor cultural". Assim fundamenta-se a arbitrariedade completa dos historiadores idealistas burgueses em sua "elaboração crítica" e a falsificação de processo histórico. Esses conceitos dos neo-kantianos se insurgem diretamente contra o materialismo histórico a que os neo-kantianos combatem encarniçada mente. A negação da existência de leis objetivas que dirijam a evolução social reflete o temor da burguesia ante essas leis históricas, que condenam o capitalismo à morte e que, com tanta profundidade, foram descobertas pelos fundadores do comunismo científico.
O neo-kantismo divulgou-se durante a segunda metade do século XIX na Alemanha, e também na França, onde uniu-se diretamente com os ideólogos do clericalismo católico. Também os "marxistas legais (Struve e outros) e muitos "economistas", na Rússia, colocaram-se em posições neo-kantianas. Lenin faz notar a influência do neo-kantismo sobre os mencheviques (Axelrod e outros).
Durante a oitava década do século XIX ficou "em moda", na Alemanha e na Áustria, e posteriormente nos demais países, outra corrente idealista: o empírio-criticismo e machismo. Seus fundadores foram o filósofo alemão Avenarius (184C 1896) e o físico austríaco Mach (1838-1916). Este último dá seu nome escola. A palavra "empírio-criticismo" significa "crítica da experiência". (A principal obra de Avenarius intitula-se "Crítica da Experiência Pura", por analogia com a "Crítica da Razão Pura" de Kant).
Lenin demonstrou que o machismo trata de ressuscitar as velhas doutrinas idealistas subjetivas de Berkeley e Hume. O machismo, como o berkeleyismo, representam um idealismo subjetivo; porém diferencia-se deste último porque os empírio-criticistas procuram encobrir seu idealismo e apresentá-lo de forma mais disfarçada. Para este fim, Mach e Avenarius chegaram a manifestar seu desejo de conciliar o materialismo com o idealismo, de superar a "estreiteza" dessas duas concepções filosóficas. Referem-se, para isso, a fragmentos de velhos conceitos sobre a matéria, às últimas descobertas da física desfiguradas de forma idealista, afirmando que as ciências naturais mais recentes demonstram que a matéria desapareceu.
Mach e Avenarius, como Berkeley, consideram que no conhecimento é preciso partir da "experiência pura", e os homens, a seu ver, percebem na experiência, não a matéria nem o espírito, mas os chamados elementos da experiência, quer dizer, a cor, o som, as formas: o belo, o amarelo, a esfera, o frio, etc. Os "elementos da experiência", que os machistas declaram ser o princípio primário do mundo, são na realidade a mesma sensação humana a que se referiu Berkeley. O novo termo "elementos", introduzido pelos machistas, serve apenas para complicar o assunto. Se dissessem direta e abertamente que o mundo existe só nas percepções humanas, seria muito notório seu idealismo subjetivo, que contradiz toda a ciência moderna. A nova palavrinha "elemento" cria a aparência dum novo sistema filosófico diferente do de Berkeley e de outras formas do idealismo subjetivo. Mas, na realidade, como já assinalava Lenin, os machistas realizam neste problema um plágio compacto de Berkeley. Como Berkeley, os machistas negam a existência do mundo objetivo, fonte das percepções humanas. Declaram que é "metafísica" toda a tentativa de sair dos limites das sensações.
Lenin demonstrou o subjetivismo dos empiriocriticistas. Segundo ele, a descoberta dos "elementos da experiência", que os machistas consideravam sua maior aquisição, reduzia-se ao seguinte:
O machismo identifica assim o ser com o pensar, o objeto com a percepção, o físico com o psíquico. "Só experimentamos nossas sensações", "o mundo compõe-se só de minhas sensações", "só eu existo"; eis o que supõe a teoria dos machistas, enquanto considera as coisas como simples "complexos de elementos da experiencia .
Os machistas tendem assim para o solipsismo ou seja a afirmação de que fora de mim, de minha consciência, nada existe no mundo.
O empírio-criticismo, que pretende representar a filosofia mais nova das ciências naturais a partir das últimas aquisições cientificas, nega na realidade as verdades elementares da ciência. Assim, por exemplo, Avenarius chegou a afirmar que o pensamento e a sensação existem independentemente do homem e de seu cérebro.
"Todos sabem, escreve sobre esse assunto Lenin, o que é a sensação humana; porém a sensação sem o homem ou anterior ao homem é um absurdo, uma abstração morta, um subterfúgio idealista"(121).
Para encobrir seu idealismo subjetivo, os machistas introduziram com abundancia termos novos. Em cada fenômeno diziam, temos à vista dois fatores: o sujeito que percebe, ou "eu", e o meio que o envolve. Por conseguinte, não há meio sem um sujeito que perceba nem há sujeito sem meio. Os machistas chamam a esta tese, "coordenação de princípio", ou "eu" e o "meio". Declaram que essa teoria da "coordenação de princípio" supera o materialismo, que afirma que o meio, a natureza, existe independentemente do homem, e ao idealismo, segundo o qual a natureza só existe na consciência do homem.
Na realidade temos aqui em vista o mais legítimo idealismo. Segundo os machistas a natureza fica dependendo do homem. Conforme seu ponto de vista, sem sujeito que perceba não existe nenhuma realidade objetiva. Acontece, portanto, que antes do aparecimento do ser pensante, o homem, tampouco o mundo exterior pode existir. Plekhanov ridicularizou engenhosamente os machistas dizendo que, sobre seu ponto de vista, não são os pais que geram o homem, mas ao contrário, o homem que gera seus pais, que o homem e suas sensações existiam antes da aparição do globo terrestre, etc.
Ao negar a existência objetiva da natureza, o machismo nega também a existência das leis objetivas pelas quais a natureza se rege: a causalidade objetiva e a necessidade.
Do ponto de vista do materialismo, a missão fundamental das ciências naturais, é conhecer as leis do movimento e desenvolvimento da matéria. O empírio-criticismo, em compensação, considera que, embora não existam leis objetivas na natureza, embora a única realidade seja a sensação, a missão da ciência, e dentro dela da física, reduz-se ao estudo dos laços entre as sensações. Do ponto de vista dos machistas, o mundo representa um caos de elementos: as sensações. Desse caos, a consciência do homem constrói o mundo, estabelecendo nele uma ordem, introduzindo as leis que hão de regê-lo.
"A relação causal universal dos fenômenos, escreve o machista russo Bogdanov... é a lei universal, a lei suprema que, expressando-se em palavras filosóficas, a razão humana impõe a natureza".
Partindo desta interpretação idealista das leis da natureza, o empírio-criticismo renuncia ao conhecimento da subordinação causal dos fenômenos. De vez que a juízo dos machistas não existe o mundo objetivo nem suas leis, de vez que todas as leis da natureza são inventadas pelos próprios homens, tampouco há naturalmente coisas a descobrir. Portanto, a ciência deve limitar-se à observação, à anotação e descrição dos fenômenos que fluem ante o observador.
Uma teoria científica não é, sob o ponto de vista do machismo, aquela que com mais exatidão descobre a essência e as leis dos fenômenos da matéria, mas a que descreve simples e oportunamente, de forma mais "econômica" os fenômenos observados. Todos os conceitos e leis físicas são condicionais, são apenas símbolos mais "econômicos" para a descrição da nossa experiência.
Reconhecendo às vezes em palavras a incompatibilidade da ciência com a religião, o machismo não só deixa de lutar contra esta última, como de fato proclama sua igualdade de direito com a ciência. Mach dizia que a religião é um assunto privado de cada homem; o empírio-criticismo, pois, não é adversário nem amigo da religião.
Lenin caracterizou esta "neutralidade" do machismo ante a religião como um servilismo perante o fideísmo, demonstrando que a interpretação machista da ciência, que renuncia ao estudo da essência das coisas, abre um amplo caminho para toda a espécie de mística e fideísmo.
Em sua crítica do machismo, Lenin desvendou as causas que engendraram a divulgação do machismo na sociedade burguesa, demonstrando que este fato está relacionado com a crise das ciências naturais burguesas. A infiltração do idealismo na física é facilitada pelas dificuldades do crescimento da própria ciência dentro da sociedade burguesa. A rutura das velhas teorias físicas demonstra o caráter relativo dos conhecimentos humanos. Uma parte dos físicos, por não dominar o método dialético-materialista, chegou à conclusão idealista de que a verdade objetiva não existe em geral, negando completamente o caráter objetivo da ciência. Do ponto de vista do machismo, que nega a realidade objetiva e declara que o mundo é um complexo de sensações do sujeito isolado — o homem, não pode haver nenhuma verdade objetiva. Toda verdade é subjetiva: tantos homens, tantas verdades. A teoria científica e o dogma religioso são igualmente justos. Partindo desse ponto de vista, os machistas chegavam a um relativismo completo.
Lenin demonstrou que, atrás da luta do machismo contra o materialismo, não se podia deixar de ver a luta dos partidos na filosofia, luta que, em última instância, expressa a tendência e a ideologia das classes hostis na sociedade moderna. Refutou as tentativas de Mach e Avenarius visando apresentar seus pontos de vista como a filosofia "mais nova" das ciências naturais e acentuou que, ao contrário, o machismo é, no fundo, o oposto das ciências naturais.
Entre os elementos oportunistas da Segunda Internacional houve os revisionistas que fizeram tentativas de "completar" o marxismo com o machismo, ou seja substituir o materialismo dialético pelo empirio-criticismo. Um desses revisionistas-machistas foi o austríaco Frederico Adler. Na Rússia, durante os anos da reação stolipiniana, quando a ofensiva da contrarrevolução se desenvolvia também na frente ideológica, aderiram ao machismo uma série de social-democratas que jamais se tinham mantido com firmeza nas posições marxistas. Entre eles figuravam escritores como Bogdanov, Basarov e Lunacharski (que em 1905 tinham aderido aos bolchevistas) e Yushkevich e Valentinov (menchevistas). Esses intelectuais dirigiam suas "críticas" simultaneamente contra os fundamentos filosóficos teóricos do marxismo, quer dizer, contra o materialismo dialético, e contra seus fundamentos histórico-científicos, quer dizer, contra o materialismo histórico.
Esta "crítica" se distinguia da crítica usual por não se desenvolver de modo franco e honrado, mas velada e hipocritamente, pretextando "defender" as posições fundamentais do marxismo. Nós, diziam estes "críticos", somos essencialmente marxistas: porém queremos "melhore o marxismo, depurá-lo de algumas teses "envelhecidas". Na realidade eram inimigos do marxismo, pois desejavam socavar-lhe os alicerces teóricos, embora negassem hipocritamente sua hostilidade para com o marxismo e, em sua duplicidade, continuassem a dizer-se marxistas. O perigo dessa crítica farisaica consistia em que, com ela, pretendia enganar aos militantes do Partido e levá-los à confusão. Quanto mais hipócrita fosse esse trabalho crítico de sapa, que tratava de minar fundamentos teóricos do marxismo, mais perigosa era para o Partido pois se identificava mais com a cruzada geral empreendida pela reação contra o Partido e contra a revolução. Parte dos intelectuais (o grupo dos chamados "pesquisadores" ou "construtores de Deus"), que desertara do marxismo, chegou até a pregar a necessidade de criar uma nova religião.
Aos marxistas impunha-se a tarefa indeclinável de dar a esses degenerados uma resposta adequada no campo da teoria marxista, arrancar-lhes o disfarce e desmascará-los, defendendo assim os fundamentos teóricos do Partido marxista.
Foi Lenin que enfrentou e realizou essa tarefa, em seu famoso livro "Materialismo e Empírio-criticismo", publicado em 1909(122).
Também hoje em dia o machismo atua como um dos inimigos mais inconciliáveis do materialismo. Os machistas atuais desejam modernizar o empírio-criticismo, adaptando-o às descobertas mais recentes das Ciências naturais, às novas exigências que a burguesia apresenta à sua filosofia como instrumento de reação ideológica. Até hoje o machismo continua sendo a filosofia mais divulgada entre os experimentadores naturalistas idealistas burgueses. Identifica-se também com a posição machista uma série de físicos estrangeiros, como Heisenberg, Schredinger, Dirac, Jeans, Eddington. O machismo moderno, ao interpretar de modo idealista e confuso as maiores descobertas da física, despenha-se para o franco misticismo, chegando a reconhecer uma quarta dimensão, povoada de espíritos, etc.
Muito próximo do machismo, encontra-se o chamado Pragmatismo (do grego, pragma — obra; "filosofia da obra", ou, em vista da obra ser compreendida aqui em seu estreito sentido utilitário, a "filosofia do praticismo"). Essa corrente se difundiu principalmente na Inglaterra e na América, onde teve grande desenvolvimento durante as primeiras décadas do século XX. Os representantes principais do pragmatismo são os americanos James e Dewey. Os pragmatistas caracterizam-se pela falta de confiança na teoria e devoção pela prática nitidamente praticista, pela vantagem e pela utilidade. Para eles, a ciência como reflexo do mundo objetivo é metafísica ociosa. Nas palavras, os pragmatistas manifestam-se não só contra o materialismo, mas também contra o idealismo, qualificando-o de "metafísica". Na realidade, porém, os pragmatistas pregam o idealismo subjetivo e o agnosticismo, adulterando de um modo idealista os conceitos da experiência e da prática. Para eles, o critério da verdade é a prática, porém não no sentido de uma prática produtora socialmente revolucionária, mas no mais estreito sentido utilitário como proveito, como praticismo. Do ponto de vista dos pragmatistas só é verdade o que ajuda praticamente os homens a adaptarem-se à vida. A verdade não deve corresponder ao objeto, mas às nossas tarefas e necessidade "práticas". Desse ponto de vista, as ideias religiosas são consideradas verdadeiras, já que têm um valor prático, levando aos homens "o consolo e o alívio". Por isso, James dá voltas e mais voltas ao redor da "experiência religiosa", do deus "prático", etc. Eis aí a pouca vergonha a que, levada pelos pragmatistas, chega à falsificação idealista da prática! James é, neste assunto, o mais franco dos pragmatistas. Em compensação outros, como Dewey, expressam-se com maior cuidado e não renunciam a fazer uso frequente de frases de "esquerda", embora sem modificar o conteúdo fundamental de seu subjetivismo e relativismo.
Se nos fins do século XIX e nos primeiros anos do século XX, as tendências predominantes na filosofia burguesa eram neo-kantianas e machistas (que eram mais ou menos as teorias filosóficas da burguesia liberal), durante o curso ulterior do desenvolvimento do pensamento filosófico burguês ganha a supremacia uma corrente ainda mais reacionária, uma especie de neo-hegelianismo e de intuicionismo.
O neo-hegelianismo nasceu durante a década de 60 do século XIX na Itália e na Inglaterra, porém teve sua maior divulgação pouco antes da primeira guerra imperialista, e particularmente depois dela. Os neo-hegelianos surgiram na Alemanha (Kroner, Libert e Kohen), na Itália (Gentile), na França, na Holanda.
Os ideólogos do capitalismo putrefacto são atraídos pela filosofia de Hegel, evidentemente não pelo seu lado revolucionário, não por sua dialética, a "álgebra da revolução", a "teoria da evolução mais multilateral, rica em conteúdo e profundidade", não pelo historicismo de Hegel. Ao contrário, esse aspecto revolucionário da filosofia hegeliana é pura e simplesmente negado e qualquer alusão a ele qualificada como "abuso ilícito de Hegel". Em troca, empurra-se para diante, por todos os meios, o aspecto reacionário do sistema idealista hegeliano; exagera-se a mística e o clericalismo. Hegel é declarado um místico cem por cento, um intuitivista e irracionalista; é interpretado no espírito do idealismo subjetivo e elogiado como conciliador da filosofia com a religião. Os ideólogos do imperialismo aferram-se à deificação do Estado por Hegel, à teoria hegeliana sobre a justificação moral da guerra, à identificação por Hegel do direito com a força, à defesa hegeliana do regime de casta, ao seu nacionalismo. Por todos os meios ao seu alcance, engrandecem os aspectos duplamente reacionários do hegelianismo, dão-lhe caráter absolutista, utilizando-os para justificar a política reacionária interior e exterior dos Estados imperialistas.
Os neo-hegelianos falam muito do "atualismo", da "energia" da filosofia. Falam até da "liberdade" individual. Contudo, na realidade, seu juízo sobre a "liberdade" nada mais significa que a tentativa de emancipar-se das leis da necessidade histórica que condenam o capitalismo à morte, e a tentativa de dar marcha a ré à roda da história. Incitam a burguesia à "energia", ou seja à luta contra o movimento revolucionário das massas, ao terror bestial, ao extermínio físico da vanguarda da classe operária.
Toda a filosofia burguesa contemporânea se caracteriza pela aspiração de limitar os direitos da razão, de exaltar o princípio irracional, o alógico ("a" em grego significa negação; "logos" significa razão). O pensamento científico, o entendimento e a razão, o conhecimento racional e a lógica começam a ser perigosos nas condições do capitalismo putrefacto, quando a burguesia sé vê obrigada a entrar em luta de morte com seus coveiros, com o proletariado revolucionário, que se manifesta sob a bandeira da ciência mais avançada, sob a bandeira do comunismo cientifico. A concepção filosófica do materialismo dialético, que é o sucessor e continuador de tudo que há de progressista na história do pensamento humano, que representa as maiores conquistas da razão humana na luta contra toda a espécie de opressão, contra toda a exploração e contra seus defensores — as forças negras do clericalismo e da mística — essa concepção filosófica infunde grande terror e espanto à burguesia moderna. Esta vira as costas, em geral, à ciência e a razão, e prega, cada vez mais abertamente, o irracionalismo, o intuicionismo (da palavra latina "intuição" que aqui significa a meditação mística imediata, oposta ao conhecimento racional, lógico).
O representante mais conhecido do intuicionismo é o filósofo francês Henri Bergson (1859-1941). Bergson afirma que o conhecimento raciocinado que se obtêm por meio das ciências, como a matemática, a física, a química, servem apenas a objetivos estritamente práticos e não descobre a essência das coisas. A razão só é capaz de reconhecer a realidade em seu aspecto externo, porém tal conhecimento não é verdadeiro, pois deforma a verdadeira realidade. O conhecimento autêntico da realidade em seu aspecto interno só nos pode proporcionar, segundo Bergson, uma filosofia que saia dos limites da razão e se encaminhe para a intuição. Essa intuição mística concebe o mundo material como uma corrente compacta de gêneses espirituais, que não se submetem ao conhecimento racional; a matéria é considerada como uma "consciência colhida com pinças"; a vida é interpretada como algo imaterial; declara-se o "impulso vital" místico, como princípio dos processos vitais. Numa palavra, Bergson proclama abertamente que a fonte da gênese espiritual e do "impulso vital" é a divindade, torrente ininterrupta de "energia criadora". Os sofismas refinados usados por Bergson para propagar seu idealismo místico tendem a revestir sua filosofia com uma aparência de algo novo e original. Na realidade, nutre-se apenas das escórias das velhas doutrinas filosóficas reacionárias, como das do neoplatônico Plotin ou das do "pai da igreja" católica Agostinho.
Em 1932, Bergson publicou um livro arquirreacionário, "Duas Fontes da Moral e da Religião", no qual prega a necessidade biológica das guerras, arremete contra a democracia como concepção política "antinatural", fala dos gênios super-homens místicos como guias espirituais da humanidade, e "argumenta" sobre a necessidade eterna da religião como sustentáculo espiritual do regime capitalista existente. É evidente que o intuicionismo se converteu numa das teorias anticientíficas utilizadas amplamente para justificar, do ponto de vista ideológico, o latrocínio imperialista e o saque dos povos coloniais.
Análogas funções desempenham na Inglaterra o chamado "wholismo" ("Filosofia do Totalismo") do general Smuts; na Alemanha, o racismo do Conde de Gobineau que prega a "mística do sangue", ou "valor desigual" nato das diversas raças e a necessidade de subordinação das raças "inferiores" às "superiores".
A crise geral do sistema capitalista revela-se, também no terreno ideológico, em uma decomposição, uma putrefação e uma decadência ideológica absoluta. As diversas formas reacionárias do idealismo eclético, o aniquilamento da base dos conhecimentos científicos, o descrédito do pensamento humano, a mitologia em lugar da ciência, a intuição mística em vez da razão: eis o que se observa cada vez mais em toda a atual filosofia burguês Os melhores cérebros da intelectualidade da Europa ocidental e América começam já a compreender que a União Soviética é o único baluarte firme contra a barbárie imperialista; que só sob a grande bandeira de Marx-Engels-Lenin-Stalin, a ciência e a cultura podem conservar-se e avançar. Daí o interesse dos melhores homens do mundo capitalista no materialismo dialético, na concepção filosófica mais avançada e consequentemente criada até o presente pelo gênio humano. Os maiores sábios dos diversos países do mundo capitalista proclamam-se abertamente adeptos do materialismo dialético e tratam de apoiar-se nele em suas investigações científicas. Não é menos certo que tal processo se efetua lenta e desigualmente: a rota que os sábios estrangeiros percorrem em direção ao materialismo dialético está cheia de sobrevivências da ideologia burguesa. Cada vez o avanço para a frente popular anti-imperialista é mais resoluto como o é para a ideologia do proletariado revolucionário, para o marxismo-leninismo.
No campo ideológico há duas espécies de ideias opostas: as ideias da força de vanguarda da sociedade e as das forças caducas. As primeiras "facilitam o desenvolvimento da sociedade, sua marcha progressista, sendo tanto maior sua importância quanto maior for a exatidão com que respondem às exigências do desenvolvimento da vida material da sociedade"(123). As segundas freiam o desenvolvimento da sociedade que desejam que a roda da história gire em sentido contrário. As primeiras ideias encarnam-se na teoria marxista-leninista. As segundas desenvolvem-se na atual filosofia burguesa. A luta pelo comunismo supõe ao mesmo tempo a luta contra as ideias putrefatas da atual filosofia burguesa que se levanta como uma barreira no caminho do progresso social, científico e cultural da humanidade.
Notas de rodapé:
(117) Engels. Ludwig Feuerbach. Tradução espanhola, Moscou 1941, páginas 1X-18. (retornar ao texto)
(118) Lenin. Materialismo e Empírio-Criticismo. Obras, tomo XIII, página 287, edição russa. (retornar ao texto)
(119) Idem, página 291. (retornar ao texto)
(120) Idem, página 169. (retornar ao texto)
(121) Idem, página 186. (retornar ao texto)
(122) "História do P. C. (b) da URSS". Tradução espanhola, Moscou 1939, página 118. (retornar ao texto)
(123) Stalin. Sobre o materialismo dialético e histórico. "Questões do Leninismo" - Tradução espanhola. Moscou 1941, página 648. (retornar ao texto)
Inclusão | 30/12/2015 |